O artigo 59 do Código Penal dispõe sobre a fixação da pena. São as chamadas circunstâncias judiciais.
O artigo referenciado, como explicou Paulo José da Costa Jr.(Comentários ao Código Penal, 2ª edição, pág. 309), reconheceu ao juiz, na aplicação da pena, larga margem de discricionariedade. Mas essa discricionariedade não poderá ser livre, mas haverá de ser vinculada. Essa discricionariedade não é arbitrariedade.
Por certo, há limitações impostos ao juiz, na fixação da pena, pois deverá fazê-lo, primeiramente, dentro das balizadas estabelecidas pelas margens do tipo penal. Ainda deverá levar em consideração os fatos elencados de maneira taxativa pelo artigo 59 do Código Penal referenciado.
Mas deverá o juiz motivar a sentença.
A pena, sabe-se, deve ser necessária e suficiente para a reprovação e prevenção do crime de forma que ela deverá desencorajar ou intimidar aqueles que pretendem iniciar-se na prática delituosa. Para tanto, a pena deve ser estabelecida com base na intensidade e nos graus de culpabilidade, não podendo igualmente excedê-la. De forma que é a culpabilidade que deverá estabelecer os limites da pena que não poderá ser transposto.
Levam-se em conta na fixação da pena: culpabilidade, antecedentes, conduta social, personalidade, motivos do crime, circunstâncias e consequências do crime; comportamento da vítima.
Os antecedentes criminais são fatos anteriores da vida do agente. Serve este componente, de forma específica, para se verificar se o delito foi um episódio esporádico na vida do sujeito ou se ele, com frequência, ou mesmo de forma habitual, infringe à lei.
Prescreve o artigo 5º, LVII, da Constituição Federal, que “toda pessoa se presume inocente até que tenha sido declarada culpada por sentença transitada em julgado”.
Aplica-se o princípio da presunção da inocência, segundo o qual toda pessoa se presume inocente até que tenha sido declarada culpada por sentença transitada em julgado.
Nessa matéria, o Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula 444 segundo a qual “é vedada a utilização de inquéritos policiais e ações penais em curso para agravar a pena-base”.
Por sua vez, o artigo 33, § 4º, da Lei nº 11.343/2006, prevê que “nos delitos definidos no artigo caput e no § 1º deste artigo, as penas poderão ser reduzidas de um sexto a dois terços, vedada a conversão em penas restritivas de direitos, desde que o agente seja primário, de bons antecedentes, não se dedique às atividades criminosas nem integre organizações criminosas”.
A Corte Interamericana de Direitos Humanos, na decisão relativa ao caso Ricardo Canese (Sentença de 31 de agosto de 2004, Série C, nº 111, parágrafo 154), por exemplo, referiu-se ao princípio consubstanciado no artigo 8º, parágrafo 2º, do Pacto de São José da Costa Rica 6 , promulgado entre nós pelo Decreto nº 678/2002, como um elemento essencial para a realização efetiva do direito à defesa, a acompanhar o acusado durante toda a tramitação do processo, até que o título condenatório no qual assentada a culpabilidade transite em julgado.
Em pronunciamento alusivo ao caso Cabrera García e Montiel Flores (Sentença de 26 de novembro de 2010, Série C, nº 220, parágrafo 184), entendeu vulneradora da garantia a decisão judicial em que refletida opinião a selar a culpa do acusado antes de este vir a ser pronunciado como tal. No julgamento dos casos Tibi (Sentença de 7 de setembro de 2004, Série C, nº 114, parágrafo 182) e Cantoral Benavides (Sentença de 18 de agosto de 2000, Série C, nº 69, parágrafo 120), assinalou ser defeso ao Estado condenar informalmente uma pessoa ou emitir juízo de valor à sociedade, de molde a formar opinião pública, enquanto não chancelada a responsabilidade penal.
De mesma maneira, o Comitê de Direitos Humanos das Nações Unidas recomenda, no Comentário Geral nº 32, acerca do direito a um julgamento justo (HRI/GEN/1/Rev.9, volume I, página 303, parágrafo 30), que o Poder Público deve abster-se de prejulgar o acusado, instando as autoridades a demonstrarem a contenção que o artigo 14, nº 2, do Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos (Decreto nº 592/1992) preconizou.
