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Princípio da primazia de julgamento de mérito

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27/07/2020 às 21:15
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Uma das grandes novidades trazidas pelo CPC/2015 foi o princípio da primazia de julgamento de mérito, a nortear todo o sistema processual.

"Tudo é veneno. Nada é veneno. A diferença está na dose" - Phillipus Aureolus Theophrastus Bombastus von Hohenheim


1. Princípio da Primazia de Julgamento de Mérito.

O processo civil brasileiro é animado por vários princípios[1]jurídicos, dentre outros, o princípio do devido processo legal, contraditório, ampla defesa, duração razoável do processo, efetividade, instrumentalidade, cooperação/colaboração processual, motivação adequada, segurança jurídica, publicidade, dentre tantos outros.

Cumpre ressaltar que o Código de Processo Civil de 2015, em observância ao postulado da segurança jurídica e ao imperativo da efetividade da prestação jurisdicional, vem a priorizar o julgamento de mérito do feito, em detrimento da extinção simplesmente terminativa da questão controvertida posta pelos jurisdicionados. Assim, indicam os artigos 4º e 6º do referido diploma legal: “Art. 4º As partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa” e “Art. 6º Todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva.”

Uma das grandes novidades trazidas pela Lei 13105/2015 – Código de Processo Civil – foi o reconhecimento e a inserção do denominado Princípio da Primazia de Julgamento de Mérito.[2]Tal princípio deve servir de norte para todo o sistema processual brasileiro.[3]

Desta maneira, “há de se considerar que o Código de Processo Civil de 2015 consagra, como uma de suas normas fundamentais, o princípio da primazia da decisão de mérito, a exigir do Poder Judiciário que dispenda todos os esforços possíveis para que o mérito de uma dada postulação seja apreciado. A própria consagração do efeito regressivo do recurso de apelação nos casos em que o processo é extinto sem resolução do mérito é manifestação desse princípio”.[4]

Conforme preleciona Fredie Didier, o Código de Processo Civil “consagra o princípio da primazia da decisão de mérito. De acordo com esse princípio, deve o órgão julgador priorizar a decisão de mérito, tê-la como objetivo e fazer o possível para que ocorra. A demanda deve ser julgada seja ela a demanda principal (veiculada pela petição inicial), seja um recurso, seja uma demanda incidental”.[5]

Antes mesmo da vigência da Lei 13105/2015 – novo Código de Processo Civil – admitia a jurisprudência dos Tribunais Superiores, em atenção aos princípios da instrumentalidade processual, economia processual e da efetividade jurisdicional, a correção de determinados atos processuais[6], mesmo depois da estabilização da demanda.

Tal proceder corretivo não incluiria, entretanto, a correção de eventuais falhas processuais para fins de análise de pressupostos de recursos de natureza extraordinária e sua admissão, como norte geral seguido pela jurisprudência predominante. Nesse sentido caminhou a jurisprudência: 

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO CONTRA DECISÃO QUE INDEFERIU INCLUSÃO DE PARTE NO POLO PASSIVO DA AÇÃO APÓS A CITAÇÃO DO RÉU. INTERDITO PROIBITÓRIO. AUSÊNCIA DOS VÍCIOS ELENCADOS NO ART. 535 DO CPC. EMENDA DA INICIAL APÓS CITAÇÃO. POSSIBILIDADE. PRINCÍPIOS DA INSTRUMENTALIDADE DAS FORMAS E DA ECONOMIA PROCESSUAL. PECULIARIDADES DO CASO QUE JUSTIFICAM A RETIFICAÇÃO DO POLO PASSIVO. INEXISTÊNCIA DE MODIFICAÇÃO DA CAUSA DE PEDIR OU PEDIDO. RECURSO NÃO PROVIDO. 1. Não há violação do disposto no art 535 do CPC quando o aresto recorrido adota fundamentação suficiente para dirimir a controvérsia, sendo desnecessária a ma-nifestação expressa sobre todos os argumentos apresentados. 2. Observados os princípios da instrumentalidade das formas e da economia processual, é possível a relativização das regras previstas no art. 264 do CPC para se admitir a emenda da inicial após a citação do réu desde que isso não acarrete alteração da causa de pedir ou do pedido. Precedentes. 3. Recurso especial não provido.” STJ, 3ª Turma, REsp 1473280/ES, Relator: Ministro Moura Ribeiro, Julgamento: 1/12/2015, DJe 14/12/2015. 

