5. REPERCUSSÃO DA INAPLICABILIDADE DOS PRECEDENTES JUDICIAIS NO MODELO BRASILEIRO SOB A VIGÊNCIA DO CPC/73: VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DA ISONOMIA E SEGURANÇA JURÍDICA.
5.1. ISONOMIA E SEGURANÇA JURÍDICA
A segurança jurídica, embora não esteja expressamente prevista na Constituição Federal, é direito fundamental assegurado ao cidadão e subprincípio concretizador do Estado Democrático de Direito.
De fato, o Estado Democrático de Direito só se confirma quando o cidadão tem garantias em relação ao modo como seu comportamento será visto diante da sociedade e como esse Estado irá efetivar seus direitos. Nesse sentido, Marinoni[20] afirma que:
A segurança jurídica, vista como estabilidade e continuidade da ordem jurídica e previsibilidade das consequências jurídicas de determinada conduta, é indispensável para a conformação de um Estado que pretenda ser “Estado de Direito”.
Sarlet[21], por sua vez, associa a Segurança ao Princípio da Dignidade da Pessoa Humana ao dispor que:
(...) a dignidade não restará suficientemente respeitada e protegida em todo lugar onde as pessoas estejam sendo atingidas por um tal nível de instabilidade jurídica que não estejam mais em condições de, com um mínimo de segurança e tranquilidade, confiar nas instituições sociais e estatais (incluindo o direito) e numa certa estabilidade das suas próprias posições jurídicas.
Em termos jurídicos, a segurança jurídica é efetivada na estabilidade da interpretação da norma jurídica, uma vez que a previsibilidade da decisão não depende apenas da lei (abstrata e genérica) em si, mas da interpretação que será dada a ela de acordo com a análise do caso concreto. Com efeito,
A acentuada imprevisibilidade das decisões judiciais fortalece os males provocados pela insegurança jurídica, contribuindo para enfraquecer o regime democrático. A presença da não uniformidade das decisões judiciais, por inexistência de causas jurídicas justificadoras para a mudança de entendimento por parte dos Tribunais Superiores e do Supremo Tribunal Federal, gera intranquilidade, tornando-se causa aumentativa dos conflitos. Ofende, de modo fundamental, aos princípios do regime democrático e do respeito à dignidade humana, da valorização da cidadania e da estabilidade das instituições[22].
Dessa forma, após analisar os sistemas jurídicos do Common Law e do Civil Law, conclui-se que o primeiro confere maior segurança jurídica em razão do respeito ao precedente (o jurisdicionado pode prever as consequências do seu ato e confiar nas decisões já proferidas), enquanto no segundo não existe vinculação às decisões anteriores no mesmo sentido, podendo cada juiz, ou o mesmo, decidir casos iguais de formas distintas. Assim, o advogado que atue no sistema jurídico do Common Law pode orientar seu cliente quanto à atuação do magistrado, enquanto no Civil Law não é possível saber se a lei será interpretada a favor do cliente ou não.
Outra garantia de segurança jurídica consiste na estabilidade das decisões, uma vez que é nela que a eficácia do direito tutelado se concretiza como forma de manutenção de um sistema jurídico estável.
De igual modo, o princípio da igualdade é constitucionalmente assegurado no caput do art. 5º da Constituição Federal, segundo o qual “todos são iguais perante a lei sem distinção de qualquer natureza”. Dessa forma, não é permitida a diferenciação sem motivos que justifiquem a adoção dessa postura, ou seja, só são permitidas discriminações na exata medida das desigualdades existentes.
Nesse sentido, Dinamarco[23] dispõe que
A absoluta igualdade jurídica não pode, contudo, eliminar a desigualdade econômica; por isso, do primitivo conceito de igualdade, formal e negativa (a lei não deve estabelecer qualquer diferença entre os indivíduos), clamou-se pela passagem à igualdade substancial. E hoje, na conceituação positiva da isonomia (iguais oportunidades para todos, a serem propiciadas pelo Estado), realça-se o conceito realista, que pugna pela igualdade proporcional, a qual significa, em síntese, tratamento igual aos substancialmente iguais.
Este princípio atua em dois planos: frente ao legislador (ou executivo) quando da edição de leis e atos normativos, impedindo o tratamento desigual em situações idênticas; e na obrigatoriedade de aplicação da lei sem diferenciação em razão do sexo, idade, raça, origem, convicção política e religiosa.