Observe-se, de toda sorte, que o Supremo Tribunal Federal, no julgamento da ADPF 444/DF, Relator Ministro Celso de Mello, entendeu que “a mera sujeição de alguém a simples investigações policiais(arquivadas ou não) ou a persecuções criminais ainda em curso não basta, só por si- ante a inexistência, em tais situações, de condenação penal com trânsito em julgado - para justificar a exacerbação da pena, pois com o trânsito em julgado, descaracteriza-se a presunção “juris tantum” de inocência do réu, que passa, então, a ostentar o “status’ jurídico-penal de condenado com todas as consequências legais daí decorrentes”.
O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do HC 97.665 Relator Ministro Celso de Mello, em 4 de maio de 2010, já havia entendido que “processos penais em curso, ou inquéritos em andamento, ou, até mesmo, condenações criminais ainda sujeitas a recurso não podem ser considerados, enquanto episódios processuais, suscetíveis de pronunciamento absolutório, como elementos evidenciadores de maus antecedentes do réu”.
Caso os inquéritos ou processos criminais considerados como antecedentes tenham desfecho favorável ao acusado, ainda assim ele sofrerá prejuízo, pois os procedimentos terão sido utilizados para aumentar sua pena em processo no qual foi efetivamente condenado. “O lançamento no mundo jurídico de enfoque ainda não definitivo e portanto sujeito à condição resolutiva potencializa a não mais poder a atuação da polícia judiciária e a precariedade de certos pronunciamentos judiciais”, como advertiu o Ministro Marco Aurélio, em voto no julgamento do RE 591.054, com repercussão geral.
A divergência foi aberta pelo ministro Ricardo Lewandowski. Segundo ele, o artigo 59 do Código Penal compreende diversos aspectos que devem ser considerados pelos juízes para dosar a pena, entre os quais a culpabilidade, os antecedentes, a conduta pessoal e a personalidade do sentenciado. “Esse artigo entrega ao prudente arbítrio do juiz a possibilidade de dosar a pena de maneira a fazê-la suficiente para a reprovação e prevenção do crime”, argumentou.
No entendimento do ministro, os antecedentes mencionados no artigo 59 do Código Penal, que trata da fixação da pena, não podem ser confundidos com o artigo 61, que fala das circunstâncias agravantes. Em seu voto, destacou que não é incomum que os juízes criminais se deparem com extensa ficha criminal de um determinado réu, muitas vezes por fatos semelhantes ao que são objeto do julgamento, e que essas circunstâncias devem ser levadas em consideração na dosimetria da pena.
Nesse mesmo sentido votaram as ministras Rosa Weber e Cármen Lúcia e o ministro Luiz Fux.
Assim, ao examinar o Habeas Corpus nº 81.974/SP, relatado, em 22 de outubro de 2002, perante a Segunda Turma, o ministro Gilmar Mendes, designado para redigir o acórdão, aventou, ao indeferir o pedido, a possibilidade de rever a posição então sufragada, o que efetivamente veio a ocorrer quando, em 29 de novembro de 2005, Sua Excelência defrontou-se, uma vez mais, com a problemática, ao relatar o Habeas Corpus nº 84.088/MS. Em que pese a óptica prevalente não ter sido alterada, verificou-se flexibilização na orientação, no que o redator do acórdão, ministro Joaquim Barbosa, consignou que apenas a análise do caso concreto revelaria se a existência de inquéritos e processos em andamento poderiam ser considerados antecedentes para agravar a pena-base.
No julgamento do HC 122.940, Segunda Turma, o Ministro Gilmar Mendes, concedeu a ordem com base no princípio constitucional da não culpabilidade ou da presunção de inocência, uma vez que considerou inviável o reconhecimento de maus antecedentes referentes a inquéritos e ações penais em fase que ainda seja permitida a apresentação de novos recursos. Por sua vez, a Ministra Cármen Lúcia apresentou pedido de vista.
Posteriormente, em julgamento no Recurso Extraordinário 591.054/SC, Relator Ministro Marco Aurélio, publicado em 26 de fevereiro de 2015, entendeu-se que “ ante o princípio constitucional da não culpabilidade, inquéritos e processos criminais em curso são neutros na definição dos antecedentes criminais”.
