A cassação da aposentadoria do militar como consequência de fato praticado após a passagem para a inatividade

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12/06/2019 às 10:16
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10. A cassação da aposentadoria do militar em razão da prática de falta na atividade

No âmbito do STJ, prevalece o entendimento de que a legitimidade do ato que cassa a aposentadoria e consequentemente cessa o pagamento dos proventos respectivos do policial militar excluído das fileiras da corporação militar exige a confluência de duas situações: que o “fato ferrador” da sanção tenha sido praticado pelo praticado militar aposentado quando estava na ativa; e, que tenha sido assegurado ao aposentado o direito ao contraditório e a ampla defesa no processo administrativo instaurado especificamente para a cassação da aposentadoria. Eis as transcrições nas partes que interessam:

RMS 33.494/PR, 1ª Turma, DJe 22/05/2012:

1. Insurge-se o recorrente contra a exclusão da folha de pagamento de inativos do Estado, com o consequente cancelamento do registro de sua reserva remunerada pelo Tribunal de Contas Estadual, bem como contra a ocorrência de cerceamento de defesa em razão de não ter sido notificado da cessação de seus proventos. 2. A jurisprudência desta Corte entende que se as faltas praticadas por servidor da ativa, posteriormente aposentado, forem devidamente apuradas em regular processo administrativo, não há óbice legal na conversão da pena de exclusão em cassação de reserva remunerada. 3. A Lei Estadual n. 12.398/98 (Cria o Sistema de Seguridade Funcional do Estado do Paraná), dispõe, em seu art. 40, parágrafo único, que o cancelamento da inscrição de segurado dar-se-á "pela perda de sua condição de servidor público estadual ativo, inativo, militar da ativa, da reserva remunerada ou reformado". Assim, se a legislação estadual prevê a possibilidade de cancelamento da inscrição de segurado, não há direito líquido e certo a ser amparado quanto ao ponto, mormente porque, os atos que ensejaram o cancelamento da inscrição foram praticados pelo recorrente quando o mesmo se encontrava na ativa. 4. Por outro lado, extrai-se dos autos que o ora recorrente não foi notificado para apresentar defesa contra a exclusão do quadro de Inativos, consubstanciado na edição da Resolução 2900/07, nem mesmo por ocasião do cancelamento do registro da reserva remunerada pelo Tribunal de Contas Estadual, tornando-se evidente o cerceamento de defesa. 5. Cumpre registrar que apesar da alegação de cerceamento de defesa não ter sido trazida nas razões iniciais do mandamus, mas somente por ocasião do presente recurso, a mesma pode ser conhecida de ofício, visto tratar-se de matéria de ordem pública, como bem registrou o voto vencido. Nesse sentido: RMS 19240/RJ, Rel. Min. Paulo Medina, Sexta Turma, DJe 9/6/08. Ademais, a jurisprudência desta Corte entende que nos processos perante o Tribunal de Contas, deve-se assegurar o contraditório e a ampla defesa quando da decisão puder resultar anulação ou revogação de ato administrativo que beneficie o interessado, excetuada a apreciação da legalidade do ato de concessão inicial de aposentadoria, reforma e pensão, nos termos da Súmula Vinculante 3/STF. 6. Tendo em vista a ocorrência de cerceamento de defesa em ato que resultou em revogação de benefício, a segurança deve ser concedida parcialmente  para anular o ato coator (Portaria 2900/07) que excluiu o ora recorrente do quadro de Inativos da Policia Militar do Paraná, tornando nulo, por consequência, o Acórdão 628/08 do Tribunal de Contas do Estado do Paraná, a fim de que a Administração oportunize prazo para defesa. 7. Recurso ordinário parcialmente provido. (g.n)

AREsp nº 963.197-PE, 2ª Turma, DJe 26/10/2016:

1 – (...); 2 - O Código Disciplinar dos Militares do Estado de Pernambuco (lei 11.817/2000), em seus artigos 8º e 15, prevê: Art. 8º Estão sujeitos ao regime disciplinar, estabelecido neste Código, os militares na ativa, na reserva remunerada e reformados; Art. 15. O militar estadual passa a estar subordinado ao regime disciplinar deste Código a partir da data que, oficialmente, se der sua inclusão na Corporação Militar Estadual. Parágrafo único. Quanto aos militares estaduais da reserva remunerada e reformados, ressalvadas as peculiaridades de convocação, somente se desobrigam do regime disciplinar por ocasião do óbito; 3 - Por sua vez, o Estatuto dos Policiais Militares deste Estado (lei 6.783/1974) preconiza em seu art. 48, §3º que às praças reformadas poderá ser aplicado o Conselho de Disciplina; 4 - Como decorrência lógico-jurídica da exclusão das fileiras da Corporação, o art. 114, §3º do mesmo diploma legal estatui que "a praça excluída a bem da disciplina não terá direito a qualquer remuneração ou indenização e sua situação militar será definida pela Lei do Serviço Militar"; 5 - Está-se a ver, portanto, que a legislação estadual prevê expressamente a possibilidade de cessação do pagamento dos proventos de inatividade no caso de exclusão a bem da disciplina; 6 - Ademais, a jurisprudência do STJ é clara, no sentido de que, se a legislação estadual previr a possibilidade de cancelamento da inscrição de segurado, não há direito a ser amparado, já que os atos que ensejaram o cancelamento da inscrição foram praticados pelo recorrente quando ele se encontrava na ativa; 7 - Agravo de instrumento improvido. Prejudicado o agravo regimental. (g.n)

AgRg no REsp 1398779 / SP, 6ª TURMA, DJe 13/09/2016:

 PENAL MILITAR. SÚMULAS 280 E 284/STF.  AFASTAMENTO.  PERDA DA GRADUAÇÃO. CASSAÇÃO DE PROVENTOS DA RESERVA REMUNERADA. LEGISLAÇÃO ESPECÍFICA. INEXISTÊNCIA. ANALOGIA. UTILIZAÇÃO. ILEGALIDADE 1. Nas razões do recurso especial apontou-se expressamente a ofensa ao art. 6º da Lei de Introdução ao Código Civil, atualmente denominada Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro.   E, também, evidenciou-se   a   desnecessidade   de interpretação de direito local, uma vez que esta já está delineada no acórdão recorrido, restando aferir se a conclusão adotada pelo Tribunal de origem afrontaria o dispositivo de lei federal indicado. Afastamento das Súmulas 284 e 280 do Supremo Tribunal Federal. 2.  O  Tribunal  a quo entendeu que, apesar de não haver previsão de perda  dos  proventos  da  reserva  remunerada,  em  razão de delito cometido  durante  a atividade, na legislação específica de regência dos  militares  do Estado de São Paulo, considerou ser possível, por analogia,  a  aplicação da medida, como consectário da decretação da perda da graduação, em razão de o Estatuto dos Funcionários Públicos Civis  do  Estado  de  São  Paulo  prever  a  pena  de  cassação  da aposentadoria  se  ficar  provado  que o inativo praticou, quando em atividade,  falta grave para a qual é cominada a pena de demissão ou de demissão a bem do serviço público. 3.  Em se tratando de norma punitiva, a interpretação deve ser restritiva, não se admitindo a analogia in malam partem, como bem sustentou a defesa nas razões do recurso especial. Precedentes desta Corte Superior. 4.  Embora pudesse a Corte estadual declarar a perda da graduação, não poderia ter determinado a perda dos proventos da reserva remunerada, em razão de ausência previsão legal específica quanto a esse último ponto. 5.  Agravo regimental provido para dar parcial provimento ao recurso especial, decotando a parte do acórdão recorrido em que se determinou a cassação dos proventos da reserva remunerada. Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, dar provimento ao agravo regimental para dar parcial provimento ao recurso especial nos termos do voto do Sr.  Ministro Relator. Os Srs. Ministros Rogerio Schietti Cruz, Nefi Cordeiro, Antonio Saldanha Palheiro e Maria Thereza de Assis Moura votaram com o Sr. Ministro Relator. (g.n)

O Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, segue a mesma linha, de acordo com o julgado:

MANDADO DE SEGURANÇA. POLICIAL MILITAR INATIVO. PRÁTICA DE CRIME DURANTE A ATIVIDADE. TORTURA. CONDENAÇÃO EM PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE E PERDA DO CARGO. EXCLUSÃO DA APOSENTADORIA. POSSIBILIDADE. 1. Nos termos do art. 23, da Lei nº 10.486/02[8], o militar terá cassada sua situação de inatividade quanto houver cometido em atividade falta punível com pena de demissão ou exclusão a bem da disciplina. 2. De forma complementar, o artigo 112, da Lei nº 7.289/84, determina que a exclusão a bem da disciplina será aplicada ao militar quando condenado, por Tribunal Civil ou Militar, à pena restritiva da liberdade superior a 2 (dois) anos ou nos crimes previstos na legislação concernente à segurança do Estado à pena de qualquer duração. 3. Recurso conhecido e desprovido. (Acórdão n. 1099615, 20150111433152APC, Relatora Desª. MARIA DE LOURDES ABREU, 3ª Turma Cível, data de julgamento: 23/5/2018, publicado no DJe: 5/6/2018). (g.n)

O Tribunal de Justiça Militar do Estado de São Paulo, também tem entendido nesse mesmo sentido:

TJMSP, Representação para Declaração de Indignidade/Incompatibilidade nº 37/13, DJ 15/01/2014. POLICIAL MILITAR – Representação para Declaração de Indignidade/Incompatibilidade (RDI) oferecida em razão de condenação com trânsito em julgado à pena de 6 (seis) anos de reclusão pela prática de homicídio – Defesa do representado sustentando que à época dos fatos ele era Subtenente PM, de modo que não detinha posto e patente e não poderia ser considerado indigno com o oficialato – À época do trânsito em julgado da sentença condenatória (condição de procedibilidade da RDI) o Representado já havia sido promovido a 2º Tenente PM quando de sua transferência para a reserva a pedido – Decisão de mérito lastreada em condenação transitada em julgado – Conduta incompatível com o oficialato – Decretação da perda do posto e da patente, com cassação dos proventos, medalhas, láureas e condecorações – Decisão por maioria.

Como se percebe, fazendo uma análise paralela, não faria sentido a possibilidade da cassação da aposentadoria do servidor civil que praticou a falta quando na atividade e igual situação não alcançasse os militares. Por outro lado, já adiantando o nosso entendimento, não faz sentido igualmente, a possibilidade da cassação da aposentadoria do militar inativo por falta praticada quando já na inatividade.


11. Posto e patente sem percepção de vencimentos, remuneração e /ou proventos (será possível?)

O fato de uma determinada pessoa possuir posto e patente militar não é conditio sine qua non determinante para o usufruto do direito de percepção de vencimentos, remuneração e/ou proventos.

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Segundo a Constituição Federal “o oficial só perderá o posto e a patente se for julgado indigno do oficialato ou com ele incompatível, por decisão de tribunal militar de caráter permanente, em tempo de paz, ou de tribunal especial, em tempo de guerra” [9].

Duas consequências decorrem dessa disposição:

1.A primeira é que se um determinado oficial requerer a sua demissão, o mesmo deixará de ser militar da ativa, deixando, portanto, de ocupar cargo militar [10], mas conservando o seu posto e a sua patente, ainda que não receba qualquer espécie remuneratória decorrente.[11]

2.A segunda, é que se o mesmo não readquirir a condição de militar, sequer poderá vir a perder o posto e a patente em decorrência de pronunciamento administrativo [12].

Ora, aposentadoria não se confunde com posto, patente ou graduação. Portanto, determinado indivíduo pode ostentar posto, patente ou graduação sem que perceba proventos de aposentadoria em razão deles. Cabe distinguir a condição do militar (da reserva remunerada ou reformado) que ostenta posto e patente, e, o ex-militar (o civil) que não teve decretada a perda do posto e patente:

a)o militar da reserva remunerada ou reformado que ostenta posto e patente, além da percepção dos proventos, tem garantido as prerrogativas, direitos e deveres a elas inerentes, sendo sendo-lhes privativos os títulos e postos militares e, juntamente com os demais membros, o uso dos uniformes das Forças Armadas [13];  

3.o ex-militar (civil) da reserva não remunerada, apesar de não ter direito à percepção dos proventos, nem as prerrogativas, direitos e deveres inerentes ao posto ou patente militar, ainda conserva o referido posto e patente.

Diante de tais considerações é perfeitamente possível que determinada pessoa ostenta posto e patente sem qualquer contraprestação estatal (patrimonial ou honrarias), assim como, não ostentar posto e patente, mas receba a contraprestação patrimonial (proventos).

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