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O direito das consumidoras-mães ao aleitamento em estabelecimentos

05/09/2018 às 14:50
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Critica-se a proibição de aleitamento em estabelecimentos privados, em diversos lugares do mundo, incluído o Brasil. Para tanto, são verificadas as legislações aplicáveis ao caso.

 

 

 

Nos últimos meses, um assunto que não deveria ser polêmico, por envolver um ato extremamente natural e de amor, ganhou as mídias sociais, impressa e a TV. É cada vez mais comum os noticiários divulgarem informações de mães que foram expulsas ou advertidas por estarem amamentando em estabelecimentos privados como bares, restaurantes, shopping centers etc.

Algumas dessas mães, além de serem advertidas, foram expulsas desses estabelecimentos, como aconteceu em um Shopping Center de Oklahoma, nos Estados Unidos. [1] Aqui no Brasil, vários casos também já aconteceram em diferentes estados da federação, e nos mais diversos lugares, como shoppings, lojas, pontos de ônibus e dentro dele, e também em restaurantes. [2]

Afinal de contas, como consumidoras, essas mães têm direito de amamentar seus filhos nos estabelecimentos? O que diz o Código de Defesa do Consumidor a respeito do assunto?

De início é importante destacar que a amamentação é a forma mais saudável de alimentação do bebê, já comprovada em estudos científicos e recomendada por todos os profissionais médicos.

A amamentação, além de ser extremamente saudável para o bebê, cria um vínculo de afeto e carinho da mãe com o seu filho em toda plenitude da maternidade. É um ato perfeitamente natural e que não ofende os bons costumes de qualquer sociedade.

O Código de Defesa do Consumidor não tem nenhum dispositivo específico sobre o direito à amamentação, mas isso não significa dizer que a prática possa ser proibida pelos estabelecimentos.

O Estatuto da criança e do adolescente prevê que a criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata a lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade. Além disso, o mesmo estatuto dispõe que é dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, arts. 3º e 4º, e complementa o art. 9º que o poder público, as instituições e os empregadores propiciarão condições adequadas ao aleitamento materno.

Desse modo, o ECA prevê expressamente que é dever da sociedade, da família e do poder público, com absoluta prioridade, o direito à alimentação e esse direito não pode ser suprimido por qualquer regulamentação ou norma interna.

Ademais, o art. 7º do CDC dispõe que os direitos previstos neste código não excluem outros decorrentes de tratados ou convenções internacionais de que o Brasil seja signatário, da legislação interna ordinária, de regulamentos expedidos pelas autoridades administrativas competentes, bem como dos que derivem dos princípios gerais do direito, analogia, costumes e equidade.

Em Belo Horizonte, existe a Lei Municipal n. 10.940/2016 que prevê multa ao estabelecimento que vier a constranger a gestante, independentemente da existência de áreas exclusivas para aleitamento. Em âmbito estadual, também existe a Lei n. 22.439/2016 que regulamenta o direito à amamentação.

Em Teresina, no Estado Piauí, existe a Lei n. 4.778/2015, que também proíbe o constrangimento, assim também, em São Paulo, a Lei n. 16.047/2015, e, no Rio de Janeiro, a Lei Estadual n. 7.115/2015 também proíbe qualquer tipo de constrangimento sob pena de multa.

Obras de arte, por diversas vezes, já retrataram o ato de aleitamento no decorrer da história, mas, nos dias atuais, por incrível que pareça, esse ato natural passou a ser ofensivo a uma parcela da população. [3]

Essa mesma sociedade que se sente ofendida com o aleitamento, não se sente ofendida com a nudez gratuita nas publicidades, na televisão, na internet. Comercialmente, tudo é possível.

Atualmente, no Congresso Nacional existe um Projeto de Lei do Senado, PLS/2015, de autoria da Senadora Vanessa Grazziotin do PCdoB do Amazonas que dispõe sobre o direito à amamentação em público, em estabelecimentos públicos ou privados, independentemente da existência de locais apropriados e ainda tipifica como crime a prática do constrangimento ou proibição.

Desse modo, entende-se que, mesmo não estando prevista no art. 39 do CDC, a prática de constranger o aleitamento em qualquer tipo de estabelecimento, existindo lugar destinado ou não, é uma prática abusiva que viola os direitos fundamentais da mãe e do bebê, constitucionalmente protegidos e hoje garantidos por leis estaduais e municipais, além disso, o texto constitucional garante, também, à todos, em seu art. 5º, V e X, o direito à indenização por dano moral e material, bem como o art. 6º, VI, do Código de Defesa do Consumidor também prevê a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais sofridos pelo consumidor.

 

 


Notas

[1] Mãe é expulsa de shopping por amamentar filho. Disponível em: https://paisefilhos.uol.com.br/bebe/mae-e-expulsa-de-shopping-por-amamentar-seu-filho/ Acesso em 27.08.2018.

[2] Mãe é constrangida por amamentar em restaurante da zona leste e grupo faz mamaço. Disponível em: https://cidadeverde.com/noticias/204923/mae-e-constrangida-por-amamentar-em-restaurante-na-zona-leste-e-grupo-faz-mamaco acesso em 27.08.2018.

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[3] 19 obras de arte que mostram como a amamentação sempre foi bela. Disponível em: https://www.huffpostbrasil.com/2015/06/03/19-obras-de-arte-que-mostram-como-a-amamentacao-sempre-foi-bela_a_21681760/ acesso em 27.08.2018.

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Sobre o autor
Júlio Moraes Oliveira

Mestre em Instituições Sociais, Direito e Democracia pela Universidade FUMEC (2011), Especialista em Advocacia Civil pela Escola de Pós-Graduação em Economia e Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas da Fundação Getúlio Vargas EPGE/FGV e EBAPE/FGV. (2007), Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito Milton Campos - FDMC (2005). Membro da Comissão de Defesa do Consumidor - Seção Minas Gerais - OAB/MG. Membro do Instituto Brasileiro de Política e Direito do Consumidor (BRASILCON). Membro Suplente do Conselho Municipal de Proteção e Defesa do Consumidor - Comdecon-BH. Professor da FAPAM - Faculdade de Pará de Minas. Professor da Faculdade Asa de Brumadinho. Parecerista da Revista da Faculdade de Direito do Sul de Minas (FDSM) Qualis B1, Parecerista da Revista Quaestio Iuris da Universidade do Estado Rio de Janeiro (UERJ) Qualis B1. Pesquisador com diversos artigos publicados em periódicos. Autor dos Livros: CURSO DE DIREITO DO CONSUMIDOR COMPLETO, 4ª edição e CONSUMIDOR-EMPRESÁRIO: a defesa do finalismo mitigado. Advogado, com experiência em contencioso e consultivo, em direito civil, consumidor, empresarial e trabalhista. [email protected]

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

OLIVEIRA, Júlio Moraes. O direito das consumidoras-mães ao aleitamento em estabelecimentos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5544, 5 set. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/68802. Acesso em: 28 mar. 2024.

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