Na doutrina, Cezar Roberto Bittencourt(Código Penal Comentado, 2004) sustentou não ser “a melhor corrente, embora respeitável, o entendimento de que ‘inquéritos instaurados e processos criminais em andamento’, ‘absolvições por insuficiência de provas’, ‘prescrições abstratas, retroativas e intercorrentes’ não podem ser considerados como ‘maus antecedentes’”. Porém, na edição de 2014, pág. 294, Cezar Roberto Bittencourt reformulou a passagem. Lê-se agora que, “embora tenha sido válido ao seu tempo, hoje, em um Estado Democrático de Direito, é insustentável o entendimento de Nelson Hungria, segundo o qual devem ser apreciados como antecedentes penais os ‘processos paralisados por superveniente extinção da punibilidade antes da sentença irrecorrível, inquéritos arquivados por causas impeditiva da ação penal, condenações ainda não passadas em julgado(...), processos em andamento, até mesmo absolvições anteriores por deficiência de prova’”, ao argumento de que, “sob o império de uma nova ordem constitucional e ‘constitucionalizando o Direito Penal’, somente podem ser valoradas como ‘maus antecedentes’ decisões condenatórias irrecorríveis”, não podendo ser considerados como tais “quaisquer outras investigações preliminares, processos criminais em andamento, mesmo em fase recursal”.
Nessa matéria, ainda, registre-se que, no acórdão veiculado no Diário da Justiça de 17 de maio de 1996, proclamou-se que a incidência penal só servirá para agravar a medida da pena quando ocorrida antes do cometimento do delito, independentemente de a decisão alusiva à prática haver sido dada como firme em momento prévio. Em síntese, é considerado o quadro existente na data da prática delituosa. Leia-se o julgamento, a respeito, do HC 73.174/Rj, Relator Ministro Francisco Rezek.
A teor do artigo 64, inciso I, do Código Penal, não prevalece para efeito de reincidência “a condenação anterior, se entre a data do cumprimento ou extinção da pena e a infração posterior tiver decorrido período de tempo superior a cinco anos, computado o período de prova da suspensão ou livramento condicional, se não ocorrer a revogação”.
Adota-se, pela redação dada pela Lei 6.416/77, o sistema da temporariedade com relação à caracterização da reincidência. Sendo assim, a condenação anterior somente será considerada para o reconhecimento da agravante de reincidência, se não houver decorrido cinco anos entre a data do cumprimento da pena referente ao delito anterior e a prática de crime posterior.
A lei determina que se passe a computar no prazo de cinco anos o período de prova de suspensão ou livramento condicional, se não ocorreu a revogação do benefício.
Necessário distinguir o que se chama de criminoso primário e criminoso reincidente. Criminoso primário é aquele que jamais sofreu condenação irrecorrível. Chama-se reincidente aquele que cometeu um crime após a data do trânsito em julgado da sentença que o condenou por crime anterior enquanto não transcorrido o prazo de cinco anos contados a partir do cumprimento ou da extinção da pena.
Caso reconhecida a agravante de reincidência, são seus efeitos: agrava a pena (artigo 63); prepondera essa circunstância na fixação da pena (artigo 67); quando em crime doloso, impede a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direito ou multa (artigo 44, inciso II, e 60, § 2º); impede a concessão do sursis quando se tratar de crimes dolosos (artigo 77, inciso I); impede que se inicie o cumprimento da pena em regime semiaberto (a não ser que se trate de detenção) ou aberto (artigo 33, § 2º, b e c); aumenta o prazo para a concessão de livramento condicional (artigo 83, inciso II); aumenta o prazo para a prescrição da pretensão executória (artigo 110, última parte); interrompe o prazo da prescrição (artigo 117, inciso V); revoga o sursis, obrigatoriamente, em caso de condenação por crime doloso (artigo 81, inciso I) e facultativamente na hipótese de crime culposo ou contravenção (artigo 81, § 1º); revoga o livramento condicional, obrigatoriamente, em caso de condenação a pena privativa de liberdade (artigo 86) e, facultativamente, na hipótese de crime ou contravenção, quando aplicada pena que não seja privativa de liberdade (artigo 97); revoga a reabilitação, quando o agente for condenado a pena restritiva de direitos em pena privativa de liberdade (artigo 44, § 5º); possibilita o reconhecimento da infração penal prevista no artigo 25 da LCP; impede a liberdade provisória para apelar (artigo 594 do CPP); impede a prestação de fiança em caso de condenação por crime doloso; impede o reconhecimento de causas de diminuição da pena (artigos 155, § 2º, 171, § 1º), dentre ouros efeitos.
