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A atuação do exequente quando ocorre a suspensão da fase de execução por ausência de bens passíveis de penhora do executado:

Uma análise dos artigos 921 e 924 do Código de Processo Civil de 2015

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13/04/2019 às 09:00
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O Código de Processo Civil de 2015 leva em conta os resultados da atuação do exequente para a aplicação do disposto nos artigos 921, § 4º e 924, V?

INTRODUÇÃO

É necessário que o ordenamento jurídico acompanhe a evolução histórica do homem, como ser pensante. A vida civil é dinâmica e, por conta disso, as leis que regem a sociedade também devem ser.

Seguindo esta ideia é que surge o Novo Código de Processo de 2015, buscando, sempre, o aperfeiçoamento das regras vigentes, na tentativa de aproximar, cada vez mais, a norma jurídica ao caso concreto – a subsunção do fato a norma.

Neste ínterim, o legislador processualista inovou ao positivar a possibilidade de aplicação do instituto denominado de “prescrição intercorrente” às ações civis, em especial na fase de execução (em remissão ao sincretismo processual).

Ressalta-se que a prescrição intercorrente mencionada anteriormente, alvo dos artigo 921 e 924 do novel processual, se refere ao direito processual, embora seja um tema relacionado ao direito material corriqueiramente.

Ainda na vigência do já revogado código de processo civil de 1973, não havia a possibilidade de aplicação da prescrição intercorrente como forma de extinção de processos judiciais.

Embora já houvesse, no artigo 40 da Lei de Execuções Fiscais, a previsão de sua utilização nas execuções fiscais, não havia a normatização adequada à aplicação nos casos tipicamente civis.

Mesmo sem a disposição judicial adequada, alguns Tribunais de Justiça começaram a aplicar o artigo 40 da Lei de Execuções Fiscais de forma analógica aos casos concretos, porém, sem que houvesse qualquer requisito definido para a sua configuração. Tratava-se de total discricionariedade dos julgadores.

Sabe-se que tal atitude afetou a segurança jurídica das decisões, já que a ausência de normatização específica não dava a previsibilidade necessária das consequências judiciais aplicáveis ao caso.

É neste contexto que surge o problema que é enfrentado por este trabalho científico.                        

O artigo 921, III do CPC/2015 prevê como hipótese de suspensão da execução quando o executado não possuir bens passíveis de penhora. Além disso, no § 4º há a expressa autorização para o início da contagem do prazo da prescrição intercorrente quando não houver manifestação do exequente. Em sequência, o artigo 924 do mesmo diploma legal enuncia que haverá a extinção do processo quando ocorrer a prescrição intercorrente.

Ora, percebe-se pela redação dos citados dispositivos que o novo Código transfere ao particular/Exequente uma obrigação que, originariamente, seria propriamente do Poder Judiciário. Por certo a parte Autora não possui o mesmo aparato que é disponibilizado ao Poder Judiciário para realizar a busca por bens do devedor.

Sendo assim, necessário se faz uma análise aprofundada da temática aqui exposta, buscando meios, em especial a análise jurisprudencial, embora escassa dada o pequeno lapso temporal em que o novo Código está em vigor, a fim de não macular o direito do exequente em obter o adimplemento de seu crédito, e penalizar o Exequente inoperante.

Neste contexto, o objetivo da presente pesquisa é responder à seguinte indagação: o novo Código de Processo Civil, ao tratar da prescrição intercorrente no caso de suspensão da execução por ausência de bens passíveis de penhora do Executado, leva em conta os resultados da atuação do Exequente para a aplicação do disposto nos artigos 921, § 4º e 924, V?

Visando solucionar tal entrave, o presente trabalho foi dividido em três capítulos distintos. No primeiro, há a análise dos fundamentos e requisitos necessários para a aplicação da prescrição na pretensão do titular. Diante da frequente confusão feita pelos profissionais do direito no que tange às diferenças existente entre a prescrição e a decadência, foram realizados alguns apontamentos de total relevância.

No segundo capítulo, foi realizado o estudo do instituto “prescrição intercorrente”, apontando todo o entendimento doutrinário, bem como a sua aplicação em todas as fases do processo.

