CAPÍTULO 5
INSTRUMENTOS PROCESSUAIS PARA A TUTELA JURÍDICA DO MEIO AMBIENTE
5.1 AÇÃO PENAL
A responsabilidade por ato ilícito penal ou contravencional definido em legislação ambiental é apurada através de processo instaurado com a propositura de ação penal que é pública incondicionada, ou seja, havendo notícia de crime ou contravenção prevista em diploma legal ambiental deverá, ex officio [88], instaurar o inquérito policial a fim de definir sua autoria e apurar o que for possível à elucidação dos fatos para que sirvam de base à ação penal que será ajuizada pelo Ministério Público.
A ação penal também poderá ser fundamentada em informações ou procedimentos administrativos, representação de qualquer do povo ou documentos encaminhados por juizes ou tribunais, desde que contenham elementos suficientes para o oferecimento da denúncia (CPP artigos 27 e 40). [89]
José Afonso da Silva tece interessante comentário quanto a subsidiariedade da ação penal ambiental, ensinando que será admitida ação privada se a ação pública não for proposta no prazo legal (CRFB/88, artigo 5º, LIX e CPP, artigos 29 e 46) de quinze dias, se o réu estiver solto ou de cinco dias caso esteja preso. Em matéria ambiental, a admissão de ação privada nos crimes de ação pública, tutelando por natureza os direitos coletivos e os interesses difusos, tal subsidiariedade criaria uma ação popular penal oferecendo legitimidade para qualquer pessoa ingressar com a ação privada subsidiária para a defesa ambiental.
A medida seria uma contribuição importante para aumentar a tutela penal ambiental, entretanto não há, no entender do constitucionalista, como sustentar esta posição pois seria romper com as bases científicas do Direito que impõem limites na própria expressão das normas jurídicas. [90]
Observa-se que a ação penal privada subsidiária foi criada para defender o direito do ofendido em crimes de ação pública no caso de inércia ministerial. Em matéria ambiental raramente se observa um particular diretamente ofendido, mas se tal hipótese se materializar, será ele legitimado para a ação.
5.2 PROCEDIMENTO CIVIL ORDINÁRIO
Em se tratando de ação de responsabilidade civil por danos ambientais, a apuração ocorre por meio do procedimento civil ordinário, não sendo possível o pleito por via sumária.
O pólo ativo deverá ser configurado por aquele que efetivamente suportou os prejuízos causados por ação ou omissão que causou o dano ambiental. Pode configurar no pólo passivo as entidades de Direito Público, inclusive o Estado tem legitimidade genérica nos casos em que o dano ambiental não tenha por autores os agentes públicos. Nesta situação estes poderão ser acionados em ação regressiva, após a condenação do Estado e o pagamento da indenização.
A competência do juízo é determinada pelo Código de Processo Civil e pelos Códigos de Organização Judiciária, que inclusive determinam a competência para as Varas de Fazenda Pública nas ações em que o Estado faça parte. [91]
5.3 AÇÃO CIVIL PÚBLICA
A ação civil pública é o clássico meio processual para a tutela ambiental. Prevista constitucionalmente no artigo 129, III como uma das funções institucionais do Ministério Público a promoção deste instrumento processual para a tutela do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos, sem prejuízo da legitimação de terceiros.
A lei 7.347/85 que disciplina a ação civil pública, recepcionada pela Constituição, oferece legitimidade ativa para, além do Ministério Público, as pessoas jurídicas estatais, autárquicas e paraestatais, assim como para as associações civis desde que respeitada a pertinência temática, ou seja, o direito que será postulado tem que guardar sintonia com os atos constitutivos da associação há pelo menos um ano. A leitura do texto remete ao pensamento de que o grande legitimado para esta ação realmente é o Ministério Público.
O artigo 1° deste diploma legal prevê que danos morais, além dos danos patrimoniais também podem ser pleiteados. José Afonso da Silva, em sede de objeto desta ação comenta:
O objeto mediato da ação [...] consiste na tutela ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, do direito do consumidor e dos bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico (art. 1º da Lei 7.347, de 1985), que, em face da Constituição vigente, não podem mais ser considerados meros interesses difusos, mas formas de direitos humanos fundamentais, ditos de terceira geração. O objeto imediato será a condenação em dinheiro ou o cumprimento de obrigação de fazer ou de não-fazer (art. 3°). [92]
O foro competente para processar e julgar as ações será o do local da situação, ou seja, no local onde ocorrer o dano ao ambiente, razão pela qual se impõe a competência da Justiça Federal (Súmula 183 do STJ) ainda que a união figure no processo.