Recentemente, o ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), afastou decisão de ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que, ao julgar recurso especial interposto em favor de uma condenada por tráfico de drogas, considerou como maus antecedentes condenações definitivas anteriores mesmo após o curso do período extintivo de cinco anos, previsto no artigo 64, inciso I, do Código Penal (CP), como se lê do noticiado no site do STF em 23 de novembro de 2018.
A decisão foi tomada nos autos do Habeas Corpus (HC) 164028.
O dispositivo do CP estabelece que, para efeito de reincidência, não prevalece a condenação anterior, se entre a data do cumprimento ou extinção da pena e a infração posterior tiver decorrido período de tempo superior a cinco anos, computado o período de prova da suspensão ou do livramento condicional, se não ocorrer revogação.
Com a decisão, o decano restabeleceu acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) que aplicou à condenada o redutor previsto no artigo 33, parágrafo 4º, da Lei 11.343/2006, em seu patamar mais favorável. O dispositivo prevê que as penas relativas ao tráfico de entorpecentes poderão ser reduzidas de um sexto a dois terços, desde que o agente seja primário, de bons antecedentes, não se dedique às atividades criminosas nem integre organização criminosa.
“Não se revela legítimo, em face da Constituição da República, considerar como maus antecedentes condenações criminais cujas penas, cotejadas com infrações posteriores, extinguiram-se há mais de cinco anos, pois, com o decurso desse quinquênio, não há como reconhecer nem como admitir que continuem a subsistir, residualmente, contra o réu, os efeitos negativos resultantes de sentenças condenatórias anteriores. Inadmissível, em consequência, qualquer valoração desfavorável ao acusado, que repercuta, de modo gravoso, na operação de dosimetria penal”, destacou.
O Habeas Corpus ajuizado perante o STF combateu uma decisão emanada do STJ no REsp 1.756.463/SP.
Ali foi dito:
“O registro criminal utilizado, entretanto, não pode ser utilizado para caracterização de antecedentes, pois retrata condenação cuja extinção da punibilidade pelo cumprimento foi declarada em 11 de abril de 2011, portanto mais de cinco anos antes da prática desse novo delito. Esse raciocínio decorre de uma analogia com a norma do artigo 64, inciso I, do CP, pois se o mais grave a reincidência para ser identificada deve obedecer ao limite temporal de cinco anos, logicamente que o menos grave os antecedentes também deverá ser apurado nesse lapso temporal. Nesse sentido a constatação de Saio de Carvalho: "[o]s antecedentes (...) representam um gravame penalógico eternizado", assim, para o autor, é"urgente instituir sua temporalidade, fixando um prazo determinado para a produção dos efeitos impostos pela lei penal. O recurso à analogia permite-nos limitar o prazo de incidência dos antecedentes no marco dos cinco anos delimitação temporal da reincidência -, visto ser a única orientação permitida pela sistemática do Código Penal"7. Esse o caminho já adotado em decisão do Superior Tribunal de Justiça:
"O art. 64, I, C.P. determina que, para efeito de reincidência, não prevalece a condenação anterior, se entre a data do cumprimento ou extinção da pena e a infração anterior houver decorrido período superior a 5 (cinco) anos. O dispositivo se harmoniza com o Direito Penal e criminologia modernos. O estigma da sanção criminal não é perene. Limita-se no tempo. Transcorrido o tempo referido, sem outro delito, evidencia-se ausência de periculosidade, denotando, em princípio criminalidade ocasional. O condenado quita sua obrigação com a justiça penal. A conclusão é valida também para os antecedentes. Seria ilógico afastar expressamente a agravante e persistir genericamente para recrudescer a sanção aplicada"8. Esse entendimento é decorrência direta da própria Constituição Federal, ao vedar a possibilidade da existência de penas perpétuas em nosso ordenamento. Tal dispositivo deve ser interpretado da maneira abrangente, não só para abarcar o próprio cumprimento da sanção criminal estabelecida, mas também suas conseqüências, que não podem ser eternizadas. É ilógico, afinal, o