A cassação da aposentadoria do militar como consequência de fato praticado após a passagem para a inatividade

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12/06/2019 às 10:16
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12. Outras considerações

Não se sustenta o argumento de que a cassação da aposentadoria do militar ou do servidor civil constitui uma contraprestação custeada por toda a sociedade, portanto pode vir a ser cassada por falta praticada após a passagem para a inatividade.

É verdade que o militar ou servidor civil não foram os únicos a compor o “substrato” que deu suporte a percepção dos proventos, também é verdade que o segurado do RGPS também não foi o único a “construir” com suas contribuições o respectivo substrato a dar suporte a percepção de proventos. Aliás, nesse ponto, os respectivos regimes se aproximam cada vez mais.

Como é sabido, os financiadores da Seguridade Social (onde se insere a Previdência Social) representam toda a sociedade, por meio de receitas provenientes do Poder Público e das contribuições sociais, e outras arrecadações.

Diante do que foi exposto, vamos discorrer acerca do alcance e consequências das decisões administrativas relativamente a possibilidade ou não da cassação da aposentadoria do militar inativo por fato praticado após a sua aposentadoria.

O entendimento de que o militar uma vez aposentado (reserva remunerada ou reforma) passa a ter a garantia de que a sua aposentadoria não pode vir a ser cassada, por falta praticada após a inatividade, ainda que o mesmo tenha perdido o seu posto, patente ou graduação, ao nosso ver é a solução mais coerente, lógica e justa, pois:

I - respalda uma situação que foi consolidada pelo fato do mesmo ter reunido todas as condições para vir a receber tal contraprestação estatal;

II - considera que a perda do posto ou a graduação importa no fato do militar inativo deixar de

III - dá aos militares atingidos um tratamento semelhante aos servidores civis para os quais somente se permite a penalidade de cassação de aposentadoria por “falta” cometida quando em atividade. 

Por outro lado, o entendimento, completamente desprovido de razão, de que o militar aposentado (reserva remunerada ou reforma) não tem o direito adquirido a referida aposentadoria, mas mera fruição dos proventos, de forma que tal condição (aposentadoria e percepção de proventos) sempre poderão vir a ser desconstituídos, teremos as seguintes consequências:

I - admitir que mesmo que tenha cumprido todas os requisitos exigidos para a aposentadoria (inatividade), a cassação da aposentadoria, poderá ocorrer sempre, independentemente da idade ou condição de saúde;

II - também admitir que só pelo fato de ser militar, o aposentado (inativo) estará sempre sujeito a um tratamento extremamente desigual, sem qualquer razão para tanto, em relação aos servidores civis aposentados, pois esses nunca poderão ter cassadas as respectivas aposentadorias, em consequência de “falta” praticada depois de aposentados;

III - na esteira do tratamento odioso dado ao aposentado pelo simples fato de ser militar e poder vir a ter a sua aposentadoria cassada a qualquer tempo, temos ainda a possiblidade de casos particulares que podem agravar ainda mais esse tratamento odioso. Para o momento apresentaremos as seguintes hipóteses:

  1. O militar inativo que conta com certa idade e, que vier a ter a sua aposentadoria cassada, dificilmente conseguirá se inserir no mercado de trabalho formal ou informal, o que impedirá a sua inscrição como contribuinte individual para poder um dia vir a se aposentar de acordo com as regras do Regime Geral da Previdência Social;
  2. Caso, esse ex-militar consiga se inserir novamente no mercado de trabalho, e se conseguir se aposentar, poderá (dependendo de cada caso) sofrer uma substancial redução no valor dos seus proventos, pois estará limitado ao teto do RGPS, mesmo tendo durante 30 anos ou mais, efetuado contribuições com valor superior ao estabelecido para esse patamar.


13. Conclusão

Diante do exposto, e na linha do que entendemos, quanto a eventual interpretação mais coerente a ser dada ao dispositivo atacado na ADI nº 5746/PR, a forma mais razoável, lógica e justa, é que se fixe o entendimento que aliás, vem sendo adotado até o momento pelo STF e o STJ, no sentido de que a cassação da aposentadoria, seja do servidor civil, seja do militar, somente possa ser efetivada se o fato gerador (falta punível) tenha sido cometida quando o militar estava na atividade, independentemente de posteriormente tenha passado para a inatividade, afastando assim qualquer possibilidade de cassação de aposentadoria de militar inativo por consequência de fato ocorrido após a sua passagem à condição de inativo.    