E, finalmente, no terceiro capítulo, em conformidade com o § 4º do artigo 921, CPC/2015, não se deve levar em consideração os resultados da atuação do exequente para que se inicie a contagem do prazo para aplicação da prescrição intercorrente, determinada no artigo 924. O direito não deve prestigiar a conduta do Executado/Réu devedor, mas, deve garantir ao Autor/Credor os meios necessários para obter o adimplemento de seu crédito.

Adotou-se como marco teórico as reflexões de Jorge Amaury Maia Nunes e Guilherme Pupe da Nóbrega no que se refere à obrigação do Estado em prover uma tutela jurisdicional efetiva, a fim de dar ao autor a garantia da satisfação de seu direito.

Para isso, utilizou-se da metodologia fenomenológica heideggeriana (2005, p. 56-57) como fio condutor desta pesquisa, na medida em que permitiu desvelar, com o afastamento do interesse puramente estatal, preserva o interesse da parte e, neste caso, o interesse do exequente em obter o cumprimento de seu crédito, apenas da norma processual restritiva.

Este trabalho contribui trazendo os subsídios necessários para a compreensão dos mecanismos que protegem o direito do exequente/credor no cenário da prescrição intercorrente trazida pelo novel processual. 


1 AS MODALIDADES E DEFINIÇÕES DA PRESCRIÇÃO CIVIL NO ÂMBITO DA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA: ANÁLISE DO CÓDIGO CIVIL DE 2002 E SEUS PRESSUPOSTOS

A prescrição é a perda da pretensão de reparação do direito violado, em virtude da inércia do seu titular, no prazo previsto em lei. Neste caso, a obrigação jurídica prescrita converte-se em obrigação natural, que é aquela que não confere o direito de exigir seu cumprimento, mas, se cumprida espontaneamente, autoriza a retenção do que foi pago (GAGLIANO; STOLZE, 2012, p. 497).

Até os dias de hoje, diversos são os conceitos levantados pela doutrina para definir a prescrição civil. Sendo um dos pilares de sustentação da segurança jurídica, é de vital importância o estudo da matéria e a identificação dos limites de sua aplicação. 

De certo modo, a prescrição foi introduzida no sistema pretoriano, como causa obstativa da ação temporária, e ampliada pela Constituição Teodosiana a todas as ações, pelo desaparecimento das perpétuas, a prescrição tem por efeito direto e imediato extinguir ações, em virtude do seu exercício durante um certo lapso de tempo. Sua causa eficiente é, pois, a inércia do titular da ação, e seu fator operante, o tempo (CÂMARA LEAL, 1959, p. 22).

A prescrição incide, justamente, na pretensão do titular em ter o seu direito garantido através da via judicial, não podendo prosperar o entendimento de que tal instituto incide sobre o próprio direito de ação que, como podemos perceber, é imprescritível, tendo em vista que é uma garantia constitucional.

Em contrapartida ao entendimento apresentado por Stolze e Gagliano anteriormente, Amílcar Aquino Navarro (2008, p. 6) afirma que “[...] a prescrição tem por finalidade extinguir o direito de ação de exigir determinada pretensão em juízo, em virtude do decurso do prazo fixado em lei”.

Se a inércia é a causa eficiente da prescrição, esta não pode ter por objeto imediato o direito, porque o direito, em si, não sofre extinção pela inércia de seu titular. O direito, uma vez adquirido, entra, como faculdade de agir (facultas agendi), para o domínio da vontade de seu titular, de modo que o seu não uso, ou não exercício, é apenas uma modalidade externa dessa vontade, perfeitamente compatível com sua conservação. E essa potencialidade, em que se mantém pela falta de exercício, só poderá sofrer algum risco e vir a atrofiar-se, se, contra a possibilidade de seu exercício a todo momento, se opuser alguém, procurando embaraça-lo ou impedi-lo, por meio de ameaça ou violação, por meio da ação, que a prescrição se dirige, porque há um interesse social de ordem pública em que essa situação de incerteza e instabilidade não se prolongue indefinidamente (CÂMARA LEAL, 1959, p. 24).

Superando a discussão de que a prescrição civil seria uma injustiça ao credor e um enriquecimento sem causa ao devedor, entende-se que nenhum direito pode ser absoluto ou indeterminado. A prescrição civil é um mal necessário à efetivação da segurança jurídica que deve contar com a limitação temporal à ação do autor e a punição àqueles que se mantem inertes.  

