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Intervencionismo e liberalismo no discurso político norte-americano do século XIX

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02/05/2019 às 14:38
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O indivíduo frente ao Estado:

Existe um Estado em expansão. O contexto é a metade do séc. XIX. Os EUA têm um projeto nacional-expansionista; defende a criação de um exército permanente e promove intencionalmente uma guerra contra o México. Um sexto da população é composta por escravos e através de leis o governo de Massachusetts condena criminalmente aquele que ajuda escravos fugidos. As instituições políticas Estatais passam a regular a vida do indivíduo de forma mais freqüente em uma época que isto ainda causava estranheza.

O indivíduo, portador de um potencial moral original e espontâneo, é impedido formalmente de exercer uma conduta própria; é obrigado por lei a auxiliar o Estado na guerra contra o México e é proibido de auxiliar um ser humano em condição de escravidão a se libertar. Esse homem sofre uma coação irresistível a todo o instante. A população acompanha sempre os resultados da guerra e as votações das leis através da imprensa.

O jornal diariamente enlaça as pessoas com a casa do governo, com as exportações e importações, com os heróis de guerra e suas conquistas. A política e o legislador decidem não sobre valores humanos, mas valores financeiros, sobre o comércio e sobre os impostos. A lei do Estado define o homem que é livre e o que é escravo, mas não é a lei que liberta o homem; nestas condições, é o homem que deve se libertar da lei.

Quando tudo na sociedade gira em torno do pensamento econômico, as pessoas passam a medir suas vidas e seu tempo pela utilidade e pelos resultados. Trabalho e produção, ordem e progresso, a nação levanta uma bandeira, um projeto, e os homens marcham para o oeste, por ouro e por riqueza. Entre os indivíduos o que há é o comércio, nas eleições é um façam suas apostas, o diário de notícias é a nova bíblia – e é no Diário que se perde a compreensão do Eterno.

É assim que se apresenta o contexto social que o pensamento de Thoreau se contrapõe (THOREAU; PAUL, 1962; THOREAU; DREISSER, 1965), e é esse panorama que se deve levar em conta para analisar os antagonismos entre a literatura vanguardista americana de moralização e elevação do humano no político e no social e os movimento políticos proto-intervencionistas presentes na ordem liberal americana da primeira metade do século XIX.


Referências bibliográficas

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THOREAU, H, PAUL, S. Thoreau: a collection of critical essays. Englewood Cliffs: Prentice-hall, inc., 1962.


Notas

1 “Alexander Hamilton, o primeiro Secretário do Tesouro, cuja campanha veemente levou o Estado de Nova York a aderir à Constituição, era o líder dos federalistas. Thomas Jefferson, o primeiro Secretário de Estado da União, redator da Declaração de Independência, era o porta-voz e o filósofo dos republicanos” (RÉMOND,1989).

2 Neste sentido atente-se principalmente sobre os conceitos Traditionale Herrschaft e Haushalt em WEBER, Max. Wirtschaft und Gesellschaft: Grundriss der verstehenden Soziologie, 1922, já disponível on-line em: http://www.textlog.de/weber_wirtschaft.html, acesso em 14 de março de 2009.

3 O “imposto de renda” americano, o income tax, só seria criado nos EUA no ano de 1862, sob uma taxação que variava de três a cinco por cento dos ganhos anuais de cada cidadão que ganhasse mais de 600 dólares por ano.

4 “O período de 1829 a 1860 tem recebido dos historiadores diversas designações: Marrett Wendell chamou-o ‘O Renascimento da Nova Inglaterra’, Lewis Mumford ‘A Idade de Ouro’. Mas, qualquer que seja a qualificação adotada, uma coisa é certa: foi a mais destacada fase literária desta região. Em seu transcurso os literatos de Boston e Cambridge, Concord e Salem iniciaram a divulgação de suas idéias sobre religião e natureza humana, democracia e homem comum, progresso industrial e expansão territorial do país, escravatura e Guerra Civil ou ciência e desenvolvimento humano”. (BLAIR, HORNBERGER, STEWART, Breve história da literatura americana. p. 81)

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5 . Ao discutir a proposta desconstrucionista de Derrida, Habermas destaca que, sob um ponto de vista moderno e bem fundamentado, poder-se-ia aceitar as seguintes premissas: 1) “a crítica literária não é primariamente uma atividade científica; ela obedece aos mesmos critérios retóricos que seus objetos literários; 2) tampouco existe uma diferença de gênero entre filosofia e literatura, de modo que em seus conteúdos essenciais os textos filosóficos tornam-se acessíveis para uma crítica literária; 3) a precedência da retórica sobre a lógica significa a competência geral da retórica para as qualidades universais de uma relação textual abrangente e na qual se dissolvem, em última instância, todas as diferenças de gênero(...)” (HABERMAS, 2002, pp. 268-9).

6 Sobre este termo e esta forma genérica de compreender as fontes do conhecimento e assim conseqüentemente a moralidade, e também a sua relação com o empirismo, ver POPPER, K. Acerca das fontes do conhecimento e da ignorância. In: ________. Conjecturas e Refutações. Coimbra: Almedina, 2006, pp. 40-5.

7 Neste sentido ver BRITO, E. Hermenêutica, estética e ética: quatro estudos introdutórios. Desterro: Nephelibata, 2006.

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

COELHO, Fernando Nagib Marcos. Intervencionismo e liberalismo no discurso político norte-americano do século XIX. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 24, n. 5783, 2 mai. 2019. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/72733. Acesso em: 19 abr. 2024.

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