A intervenção de provedores de internet no conteúdo publicado

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30/11/2018 às 17:49

Resumo:


  • A liberdade de expressão é um direito fundamental, mas possui limitações para garantir o respeito a outros direitos como a honra e a privacidade, sendo regulada pela Constituição Federal e leis específicas como o Marco Civil da Internet.

  • Os provedores de internet têm responsabilidades quanto ao conteúdo veiculado por terceiros, podendo ser obrigados a remover conteúdos ofensivos ou ilegais após ordem judicial, sob pena de responsabilização civil.

  • A jurisprudência brasileira estabelece critérios para a responsabilização dos provedores, considerando a natureza do conteúdo, a necessidade de proteção à privacidade e os limites da liberdade de expressão, com decisões que orientam a ação dos provedores em casos de abuso.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

Abordagem Jurisprudencial e Responsabilidade Civil dos Provedores 

Quando se trata do tema de Responsabilidade Civil dos Provedores, é notório que existem diversos fatores a serem levados em conta para a análise, identificação e quantificação do dano. Como vimos no tópico anterior, essa abordagem é realizada com base no tipo de responsabilidade adotada pela nossa doutrina e jurisprudência como a que melhor soluciona o caso em concreto: a da responsabilidade objetiva, devendo sempre inferir cada caso, que poderá ser analisado subjetivamente em certos aspectos, como é o caso de provedores pelo conteúdo praticado por terceiros na internet.

Quanto à questão do quantum indenizatório, o método adotado pelo Ministro Sanseverino se mostra como o mais adequado à situação fática, uma vez que adota o princípio da reparação integral, juntamente com o princípio da razoabilidade, não dando vazão a meros subjetivismos vazios. Através de um método prático e um filtro objetivo se é capaz de dar um mínimo de racionalidade ao processo decisório.

Outrossim, na esfera de responsabilização desses provedores, existe a questão da privacidade. E aqui vai um parêntese quanto ao fato da mesma não ter sido desenvolvida anteriormente. O fato de ter sido tratada em separado é pensado não só como uma análise sobre a abordagem dessa violação, mas também como um meio de ligação entre o usuário e o provedor de internet, na medida que há uma relação inegável de dependência entre este e aquele, priorizou-se primeiro as esferas da liberdade de expressão para depois se questionar sobre a privacidade, tal e qual esse comportamento se apresenta na prática.

E não só isso. O assunto também serve de elo à fundamentação se seria ou não possível o incremento de outras legislações sobre o assunto no nosso ordenamento jurídico. Portanto, este tópico trata de jurisprudências recentes sobre o tema que servirão de base para a comparação legislativa almejada no próximo capítulo. Então, vamos aos fatos.

No julgamento do Resp. 1679465/SP, cuja relatora foi a Min. Nancy Andrighi, trata-se de um caso de pornografia de vingança[3], em que a vítima teve cartão de memória furtado por colega de classe e divulgação de conteúdo íntimo de caráter sexual, houve o questionamento sobre a disponibilidade desse conteúdo em rede, atingindo a privacidade da vítima, “causando prejuízos a direitos de personalidade em razão da capacidade de limitar ou induzir o acesso a determinados conteúdos” (BRASIL. Resp. 1679465/SP).

Consoante a isso, há a questão da velocidade da propagação causando diversos prejuízos de ordem material e moral à vítima, bem como o tempo que leva para que tal conteúdo seja removido, causando muitas vezes um dano irreversível, pois já fora compartilhado com centenas, talvez até milhares de pessoas.

