Atuação da perícia em local de crime e a preservação das provas

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Quanto mais preservada uma cena está, ela estará o mais fiel possível de como o autor a deixou, facilitando com que os peritos encontrem ali o que o autor esqueceu-se de limpar ou nem sequer lembrava que estava deixando de vestígio no local.

“A perícia é a última voz da vítima. Se a perícia não existir, a vítima não será ouvida e a justiça não será feita.”

(Autor desconhecido)

RESUMO:O presente trabalho traz em pauta a atuação da perícia criminal oficial em local de crime e a devida preservação das provas, trazendo em questão a necessidade de uma preservação mais completa e eficaz, e a necessidade do treinamento dos profissionais que entram em contato com todo e qualquer vestígio ali encontrado, para que os mantenham inalterados até a chegada do perito oficial, que fará sua devida coleta. O objetivo com este trabalho é mostrar a importância de que todos que tenham acesso ao local do crime, desde o primeiro policial a chegar ao local, saibam conduzir uma eficaz preservação para garantir que nenhum vestígio se perca nem seja alterado, garantindo assim que o laudo que constará no processo criminal possa conduzir as alegações no caminho da veracidade do que ali aconteceu.

Palavra-chave: perícia criminal, perito criminal, preservação das provas, atuação da perícia em local de crime.

Abstract:The present work brings the performance of official criminal expertise in a crime scene and the proper preservation of evidence, bringing into question the need for a more complete and effective preservation, and the need for training of professionals who come into contact with everything and any trace found therein to keep them unchanged until the arrival of the official expert who will make his due collection. The objective of this work is to show the importance that all those who have access to the crime scene, since the first police officer arrived at the scene, can conduct an effective preservation to ensure that no trace is lost or altered, thus ensuring that the report in criminal proceedings can lead the allegations in the way of truth that happened there.

Keyword: criminal expertise, criminal expert, preservation of evidence, performance of crime scene expertise.

Sumário:1.  ATUAÇÃO DA PERÍCIA CRIMINAL EM LOCAL DE CRIME E DE PROVAS PERICIAIS . 1.1. Dinâmicas para exame de local de morte violenta.2.PROBLEMAS QUE A PERÍCIA ENFRENTA.. 2.1.Papel do primeiro policial no local de crime. 3.MEIOS PARA UMA PRESERVAÇÃO EFICAZ.. 3.1.  Classificação dos locais. 3.2. A coleta das provas e sua preservação. 4.INFORMAÇÕES OBJETIVAS E SUBJETIVAS NO LOCAL DE CRIME.5.IMPORTÂNCIA DOS VESTÍGIOS E SUA CLASSIFICAÇÃO.. 6.DOCUMENTAÇÃO DO LOCAL E DAS PROVAS.. 6.1.Estrutura de um laudo.7. CONSIDERAÇÕES FINAIS E CONCLUSÃO.. 8.BIBLIOGRAFIA.. 


INTRODUÇÃO

A perícia criminal, aliada à investigação criminal, veio se popularizando no mundo nos últimos anos devido aos seriados americanos estilo CSI, o que em partes pode ser bom por trazer uma atenção maior à profissão, mas tem seu lado negativo por apresentar certas situações que não condizem com a realidade de nosso país.

Ao olharmos a perícia no cenário brasileiro, vemos que os peritos vem há anos batalhando para terem um maior aperfeiçoamento de suas técnicas e na busca por adquirirem mais conhecimentos, para que não mais haja laudos mal fundamentados e incompletos, possibilitando assim aos magistrados proferirem uma sentença com base em um laudo completo e seguro do que ali está escrito, para que ele tenha uma base concreta ao fazer seu juízo de valor em cada caso.

Os peritos criminais atendem uma grande variedade de crimes, como crimes financeiros, crimes contra a vida, tráfico de psicotrópicos, falsificações documentais, crimes cibernéticos e muitos outros, trabalhando em cada caso para produzir a prova da materialidade do crime e vincular o autor à cena ou descartar algum suspeito do cometimento de tal crime.

Com o intuito de aprofundarmos na atuação do perito criminal no local de crime, principalmente focado nos contra a vida, e na devida preservação do local, exploraremos aspectos como: as classificações dos locais de crime; a classificação dos vestígios; a correta coleta da prova e os procedimentos de isolamento do local, tendo algumas obras utilizadas como base, conforme consta na bibliografia final.


1.    ATUAÇÃO DA PERÍCIA CRIMINAL EM LOCAL DE CRIME E DE PROVAS PERICIAIS                 

A atuação da perícia ajuda a formar o convencimento do juiz na hora de julgar o processo. Com uma perícia eficiente e treinada, eles colhem e analisam os vestígios deixados em infrações penais que passaria despercebido aos olhos de um leigo. Como dizia Lacassagne (1889) “o cadáver é a testemunha mais importante do homicídio”, e devemos ouvir bem o que ele quer dizer, pois cabe ao perito lhe dar voz uma última vez.