assessório ser perpétuo enquanto o principal não o é. Assim a doutrina de Zaffaroni e Pierangeli:"A exclusão da pena perpétua de prisão importa que, como lógica conseqüência, não haja delitos que possam ter penas ou conseqüências penais perpétuas. Se a pena de prisão não pode ser perpétua, é lógico que tampouco pode ser ela a conseqüência mais branda do delito. Isto resulta claro quanto às conseqüências acerca da reincidência, que o inciso I do art. 64 limita em cinco anos. De outro modo, se estaria consagrando a categoria de 'cidadão de segunda', ou uma capitis diminutio inaceitável no sistema democrático ou republicano. Por mais grave que seja um delito, a sua conseqüência será, para dizê-lo de alguma maneira, que o sujeito deve 'pagar a sua culpa', isto é, que numa república se exige que os autores de delitos sejam submetidos a penas, mas não admite que o autor de um delito perca a sua condição de pessoa, passando a ser um indivíduo 'marcado', 'assinalado', estigmatizado pela vida afora, reduzido à condição de marginalizado perpétuo"9. Assim, afasta-se o aumento de um sexto da pena-base de Adelma, fixando a básica em cinco anos de reclusão e pagamento de 500 dias-multa." Inicialmente, em relação à configuração de maus antecedentes, destaca-se que embora o Supremo Tribunal Federal ainda não haja decidido o mérito do RE n. 593.818 RG/SC que, em repercussão geral já reconhecida (DJe 3/4/2009), decidirá se existe ou não um prazo limite para se sopesar uma condenação anterior como maus antecedentes , certo é que, por ora, este Superior Tribunal possui entendimento consolidado no sentido de que "O conceito de maus antecedentes, por ser mais amplo, abrange não apenas as condenações definitivas por fatos anteriores cujo trânsito em julgado ocorreu antes da prática do delito em apuração, mas também aquelas transitadas em julgado no curso da respectiva ação penal, além das condenações transitadas em julgado há mais de cinco anos, as quais também não induzem reincidência, mas servem como maus antecedentes. Precedentes." (HC n. 337.068/SP, Sexta Turma, Rel. Ministro Nefi Cordeiro, DJe de 28/6/2016). Menciono, ainda: HC n. 413.693/SP, Quinta Turma, Rel. Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, DJe de 16/10/2017).
Vale dizer, decorrido o prazo de 5 (cinco) anos entre a data do cumprimento ou a extinção da pena e a infração posterior, a condenação anterior, embora não prevaleça mais para fins de reincidência, pode ser sopesada a título de maus antecedentes. Diante de tais considerações, com razão o Ministério Público Estadual ao requerer seja reconhecida a existência de maus antecedentes em desfavor da ora recorrida, para fixar a pena-base acima do mínimo legal. Ademais, nos termos do disposto no § 4º, do art. 33, da Lei 11.343/2006, os condenados pelo crime de tráfico de drogas terão a pena reduzida, de um sexto a dois terços, quando forem reconhecidamente primários, possuírem bons antecedentes e não se dedicarem a atividades criminosas ou integrarem organização criminosa. Segundo entendimento desta Corte, o mencionado dispositivo legal tem como objetivo beneficiar, apenas, os pequenos e eventuais traficantes, não alcançando aqueles que fazem do tráfico de drogas um meio de vida (AgRg no AREsp n. 648.408/SP, Sexta Turma, Rel. Ministro Rogerio Schietti Cruz, DJe de 5/10/2015; AgRg no REsp n. 1.423.806/SP; Quinta Turma, Rel. Ministro Gurgel de Faria, DJe de 20/8/2015). Na hipótese, o acórdão impugnado fundamentou a aplicação da minorante tendo em vista a inexistência de registro de condenação anterior não atingidas pelo tempo depurador, nos seguintes termos (fl. 416, grifei): "Inexistindo agravante ou atenuante genérica, não há modificação a ser feita na segunda fase de aplicação de pena. Na terceira fase, o caso é de reconhecimento da aplicabilidade da causa de redução de pena do § 4o do art. 33 da Lei 11.343/2006. Os fatores utilizados pela decisão impugnada para afastar a aplicação da causa de aumento de pena não se mostram idôneos. Isso por que a prova dos autos não demonstra que os acusados se dediquem às atividades criminosas nem que integrem organização criminosa, sendo ambos primários não registrando antecedentes criminais recentes