O Código Civil de 2002 partiu da ideia da pretensão, ou seja, o titular do direito subjetivo recebe da ordem jurídica o poder de exercê-lo, e normalmente o exerce, sem obstáculo ou oposição de quem quer, porém, se num dado momento ocorre a sua violação por outrem, nasce para o titular uma pretensão exigível judicialmente. O sujeito não conserva indefinitivamente a faculdade e intentar um procedimento judicial defensivo de seu direito, uma vez que, ao mesmo tempo que a lei o reconhece, estabelece que a pretensão deve ser exigida em determinado prazo, sob pena de perecer (PEREIRA, 2012, p.576).

Na realidade, vê-se que “pretensão” é a faculdade dada ao titular que, no livre exercício de sua vontade, pode optar ou não por pleitear em juízo o seu direito. A prescrição incide, justamente, sobre a pretensão, já que, conforme dito, o direito de ação é imprescritível. Tanto é que, caso haja o pagamento da dívida prescrita, a obrigação torna-se natural, sendo incabível o pedido de restituição com fundamento na prescrição.

Segundo os conceitos doutrinários incorporados, para apurar a prescrição requer-se o consenso de dois elementos essenciais: o tempo e a inércia do titular. Não basta o decurso do lapsus temporis. Pode ele ser mais ou menos prolongado, sem que provoque a extinção da exigibilidade do direito. Ocorre, muitas vezes, que a não utilização deste é mesmo forma de o exercer. Para que se consume a prescrição é mister que o decurso do prazo esteja aliado à inatividade do sujeito, em face da violação de um direito subjetivo. Esta, conjugada com a inércia do titular, implica a cessação da relação jurídica e extinção da pretensão (PEREIRA, 2012, p. 576).

A prescrição é uma causa extintiva da pretensão de direito material pelo seu não exercício no prazo estipulado pela lei (NERY JUNIOR, 2009, p. 396).

Positivando tal teoria, o Código Civil Brasileiro de 2002 – CC/2002, em seu artigo 189, determina que “Violado o direito, nasce para o titular a pretensão, a qual se extingue, pela prescrição, nos prazos a que aludem os artigos 205 e 206” (BRASIL, 2002).

Vale ressaltar que, ao assim estabelecer, o legislador não restringiu a legitimidade para invocar a prescrição apenas ao devedor diretamente vinculado à pretensão extinta pelo decurso do tempo. Qualquer pessoa que tenha benefícios econômicos, direta ou indiretamente advindos da prescrição, pode alega-la. A toda evidência, o reconhecimento da prescrição acarreta um aumento no patrimônio do prescribente, tendo, pois, um caráter patrimonial. Portanto, o critério adotado pela legitimidade da alegação da prescrição é econômico (TEPEDINO, 2014, p. 368).

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Em sequência, diversos são os fundamentos apresentados pelos exegetas como razão determinante para a criação legal do instituto em voga.

Neste sentido, aponta-se os seguintes fundamentos: (1) o da ação destruidora do tempo, mencionada por Coviello; (2) o do castigo à negligência, indicado por Savigny; (3) o da presunção de abandono ou renúncia, sugerido por M. I. Carvalho de Mendonça; (4) sobre a presunção de extinção do direito, apontado por Colin e Capitant e já referido por Savigny; (5) o da proteção ao devedor, enunciado por Savigny e reproduzido por Vampré e Carvalho Santos; (6) o da diminuição das demandas, referido por Savigny; (7) o do interesse social, pela estabilidade das relações jurídicas, adotado pela maioria dos escritores (LEAL, 1959, p. 28).

Desse modo, ao salientar a questão da busca pela segurança jurídica, referenciada pela maioria dos doutrinadores como “estabilidade das relações”, Pamplona e Stolze (2012, p. 496) afirmam que, “[...] além da inerente segurança jurídica, o maior fundamento da prescrição é a garantia de pacificação social”.

O ordenamento jurídico deve buscar prever, na medida do possível, a disciplina das relações sociais, para que todos saibam – ou tenham expectativa de saber – como devem se portar para o atendimento das finalidades – negociais ou não – pretendam agir (GAGLIANO; STOLZE, 2012, p. 496).