Ter peritos eficazes garante que os vestígios não passem despercebidos e que ao serem analisados e for constatado que tal vestígio é relacionado ao crime, passa essa evidência a ser importante ao caso, garantindo assim uma apuração que os guie pelo caminho do que ali aconteceu, e os conduzindo através de fatos e provas verdadeiras, cientificamente comprovadas, até seu esclarecimento da verdade, e como diz Albani Borges dos Reis (2013) “Todo crime tem pelo menos duas versões. A perícia com os recursos da metodologia científica e da tecnologia pode contar versão verdadeira”.

Ao analisar cada local de crime, o perito deve responder a sete perguntas básicas que formam o Heptâmetro de Quintiliano: “o que?”, “como?”, “quem é o autor?”, “quem é a vítima?”, “onde?” “quando?” e “por quê?”. Nem sempre será possível responder logo no local todas as perguntas, mas se deve persistir até responder a todas. Em “o que”, se busca responder quais são os elementos constitutivos do delito; “quem?” busca responder quem é a vítima; “quando?” se quer uma estimativa da hora da morte; “onde?” se busca qual o local do crime e os locais relacionados caso existam; “como?” se quer saber qual o modo que o crime ocorreu, qual o trajeto de chegada e saída do autor; “quem?” se busca saber quem é o autor daquele crime; e no “por quê?” se quer responder qual o motivo daquele crime.

O desafio do perito começa em determinar qual é o local do crime, pois o local de crime é singular e peculiar, contendo diversas variáveis, e este só poderá ser inteiramente definido após uma minuciosa análise do perito, onde não raro os limites não ficam restritos ao local inicialmente encontrado. Podem ser outros locais na vizinhança ou até mesmo em outro local mais distante de onde foi encontrado o corpo. Estende-se a locais onde o crime pode ter sido iniciado, ou até mesmo locais posteriores ao delito, onde juntando todas essas informações, o perito iniciará uma linha do tempo onde começará a colocar todos os fatos e atos já identificados para traçar de forma mais exata possível tudo que ali ocorreu, começando sua teoria da dinâmica do fato. Eraldo Rabello define que

Local de crime é a porção do espaço compreendida num raio que, tendo por origem o ponto no qual é constatado o fato, se estenda de modo a abranger todos os lugares em que, aparente, necessária ou presumivelmente, hajam sido praticados, pelo criminoso, ou criminosos, os atos materiais, preliminares ou posteriores, à consumação do delito, e com este diretamente relacionados. (informação verbal) {C}[1]

Ou seja, o local de crime será todo e qualquer local que seja ligado ao delito, que é aquele onde aconteceu o fato, e terá uma enorme quantidade de vestígios materiais. Será também considerado local onde se sofreu as consequências do crime, onde aqui podemos dar como exemplo os crimes virtuais, onde os indivíduos que estão cometendo o crime estão em locais diferentes de onde os resultados foram produzidos; consideramos também como local onde o crime foi originalmente planejado, onde podemos vir a descobrir inclusive outros locais dos quais ainda não se há conhecimento; e por fim, o local relacionado ao fato, onde encontraremos informações adicionais sobre o crime e dão continuidade aos locais imediatos e mediatos. Aqui damos como exemplo o local de desova de corpo, onde se classifica como um local relacionado ao fato.

Os peritos devem seguir alguns procedimentos padrões de modo a garantir um exame o mais completo possível, citamos alguns como: anotar a hora de chegada ao local de crime, descrever as lesões e os locais onde se encontram manchas de sangue, coletar tudo que pareça ser importante e relacionado ao crime, se havia sinais de arrombamento, odores, entre outros procedimentos. Desse modo o perito começa a materializar o delito, fazendo com que ele se perpetue ao longo dos anos, o que é de extrema importância, fato este que possibilitará a alguém pegar o laudo para ler daqui a alguns anos, e consiga se colocar naquela cena de crime mesmo não tendo estado no local, e irá entender perfeitamente tudo o que aconteceu. Os vestígios se perdem com o tempo, ou até mesmo em um único toque que seja feito de forma errada. Ao contrário do laudo, que irá perpetuar aquele vestígio. Rabello (1996) ainda destaca que

Local de crime constitui um livro extremamente frágil e delicado, cujas páginas por terem a consistência de poeira, desfazem-se, não raro, ao simples toque de mãos imprudentes, inábeis ou negligentes, perdendo-se desse modo para sempre, os dados preciosos que ocultavam à espera da argúcia dos peritos.

E é exatamente nesse contexto que a perícia criminal mostra toda sua importância, usando como fonte de seu trabalho o conhecimento cientifico e as inovações tecnológicas, sendo responsável pela produção da prova pericial. O perito irá suprir com seu laudo as expectativas de se elucidar como cada evidência se encaixa no crime.

1.1.        Dinâmicas para exame de local de morte violenta                                         

Como aqui nesse trabalho o foco é o crime contra a vida, vamos falar um pouco sobre os procedimentos para o exame de local de morte violenta. Em cada tipo de crime, há aqueles vestígios que são mais previsíveis de se encontrar, mas ainda assim há uma variável muito grande a se prestar atenção. O principal a fazer assim que se chegar a um local de morte violenta, é isolar e preservar o corpo, se este estiver no local; roupas que estiverem desalinhadas; objetos fora do lugar; ver se há objetos e portas arrombados; se há armas brancas ou de fogo no local; substâncias suspeitas; impressões digitais; manchas de sangue; pegadas visíveis; sêmen e qualquer outro vestígio que possa se relacionar com o delito.

