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Enriquecimento ilícito e pagamento indevido

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09/10/2018 às 11:00

Resumo:


  • O enriquecimento ilícito ocorre quando alguém obtém vantagem patrimonial sem justa causa, à custa de outrem, e é obrigado a restituir o indevidamente auferido.

  • A ação de repetição de indébito permite que o pagador reivindique a devolução de pagamentos realizados por erro, sem a existência de uma obrigação válida que justifique o enriquecimento.

  • No direito tributário, a repetição de indébito refere-se à possibilidade do contribuinte solicitar a restituição de tributos pagos indevidamente ou a mais do que o devido, conforme as condições estabelecidas pelo Código Tributário Nacional (CTN).

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

III – PREJUÍZOS CAUSADOS AO ENRIQUECIDO

Quanto aos prejuízos que o objeto possa causar ao enriquecido, Pontes de Miranda(Tratado de Direito Privado, volume XXIV, pág. 226) disse:

  1. Se o que recebeu destrói o documento, ou o reconhecimento de dívida, ou renuncia a garantias, ou deixa de prescrever o crédito, não tem dever de restituir, mas, tratando-se de erro quanto ao devedor, o que pagou tem ação contra o devedor verdadeiro e o fiador(artigo 880 do Código Civil);
  2. Se o objeto causa dano a outro objeto, ou à pessoa do que recebeu, desconta-se o valor dos prejuízos. Aqui ensinou Pontes de Miranda que o princípio que se acentuou aqui, somente concerne ao que tem de restituir o enriquecimento injustificado, tendo estado de boa-fé. O enriquecido, que estava de má-fé, desde o início, não tem pretensão a ressarcimento do dano causado pelo bem com que enriqueceu; se a boa-fé havia ao se dar o enriquecimento injustificado e só depois desapareceu, é ressarcível o dano que ocorreu durante o tempo da boa-fé;
  3. As despesas de transporte, alfândegas, impostos, custas e outras semelhantes, relativas ao recebimento da prestação, também se descontam;
  4. Se houve contraprestação, o enriquecido pode reclamar o que contraprestou, na medida do enriquecimento do que exerceu a pretensão;
  5. As despesas que o enriquecido faça para restituir hão de ser restituídas (comissão de banco e mais despesas de remessa do dinheiro, transporte do animal, custas e mais despesas de ordem notarial). O enriquecido de boa-fé pode computar, no que se há de deduzir do quanto do enriquecimento, aquilo que perdeu com a confiança na existência de causa do negócio jurídico(vendeu o objeto recebido e deve indenizar o comprador de boa-fé), porém não, se não a prestação pelo figurante titular da pretensão de enriquecimento. Nesta matéria, quanto ao agravamento da responsabilidade do enriquecido, apliquem-se os artigos 878, 1244 – 1.222);


IV – AÇÃO DE ENRIQUECIMENTO INJUSTIFICADO E PARTE PASSIVA

A pretensão e a ação de enriquecimento sã pessoais. Não se trata de pretensão e ação subsidiárias., como avisou Plank(Kommentar, II, 4ª edição, 931).

Com a litispendência, ou com o conhecimento anterior da falta de causa de recepção, começa a responsabilidade do que recebeu como para o devedor em mora.

Ensinou Pontes de Miranda(obra citada, pág. 229) que, se a propriedade foi transferida sem causa, a ação pelo enriquecimento indevido contém a condictio possessionis. Se só se transferiu a posse, pois que não era titular da propriedade o possuidor, ou não a adquiriu o adquirente da posse, cabe a condictio possessionis. O demandado não pode alegar, em defesa, ou exceção, que o demandante não era proprietário; nem o demandante tem de afirmar a sua propriedade.

Na matéria envolvendo aquisição de imóvel, à luz do artigo 967 do Código Civil de 1916, tinha-se:

Art. 967. Se, aquele, que indevidamente recebeu um imóvel, o tiver alienado, deve assistir o proprietário na retificação do registro, nos termos do art. 860.