que impeçam a concessão da redução. Assim, estabelecidas as básicas no mínimo legal, é caso de reduzi-las em dois terços para obter a sanção de um ano e oito meses de reclusão e o pagamento de 166 diárias de multa, estabelecidas no valor unitário mínimo." Como já devidamente esclarecido em parágrafo acima, consoante jurisprudência deste Tribunal Superior, a condenação anterior existente, ainda que alcançada pelo período depurador de cinco anos previsto no art. 64, I, do Código Penal, embora não seja apta a caracterizar a agravante da reincidência, configura maus antecedentes, razão pela qual fica impedida a aplicação do redutor previsto no art. 33, § 4º, da Lei de Drogas, diante da ausência do preenchimento dos requisitos legais. Nesse sentido:
"PENAL E PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL RECURSO ESPECIAL. PLEITO ABSOLUTÓRIO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. DOSIMETRIA. PENA-BASE. EXASPERAÇÃO DEVIDAMENTE FUNDAMENTADA. MAUS ANTECEDENTES. PRAZO DEPURATIVO DE 5 (CINCO) ANOS. POSSIBILIDADE DE CONFIGURAÇÃO. [...] III - Por fim, no que pertine aos maus antecedentes fora do prazo depurativo, vale destacar, contudo, que a jurisprudência deste Tribunal é assente no sentido de que as condenações alcançadas pelo período depurador de 5 anos, como no presente caso, previsto no art. 64, inciso I, do Código Penal, afastam os efeitos da reincidência, mas não impedem a configuração de maus antecedentes, permitindo, assim, o aumento da pena-base acima do mínimo legal. Agravo regimental desprovido." (AgRg no REsp n. 1.719.831/SC, Quinta Turma, de minha relatoria, DJe de 1º/8/2018, grifei).
"AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS. CONDENAÇÃO CRIMINAL COM TRÂNSITO EM JULGADO HÁ MAIS DE 5 ANOS. CONFIGURAÇÃO DE MAUS ANTECEDENTES. POSSIBILIDADE. 1. Condenação criminal transitada em julgado há mais de 5 (cinco) anos, embora não possa ser utilizada para configurar a reincidência (art. 64, I, do Código Penal), pode ser considerada como maus antecedentes. Precedentes. 2. Agravo regimental a que se nega provimento" (AgRg no HC n. 323.661/MS, Quinta Turma, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, DJe de 8/9/2015, grifei).
"PENAL. AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. TRÁFICO DE DROGAS. PENA-BASE. MAJORAÇÃO NO TRIBUNAL. MAUS ANTECEDENTES. CONDENAÇÕES TRANSITADAS EM JULGADO. PERÍODO DEPURADOR PARA REINCIDÊNCIA. POSSIBILIDADE. SÚMULA 83/STJ. REDUÇÃO DA PENA PELA CONFISSÃO ESPONTÂNEA. SEIS MESES. RAZOABILIDADE. SÚMULA 7/STJ. 1. Nos termos da jurisprudência consolidada nesta Corte, as condenações alcançadas pelo período depurador de 5 anos, previsto no art. 64, I, do Código Penal, afastam os efeitos da reincidência, mas não impedem a configuração de maus antecedentes, permitindo o aumento da pena-base acima do mínimo legal e a devida individualização das penas. 2. A redução da pena em seis meses, em razão da atenuante de confissão espontânea, resultou de uma valoração feita pelo julgador; ademais, a quantidade de seis meses encontra-se dentro da razoabilidade, sendo desnecessária a intervenção desta Corte a respeito. 3. Agravo regimental improvido" (AgRg no AREsp n. 508.791/MT, Sexta Turma, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, DJe de 26/10/2015, grifei). No que diz respeito ao pleito de restabelecimento do regime inicial fechado, fixado pelo Juízo de primeiro grau e reformado pela Corte a quo, inviável sua acolhida, porquanto imposto pela instância originária com base no artigo 2º, § 1º, da Lei n. 8.072/1990, com a redação que lhe foi dada pela Lei n. 11.464/2007. Sabe-se que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, em 27/7/2012, ao julgar o HC n. 111.840/ES, por maioria, declarou incidentalmente a inconstitucionalidade do art. 2º, § 1º, da Lei n. 8.072/1990, com a redação que lhe foi dada pela Lei n. 11.464/2007, afastando, dessa forma, a obrigatoriedade do regime inicial fechado para os condenados por crimes hediondos e equiparados. Dessa forma, para o estabelecimento de regime de cumprimento de pena mais gravoso, seria necessária fundamentação específica, com base em elementos concretos extraídos dos autos, o que não se fez no caso em apreço, uma