Linhas Gerais
Você, caro(a) leitor(a), certamente já ouviu falar sobre a ação de reintegração de posse. Mas você sabe exatamente o que ela é e para que serve?
Neste artigo, vamos explanar um pouco acerca do tema, explicando, de maneira simples e didática, de que se trata a ação em comento e em quais situações ela poderá ser utilizada.
Começaremos por um panorama, para que você se familiarize com o assunto e, em artigos diferentes, poderemos nos aprofundar em outras situações mais específicas, decorrentes do tema principal.
Conceito
A ação de reintegração de posse se enquadra nas chamadas “ações possessórias”, isto é, ela não é a única ação possessória, mas tão somente uma de suas integrantes.
As ações possessórias, de maneira geral, visam assegurar a alguém a posse de determinado bem - sendo assim, a ação de reintegração de posse, enquanto espécie de ação possessória, possui exatamente este objetivo: assegurar a posse de um bem.
Entendido isto, comecemos a destrinchar sua definição:
“Reintegração de posse”- como o nome diz, visa “reintegrar” a posse de algo. Reintegrar, neste caso, poderemos entender como “reestabelecer, devolver” a posse de um bem para alguém.
Quem é esse alguém?
No âmbito da reintegração, essa pessoa será alguém que perdeu a posse por um motivo chamado “esbulho”.
Esbulho Possessório
O esbulho ocorre quando alguém é retirado da posse ou propriedade de um bem que lhe pertence, indevidamente, por outra pessoa, que não detém esse direito.
Vamos exemplificar:
Imagine que você é proprietário(a) de um imóvel, em que você não reside ou deixou de residir por algum motivo, por exemplo, uma casa na praia. Um belo dia, você fica sabendo que uma terceira pessoa, sem a sua autorização, simplesmente invadiu o imóvel e passou a residir nele (sem autorização) - neste caso, está nitidamente caracterizado o esbulho.
O esbulho possessório é fenômeno por meio do qual uma pessoa, que é proprietária de um bem, perde completamente o contato com a coisa – o bem protegido – por atitude de outrem, isto é, para que ele seja caracterizado, não basta que alguém ameace ou somente atrapalhe a posse ou propriedade, é necessário que essa pessoa realmente o prive do contato com o bem.
Exemplificando, novamente, imagine a seguinte situação:
No caso do imóvel da praia - você não mora lá, mas mantém essa propriedade apenas para passeios de final de semana, para passar as férias ou até mesmo emprestar para parentes e amigos ou alugar em temporadas.
Se uma pessoa adentra ao imóvel e passa um final de semana lá, com a sua autorização (escrita ou verbal), não ocorre o esbulho, pois você não foi privado do contato com o bem violentamente, afinal, houve autorização.
Agora, se essa casa está vazia e uma pessoa que não possuía sua autorização invadiu esse imóvel e passou a morar nele, ocorre o esbulho, afinal, com essa pessoa morando lá, você não poderá passar seus finais de semana, emprestar ou alugar o bem.
O que fazer quando há esbulho?
Eis que, neste caso, a lei lhe permite ingressar com a chamada “ação de reintegração de posse”.
A matéria está regulamentada pelo Código Civil de 2002, artigo 1210, bem como, pelos artigos 558 e 560 e seguintes do novo Código de Processo Civil.
Como funciona essa ação?
Como vimos, para que haja “causa de pedir”, ou seja, para que seja possível o ingresso com a ação de reintegração de posse, é necessário que haja o esbulho possessório, anteriormente conceituado.
Desta feita, vejamos como funciona a ação em si:
Em primeiro lugar, é necessário que haja a “legitimidade ativa” para o ingresso com a ação, isto é, aquele que ingressará com a ação deve possuir o direito de fazê-lo. Neste caso, a parte legítima para o ingresso com a reintegração será o proprietário do imóvel esbulhado.