PROCESSO CIVIL. EMENDA À INICIAL APÓS A CITAÇÃO.POSSIBILIDADE. CORRETA INDICAÇÃO DAS PESSOAS JURÍDICAS QUE DEVEM COMPOR O POLO DENTE DO STJ. 1. A discussão central diz respeito à suposta ocorrência de violação do art. 264, parágrafo único c/c art. 267, VI, todos estes do Código de Processo Civil por entender pela impossibilidade de regularização do polo passivo da demanda após o saneamento do feito, razão pela qual deve o processo ser extinto sem julgamento de mérito. 2. Não obstante, tendo como norte as cláusulas gerais da efetividade do processo e da instrumentalidade das formas, é possível a relativização das regras constantes no art. 264, parágrafo único c/c art. 267, VI, todos estes do Código de Processo Civil, quando se tratar de emenda à petição inicial em face de ilegitimidade do pólo passivo da demanda. Assim, é possível que se promova a emenda à inicial sem que tal providência implique, no entanto, na extinção do processo sem julgamento de mérito.3. Agravo regimental não provido.”  STJ, 2ª Turma, AgRgREsp 1.362.921/MG, Relator: Ministro Mauro Campbell Marques, Julgamento: 25/6/2013, DJe 1/7/2013. 

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM recurso especial. EMENDA APÓS A CITAÇÃO. INSTRUMENTALIDADE DAS FORMAS. ECONOMIA PROCESSUAL. AUSÊNCIA DE MODIFICAÇÃO DO PEDIDO E DA CAUSA DE PEDIR. POSSIBILIDADE. DECISÃO MANTIDA. 1. A vedação de emenda da petição inicial após a citação, sem o consentimento do réu, somente incide nas hipóteses em que há alteração da causa de pedir ou do pedido. Precedentes.2. O conhecimento do recurso especial interposto com fundamento na alínea "c" do permissivo constitucional exige a indicação do dispositivo legal objeto de interpretação divergente, a demonstração do dissídio mediante a verificação das circunstâncias que assemelhem ou identifiquem os casos confrontados e a realização do cotejo analítico entre elas, nos moldes exigidos pelos arts. 255, §§ 1º e 2º, do RISTJ e 541, parágrafo único, do CPC, ônus dos quais o recorrente não se desincumbiu. 3. Agravo regimental a que se nega provimento.” STJ, 4ª Turma, AgRgAREsp 620146/SP, Relator: Ministro Antônio Carlos Ferreira, Julgamento: 16/6/2015, DJe 26/6/2015.

 Em atenção ao princípio da primazia de julgamento de mérito, recentemente o Superior Tribunal de Justiça entendeu que o interessado deverá ser intimado para a realização do preparo recursal nas hipóteses de indeferimento ou de não processamento do pedido de gratuidade da justiça - STJ, Corte Especial, EAREsp 742.240/MG, Relator: Ministro Herman Benjamin, julgado em 19/9/2018 (Informativo 643).