O princípio da igualdade atua, portanto, como limitador do legislador, do intérprete da lei e também do particular. No primeiro caso, quando da criação da lei a não observância desse princípio acarreta a inconstitucionalidade da mesma. Quanto ao interprete, é vedado aplicar a lei ao caso concreto de forma a criar ou aumentar desigualdades existentes. Por fim, ao particular é vedada a adoção de condutas discriminatórias sob pena de sanção civil e penal.
No judiciário esse princípio concretiza-se na igualdade de tratamento, de acesso e de técnica processual e, acima de tudo, na uniformidade das decisões proferidas em respeito às já existentes, especialmente em casos semelhantes.
De fato, permitir que os juízes decidam com base em seu subjetivismo, sua interpretação própria da lei, significa abrir margem para a existência de decisões que, embora versem sobre a mesma matéria, conflitem entre si, desacreditando o judiciário diante da sociedade e distorcendo a idéia de justiça.
Além disso, deve-se atentar para o poder dado ao judiciário atualmente, capaz de exercer o controle de constitucionalidade de leis, e, assim, negar o produto da elaboração dos eleitos pela maioria (poder legislativo). Nesse sentido, Marinoni[24] afirma que
Nota-se que se o Judiciário tem o poder de afirmar o significado dos direitos fundamentais para controlar e corrigir as leis, a decisão judicial que os afirma, por ter uma decisão que transcende a toda legislação infraconstitucional e a necessidade de identificar um discurso racional, não pode deixar de ter alcance geral obrigatório (...). De qualquer forma, esta claro que as concepções de direito e jurisdição foram transformadas, sobretudo em virtude do impacto da técnica das cláusulas gerais e do neoconstitucionalismo. Isso é mais do que suficiente para impor urgente elaboração dogmática capaz de garantir a igualdade perante as decisões judiciais.
5.2. NECESSIDADE DE PRECEDENTES VINCULANTES
O Estado de Direito implica necessariamente na limitação dos poderes estatais, garantia dos direitos fundamentais e controle de constitucionalidade das leis. Nesse contexto, o juiz assume papel de “controlador” desse poder estatal tendo em vista que o direito que impõe limites ao poder, é o mesmo aplicado e interpretado por juízes.
Dessa forma é que as decisões judiciais, notadamente quando da aplicação do controle de constitucionalidade difuso pelos juízes de primeiro grau (que podem decidir inclusive contrariamente ao que determinam os tribunais superiores) das quais efetivamente resulta a aplicação da norma jurídica, devem ser coerentes num mesmo sistema jurídico, e pautadas pela igualdade.
Aliado a isso, diante da existência de cláusulas gerais que permitem ao juiz maior liberdade de decisão e adaptação da lei ao caso concreto, é imprescindível a existência de uma coerência entre decisões em casos similares como forma de efetivação dos princípios constitucionais.
De fato,
a advertência de que a lei é igual para todos, que sempre se viu escrita sobre a cabeça dos juízes nas salas do civil law, além de não mais bastar, constitui piada de mal gosto àqueles que, perante uma das turmas do Tribunal e sob a inscrição, recebe decisão distinta a proferida – em caso idêntico – pela Turma cuja sala se localiza metros adiante, no mesmo longo corredor de prédio que, antes de tudo, deveria abrigar a igualdade de tratamento perante a lei[25].
Assim, parece que a melhor alternativa à resolução desse impasse seria a adoção de um sistema de precedentes vinculantes, tal com exposto por Paula Pessoa Pereira[26]:
Convém destacar que quando se trata aqui de precedente vinculante esta se falando da adoção de regra jurídica coerente que deve ser observado pelos tribunais nos casos semelhantes, a fim de se evitar a loteria judiciária, onde demandas jurídicas semelhantes são tuteladas de forma diferente. Contudo, não queremos sustentar aqui que a uniformidade de decisões que é ditada pelo princípio da igualdade perante as decisões judiciais (treat like cases alike) implica a eliminação da capacidade dos tribunais em fazer escolhas diferentes em circunstâncias similares, quando presente necessidades que refletem diferentes preferências, em razão da diversidade e do pluralismo. Evidentemente, o princípio da uniformidade das decisões em alguns casos não é desejável, porquanto as particularidades do caso concreto não o aceitam, o que requer uma nova decisão que leve em consideração as diferenças. E esta diferenciação, ao contrário do que se pode supor, é a desejável, todavia, para tanto, competirá ao tribunal fazer uso de um esforço argumentativo a fim de demonstrar a particularidade presente no caso e o afastamento da regra. O que não pode, e não é aceitável, é a marginalização do precedente quando o caso apresenta os mesmos fatos e os mesmos argumentos de direito.