Na hora de se buscar algumas respostas nesses locais, além das perguntas do Heptâmetro de Quintiliano, deve-se também procurar ver na vítima se há sinais de luta corporal e defesa, ver se há ferimentos pelo corpo da vítima, se houve tortura, se houve perfuração por projétil, se os ferimentos ocorreram após a morte ou se ocorreram enquanto a vítima ainda se encontrava viva ou quaisquer outros sinais. Cada caso tem suas particularidades, então não cabe tentar aqui citar todos os tipos de situações que se podem encontrar e verificar. Caberá em cada caso o perito analisar e ver quais perguntas ele deve ir atrás de resposta, cabendo a ele buscar a verdade escondida atrás daquele vestígio.

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O perito precisa já saber do que se trata a ocorrência ao se deslocar para o local e assim pode definir quais serão os exames mínimos a serem realizados e, claro, levar os equipamentos que serão indispensáveis para a realização dos mesmos. Deverá sempre estar munido de seu mais completo material de trabalho, para evitar que seja pego desprevenido e acabe atrasando a investigação ou acabe fazendo uma coleta sem o equipamento adequado.

No local, irão levantar as informações básicas como nome das autoridades que estavam preservando o local até o momento, nome de parentes que estiverem no local caso haja, nome da vítima caso já seja de conhecimento, hora, histórico do ocorrido, e qualquer outra informação que já se tenha no momento. Irá verificar se foi feito um isolamento e preservação eficaz, pois é uma providência que jamais deve ser esquecida e deve ser considerada embasada no que o Código de Processo Penal estabelece como necessidade; e ao ter o tipo de ocorrência definido, deverá ver qual abordagem irá usar, para assim começar a coleta de vestígios e materiais para exame. Cabe ressaltar que esses exames se referem a qualquer procedimento que precise ser feito em laboratório, dizendo respeito aos exames realizados internamente com equipamentos específicos para tal, devendo ser feito à seção competente, mediante formulário de solicitação de exames.

Quem assina o laudo é o perito, e ele é o responsável pelo resultado obtido e colocado no laudo, cabendo a ele ver se foram feitos os exames que visem o melhor resultado possível para aquele vestígio, pois caso seja feito uma coleta de forma errada, pode acabar invalidando aquele vestígio no processo ou até mesmo fazendo constar em erro, prejudicando até seu trânsito em julgado. Com isso em mente, tendo sido feita a coleta adequada, o perito irá encaminhar cada vestígio para os setores respectivos analisarem. E concluídos os exames, todos deverão ser anexados no laudo e seu conteúdo discutido para que as partes interessadas fiquem convencidas da verdade que foi investigada.

Uma abordagem adequada do local engloba que o perito analise se há locais relacionados já conhecidos, podendo assim o perito traçar uma dinâmica para começar, sabendo desse modo onde se encontram os locais de possível entrada e saída que o autor pode ter usado, e até mesmo outros vestígios importantes que possam estar nesses outros locais.

Além disso, irá formular as hipóteses do que aconteceu ali, analisando vários fatores como: se houve luta corporal; se existem ferimentos no corpo da vítima, e em caso positivo, se foi provocado por instrumento perfurante, cortante ou contundente; se houve tiro, irá ver se foi a curta distância, longa ou média; se existe sangue no local, e em caso positivo, se é sangue humano ou animal; se houver sangue humano, testar a compatibilidade de o sangue encontrado ser da vítima; entre outras hipóteses que se pode formar. Tendo essas respostas negadas ou confirmadas, elas irão ajudar a corroborar certas possibilidades ou descartá-las. Algumas ainda irão traçar o caminho de novos questionamentos, como por exemplo, se houve interferência de uma ou mais pessoas; um ou mais objetos usados para ferir a vítima, entre outros. Algumas dessas hipóteses serão respondidas ainda no local, outras, após certos exames serem concluídos. O importante é sempre descartar o máximo de possibilidades para se chegar o mais próximo possível de como se estendeu o delito.

Para um fácil entendimento das ações anteriores, veremos a figura 1 que mostra o antes de chegar ao local de crime, e a figura 2 que mostra os procedimentos ao se chegar ao local de crime.

Figura {C}1{C}: procedimentos antes de se deslocar ao local de crime

Fonte: Metodologia Cientifica / Albani Borges dos Reis; Neide Maria de Oliveira Godinho, Ian Marques, colaboradores – 3. Ed – Campinas, SP : Millennium Editora, 2015.

Figura {C}2{C}: procedimentos ao se chegar no local de crime

Fonte: Metodologia Cientifica / Albani Borges dos Reis; Neide Maria de Oliveira Godinho, Ian Marques, colaboradores – 3. Ed – Campinas, SP : Millennium Editora, 2015.

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Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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