Como é ensinado nos manuais de estudo da ciência processual, o processo é uma forma de participação democrática na vida social e também manifestação da própria cidadania e, por isso, deve ter regras claras, seguras e simples. O processo não pode se transformar numa armadilha para o jurisdicionado, uma vez que tal proceder iria contra a própria função social que a jurisdição exerce. Não pode ser olvidado que processo é Poder, Função e Atividade. Há nisso o que o Supremo Tribunal Federal denominou de “primazia da simplificação do processo judicial”.[7]   

Tal princípio – Princípio da Primazia de Julgamento de Mérito- foi incluso no Código de Processo Civil certamente com o feitio de combater a denominada jurisprudência defensiva.[8]

Jurisprudência defensiva é o nome que se dá ao não-conhecimento – sem amparo na lei – pelos Tribunais Superiores de recursos sob alegação de falta de preenchimento dos mais diversos pressupostos recursais. 

O processualista Armando Wesley Pacanaro ressalta sobre a denominada jurisprudência defensiva as seguintes considerações: 

“A doutrina processual pouco fala sobre o assunto, porem podemos defini-la como a instituição de “requisitos judiciais” e ilegítimos exigidos no caso concreto com a finalidade de conter o excesso de recursos interpostos. Frisamos “requisitos judiciais” justamente porque tais exigências não são previstas em lei, mas sim criadas e imaginadas pelos julgadores das superiores instâncias. Definitivamente não se pode concordar com tal prática, conquanto seja muito usual atualmente. Embora sob outro enfoque, interessante passagem doutrinária bem sintetiza o pensamento crítico desenvolvido neste ensaio (Azevedo, 2000, p. 134) ao afirmar que “para chegar a decisões adequadas e socialmente convincentes e indispensável superar o positivismo jurídico. Contudo, a superação deste e da ideologia que o anima não pode conduzir a negação do ordenamento jurídico mediante a tácita permissão de decidir o juiz as questões ao seu alvedrio. O problema põe-se justamente em função da existência da ordem jurídica”.”[9]

Há quem veja no parágrafo único, do artigo 932 do Código de Processo Civil verdadeiro direito em ter apreciado o mérito da demanda judicializada, como é, por exemplo, o entendimento sufragado pelo ilustre processualista Said Ramos Neto, que assim entende o tema:

“Pois bem, com a entrada em vigor do Novo Código de Processo Civil – Lei 13.105/2015 – a controvérsia parece-me estar superada. Isso porque referido regramento processual estabelece, de maneira expressa em seu art. 4º, abaixo transcrito, e de forma indireta em outros de seus dispositivos, v. g.art. 6º, art. 139, IX, art. 282, § 2º, art. 317, art. 319, § 2º, art. 321, art. 338, art. 352, art. 485, § 1º, art. 488, art. 933, art. 1029, § 3º, o princípio da primazia da decisão de mérito: Art. 4º As partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa. Consoante depreende-se do dispositivo legal transcrito, a solução integral do mérito passou a ser um direito das partes, tendo sido construído todo o novo arcabouço de regras processuais com a finalidade de se empreender esforços e superar questões formais a fim de se obter a solução do mérito, consistindo, nisto, tal princípio da primazia da decisão de mérito. Sendo assim, uma vez extinto o processo sem resolução do mérito, passou a possuir não apenas o autor, mas também o réu, interesse recursal visando à obtenção de uma sentença de mérito, tendo em vista tal provimento consistir, com a entrada em vigor do atual Código de Processo Civil, em direito das partes”.[10]

De forma similar Márcia Cristina Xavier de Souza Bárbara Gomes Luppeti Baptista ressaltam: “Sendo assim, verifica-se que a justificativa para combater a jurisprudência defensiva está na garantia da parte de, sempre que possível, receber a solução de mérito. Nessa linha, o Novo CPC consagra como norma fundamental o princípio da primazia da resolução do mérito, que, além de ter sido expressamente prescrito no art. 6°, também se manifesta sob distintas formas em dispositivos esparsos do Novo CPC”.[11]

Consoante asseverado, o Princípio da Primazia de Julgamento de Mérito tem previsão no artigo 932, parágrafo único, do Código de Processo Civil, que preceitua: “Antes de considerar inadmissível o recurso, o relator concederá o prazo de 5 (cinco) dias ao recorrente para que seja sanado vício ou complementada a documentação exigível”. 