A segurança jurídica dá, não só às partes de um litígio, mas a todo o jurisdicionado, o mínimo de previsibilidade de resultado numa demanda, evitando, sempre, as chamadas “demandas ad eternum”. Hoje, com o advento do novo Código de Processo Civil, presencia-se um período de penumbra, em que não se sabe, ao certo, como ocorrerá a aplicação das “novas” normas, inserindo um sentimento de incerteza nos profissionais do direito.

Fazendo um vínculo com o direito comparado, a jurisprudência espanhola recepcionou, em alguns casos, a tese de que a extinção da pretensão pela prescrição tem fundamento na presunção de abandono ou de renúncia do direito por parte de seu titular. Entretanto, a vinculação da prescrição a qualquer elemento subjetivo configura grave erro interpretativo, tendo em vista que se considera apenas a existência de causas objetivas para a consumação dos prazos extintivos de direito material (SANTANA, 2002, p. 21).

Na concepção de Paulo Torminn Borges (1980, p. 35-36),

[...] o fundamento da prescrição reside na locução legal bem comum, cuja ideia está associada aos conceitos jurídicos indeterminados da necessidade social e do interesse geral. Considera que a Lei de Introdução ao Código Civil brasileiro – Dec.-lei 4.657, de 04.09.1942, por via do art. 5º, estabelece que a meta de toda lei é atender às exigências do bem comum. O bem coletivamente considerado deve prevalecer sobre eventual bem individual, para alcançar uma ordem estável.

Já não há mais espaço para questionar o embaraçoso fundamento escorado em considerações éticas e lógicas, articulando contra a prescrição, nela identificando uma aparente iniquidade, ou mesmo sua duvidosa eticidade, na consideração de que o credor poderia ficar privado de receber o seu crédito, pelo simples fato de não ter tido o cuidado de exercer oportunamente os seus direito, fato que, a rigor, não consubstancia nenhuma infração, e que não deveria alterar relações jurídicas (CAHALI, 2012, p. 22).

Atualmente, essa colocação está definitivamente superada, sendo a prescrição um instituto tranquila e universalmente aceito pro bono publico (CAHALI, 2012, p. 22).

A prescrição surge como um alento, em que se prioriza o bem público, qual seja o bom andamento processual e a segurança jurídica, em relação ao recebimento de uma contraprestação que, teoricamente, nem mesmo seu credor possui interesse em receber.

Primeiramente, a necessidade de fixar as relações de direito incertas, suscetíveis de dúvidas e contestações, impõe a conveniência de encerrar a incerteza em um lapso de tempo determinado (ALMEIDA JR., 1960, p. 158)

Em seguida, a presunção de estar extinto o direito protegido pela ação resulta da natural suspeita de que o titular do direito tenha deixado por tanto tempo de exercer a sua ação, se o próprio direito já não estivesse extinto por qualquer maneira cuja prova não existe mais (ALMEIDA JR., 1960, p. 158).

Por fim, a punição da negligencia do autor, razão esta que Savigny considera não como motivo positivo da prescrição, mas como uma resposta à alegação de injustiça da instituição; é justo evitar que o autor, adiando por tempo a sua ação, possa aumentar as dificuldades da defesa e das provas do réu (ALMEIDA JR., 1960, p. 158).

Em resumo, justificam a prescrição o interesse social em que as relações jurídicas não permaneçam indefinidamente incertas; a presunção de que quem descuida do exercício do próprio direito não tinha vontade de conservá-lo; a utilidade de punir a negligencia; e a ação deletéria do tempo que tudo destrói (COVIELLO, 1924, p. 452, tradução nossa)[1].

Além disso, para que a prescrição seja corretamente aplicada, têm-se que analisar a configuração de certos requisitos essenciais. Citam-se os seguintes: (1) a existência de uma pretensão que possa ser em juízo alegada por meio de uma ação exercitável, (2) inércia do titular da ação (em sentido material) pelo seu não exercício, (3) a continuidade dessa inércia durante um certo lapso temporal e, por fim, (4) ausência de algum fato ou ato a que a lei confere eficácia impeditiva, suspensiva ou interruptiva de curso prescricional, que é o seu fator neutralizante (DINIZ, 2011, p. 430).