Se eu for vizinha de uma pessoa cujo imóvel está sendo esbulhado, posso ingressar com a ação em nome dessa pessoa?
Resposta: Não. Nem mesmo se for parente de alguém cujo imóvel está sendo esbulhado, não poderei ingressar com a ação pela pessoa, a menos em situações muito específicas, como por exemplo, representação legal (procuração, curadoria etc.).
Em seguida, deverá haver “legitimidade passiva”, isto é, a pessoa a integrar o polo passivo da ação, enquanto ré, ou seja, a pessoa a sofrer a ação, deve ser aquela que está cometendo o ilícito civil.
Ilícito civil é toda ação não autorizada pela lei.
Por exemplo: Se Joana está invadindo meu imóvel indevidamente, não posso processar Júlia, devo processar Joana. Isto é, Joana é quem possui legitimidade passiva para essa ação, ou seja, é quem pode sofrer a ação, pois é ela quem está cometendo o ilícito. Se eu processar a Júlia, a ação carecerá de legitimidade passiva e será extinta pelo magistrado.
Procedimento
A depender do valor do imóvel, a ação poderá ser proposta no Juizado Especial Cível ou na Justiça Comum.
A peça processual deverá relatar todo o problema ocorrido, como: Quando o esbulho se deu, como o proprietário ficou sabendo, quais medidas tomou quando soube, o que a pessoa invasora está fazendo no imóvel, quem é essa pessoa, dentre outros fatores.
Requisito importantíssimo para o ingresso com tal ação é a realização de uma notificação extrajudicial, anterior ao processo.
A notificação extrajudicial é procedimento formal de tentativa amigável de resolução de um conflito, por meio do qual o notificante (quem requisita algo e envia a notificação) solicita algo ao notificado (aquele que recebe a notificação). Ela serve, inclusive, como prova de boa fé do autor da ação.
Neste caso, a notificação extrajudicial giraria em torno de esclarecer à pessoa invasora que está esbulhando a posse de quem legitimamente a detém, ou a quem ela pertence, solicitando que deixe o imóvel, em prazo razoável (por exemplo, 30 ou 60 dias), sob pena de, se não o fizer, sofrer a ação de reintegração propriamente dita.
Se com a notificação extrajudicial tudo for resolvido e a pessoa invasora deixar o imóvel, o ingresso com a ação não será necessário. No entanto, se a pessoa continuar no imóvel, após decorrido o prazo fornecido na notificação, o proprietário poderá ingressar com a ação para retomada da posse do bem.
Peça Processual
Por óbvio, a peça processual deverá ser acompanhada dos documentos pessoais da parte autora (quem ingressa com a ação) e documentação do imóvel (tais como: Contrato de compra e venda, matrícula, certidões vintenárias ou centenárias, fotografias, comprovantes de pagamento de impostos, contas, taxas, dentre outros), a fim de provar a posse do imóvel, isto é, comprovar que possui poder absoluto sobre a coisa.
Proposta a ação, o/a ré(u) será citado(a), haverá um prazo para apresentação de defesa, após isso haverá o direito de réplica da parte autora e o magistrado poderá designar audiências, perícias, dentre outros.
Ao final da ação, haverá a decisão final do(a) juiz(a) - sentença.
Considerações Finais
Não há como prever o tempo de duração de um processo como esse, visto que ações envolvendo imóveis costumam ser demoradas.
A depender do caso concreto, pode ser viável requerer liminar para a imediata saída ou retirada da pessoa do imóvel, porém nem sempre isso ocorre.
Na maioria dos casos, em sentença final, o juiz designará prazo para que o invasor deixe a propriedade, sob pena de uso de força policial para tal, quando a polícia realmente se dirige ao local, solicita a saída e, se isso não for obedecido, a pessoa é colocada para fora à força, junto com seus pertences.
Além disso, em determinados casos, poderá ser possível ao proprietário solicitar indenização por perdas e danos causados pela pessoa invasora.