Embora o dispositivo legal faça menção apenas na hipótese de ser “inadmissível o recurso”, o preceito normativo deve ter interpretação generosa, incluindo aí outras espécies processuais, tais como ações autônomas de impugnação e sucedâneos recursais, dentre outros. Além disso, não são apenas os recursos que possuem “mérito” a ser apreciado pelo Estado-Juiz.

O prazo do artigo legal mencionado foi pensado exclusivamente para sanar vício de natureza estritamente formal e não todo e qualquer vício.

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Há sobre a aplicação do preceito normativo, os seguintes enunciados persuasivos:

Enunciado 82/FPPC (Fórum Permanente de Processualistas Civis): “É dever do relator, e não faculdade, conceder o prazo ao recorrente para sanar o vício ou complementar a documentação exigível, antes de inadmitir qualquer recurso, inclusive os excepcionais.”

Enunciado 197/FPPC: “Aplica-se o disposto no parágrafo único do art. 932 aos vícios sanáveis de todos os recursos, inclusive dos recursos excepcionais.”

Enunciado 463/FPPC: “O parágrafo único do art. 932 e o art. 933 devem ser aplicados aos recursos interpostos antes da entrada em vigor do CPC de 2015 e ainda pendentes de julgamento.”

Enunciado 550/FPPC: “A inexistência de repercussão geral da questão constitucional discutida no recurso extraordinário é vício insanável, não se aplicando o dever de prevenção de que trata o parágrafo único do art. 932, sem prejuízo do disposto no art. 1.033 do FPPC.”

Enunciado 551/FPPC: “Cabe ao relator, antes de não conhecer do recurso por intempestividade, conceder o prazo de cinco dias úteis para que o recorrente prove qualquer causa de prorrogação, suspensão ou interrupção do prazo recursal a justificar a tempestividade do recurso.”

Enunciado 593/FPPC: “Antes de inadmitir o recurso especial ou recurso extraordinário, cabe ao presidente ou vice-presidente do tribunal recorrido conceder o prazo de cinco dias ao recorrente para que seja sanado o vício ou complementada a documentação exigível, nos termos do parágrafo único do art. 932.”

Enunciado 66/CJF: (Conselho da Justiça Federal): “Admite-se a correção da falta de comprovação do feriado local ou da suspensão do expediente forense, posteriormente à interposição do recurso, com fundamento no art. 932, parágrafo único, do CPC.”

Enunciado 73/CJF: “Para efeito de não conhecimento do agravo de instrumento por força da regra prevista no § 3º do art. 1.018 do CPC, deve o juiz, previamente, atender ao art. 932, parágrafo único, e art. 1.017, § 3º, do CPC, intimando o agravante para sanar o vício ou complementar a documentação exigível.”

Enunciado administrativo 5/STJ: “Nos recursos tempestivos interpostos com fundamento no CPC/15 (relativos a decisões publicadas até 17 de março de 2016), não caberá abertura de prazo previsto no art. 932, parágrafo único, c/c o art. 1.029, § 3º, do novo CPC para que a parte sane vício estritamente formal.”

Enunciado administrativo 6/STJ: “Nos recursos tempestivos interpostos com fundamento no CPC/15 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016), somente será concedido o prazo previsto no art. 932, parágrafo único, c/c o art. 1.029, §3", do novo CPC para que a parte sane vício estritamente formal.”