Contudo, como consta na decisão, os provedores de internet nesses casos não realizam um monitoramento prévio dessas informações, não sendo obrigados a guardar informações de pesquisa de seus usuários. Existe uma exceção, contudo, quanto à retirada de conteúdo ilícito na internet previsto na Lei 12.965/2014:

[...] 8. A única exceção à reserva de jurisdição para a retirada de conteúdo infringente   da   internet, prevista na Lei 12.965/2014, está relacionada a "vídeos ou de outros materiais contendo cenas de nudez ou de atos sexuais de caráter privado", conforme disposto em seu art.  21 ("O provedor de aplicações de internet que disponibilize conteúdo gerado por terceiros será responsabilizado subsidiariamente pela   violação   da   intimidade   decorrente  da  divulgação,  sem autorização  de  seus  participantes,  de  imagens,  de vídeos ou de outros  materiais  contendo  cenas  de  nudez  ou de atos sexuais de caráter  privado  quando,  após  o  recebimento  de notificação pelo participante  ou  seu  representante  legal,  deixar de promover, de forma  diligente, no âmbito e nos limites técnicos do seu serviço, a indisponibilização   desse   conteúdo").  Nessas circunstâncias, o provedor passa a ser subsidiariamente responsável a partir da notificação extrajudicial formulada pelo particular interessado na remoção desse conteúdo, e não a partir da ordem judicial com esse comando. 9. Na hipótese em julgamento, a adolescente foi vítima de "exposição pornográfica não consentida" e, assim, é cabível para sua proteção a ordem de exclusão de conteúdos (indicados por URL) dos resultados de pesquisas feitas pelos provedores de busca, por meio de antecipação de tutela (Resp. 1679465/SP).

A partir de tal exceção, há de se concluir que o legislador ressaltou a privacidade em entendimento semelhante ao de Celso Ribeiro Bastos, quando este a trata com o acesso “a informações sobre a área de manifestação existencial do ser humano” (BASTOS, 2000, p.63). Logo, a indisponibilidade e o acesso a conteúdos por parte dos provedores somente podem ser excepcionados no caso narrado, sendo a exclusão de conteúdos uma medida passível de ser adotada.

Resumindo, os provedores de internet não respondem, de acordo com o STJ, pelo conteúdo das buscas realizadas por seus usuários, não podendo, inclusive, serem obrigados a retirar dos seus resultados de busca um determinado termo ou expressão (há, porém, a exceção do caso que permite o contrário), ou seja, o direito à liberdade de expressão nesse caso específico não se suplanta ao direito à privacidade.

Um outro exemplo de jurisprudência sobre o tema é o REsp. 1306066 / MT, que trata de um caso de mensagens ofensivas expostas em provedor de internet através do antigo site de relacionamento Orkut. O conteúdo dessas mensagens esbarra na questão do anonimato na internet. O provedor de conteúdo é obrigado a disponibilizar a identificação desses usuários, visando coibir o anonimato, fornecendo o número de registro de protocolo (IP) dos computadores realizarem o seu respectivo cadastro na internet. Há também a obrigação de retirada do conteúdo por parte do provedor, sob pena de responder solidariamente pelo dano se após notificação judicial nada fizer contra o ato ilícito (BRASIL.REsp. 1306066 / MT).

Outro aspecto a ser considerado no tópico é o Informativo de Jurisprudência n. 0558 do STJ, que trata da responsabilidade do provedor por ofensas veiculadas por terceiros em portais de notícias. No texto veiculado, o relator Min. Paulo de Tarso, cita que esse caso é excepcional por se tratar de um portal de notícias, pois o mesmo desenvolve uma atividade jornalística, sendo passível, portanto uma maior responsabilização tendo em vista o controle de comentários como atividade inerente ao papel que deve ser exercido pela própria empresa.

Então, nesse caso em especial, a sociedade empresária responde como bystander[4], segundo o art. 17 do CDC, ou também aplica-se o disposto no art. 927, parágrafo único do CC, que trata da responsabilidade objetiva de tal risco (REsp 1.352.053-AL, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 24/3/2015, DJe 30/3/2015). Recentemente, há a discussão acerca do Facebook se o mesmo agiria ou não como um veículo de notícias (de conteúdo jornalístico)[5], o que implicaria sérios problemas sobre como lidar com sua responsabilização, se como rede social ou meio jornalístico propriamente dito, causando insegurança quanto ao julgado aqui citado. Bem, isso caberá a futuras discussões o assunto, mas vale o questionamento a título de reflexão.