O artigo 860 do Código Civil por sua vez determinava:

Art. 860. Se o teor do registro de imóveis não exprimir a verdade, poderá o prejudicado reclamar que se retifique.

Parágrafo único. Enquanto se não transcrever o título de transmissão, o alienante continua a ser havido como dono do imóvel, e responde pelos seus encargos.

Para Pontes de Miranda(obra citada, pág. 230), o artigo 967 do Código Civil de 1916 ressentia-se de defeituosa terminologia: confundia-se o credor da propriedade com o proprietário e falava-se do novo registro como retificação. O registro exprimia a verdade; apenas, com a eficácia da sentença na ação de enriquecimento injustiçado, se faz volver ao dador a propriedade do imóvel. Disse ainda Pontes de Miranda(obra citada, pág. 231), em redação atualizada por Vilson R. Alves: “Mas, é de advertir-se, o registro de imóveis exprimia a verdade: a propriedade passara ao enriquecido, ou a ele e ao terceiro adquirente a título gratuito, ou a título oneroso e de ma-fé: não se há de pensar em retificação e, sim em volta(novo registro), o que se discrepa, até certo ponto, da terminologia incorreta do Código Civil anterior, art. 967, atende ao sistema do direito registrário brasileiro. A inscrição, segundo o artigo 227 do Decreto nº 4.857, seria inadequada; a averbação, minus. Se fosse feita a inscrição, satisfazia-se ao sistema jurídico, ; se fosse feita a inscrição, à letra da lei, pois não se poderia entender ineficaz ou nula, posto que inadequada. Mas o que há de fazer é a transcrição, hoje registro(Lei nº 6.015, artigo 168), em retorno.

A ação de enriquecimento injustificado, em princípio, só se dirige contra o enriquecido ou contra os seus herdeiros, ou outros sucessores universais; não contra o sucessor a título particular. Se algumas pessoas foram enriquecidas pela mesma prestação, cada uma responde na medida em que se enriqueceram; se não e pode saber em que medida o fora, restituem todas, por partes iguais.

Assim, se B aliena a C objeto que adquiriu de forma injustiçada, B tem de restituir a o preço pelo qual alienou; e, em princípio, C nada teria a temer.

No Código Civil de 1916 tinha-se o artigo 879, na linha do Código Civil alemão, § 822:

Art. 879. Se a prestação do fato se impossibilitar sem culpa do devedor, resolver-se-á a obrigação; se por culpa do devedor, responderá este pelas perdas e danos. .

Por sua vez, em caso de cobrança judicial indevida, o CC prevê:

Art. 940. Aquele que demandar por dívida já paga, no todo ou em parte, sem ressalvar as quantias recebidas ou pedir mais do que for devido, ficará obrigado a pagar ao devedor, no primeiro caso, o dobro do que houver cobrado e, no segundo, o equivalente do que dele exigir, salvo se houver prescrição.

Art. 941. As penas previstas nos arts. 939 e 940 não se aplicarão quando o autor desistir da ação antes de contestada a lide, salvo ao réu o direito de haver indenização por algum prejuízo que prove ter sofrido. (Grifou-se)

Nesse caso, a simples propositura da medida representa justificativa suficiente para amparar a procedência do pedido de repetição, em dobro, a ser formulada mediante reconvenção ou pedido contraposto, conforme o rito.

Ressalva-se, contudo, a ponderação da Súmula nº 159, do STF que impede a aplicação dessa penalidade, se houver boa-fé do pretenso credor.

Também sobre a repetição de indébito, o CDC dispõe:

Art. 42. Na cobrança de débitos, o consumidor inadimplente não será exposto a ridículo, nem será submetido a qual tipo de constrangimento ou ameaça.

Parágrafo único. O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável. (Grifou-se)


V – A REPETIÇÃO DE INDÉBITO E O CDC

Assim, em se tratando de relação de consumo, prescinde de ser judicial a cobrança, para aplicação da repetição da quantia em dobro, em favor do consumidor.