      Nesse passo, até mesmo a Súmula 422/TST recentemente foi revista para admitir que o mérito recursal seja analisado, quando, mesmo quando não existir possibilidade de complementação das razões recursais, torne-se possível entender que houve desacerto da sentença e que o recurso foi minimamente fundamentado e que a motivação apresentada nas razões recursais não seja inteiramente alienada das razões de decidir objeto de insurgência recursal.  A Súmula tem a seguinte redação:

 “RECURSO. FUNDAMENTO AUSENTE OU DEFICIENTE. NÃO CONHECIMENTO. I – Não se conhece de recurso para o Tribunal Superior do Trabalho se as razões do recorrente não impugnam os fundamentos da decisão recorrida, nos termos em que proferida. II – O entendimento referido no item anterior não se aplica em relação à motivação secundária e impertinente, consubstanciada em despacho de admissibilidade de recurso ou em decisão monocrática. III – Inaplicável a exigência do item I relativamente ao recurso ordinário da competência de Tribunal Regional do Trabalho, exceto em caso de recurso cuja motivação é inteiramente dissociada dos fundamentos da sentença.”  

Aqui também pode-se entender que o princípio da primazia de julgamento de mérito foi prestigiado, conquanto não se admita a complementação das razoões de recorrer.

No processo do trabalho, há necessidade de observância, ainda, do que preceitua o artigo 769 da Consolidação das Leis do Trabalho, que exige, para aplicação subsidiária das normas processuais civis: ausência de dispositivo celetário específico regendo o tema e a existência de harmonia com o conjunto principiológico do Processo do Trabalho, que busca a simplicidade na aplicação de suas normas.

A doutrina traz interessantes comentários sobre o dispositivo processual que introduziu o Princípio da Primazia de Julgamento de Mérito. Consoante ensinam Luiz Guilherme Marinoni Daniel Mitidiero:

“Em primeiro lugar, cumpre observar que o art. 932, parágrafo único, CPC/2015, alcança todo e qualquer vício capaz de inviabilizar o conhecimento - isto é, a admissibilidade - do recurso. Ressalvada a tempestividade recursal (analogicamente, art. 1.029, § 3°, CPC/2015), todos os demais requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade recursal são passíveis de correção. Se é verdade que constitui um dos objetivos do processo civil a viabilização de uma decisão de mérito justa e efetiva (art. 6°, CPC/2015), com o que há primazia do mérito no julgamento da causa, então é evidente que o art. 932, parágrafo único, CPC/2015, deve ser lido à luz dessa norma fundamental.”[12]  

“Em qualquer situação de recurso que contiver vício formal passível de ser sanado, deve ser dada a oportunidade de correção para evitar que um obstáculo que nada tem a ver com o mérito da postulação prejudique o recorrente. O art. 932, parágrafo único, do CPC/2015dispõe expressamente: "Antes de considerar inadmissível o recurso, o relator concederá o prazo de cinco dias ao recorrente para que seja sanado vício ou complementada a documentação exigível". Alguns vícios, no entanto, não são corrigíveis, especialmente aqueles que, para serem sanados, necessitariam de uma repetição da prática do ato de recorrer. É o caso, por exemplo, de um recurso incabível ou equivocado com erro grosseiro. Pensemos na hipótese da exclusão de um litisconsorte, que desta decisão interpõe apelação, quando o código expressamente prevê cabimento de agravo de instrumento (art. 1.015, VII, do CPC/2015).Para "corrigir" o equívoco, o recorrente deveria repropor o recurso, o que não é possível dada a preclusão consumativa”.[13] 

Cassio Scarpinella Bueno afirma que:

“Consequentemente, podemos compreender que o Princípio da Primazia do Julgamento do Mérito, flexibiliza o formalismo processual, vez que busca cada vez mais a eficiência processual, onde essa efetividade deverá ser medida pela sua capacidade de tornar reais (concretizados) os direitos controvertidos, ameaçados ou lesionados, ou seja, buscando cada vez mais o dialogo no processo, a resolução do mérito”.[14]

Alberto Gossom Jorge Júnior pondera:

“Ainda a guisa de comentário genérico sobre o nosso tema, tem-se observado que o novo CPC transparece o propósito de evitar a não admissibilidade dos recursos, direcionando o processo para o julgamento de fundo, o que levou Clito Fornaciari Jr. a dizer que “O novo Código de Processo Civil reduz a importância do processo nas demandas de natureza cível. Essa conclusão salta aos olhos na medida em que praticamente se elimina a possibilidade de extinção do processo sem julgamento de mérito, como também se procura abolir os casos de não conhecimento de recurso” (...) “Na segunda instância, mais ainda, de vez que cabe ao relator, antes de considerar inadmissível o recurso, conceder prazo para o vício ser sanado ou ser exibido o documento faltante (parágrafo único do art. 932 do CPC/2015); admite-se a renovação ou realização de ato processual para solucionar vício sanável (art. 938, § 1º do CPC/2015); permite-se, quando houver falta de prova, a conversão do julgamento em diligência, a fim de produzi-la (art. 932, § 4º, do CPC/2015), parecendo, pois, descartar-se o julgamento com base no ônus da prova, se houver possibilidade de sua produção”.”[15]

Comentando a primazia de julgamento de mérito, Alberto Gossom Jorge Júnior alinha seu pensamento nas seguintes linhas:

“O CPC/15 preza pela primazia do exame do mérito. Deseja-se o aproveitamento dos atos processuais que não prejudiquem a parte adversa, para que se tenha uma solução de mérito com a maior brevidade possível. Assim, é salutar a possibilidade de correção. A norma do artigo não afasta a preclusão consumativa, pois apenas possibilita a emenda do ato, ou seja, apenas possibilita a correção de vícios, vícios estes que iriam ser sanados com a obrigatoriedade da intimação judicial para correção, prática estimulada pelo Código de Processo Civil”.[16]

Fernanda Medina Pantoja Verônica Estrella Holzmeister ministram o seguinte entendimento:

“Do mesmo modo, também um defeito processual que recaia sobre um ou alguns dos pedidos deve ser reconhecido o quanto antes, com a ressalva de que, quando possível, dê-se previamente à parte a oportunidade de corrigir o vício, à luz do princípio da primazia da decisão de mérito. Assim, evita-se o prosseguimento desnecessário do feito em relação àquele pedido inquinado de manifesto defeito processual, poupando-se a prática de atos claramente prescindíveis, como a produção de provas pelas partes em relação a um pedido cujo mérito sabidamente não poderá ser objeto de julgamento”.[17]

Estefânia Freitas Côrtes ensina:

“Segundo o novo Código, tanto nas hipóteses de extinção sem resolução de mérito, como nos casos em que não seja observada a regra da correlação entre pedido e decisão e também nos casos de ausência de fundamentação, deverá ocorrer a aplicação da teoria da causa madura, desde que não haja necessidade de produção probatória, a qual mitiga o efeito devolutivo da apelação e o duplo grau de jurisdição, a fim de alcançar os princípios normativos da primazia de mérito e da duração razoável do processo, nos moldes dos artigos 4° do CPC/15 e 5°, LXXVIII da Carta Magna”.[18]

Lorena Miranda Santos Barreiros leciona:

“tratando-se o princípio da primazia da decisão de mérito de norma fundamental do processo civil e ante o denominado "postulado interpretativo da unidade do Código': segundo o qual o diploma processual civil de 2015 deve ser interpretado como uma unidade normativa coerente (e não como fragmentos isolados), também não se mostra compatível com o sistema a conclusão de que o magistrado, diante de um vício que pode ser sanado, estaria impedido de praticar atos tendentes à sua correção, como premissa para exercício de seu juízo de retratação”.[19]

Pode ser acrescentado às razões acima que o artigo 15 do Código de Processo Civil preceitua que ocorrência ausência de normas que regulem processos eleitorais, trabalhistas ou administrativos, as disposições deste Código lhes serão aplicadas supletiva e subsidiariamente. 

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Sobre o autor
Horácio Eduardo Gomes Vale

Advogado Público em Brasília (DF).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

VALE, Horácio Eduardo Gomes. Princípio da primazia de julgamento de mérito. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 25, n. 6235, 27 jul. 2020. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/73410. Acesso em: 21 nov. 2024.

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