Ressalta-se que o primeiro elemento citado anteriormente deve ser atualizado, tendo em vista que a moderna doutrina e o Código Civil exigem não uma ação exercitável, mas uma pretensão. E o ultimo não constitui propriamente elemento conceitual da prescrição, implicando apenas na não tipificação ou em mera forma alternativa de contagem de prazo (GONÇALVES, 2013, p. 514).

Quanto ao segundo elemento, inércia do titular do direito, é uma causa eficiente, já que, mantendo-se o titular em passividade ante a violação que sofreu em seu direito, deixa que ela permaneça. Cessa tal inércia no momento em que o titular ajuizar ação pedindo ao órgão judiciário o reestabelecimento do seu direito, impondo ao infrator a reparação de perdas e danos (DINIZ, 2011, p. 430).

Para que seja abarcado pela prescrição, o titular da pretensão deverá se portar de maneira inerte perante a situação jurídica, demonstrando o seu não interesse, ou a sua não preocupação em haver resgatado o seu direito.

Ainda deve ocorrer o decurso de um certo lapso temporal definido em lei, mais especificamente no Código Civil de 2002, para que a pretensão do titular do direito seja prescrito.

O credor da obrigação deve se manter inerte durante um período de tempo determinado, que é o seu fator operante, pois o que a norma jurídica pretende punir é a inércia prolongada e não a passageira. Para a consumação da prescrição exige-se inércia continuada, sem qualquer interrupção, durante todo o tempo previsto em lei para o exercício da ação. O Código Civil fixa, no artigo 205[2], o prazo prescricional geral de 10 anos para os casos em que a lei não fixou prazo menor e prazos especiais para as diversas ações no artigo 206 (BRASIL, 2002). Não havendo prazo especial, a ação submete-se ao prazo geral, segundo sua natureza pessoal ou real, salvo casos expressamente previstos em lei (CÂMARA LEAL, 1978, p. 26-27).

Para que ocorra o fenômeno da prescrição, deve-se conjugar, necessariamente, os requisitos supracitados, sem os quais não será possível a sua aplicação.

Um fator que merece estrita atenção é a diferenciação conceitual entre o instituto da prescrição e a decadência, teoria positivada pelo Código Civil de 2002. Embora seja um assunto, até mesmo, corriqueiramente tratado pela doutrina e jurisprudência, muitos operadores ainda possuem dificuldades em diferenciar e aplicar os dois temas nos casos concretos.

No Código de 1916, não havia a figura denominada de decadência ou caducidade, apenas se referindo à prescrição; mas era unânime a doutrina e torrencial a jurisprudência no admitir que vários dos casos disciplinados no Código Civil sob aquela rubrica são de caducidade. Inovando, o CC/2002 trouxe um capítulo referente à decadência civil (RODRIGUES, 2003, p. 329).

Como característica diferenciadora principal, deve-se compreender quais são os tipos de direitos abarcados pela prescrição e quais são abarcados pela decadência.

A decadência não seria mais do que a extinção do direito potestativo, pela falta de exercício dentro do prazo prefixado, atingindo diretamente a ação, enquanto a prescrição extingue a pretensão alegável em juízo por meio de uma ação, fazendo desaparecer, por via oblíqua, o direito por ela tutelado que não tinha tempo fixado para ser exercido. Logo, a prescrição supõe direito já exercido pelo titular, existente em ato, mas cujo exercício sofreu obstáculo pela violação de terceiro; a decadência supõe um direito que não foi exercido pelo titular, existente apenas em potência (DINIZ, 2011, p. 457).

O direito subjetivo é retratado como a possibilidade de exigir de alguém um determinado comportamento. Entretanto os direitos potestativos são considerados como os que conferem ao seu titular o poder de fazer produzir efeitos, pela simples manifestação de vontade (RODRIGUES, 2003, p. 329).

Além disso, os direitos subjetivos se dividem em duas grandes categorias; onde a primeira compreende aqueles direitos que têm por finalidade um bem da vida a conseguir-se mediante uma prestação, positiva ou negativa, de outrem, isto é, do sujeito passivo (AMORIM FILHO, 1997, p. 728).