Referências bibliográficas

[1] Art. 40. O cancelamento da inscrição do segurado na PARANAPREVIDÊNCIA dar-se-á:

I – (...);

II - pela perda de sua condição de servidor público estadual ativo, inativo, militar da ativa, da reserva remunerada ou reformado.

[2] O conceito de lei específica, por construção jurisprudencial, diz respeito à lei monotemática, ou seja, aquela que só cuida de um determinado assunto (ADI 4.029/AM, e , ADI 64/RO)

[3] Quanto a esse aspecto, a petição inicial sintetiza tal premissa,  nos seguintes termos “ que é inviável a existência de um regime próprio de previdência social com normas infraconstitucionais que não diferenciem os servidores públicos civis e os militares” e conclui o ponto “vê-se, pela simples análise do dispositivo impugnado, que o Poder Legislativo tratou com indistinção os inativos civis e militares, o que, como visto, é vedado pela ordem constitucional vigente”.

[4] “ADMINISTRATIVO. MILITAR DA RESERVA. PERDA DE PATENTE POR CONDENAÇÃO CRIMINAL. SUPRESSÃO DE PROVENTOS. IMPOSSIBILIDADE. RECURSO DE AGRAVO DESPROVIDO. 1. Tendo adquirido o direito à aposentadoria por meio da contribuição necessária durante o tempo exigido, a exclusão do militar da Corporação, fundada em condenação criminal após a passagem para a inatividade, não tem o condão de suplantar sua aposentação. 2. A legislação estadual de regência não prevê expressamente a possibilidade de cancelamento dos proventos, principalmente porque a aposentadoria, decorrente de contribuição por vários anos à previdência, difere dos vencimentos, que apenas configuram uma contraprestação pelo serviço prestado à Corporação, entendimento já corroborado por esta Corte de Justiça. 3. Não vulneração dos arts. 125, § 4º, da CF; 112, b, III, 114, parágrafo único, e 89, § 2º, da Lei Estadual nº 6.789/74; 199, VI, da Lei Estadual nº 6.123/68; e 2º, I, "a" e "b", do Decreto Estadual nº 3.639/75. 4. Integrativo improvido à unanimidade.” 5. Agravo regimental não provido. 18 (ARE 663127 AgR, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 05/02/2013, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-039 DIVULG 27-02-2013 PUBLIC 28-02-2013).

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[5] CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 16. ed. p. 598-599, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006.

[6] Cassação de aposentadoria é incompatível com regime previdenciário dos servidores (Publicado no site Conjur em 16/04/2015)

[7] NUCCI, Guilherme de Souza. Código Penal Comentado, 15 ed. p.604, Saraiva, 2015.

[8] Art. 23. Cessa o direito à percepção dos proventos na inatividade na data:

I - do falecimento do militar;

II - da cassação da situação de inatividade.                     

Parágrafo único.  Será cassada a situação de inatividade do militar que houver praticado, quando em atividade falta punível com a demissão ou exclusão a bem da disciplina.  

[9] Art.142, § 3º, VI da CF/88.

[10] Cargo militar é um conjunto de atribuições, deveres e responsabilidades cometidos a um militar em serviço ativo (Art. 20 da Lei nº 6.880/1980).

[11] O oficial militar que tomar posse em cargo ou emprego público civil permanente será demitido, mas ainda preserva o seu posto/patente, uma vez que tal perda exige, que o mesmo tenha sido submetido ao procedimento próprio (Art.142, § 3, II, e, VI da CF).

[12] Uma vez que o Conselho de Justificação, segundo pacífica jurisprudência do STF, STJ e STM têm natureza administrativa. E se aplica somente em relação aos militares da ativa, da reserva remunerada e/ou reformados não se estendendo tal possibilidades àqueles que apesar de possuírem posto e patente se encontram na reserva não remunerada (civis).

[13] Art.142, § 3º, I da CF/88.

[14] Como bem definido no art.23, par. único da Lei nº 10.486/02. 

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