[...] A ação civil pública nasceu como instrumento processual adequado para coibir danos ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico, atendendo, assim, aos interesses coletivos da sociedade. O campo de aplicação da ação civil pública foi alargado por legislações posteriores, especialmente pelo Código de Defesa do Consumidor, para abranger quaisquer interesses coletivos e difusos, bem como os individuais homogêneos, estes últimos na proteção do meio ambiente, do consumidor, dos bens e direitos de valor artístico, estéticos, históricos, turísticos e paisagísticos. [93]
Insta observar que a sentença civil poderá instruir eventual ação ordinária proposta pelo indivíduo que efetivamente suportou os danos causados.
Em termos práticos, analisando-se a aplicabilidade da ação civil pública às reservas legais e áreas de preservação permanente, o proprietário tem a obrigação constitucional e legal de florestar as áreas de preservação permanente, bem como de instituir, averbar e florestar a reserva legal no caso do proprietário rural.
O cumprimento dessas determinações é medida que causa impacto benéfico ao meio ambiente, pois aumenta as áreas de cobertura vegetal.
Tratando-se de interesse difuso, deve ser defendido pela via em estudo e os legitimados ativos devem usar da ação para a reconstituição da vegetação obrigatória nas áreas de preservação permanente e de reserva legal.
Para que se possa melhor conhecer o trabalho do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, realizou-se uma entrevista, no dia 23 de maio de 2005, por correio eletrônico, com a Promotora de Justiça da Procuradoria de Interesses Difusos do Município do Rio de Janeiro a Senhora Denise Tarim que muito gentilmente respondeu algumas questões acerca da atividade do órgão nas ações em prol do meio ambiente.
A população vem efetivamente ao MP/RJ trazendo denúncias ambientais?
Promotora Denise Tarim - Sim, a população, efetivamente, está participando no encaminhamento de denúncias, que, tecnicamente, denominamos representações. Porém, é importante realçarmos um fenômeno: não obstante a atuação do Ministério Público seja a defesa dos interesses difusos, sendo o meio ambiente um dos melhores exemplos, a participação ainda é individual, vale dizer, as ONGs, ainda, não assumiram, totalmente, o compromisso de mobilização social.
Quando o cidadão faz uma denúncia, como pode acompanhar o inquérito/processo que se originou de seu relato?
Promotora Denise Tarim - O acompanhamento deve ser feito, pessoalmente, com fins à garantir o direito à privacidade e a responsabilidade do Promotor com a divulgação das informações.
Qual o contingente de promotores engajados em promotorias de interesses difusos? Quantos promotores para a tutela ambiental estão locados na 10ª Centro Regional?
Promotora Denise Tarim - São 18 Promotores de Justiça na Tutela Coletiva, sendo 4 do meio ambiente, 4 de defesa do consumidor, 9 de defesa da Cidadania e 1 regional.
O contingente de promotores atuando em matéria ambiental é suficiente para atender a demanda ambiental?
Promotora Denise Tarim - O número de Promotores de Justiça é suficiente, porém entendo que deveríamos aumentar o número de funcionários e estagiários e ampliar o nosso espaço físico, inclusive com uma biblioteca especializada.Eu me vejo coordenado uma equipe de até oito funcionários. Esta é a minha capacidade.
O C.D.C. dá a noção de consumidor por equiparação, ampliando o acesso ao judiciário. Em matéria ambiental o legitimado ativo ainda é muito restrito, tornando inviável a tutela de pequenas lesões ambientais. A Senhora entende que a ampliação do legitimado ativo em pequenas lesões ambientais pode ter o condão de criar uma cultura de preservação ambiental na população?
Promotora Denise Tarim - Para criarmos a cultura de preservação devemos investir na educação ambiental, desde o ensino fundamental. Acredito que ampliar o acesso à justiça não resolve a problemática. Temos que buscar alternativas de conciliação e não de demandas.
A Senhora sabe que no sítio virtual do MP/RJ a 10ª Centro Regional ainda está com endereço na Avenida Presidente Antônio Carlos 607/12° andar apesar de já ter se mudado em setembro de 2003, fazendo 1 ano e 8 meses, para a Av. Nilo Peçanha 26/4 ° andar?
Promotora Denise Tarim - Não, contudo você pode nos ajudar informando à ouvidoria. O correio é [email protected].