A esse respeito, Antônio Herman de Vasconcellos e Benjamin2 destaca que, no CDC, "usa-se aqui o verbo cobrar, enquanto o CC refere-se a demandar. Por conseguinte, a sanção, no caso da lei especial, aplica-se sempre que o fornecedor (direta ou indiretamente) cobrar e receber, extrajudicialmente, quantia indevida".

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Logo, outro pressuposto para a repetição do indébito em dobro na relação de consumo é, além da cobrança, o pagamento indevido, o que é dispensável segundo elenca o artigo 940 do CC, pelo qual a simples propositura da demanda judicial é bastante para tanto.

Nesse sentido, a jurisprudência do Col. STJ:

RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. TARIFA DE ÁGUA E ESGOTO. ENQUADRAMENTO NO REGIME DE ECONOMIAS. CULPA DA CONCESSIONÁRIA. RESTITUIÇÃO EM DOBRO. 1. O art. 42, parágrafo único, do CDC estabelece que "o consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável". 2. Interpretando o referido dispositivo legal, as Turmas que compõem a Primeira Seção desta Corte de Justiça firmaram orientação no sentido de que "o engano, na cobrança indevida, só é justificável quando não decorrer de dolo (má-fé) ou culpa na conduta do fornecedor do serviço" (REsp 1.079.064/SP, 2ª Turma, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe de 20.4.2009). Ademais, "basta a culpa para a incidência de referido dispositivo, que só é afastado mediante a ocorrência de engano justificável por parte do fornecedor" (REsp 1.085.947/SP, 1ª Turma, Rel. Min. Francisco Falcão, DJe de 12.11.2008). Destarte, o engano somente é considerado justificável quando não decorrer de dolo ou culpa. 3. Na hipótese dos autos, conforme premissas fáticas formadas nas instâncias ordinárias, não é razoável falar em engano justificável. A cobrança indevida de tarifa de água e esgoto deu-se em virtude de culpa da concessionária, a qual incorreu em erro no cadastramento das unidades submetidas ao regime de economias. Assim, caracterizada a cobrança abusiva, é devida a repetição de indébito em dobro ao consumidor, nos termos do parágrafo único do art. 42 do CDC. 4. Recurso especial provido. (STJ 1ª turma Min. Rel. Denise Arruda REsp 1084815/SP DJ 5.8.2009) (Grifou-se)

Se o objeto de pagamento indevido for um imóvel, aplica-se o artigo 879 do Código Civil:

Art. 879. Se aquele que indevidamente recebeu um imóvel o tiver alienado em boa-fé, por título oneroso, responde somente pela quantia recebida; mas, se agiu de má-fé, além do valor do imóvel, responde por perdas e danos.

Parágrafo único. Se o imóvel foi alienado por título gratuito, ou se, alienado por título oneroso, o terceiro adquirente agiu de má-fé, cabe ao que pagou por erro o direito de reivindicação.

Há hipóteses legais de exclusão da restituição do indébito:

a)  O accipiens, que recebe de quem não é o devedor pagamento de prestação como parte de dívida verdadeira, inutilizou o título, deixou prescrever a prestação ou abriu mão das garantias que asseguravam seu direito(CC, artigo 880, primeira parte);

b)  O pagamento se destinou a solver dívida prescrita ou obrigação natural ou judicialmente exigível (artigo 882, Código Civil);

c)  O solvens pagou certa importância com o intuito de obter fim ilícito ou imoral(artigo 883).


 VI - REPETIÇÃO DE INDÉBITO TRIBUTÁRIO

Repetição de indébito tributário refere-se à possibilidade do direito do contribuinte pleitear, junto às autoridades fazendárias, a devolução de tributo pago indevidamente ou nas demais hipóteses listadas pela Lei.

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Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ROMANO, Rogério Tadeu. Enriquecimento ilícito e pagamento indevido. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5578, 9 out. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/68761. Acesso em: 22 dez. 2024.

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