Canotilho[27], por sua vez, entende que a segurança jurídica envolve a estabilidade e a previsibilidade das decisões, sendo a primeira o fato de que uma vez adotada uma posição pelos tribunais estaduais, e de esta revestir-se das formalidades legais, não deverá ser modificada, exceto quando existirem particularidades relevantes que autorizem essa mudança; e a previsibilidade refere-se à necessidade de certeza quanto aos efeitos jurídicos dos atos normativos.
Dessa forma,
a experiência do common law demonstra que o precedente contribui à segurança jurídica. No civil law, a aplicação de interpretação consolidada a respeito do sentido das leis de uma maneira geral e, mais ainda, dos conceitos jurídicos indeterminados e cláusulas gerais, permitiria um equilíbrio entre a necessidade de arejamento do sistema e a isonomia de tratamento para casos iguais e o estabelecimento de um ambiente de mínima previsibilidade para os cidadãos. Ao precedente cabe o papel de realizar os valores de igualdade, coerência e continuidade do ordenamento[28].
Pode-se pensar, portanto, numa aproximação maior entre os dois sistemas tendo por base a exitosa experiência do Common Law na adoção dos precedentes, como forma de assegurar a isonomia, a segurança jurídica, a estabilidade e a previsibilidade das decisões judiciais.
Como forma de exemplificar a disparidade existente nas decisões judiciais proferidas pelos juízes brasileiros, podemos citar interessante estudo[29] acerca da fixação de indenização em caso de dano moral pelo Superior Tribunal de Justiça nos casos de dano provocado por banco a seus clientes.
Nele verificou-se que em 70% dos casos a corte reduziu o valor da indenização fixada pelo tribunal a quo, estabelecendo valores entre cinco e trinta mil reais. Constatou-se que
No universo dos julgados estudados, a média condenatória na primeira instância é de R$ 88.585,38; na segunda instância, eleva-se para R$ 105.920,86; e no Superior Tribunal de Justiça, a media decai vertiginosamente para R$ 12.445,59. Se somente considerados os valores médios, a redução experimentada no âmbito do Superior Tribunal de Justiça é da ordem de 85,95% relativamente à quantia fixada na primeira instância e de 88,25% em relação à segunda instância[30].
Diante disso, questiona-se qual a razão dessa redução vertiginosa e porque a concessão de indenizações em valores muito superiores aos fixados pelo tribunal superior, evidenciando a pouca credibilidade no julgamento dos juízes de primeiro grau e a reiterada inobservância dos precedentes da corte.
Nesse mesmo sentido, um recente estudo feito pela Faculdade de Direito da FGV-Rio, o “I Relatório do Supremo em números”[31], constatou-se que de trinta mil processos que chegam ao Supremo, noventa e dois por cento são recursos (recursos extraordinários e agravos), enquanto os processos constitucionais constituem 0,5% dos casos. Isso comprova que antes de ser realmente uma Corte Constitucional, o STF é um tribunal recursal. Tudo isso em razão da inobservância dos precedentes. Enquanto isso, a Suprema Corte dos Estados Unidos julga menos de 200 causas constitucionais por ano[32].
5.3 PRECEDENTES JUDICIAIS E O NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL BRASILEIRO
O crescimento das demandas e a necessidade de maior celeridade, ao mesmo tempo em que se exige a observância de princípios básicos, como a isonomia e a segurança das decisões judicias, são questões recorrentes do cenário jurídico brasileiro, que levaram ao desenvolvimento de instrumentos no intuito de solucioná-los, a exemplo das súmulas e do efeito vinculante atribuído às decisões em algumas situações.
Nesse quadro, surge o Novo Código de Processo Civil no intuito de aperfeiçoar institutos vigentes e implementar novos modelos, aproximando ainda mais as duas famílias jurídicas objeto do presente estudo, uma vez que “a composição da lei escrita com o precedente já não existe e, sobretudo, já não serve para dividir o mundo em dois, as coisas tornaram-se mais complexas[33]”.
Ao analisar o Novo Código vislumbra-se que fora ampliada a utilização das cláusulas gerais e conceitos jurídicos indeterminados como forma de possibilitar maior efetividade ao direito processual na tutela do direito material. A primeira, de acordo com Judith Martins Costa[34],
constitui, portanto, uma disposição normativa que utiliza, no seu enunciado, uma linguagem de tessitura intencionalmente “aberta”, “fluida” ou “vaga”, caracterizando-se pela ampla extensão do seu campo semântico, a qual é dirigida ao juiz de modo a conferir-lhe um mandato (ou competência) para que, à vista dos casos concretos, crie, complemente ou desenvolva normas jurídicas, mediante o reenvio para elementos cuja concretização pode estar fora do sistema; estes elementos, contudo, fundamentarão a decisão, será viabilizada a ressistematização destes elementos originariamente extra-sistemáticos no interior do ordenamento jurídico.