5.4 AÇÃO POPULAR
Originalmente, o título ação popular provém da atribuição ao povo, ou parcela dele, de legitimidade para atuar em juízo defendendo direito que não lhe pertence, ut singuli, mas a toda coletividade. A natureza impessoal do interesse defendido é a principal característica, pois visa a atender a interesse coletivo, ou seja, direito ou interesse público. [94]
A Constituição brasileira restringe a legitimidade ativa quando determina que qualquer cidadão pode propor a ação popular. Há restrição quanto à utilização da palavra cidadão, pois, somente é cidadão aquele que goza de direitos políticos, ou seja, pode votar e ser votado. Tal restrição, atualmente, atinge principalmente os estrangeiros e a pessoa jurídica. Esta vedação é um resquício do modelo ditatorial que o Brasil viveu recentemente. Na época, quem exercia oposição ao governo tinha, entre outras penalidades, seus direitos políticos cassados. Para evitar que a ação popular se tornasse uma poderosa ferramenta nas mãos de seus opositores, o regime militar inseriu o termo cidadão como única parte legítima para propor a ação popular, afastando desta forma os cassados.
A ação popular tem por objeto a proteção da moralidade administrativa, do meio ambiente e do patrimônio histórico e cultural contra ato do Estado ou de entidade da qual este participe.
Note-se que o instituto é aplicável apenas contra a administração pública, pois somente o poder público pode compor o pólo passivo da ação. No entanto, as entidades privadas podem ser indiretamente atacadas. Como na maioria das vezes elas dependem de autorização e licença do Estado para poderem atuar, tais atos administrativos poderão ser impugnados por meio da ação popular, podendo-se pleitear sua anulação se for verificada a lesão ambiental.
Sua aplicação é, portanto, corretiva e não preventiva, mas existe a possibilidade de se suspender liminarmente a eficácia do ato a fim de prevenir a lesão.
5.5 MANDADO DE SEGURANÇA COLETIVO
O artigo 5º, LXX da Constituição Federal determina que o mandado de segurança coletivo poderá ser impetrado por partido político com representação no Congresso Nacional ou por organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída e em funcionamento há pelo menos um ano, em defesa de seus membros ou associados. No caso da sociedade civil, observa-se que deverá haver pertinência temática entre os objetos sociais e a atuação ambiental.
O conceito caracteriza a legitimidade processual para a defesa de interesses coletivos, legitimando as associações que tenham como finalidade institucional a proteção ao meio ambiente para impetrar mandado de segurança coletivo com tal objeto. [95]
Em última análise, significa dizer que a população ribeirinha ou os componentes do povo da floresta, carentes de recursos educacionais, financeiros e, não raro alimentares, devem-se organizar em associações civis, incluindo em seus atos constitutivos a tutela jurídica ambiental. Obviamente, esta sociedade deverá ter em seu quadro advogado para tratar dos assuntos legais. Tal situação, na prática é inusitada, pois, como exigir que pessoas nessas condições possam investir em tal organização civil.
Neste aspecto, questiona-se se a tutela ambiental está efetivamente colocada à disposição das pessoas que imediatamente sofrem o dano. Exemplificando: em recente acidente ecológico ocorrido em 27 de abril de 2005, a Ferrovia Centro Atlântica, controlada pela Companhia Vale do Rio Doce, deixou vazar 60 mil litros de óleo diesel, após descarrilamento de um trem. O combustível invadiu o terreno de cerca de 30 casas e alcançou
rios que deságuam na área mais preservada da Baía da Guanabara. [96] O grande legitimado é realmente o Ministério Público.
Em grandes acidentes com repercussão na mídia, a ação ministerial é rápida e eficaz. Entretanto, em pequenas lesões, o mesmo não ocorre. Desta forma, uma tutela ambiental mais célere e direta seria conseguida caso se ampliasse a legitimação ativa a fim de atender a demanda de pequenas lesões. Com base no artigo 5°, XXXV da Constituição temos que nenhuma lesão ou ameaça a lesão poderá ser excluída da apreciação do poder judiciário, de forma que, em se tratando de tutela ambiental, a ação civil ordinária pode se materializar na melhor via para a micro-tutela ambiental, objetivando indenizações para as populações prejudicadas.
5.6 TUTELA CAUTELAR
Em matéria ambiental, a sabedoria popular demonstra através do ditado mais vale prevenir do que remediar a importância da tutela cautelar.
