CONCLUSÃO
Por fim, conclui-se que as provas orais, assim como as outras integrantes do conjunto probatório, precisam estar em conformidade com os limites estabelecidos pelas garantias constitucionais e as formalidades exigidas no processo. Essas não apenas cumprem com os imperativos do devido processo legal e da segurança jurídica, como também buscam a verdade processual, a qual deve ser o mais verossímil possível da real.
Temos, então, que a prática processual, segundo os dizeres de Natalie Ribeiro Pletsch, “nada mais é do que a representação cênica de inúmeras interpretações possíveis do 'caso penal'” (2007, p. 26), isto é, dentre diversas possibilidades de narrativas, o juiz acata aquela que o persuadiu. Contudo, para findar tal decisão, o juiz é influenciado tanto pelo discurso verbal, como também pelo não-verbal, ambos proferidos na coleta da prova oral.
Depreende-se ser “fundamental para que o processo funcione como mecanismo de redução de danos”, que exista “a percepção de que a subjetividade está intrincada com a racionalidade” e que, ambas, “funcionam conjunta e indistintamente no momento das decisões” (PLETSCH, 2007, p. 113).
Assumindo-se, então, a existência da perspectiva subjetiva do juiz como fator de relevância na valoração da prova e no consequente remate do conflito, a linguagem não-verbal encontra espaço para o debate acerca de sua influência na formação da sentença. Presente com ênfase nas provas orais, a comunicação corporal, por óbvio, transmite informações ao magistrado, tanto coincidindo com as declarações verbais, ou as contradizendo.
Indagou-se, a partir daí, acerca da possibilidade dessa interpretação ser utilizada como motivação, pelo juiz, na hora de proferir seu veredito.
O acusado não pode ser prejudicado pelo seu silêncio, assim como também pode apresentar sua própria versão dos fatos, adotando aquela que melhor lhe atende. Com isso, temos que a análise de aspectos não-verbais do acusado, para fundamentação pelo juiz, não se faz possível.
No que se refere ao ofendido, a comunicação não-verbal é tida com um artificio de convencimento, podendo aquele coadunar os tipos de linguagem para tentar convencer o juiz de sua narrativa. Assim, com o sistema de livre apreciação motivada das provas, pode o magistrado valorar com preponderância as declarações do ofendido frente a essa articulação corporal.
Já a prova testemunhal, por prestar compromisso com a verdade, deve ter seu relato analisado com maior cautela, atentado o magistrado para as divergências admissíveis entre linguagem verbal e não-verbal. Desse modo, deve o juiz realizar um exame minucioso do porquê da divergência, não podendo se antecipar aos motivos e concluir pela má-fé da testemunha. Existem muitas razões possíveis acerca das incongruências, sendo preferivel uma acareação para melhor compreensão do que uma aplicação de determinada interpretação equivocada e, consequentemente, indevida.
Dessa forma, Paul Ekman adverte que “não há um único indício infalível relacionado à dissimulação”, desse modo, temos que, “em todas as situações, as emoções não nos revelam a fonte” e a contradição entre as informações verbalizadas e as transmitidas pelo corpo, apenas nos “indica que precisamos de outras explicações; isso é tudo” (EKMAN, 2011, p. 232).
Por fim, restou clara sua impossibilidade de incriminação por falso testemunho (art. 342 CP) com base em divergência do discurso verbal e não-verbal, uma vez que não pode ser constatado, com firmeza, a existência do dolo por parte do agente.
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