Os conceitos jurídicos indeterminados, por outro lado, ela divide em duas espécies:
(...) referentes a valores são os que mais se assemelham às clausulas gerais, pois também apresentam vagueza semântica e reenvio a standarts. Para alguns, a diferença entre clausula geral e conceito jurídico indeterminado referente a valores é que a norma que contem um conceito jurídico indeterminado já apresenta as consequências, quais os efeitos incidentes no caso concreto da aplicação do dispositivo. Na cláusula geral isso não ocorre, a operação intelectiva do juiz é mais complexa e vai mais longe, pois é ele quem determina os efeitos, as consequências práticas[35].
Assim, diante dessa crescente utilização de cláusulas abertas e conceitos indeterminados é que Luiz Guilherme Marinoni propõe uma aproximação entre os sistemas da Common law e Civil law , com a maior utilização de precedentes. De fato,
Se a outorga de sentido aos textos é dada mediante a reconstrução de elementos jurídicos à disposição do juiz no momento da aplicação do direito, então é certo que a norma não preexiste no momento de sua interpretação/aplicação. Logo, para promoção do império do direito é preciso vinculação às normas concretas formuladas pela jurisdição. Em uma perspectiva geral, a nova teoria das normas (princípios, regras e postulados) e a nova técnica legislativa, com emprego de conceitos indeterminados e cláusulas gerais, impõem para promoção da supremacia um sistema baseado em precedentes vinculantes. Em uma perspectiva particular, de reconstrução normativa para solução do caso concreto, para que exista atendimento fiel ao dever de motivação das decisões judiciais, é preciso atentar para a necessidade de fundamentação especifica quando há colisão de princípios, afastamento de regras, densificação de termos indeterminados e de determinação de congruências jurídicas não previstas expressamente pelo legislador[36].
É nesse contexto que o Novo Código de Processo Civil traz um capítulo destinado aos Precedentes Judiciais que visa à solução das incongruências existentes entre as decisões e a efetivação dos princípios constitucionais até então flagrantemente violados. É o que se depreende da leitura do art. 926 do CPC/15, abaixo transcritos:
Art. 926. Os tribunais devem uniformizar sua jurisprudência e mantê-la estável, íntegra e coerente.
§ 1o Na forma estabelecida e segundo os pressupostos fixados no regimento interno, os tribunais editarão enunciados de súmula correspondentes a sua jurisprudência dominante.
§ 2o Ao editar enunciados de súmula, os tribunais devem ater-se às circunstâncias fáticas dos precedentes que motivaram sua criação.
Como se vê, a intenção do legislador foi assegurar a efetivação de princípios que até então vinham sendo sacrificados a pretexto da independência dos juízes quando da prolação de suas decisões, que permitia até mesmo a violação às decisões da Corte.
Nesse sentido, merecem destaque as hipóteses em que o CPC/15 prevê a vinculação aos precedentes de maneira expressa:
Art. 927. Os juízes e os tribunais observarão:
I - as decisões do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade;
II - os enunciados de súmula vinculante;
III - os acórdãos em incidente de assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas e em julgamento de recursos extraordinário e especial repetitivos;
IV - os enunciados das súmulas do Supremo Tribunal Federal em matéria constitucional e do Superior Tribunal de Justiça em matéria infraconstitucional;
V - a orientação do plenário ou do órgão especial aos quais estiverem vinculados.
Verifica-se, ainda, uma aproximação do Common law em razão da existência de institutos semelhantes ao distinguishing e overruling, que afastam a aplicação do precedente no julgamento de caso semelhante em razão das particularidades do caso concreto ou permitem a alteração do mesmo em razão da mudança de contexto, exigindo-se, em ambos os casos, fundamentação.
Art. 927.
(...)
§ 2o A alteração de tese jurídica adotada em enunciado de súmula ou em julgamento de casos repetitivos poderá ser precedida de audiências públicas e da participação de pessoas, órgãos ou entidades que possam contribuir para a rediscussão da tese.
§ 4o A modificação de enunciado de súmula, de jurisprudência pacificada ou de tese adotada em julgamento de casos repetitivos observará a necessidade de fundamentação adequada e específica, considerando os princípios da segurança jurídica, da proteção da confiança e da isonomia.