vez que o regime fechado foi fixado com lastro apenas na hediondez do delito. Tendo em vista a fundamentação supra, passo à dosimetria da pena. Na primeira fase, considerada negativa a circunstância "antecedentes", aumenta-se a pena-base em 10 (dez) meses, razão pela qual resta fixada a reprimenda inicial em 5 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão. Na segunda fase da dosimetria, nada foi considerado pelas instâncias ordinárias, motivo por que fica a pena intermediária assentada em 5 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão. Na terceira fase, por sua vez, considerando o reconhecimento dos maus antecedentes, afasto a redutora prevista no § 4º, do art. 33, da Lei n. 11.343/2006, o que conduz a reprimenda final e definitiva no patamar de 5 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão. Em face do quantum de pena aplicado, fixo o regime inicial semiaberto, a teor do artigo 33, § 2º, b, do Código Penal. Ausentes as condições descritas no artigo 44 do Código Penal, deixo de substituir a pena privativa de liberdade por outras restritivas de direitos. Ante o exposto, com fulcro no art. 255, § 4º, incisos II e III, do Regimento Interno do STJ, dou parcial provimento ao recurso especial ministerial, para elevar a pena imposta à recorrida ao patamar de 5 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão, em regime inicial semiaberto, nos termos da fundamentação retro. P. e I. Brasília (DF), 11 de outubro de 2018. Ministro Felix Fischer Relator”
No julgamento do HC noticiado perante o STF, disse o ministro Celso de Mello:
“Antes, porém, registro, por oportuno, que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, defrontando-se com o tema ora em exame (CP, art. 64, I), reconheceu, quanto a ele, a existência de repercussão geral, fazendo-o em sede recursal extraordinária (RE 593.818/SC, Rel. Min. ROBERTO BARROSO), em ordem a definir se se revela legítimo, em face da Constituição da República, considerar, ou não, como maus antecedentes condenações criminais cujas penas, cotejadas com infrações posteriores, extinguiram-se há mais de cinco (05) anos.
Essa controvérsia constitucional, no entanto, já decorridos quase 10 (dez) anos, ainda não foi julgada pelo Plenário desta Corte Suprema, razão pela qual inexiste qualquer obstáculo que impeça a apreciação, pelos Juízes deste Tribunal, de referido litígio jurídico. Passo, desse modo, a analisar a matéria veiculada na presente impetração. E, ao fazê-lo, verifico registrar-se, no caso, a situação aludida pelo art. 64, I, do Código Penal, que consagra a impropriamente denominada “prescrição da reincidência”.
Com efeito, decorrido o período de 05 (cinco) anos referido pelo art. 64, I, do Código Penal, não há como reconhecer nem como admitir que continuem a subsistir, residualmente, contra o réu, os efeitos negativos resultantes de condenações anteriores. Em face disso, mostrar-se-á ilegal qualquer valoração desfavorável, em relação ao acusado, que repercuta, de modo gravoso, na operação de dosimetria penal, tal como sucedeu no caso ora em exame. É por essa razão que a colenda Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal tem advertido que, “Decorridos mais de 5 anos desde a extinção da pena da condenação anterior (CP, art. 64, I), não é possível alargar a interpretação de modo a permitir o reconhecimento dos maus antecedentes” (HC 110.191/RJ, Rel. Min. GILMAR MENDES – grifei).
No mesmo sentido: HC 125.586/SP, Rel. Min. DIAS TOFFOLI – HC 126.315/SP, Rel. Min. GILMAR MENDES – HC 130.500/RJ, Rel. Min. DIAS TOFFOLI – HC 133.077/SP, Rel. Min. CÁRMEN LÚCIA – HC 138.802/SP, Rel. Min. RICARDO LEWANDOWSKI – HC 157.548-MC/RJ, Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.: “’HABEAS CORPUS’. CONSTITUCIONAL. PENAL. CONDENAÇÃO TRANSITADA EM JULGADO HÁ MAIS DE CINCO ANOS. IMPOSSIBILIDADE DE UTILIZAÇÃO PARA CARACTERIZAÇÃO DE MAUS ANTECEDENTES. ORDEM CONCEDIDA. 1. Condenação transitada em julgado há mais de cinco anos utilizada nas instâncias antecedentes para consideração da circunstância judicial dos antecedentes como desfavorável e majoração da pena-base. Impossibilidade. Precedentes. 2. Ordem concedida.” (HC 131.720/RJ, Rel. Min. CÁRMEN LÚCIA – grifei).
