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A desclassificação do delito consumado para o tentado: como alegar na defesa

03/10/2019 às 08:30

Resumo:


  • O iter criminis divide a prática de um crime em 4 fases: cogitação, atos preparatórios, execução e consumação.

  • Na fase de execução, ocorre a tipicidade da conduta, sendo que ao menos a tentativa já está caracterizada.

  • A tentativa é o início da fase executória do delito, mas sem consumação devido a circunstâncias alheias à vontade do agente, sendo causa de diminuição da pena.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

É imprescindível que se saiba das teses defensivas cabíveis em cada caso concreto, pois de suma importância para a defesa de nossos clientes.

O que diferencia a prática de um crime em sua forma consumada ou tentada é o iter criminis, o caminho do crime, sendo dividido em 4 fases:

  • cogitação;
  • atos preparatórios;
  • execução;
  • consumação.

Consumação:

Em regra, a cogitação e os atos preparatórios não são puníveis.

A exceção que se constata em relação aos atos preparatórios se observa no artigo 288 do Código Penal, uma vez que o simples fato de 3 ou mais pessoas se associarem para cometer crimes, ainda que não tenham iniciado a prática delituosa, já caracteriza o crime de associação criminosa.

Outra exceção se verifica no artigo 5º da Lei 13.260/16, pois somente o fato de o indivíduo preparar atos de terrorismo já caracteriza o delito, sem necessidade de sua consumação. Em ambos os exemplos, o que se vê presente são tão somente atos preparatórios.

Estes atos preparatórios, de forma autônoma, já caracterizam crimes.

Quanto à execução, nesta fase já se fala em tipicidade da conduta. Os atos executórios demonstram inequivocadamente que o agente almeja a prática delituosa. Quando iniciados os atos executórios, ao menos a tentativa já está caracterizada.

A consumação se vê presente quando estiverem reunidos todos os elementos do tipo penal. Na consumação, precisa-se ter o resultado finalístico para caracterizar o crime como consumado, não basta apenas a conduta.

O resultado finalístico é preciso para os crimes materiais, como exemplo o delito do artigo 121 do Código Penal.

Já quando se tratar de crimes formais, não há necessidade do resultado para a consumação delitiva; basta que o sujeito tenha praticado a conduta descrita pelo legislador com a finalidade de alcançar o resultado, ainda que este não ocorra. Como exemplo, podemos citar o artigo 316 do Código Penal, pois para que se tipifique a concussão não é preciso que o funcionário público tenha obtido vantagem indevida para a consumação do crime; basta que ele a tenha exigido.

Tentativa:

Na tentativa há o início da fase executória do delito, mas não há consumação por circunstâncias alheias à vontade do agente. Ela é causa de diminuição da pena.

Não caberá alegação de tentativa para os crimes culposos, para as contravenções penais (artigo 4º da Lei 3688/41), para os crimes omissivos próprios e crimes unissubsistentes.

Não cabe tentativa em crime culposo, pois são institutos incompatíveis. No crime culposo o agente agiu sem dolo, sem animus em praticar o delito, ele o fez por imprudência, imperícia ou negligência. Já a tentativa pressupõe dolo, uma vez que o indivíduo queria o resultado, mas não o fez porque circunstâncias, situações diversas a sua vontade, alheias ao seu desejo o impediu de consumar o crime.

Os crimes omissivos próprios não admitem tentativa, em virtude do fato de a mera omissão já consumar o delito.

Os crimes unissubsistentes também não admitem a tentativa, pois são crimes de apenas uma conduta, isto é, uma única conduta consuma o delito, não há fracionamento de atos, como é o caso do crime de injúria (artigo 141 do CP).

Por outro ângulo, o crime tentado é diferente dos institutos da desistência voluntária e do arrependimento eficaz, presentes no artigo 15 do Código Penal. Quanto à desistência voluntária e arrependimento eficaz, há o início da execução do delito, mas não há consumação do mesmo por vontade do próprio agente delituoso.

Na desistência voluntária, o delinquente não esgota seus meios lesivos, não pratica todos os atos executórios almejados para consumar o crime. No arrependimento eficaz o agente esgota todos os meios executórios que lhe eram possíveis mas, por vontade própria, pratica ato que impede o alcance do resultado, evitando, assim, a consumação do delito.