O legislador preocupou-se, ainda, com os efeitos resultantes da alteração dos precedentes e da jurisprudência e sua repercussão na Segurança Jurídica, conforme se depreende da leitura dos excertos abaixo:
Art.927. (...)
§ 3º na hipótese de alteração de jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal e dos tribunais superiores ou daquela oriunda de julgamento de casos repetitivos, pode haver modulação dos efeitos da alteração no interesse social e no da segurança jurídica.
§4º A modificação de enunciado de súmula, de jurisprudência pacificada ou de tese adotada em julgamento de casos repetitivos observará a necessidade de fundamentação adequada e específica, considerando os princípios da segurança jurídica, da proteção da confiança e da isonomia.
Importante ressaltar a inserção de dois institutos novos: o incidente de assunção de competência e o incidente de resolução de demanda repetitiva (IRDR). No primeiro caso temos a assunção da competência para julgamento de recurso, remessa necessária ou ação de competência originária por órgão fracionário indicado pelo regimento interno, com a finalidade de prevenção de divergência.
Art. 947. É admissível a assunção de competência quando o julgamento de recurso, de remessa necessária ou de processo de competência originária envolver relevante questão de direito, com grande repercussão social, sem repetição em múltiplos processos.
§ 1o Ocorrendo a hipótese de assunção de competência, o relator proporá, de ofício ou a requerimento da parte, do Ministério Público ou da Defensoria Pública, que seja o recurso, a remessa necessária ou o processo de competência originária julgado pelo órgão colegiado que o regimento indicar.
§ 2o O órgão colegiado julgará o recurso, a remessa necessária ou o processo de competência originária se reconhecer interesse público na assunção de competência.
§ 3o O acórdão proferido em assunção de competência vinculará todos os juízes e órgãos fracionários, exceto se houver revisão de tese.
§ 4o Aplica-se o disposto neste artigo quando ocorrer relevante questão de direito a respeito da qual seja conveniente a prevenção ou a composição de divergência entre câmaras ou turmas do tribunal.
O IRDR, por sua vez, consiste em um procedimento especial para julgamento de processos repetitivos sobre mesma matéria em determinado Estado ou Região. Julgado o incidente, a tese deverá ser aplicada por todos os juízes em razão do efeito vinculante. Os requisitos exigidos são os seguintes:
Art. 976. É cabível a instauração do incidente de resolução de demandas repetitivas quando houver, simultaneamente:
I - efetiva repetição de processos que contenham controvérsia sobre a mesma questão unicamente de direito;
II - risco de ofensa à isonomia e à segurança jurídica.
Dessa forma, o Novo Código de Processo Civil visa assegurar a observância da isonomia, segurança jurídica, estabilidade das decisões e a celeridade, resgatando valores até então violados pelos julgadores.
Quanto à eficácia das decisões judiciais, Ministro Luís Roberto Barroso[37] e Patrícia Perrone esclarecem que:
A eficácia das decisões judiciais foi substancialmente alterada pelo CPC/2015. Permaneceram dotadas de eficácia persuasiva as decisões proferidas pelos juízos de primeiro grau. O mesmo ocorreu com os acórdãos dos tribunais em geral, desde que proferidos em casos não sujeitos a incidente de resolução de demanda repetitiva ou ao incidente de assunção de competência.
Por outro lado, são dotados de eficácia normativa em sentido forte: as súmulas vinculantes, os julgados produzidos em controle concentrado da constitucionalidade, os acórdãos proferidos em julgamento com repercussão geral ou em recurso extraordinário ou especial repetitivo, as orientações oriundas do julgamento de incidente de resolução de demanda repetitiva e de incidente de assunção de competência. O desrespeito a estes precedentes enseja a sua cassação, por meio de reclamação, junto à corte que o proferiu, nos termos do art. 988 do CPC
Produzem eficácia intermediária ou eficácia normativa em sentido fraco os enunciados da súmula simples da jurisprudência do STF e do STJ sobre matéria constitucional e infraconstitucional, respectivamente, e as orientações firmadas pelo plenário ou pelos órgãos especiais das cortes. Esses entendimentos são obrigatórios e devem ser seguidos. Entretanto, sua inobservância não possibilita o ajuizamento de reclamação. Por consequência, tal "dever" tenderá a funcionar, a prática, como mera recomendação, ao menos no estágio cultural em que nos encontramos no que respeita à operação com precedentes judiciais.