Em um outro julgado sobre o assunto, o REsp 1323754 / RJ, de relatoria da Min. Nancy Andrighi, há um caso de mensagem ofensiva veiculada através de rede social com efetiva ciência do provedor. Diz o julgado que uma vez que haja a notificação judicial a respeito de um ato ilícito cometido mediante a publicação de conteúdo considerado ofensivo por meio daquele provedor de internet, o mesmo deve retirar tal conteúdo em um prazo de até 24 horas, sob a pena de responder solidariamente pelo ato praticado, em virtude de omissão. Ressalta também que:

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3. Nesse prazo de 24 horas, não está o provedor obrigado a analisar o teor da denúncia recebida, devendo apenas promover a suspensão preventiva das respectivas páginas, até que tenha tempo hábil para apreciar a veracidade das alegações, de modo a que, confirmando-as, exclua definitivamente o perfil ou, tendo-as por infundadas, restabeleça o seu livre acesso. 4. O diferimento da análise do teor das denúncias não significa que o provedor poderá postergá-la por tempo indeterminado, deixando sem satisfação o usuário cujo perfil venha a ser provisoriamente suspenso. Cabe ao provedor, o mais breve possível, dar uma solução final para o conflito, confirmando a remoção definitiva da página de conteúdo ofensivo ou, ausente indício de ilegalidade, recolocando-a no ar, adotando, nessa última hipótese, as providências legais cabíveis contra os que abusarem da prerrogativa de denunciar. (BRASIL. RECURSO ESPECIAL Nº 1.323.754 - RJ (2012/0005748-4) RELATORA: MINISTRA NANCY ANDRIGHI, DJe: 28/08/2012).

Assim, tendo como base o mencionado, há a conclusão de que o provedor de internet tem como obrigação ao usuário prejudicado responder sobre aquele dano e que medidas está tomando a respeito no sentido de tentar amenizar o dano ocorrido, não o deixando sem resposta adequada; sendo que deverá o mais rápido possível se utilizar de mecanismos específicos para a retirada daquele conteúdo do ar (PINHEIRO, 2013, p. 195).

Há também o chamado princípio do menor dano[6], dizendo que é sempre melhor remover aquele conteúdo do que fazer com que continue sendo disseminado pela internet, garantindo desse jeito o devido processo legal e a devida proteção a bens jurídicos tutelados como a expressão e a intimidade, por exemplo (PINHEIRO, 2013, p. 195-196).

Em termos gerais, há uma orientação jurisprudencial no sentido de responsabilizar o provedor de internet subjetivamente em casos de conteúdo veiculado por terceiros e de maneira objetiva na maioria dos outros casos. O que se deve observar para fins de identificação de casos envolvendo a responsabilidade civil é justamente o dano causado e os critérios fixados para fins de indenização.

Sob o aspecto prático, os exemplos citados demonstram que uma vez demonstrado o conjunto probatório dos fatos, há a indenização e a eventual notificação judicial para que o responsável pela internet exerça um papel ativo na questão, sendo que sua omissão também implica um crescimento em sua esfera de responsabilização.

Observando-se a maneira como a jurisprudência nacional trata a questão, existem alguns questionamentos sobre a eficácia dessas decisões, uma vez que em alguns casos há um excesso de zelo por parte dos provedores, bloqueando conteúdo legal e não havendo uma análise em um tribunal independente, assim como maior transparência e direito de contestação em certas situações. É possível aumentar a restrição a certos direitos/princípios constitucionais protegidos e garantir ainda assim uma maior liberdade e privacidade de seus usuários? Como as legislações estrangeiras tratam o assunto da responsabilidade civil? Seria possível adaptá-las ou incorporá-las ao ordenamento jurídico nacional?

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