Estes dois institutos excluem a tipicidade da tentativa. O agente responde exclusivamente pelos atos que já tenha praticado, nunca pela tentativa e, se caso os atos praticados não forem típicos, se não constituírem crimes, por nada responderá o indivíduo.

Nota-se que o arrependimento precisa ser eficaz, ou seja, mesmo tendo o agente procurado minorar ou evitar o resultado, se ele vier a ocorrer, o indivíduo responderá pelo crime consumado pois, mesmo que tenha se arrependido, esse arrependimento não foi eficaz, não impediu o resultado.

Cuidado para não confundir arrependimento eficaz (artigo 15 do CP) com arrependimento posterior (artigo 16 do CP)! No arrependimento posterior, o agente responde pelo crime praticado, uma vez que ele se consumou, no entanto, recai sobre ele a causa de diminuição da pena quando se verifica que o delinquente reparou o dano que causou ou ao menos adotou práticas que minoraram os efeitos do resultado, antes do recebimento da peça acusatória.

Se a restituição ou reparação ocorrer após o recebimento da denúncia, não mais incidirá o instituto do arrependimento posterior, mas sim será aplicado ao caso concreto uma atenuante da pena, conforme prevê o artigo 65, III, b do Código Penal, em que a pena é diminuída, mas em menor quantidade.

Situações especiais:

Artigo 312, §2º do Código Penal: no caso do peculato culposo, se o funcionário público repara o dano causado por outrem em razão de seu descuido, antes do trânsito em julgado, essa reparação acarretará a extinção da punibilidade. Se a reparação for posterior à sentença irrecorrível, não extinguirá a punibilidade, mas reduzirá a pena pela metade.

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Artigo 171, §2º, VI do Código Penal c/c Súmulas 246 e 554 do STF: se o agente emite cheque sem provisão de fundos com o intuito de fraudar o sacado, incorre no crime de estelionato. No entanto, se pagar o valor do cheque emitido até o recebimento da denúncia, para a ação penal e obsta o seu prosseguimento e, segundo a doutrina majoritária, extingue-se a punibilidade.

Crime impossível (artigo 17 do Código Penal): leva à atipicidade da conduta e a consequente absolvição do acusado. Se dá pela ineficácia absoluta do meio ou impropriedade absoluta do objeto, tornando impossível a consumação do delito.

Por ser crime impossível, a conduta será considerada atípica e, portanto, não haverá crime. Se não há crime, então nem pela tentativa o agente responde.

Mas devemos nos atentar com as Súmulas 567 do STJ e 145 do STF: A Súmula 567 do STJ determina que o furto feito em estabelecimento comercial com monitoramento eletrônico, por si só, não caracteriza crime impossível. É preciso que outras variáveis estejam presentes, de forma a garantir que a consumação do delito não ocorra nunca.

Já a Súmula 145 do STF dispõe acerca do flagrante preparado/provocado, o que é considerado como crime impossível.

O crime impossível caracteriza a atipicidade da conduta, o que gera a absolvição do agente, seja por qualquer dos meios absolutórios, como prevê o artigo 397, III do Código de Processo Penal (absolvição sumária), o artigo 386, III do Código de Processo Penal ou ainda o artigo 415, III, também do CPP (absolvição no júri).

Por fim, imprescindível que se saiba, como já afirmei em momentos pretéritos, das teses defensivas cabíveis em cada caso concreto, pois de suma importância para a defesa de nossos clientes.

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Sobre a autora
Letícia Fernandes Domingos

Advogada. Policial Civil do Estado de Minas Gerais. Pós-graduanda em Direito Penal e Processual Penal. Amante da leitura e da escrita. Integrante do Núcleo de Advocacia Criminal do Canal Ciências Criminais. Membro da Associação dos Jovens Advogados de Minas Gerais.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

DOMINGOS, Letícia Fernandes. A desclassificação do delito consumado para o tentado: como alegar na defesa. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 24, n. 5937, 3 out. 2019. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/74331. Acesso em: 22 dez. 2024.

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