Esta defesa pode ser feita por meio de ação cautelar ou por medida liminar. Ambos os instrumentos estão previstos na lei 7.347, de 24 de julho de 1985, que disciplina a ação civil pública de responsabilidade por danos causados ao meio ambiente, entre outras providências, e já comentada no item 5.2.3 supra.
A ação cautelar está prevista no artigo 4° do dispositivo em tela, que determina que ela poderá ser ajuizada para se alcançar os fins desta lei e objetivando evitar o dano ambiental.
Relevante comentar que em sede cautelar os requisitos do fumus boni iuris [97] e periculum in mora [98] são essenciais para se obter sucesso no pleito judicial que, segundo Misael Montenegro Filho, "deve cingir-se à mera proteção do bem [...] sob pena de se constituir a cautelar em processo satisfativo, desvirtuando os atributos que lhe são próprios". [99]
Objetiva o processo cautelar "a conservação do objeto litigioso e suas provas". [100] Assim preserva-se a existência do bem ou do direito a ser disputado na ação principal.
Quanto à medida liminar, sua concessão está prevista no artigo 12 da lei 7.347/ 85 na ação civil pública e em processo de ação popular também com a finalidade de prevenir o dano que, em questão ambiental, muitas vezes é irreparável.
Como requisitos, Montenegro Filho elenca a verossimilhança da alegação e o periculum in mora ou manifesto propósito protelatório do réu. [101]
Na ação em que se pleiteia a tutela antecipada, arrimada existência da verossimilhança da alegação, pretende o autor obter, através de liminar (leia-se: antecipação da tutela), parte ou o todo que apenas obteria na sentença judicial definitiva, ou seja, ao final do processo. [102]
5.7 EXECUÇÃO ESPECÍFICA E MANDAMENTO COMINATÓRIO
O objetivo da ação civil pública poderá ser a condenação em obrigação de fazer ou de não fazer.
Art. 11. Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz determinará o cumprimento da prestação da atividade devida ou a cessação da atividade nociva, sob pena de execução específica, ou de cominação de multa diária, se esta for suficiente ou compatível, independentemente de requerimento do autor. [103]
Na obrigação de fazer, o devedor prestará uma atividade específica, visando a recuperação do meio ambiente que poderá ser, entre outras, a recuperação de uma área, o reflorestamento, a implantação de sistema de controle de resíduos, a manutenção de serviço para o plantio de árvores. O poluidor será condenado a cumprir com tal obrigação em prazo determinado, sob pena de execução específica ou de cominação de multa diária. Execução específica é a direta, ou seja, a realização do próprio objeto da obrigação e, em caso de inadimplência, poderão ser contratados terceiros para o cumprimento da condenação, às custas do obrigado.
Outra forma de coerção é a cominação de multa diária (astreinte) para forçar o adimplemento da sentença. Nada impede que o magistrado inicialmente comine multa diária e, na persistência do não cumprimento da decisão judicial, posteriormente convertê-la em execução específica.
José Afonso da Silva ensina que, havendo possibilidade de fazer cumprir a obrigação especificamente, deve-se dar preferência para a opção, em atendimento ao princípio de que a recuperação do meio ambiente é prioridade da atuação do Direito Ambiental.
Em relação à obrigação de não fazer, o cumprimento consiste na abstenção de determinada atuação e a inadimplência ocorre quando se realiza o ato que está vedado.
Como tais obrigações não podem ser objeto de execução específica cresce a importância da tutela cautelar ambiental como forma de impedir que a degradação se consume, pois o descumprimento deste gênero obrigacional, em questão ambiental, consiste precisamente no degradar, no poluir, na destruição dos recursos naturais. O uso da força é a forma de se impedir a realização da atividade vedada. Seu descumprimento poderá ensejar o ressarcimento das perdas e danos, ou seja, da obrigação de indenizar; o restabelecimento do status quo ante, [104] inclusive realizado por terceiro às custas do obrigado e a cessação da atividade, conforme preceitua o artigo 11 da lei 7.347/85. A cominação de astreinte não é de todo adequada em obrigação de não fazer, mas compatível com o objetivo de defender o meio ambiente.
5.8 MANDADO DE INJUNÇÃO
Previsto na Constituição Federal, no artigo 5°, inciso LXXV, haverá concessão de mandado de injunção sempre que não existir norma regulamentadora, o que tornaria inviável o exercício de direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania.