Cabe registrar, por oportuno, que essa mesma orientação tem sido observada pela colenda Primeira Turma desta Suprema Corte (RHC 118.977/MS, Rel. Min. DIAS TOFFOLI): “‘Habeas corpus’. Tráfico de entorpecentes. Dosimetria. Fixação da pena-base acima do mínimo legal em decorrência de maus antecedentes. Condenações extintas há mais de cinco anos. Pretensão à aplicação do disposto no inciso I do art. 64 do Código Penal. Admissibilidade. Precedente. ‘Writ’ extinto. Ordem concedida de ofício. 1. Impetração dirigida contra decisão singular não submetida ao crivo do colegiado competente por intermédio de agravo regimental, o que configura o não exaurimento da instância antecedente, impossibilitando o conhecimento do ‘writ’. Precedentes. 2. Quando o paciente não pode ser considerado reincidente, diante do transcurso de lapso temporal superior a cinco anos, conforme previsto no art. 64, I, do Código Penal, a existência de condenações anteriores não caracteriza maus antecedentes. Precedentes. 3. ‘Writ’ extinto. Ordem concedida de ofício.” (HC 119.200/PR, Rel. Min. DIAS TOFFOLI – grifei)”
Na doutrina, Cezar Roberto Bittencourt (Código Penal Comentado, 2004) sustentou não ser “a melhor corrente, embora respeitável, o entendimento de que ‘inquéritos instaurados e processos criminais em andamento’, ‘absolvições por insuficiência de provas’, ‘prescrições abstratas, retroativas e intercorrentes’ não podem ser considerados como ‘maus antecedentes’”. Porém, na edição de 2014, pág. 294, Cezar Roberto Bittencourt reformulou a passagem. Lê-se agora que, “embora tenha sido válido ao seu tempo, hoje, em um Estado Democrático de Direito, é insustentável o entendimento de Nelson Hungria, segundo o qual devem ser apreciados como antecedentes penais os ‘processos paralisados por superveniente extinção da punibilidade antes da sentença irrecorrível, inquéritos arquivados por causas impeditiva da ação penal, condenações ainda não passadas em julgado (...), processos em andamento, até mesmo absolvições anteriores por deficiência de prova’”, ao argumento de que, “sob o império de uma nova ordem constitucional e ‘constitucionalizando o Direito Penal’, somente podem ser valoradas como ‘maus antecedentes’ decisões condenatórias irrecorríveis”, não podendo ser considerados como tais “quaisquer outras investigações preliminares, processos criminais em andamento, mesmo em fase recursal”.
Diversos doutrinadores perfilham igual entendimento acima apresentado (AMILTON BUENO DE CARVALHO e SALO DE CARVALHO, “Aplicação da Pena e Garantismo”, p. 52, 3ª ed., 2004, Lumen Juris; CELSO DELMANTO, ROBERTO DELMANTO, ROBERTO DELMANTO JÚNIOR e FÁBIO M. DE ALMEIDA DELMANTO, “Código Penal Comentado”, p. 274, 8ª ed., 2010, Saraiva; CEZAR ROBERTO BITENCOURT, “Código Penal Comentado”, p. 297, item n. 11, 8ª ed., 2014, Saraiva; JOSÉ ANTONIO PAGANELLA BOSCHI, “Das Penas e seus Critérios de Aplicação”, p. 168, 6ª ed., 2000, Livraria do Advogado; LEONARDO MASSUD, “Da Pena e sua Fixação”, p. 157/159, 2009, DPJ; JUAREZ CIRINO DOS SANTOS, “Direito Penal – Parte Geral”, p. 521, item n. 1.1, “b”, 4ª ed., 2010, Conceito Editorial), valendo destacar, por extremamente relevante, a lição de PAULO QUEIROZ (“Direito Penal – Parte Geral”, p. 342/343, 4ª ed., 2008, Lumen Juris).
No passado, entendeu-se que, “após o decurso do prazo, o réu já não é considerado reincidente, retorna à qualidade de primário” (STF, RTJ 91/629), não servindo a antiga condenação como maus antecedentes(TACrSP, RT 715/484, 718/442), pois seria ilógico afastar expressamente a agravante a persistir genericamente para recrudescer a sanção aplicada(STJ, RHC 2.227, DJU de 29 de março de 1993, pág. 5.267).
Já se entendeu que se conta a depuração a partir da data da efetiva extinção da pena, e não somente do dia em que essa extinção foi formalmente declarada em sentença (TACrSP, julgados 77/209).