Recebem eles, de Chiovenda, a denominação de “direitos de uma prestação”, e como exemplos pode-se citar todos aqueles que compõem as duas numerosas classes dos direitos reais e pessoais. Nessas duas classes há sempre um sujeito passivo obrigado a uma prestação, seja positiva (dar ou fazer), como nos diretos de crédito, seja negativa (abster-se), como nos direitos de propriedade (AMORIM FILHO, 1997, p. 728).

Por outro lado, a segunda grande categoria é a dos denominados direitos potestativos, e compreende aqueles poderes que a lei confere a determinadas pessoas de influírem, com uma declaração de vontade, sobre situações jurídicas de outras, sem o concurso da vontade destas (AMORIM FILHO, 1997, p. 728).

Outra diferença que merece distinto destaque é referente à possibilidade de renúncia na prescrição e na decadência. Farias e Rosenvald (2011, p. 783) afirmam que a prescrição “[...] somente pode ser renunciada após a consumação e desde que não prejudique a terceiros”. Em relação à decadência, os mesmos autores (2011, p. 783) admitem que “[...] a decadência legal não admite renúncia, nem após a sua consumação”[3].

Importante ressaltar, também, a possibilidade de aplicação da suspensão, impedimento ou interrupção na decadência e na prescrição.

A prescrição admite tanto a suspensão quanto o impedimento e a interrupção. Em decorrência disto, o CC/2002 positivou nos artigos 197 e seguintes a possibilidade de aplicação destes institutos.

Já os prazos decadenciais não admitem a suspensão e a interrupção, com uma exceção especificamente elencada no artigo 207[4] do CC/2002, salvo disposição legal em contrário.

Outro ponto divergente relevante é a possibilidade de as partes determinarem os prazos para aplicação dos institutos. Quanto à prescrição, vislumbra-se pelo artigo 192[5] do atual Código Civil, que a mesma somente pode ser fixada por lei, não admitindo alteração por acordos inter partes. Quanto à decadência, deve-se elucidar a seguinte diferenciação: decadência legal e decadência convencional.

A decadência legal consiste naquela que foi determinada pela lei, pela norma civilista. Já a decadência convencional é aquela fixada pelas partes, conforme redação do artigo 211[6], CC/2002.

O CC/2002 faz distinção entre decadência legal e decadência voluntária ou convencional. A primeira é estabelecida em lei, que já define o direito subordinado a ser exercido em prazo determinado em lei, que já define o direito subordinado a ser exercido em prazo certo, pena de caducidade. A segunda resulta da vontade das partes, que podem, na celebração do negócio jurídico, fixar um lapso de tempo, ao fim do qual se extingue o direito para o titular. A primeira é de ordem pública. Não é, em princípio, passível de renúncia, e deve ser pronunciada pelo juiz quando conhecer dela (MARIO, 2012, p. 582). 

A decadência convencional é de cunho privado. Instituída pelos interessados, a benefício de um deles, pode ser alegada em qualquer fase do processo, tal qual a prescrição (artigo 193), e do mesmo modo que a decadência legal (MARIO, 2012, p. 582).

Em resumo, quando o prazo para o exercício da pretensão se referir a tutelas condenatórias, será prescricional; quando se referir a tutelas constitutivas, com estabelecimento de prazo para a propositura, será decadencial; quando se tratar de tutela constitutiva, mas não houver previsão de prazo ou se referir a pretensões de índole declaratórias, serão imprescritíveis (AMORIM FILHO, 2008, p. 37).

Identificar e adequar cada instituto ao caso concreto correlato é um desafio vivenciado todos os dias pelos juristas brasileiros. O estudo da presente matéria proporciona o amadurecimento intelectual e, consequentemente, gera segurança para exercer as funções jurídicas inerentes aos operadores do Direito.  

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Sobre a autora
Nívea Mikaela Deps Rios

Assessora Jurídica da 1ª Promotoria de Justiça de Domingos Martins -ES; Pós-graduada em Direito Processual e Civil pela Faculdade de Direito de Vitória -ES; Graduada em Direito pela Faculdade de Direito de Vitória/ES.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

RIOS, Nívea Mikaela Deps. A atuação do exequente quando ocorre a suspensão da fase de execução por ausência de bens passíveis de penhora do executado:: Uma análise dos artigos 921 e 924 do Código de Processo Civil de 2015. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 24, n. 5764, 13 abr. 2019. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/73161. Acesso em: 18 abr. 2024.

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