O mandado de injunção consiste em uma ação constitucional de caráter civil e de procedimento especial, que visa suprir uma omissão do poder público, no intuito de viabilizar o exercício de um direito, uma liberdade ou uma prerrogativa prevista na Constituição Federal. Juntamente com a ação direta de inconstitucionalidade por omissão, visa ao combate à síndrome de inefetividade das normas constitucionais. [105]
Sua primordial finalidade é conferir imediata aplicabilidade à norma constitucional que confere direitos, liberdades ou prerrogativas inertes em virtude da ausência de regulamentação. É um instrumento a ser posto à disposição de quem se considere titular de quaisquer daqueles direitos ou prerrogativas. [106] Ressalvando que sua concessão é individual, beneficiando apenas a pessoa que o impetrou.
Observa José Afonso da Silva que as liberdades constitucionais são de aplicabilidade imediata, ou seja, não dependem de regulamentação, de forma que apenas raramente haverá oportunidade de se socorrer do instituto para a matéria.
Houve controvérsia quanto à aplicabilidade do mandado de injunção independentemente da edição de lei regulamentadora, pacificada pelo Supremo Tribunal Federal, com base no artigo 5°, §1° da Carta Magna que determina que as normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata. Assim, a ordem expedida pelo mandado é auto-aplicável, não ensejando a elaboração de texto de lei para ter sua eficácia observada.
Canotilho, citado por Alexandre de Moraes, faz a seguinte observação sobre as perspectivas do mandado de injunção:
Resta perguntar como o mandado de injunção ou a ação constitucional de defesa perante omissões normativas é um passo significativo no contexto da jurisdição constitucional das liberdades. Se um mandado de injunção puder, mesmo modestamente, limitar a arrogante discricionariedade dos órgãos normativos, que ficam calados quando a sua obrigação jurídico-constitucional era vazar em moldes normativos regras atuativas de direitos e liberdades constitucionais; se, por outro lado, através de uma vigilância judicial que não extravase da função judicial, se conseguir chegar a uma proteção jurídica sem, lacunas; se, através de pressões jurídicas e políticas, se começar a destruir o ‘rochedo de bronze’ da incensurabilidade do silêncio, então o mandado de injunção logrará os seus objetivos. [107]
Existem, portanto, pressupostos para o remédio. O primeiro deles consiste em não haver norma regulamentadora do direito, liberdade ou prerrogativa reclamada e o segundo é ser o impetrante beneficiário direto do mandamento constitucional que postula em juízo. O interesse de agir neste instituto decorre, portanto, da titularidade do bem reclamado, a fim de que a sentença tenha direta utilidade para o demandante. [108]
Na matéria ambiental, o instituto pode ser utilizado para apreciar hipóteses em que o direito ao ambiente ecologicamente equilibrado foi lesado e não há normatização infraconstitucional regulamentando o tema, desde que possa ser identificado o interessado a fim de compor o pólo ativo, salientando que a sentença somente a este beneficia.
Para tanto, é importante saber o que se deve entender por norma regulamentadora:
Muitos direitos constam de normas constitucionais que prevêem uma lei ordinária ou uma lei complementar para terem efetiva aplicação. Nessas hipóteses, é fácil identificar a norma pendente de regulamentação. Há casos, contudo, que a norma constitucional apenas supõe, por sua natureza, por sua indeterminação, a necessidade de uma providência do poder público para que possa ser aplicada. Norma regulamentadora é, assim, toda "medida para tornar efetiva norma constitucional", bem o diz o art. 103, § 2°. Nesses casos, a aplicabilidade da norma fica dependente da elaboração da lei ou de outra providência regulamentadora. 108
Há quem sustente que o mandado de injunção somente é cabível para a defesa de direitos fundamentais, não cabendo, portanto, em matéria ambiental. Discorda-se deste posicionamento, argumentando que o §1° do artigo 5° da Constituição já confere aplicação imediata para os direitos fundamentais não sendo absolutamente necessário o remédio para dar efetividade ao direito e, porque o inciso LXXI do mesmo artigo não determina expressamente quais, dentre todos os direitos elencados na Carta da República, poderão ser objeto do instrumento. Além disso, na aplicação da norma, mesmo que constitucional, deverá ser atendido o fim social a que ela se dirige e às exigências do bem comum.
Esta posição é corroborada por José Afonso da Silva que declara que o mandamus109constitui um remédio posto à disposição de quem se considere titular de qualquer direito constitucional não regulamentado.