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Tutela provisória

02/10/2019 às 15:00
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A tutela provisória, inapta a tornar-se indiscutível pela coisa julgada, é uma decisão precária, assentada em cognição sumária. Estudemos seus requisitos e procedimento.

Características gerais

A tutela provisória, disciplinada pelos artigos 294 a 311 do Código de Processo Civil, é uma técnica processual que visa alcançar uma “adequada distribuição do ônus do tempo no processo” (MARINONI et al, 2015: 195). Por meio dela, o juízo pode antecipar a tutela que, de outra maneira, só seria concedida ao final do processo. Assim, a tutela provisória contrapõe-se à tutela definitiva, e disso pode-se extrair as características comuns a todas as espécies de tutela provisória, contrastadas com a tutela definitiva.

A primeira característica essencial da tutela provisória é a “sumariedade da cognição” (DIDIER JR, 2015: 568). O juízo, para conceder uma tutela provisória, realiza uma cognição mais superficial, um juízo de probabilidade. Por outro lado, em sede de tutela definitiva, realiza-se uma cognição exauriente.

A segunda característica é a “precariedade” (DIDIER JR, 2015: 568). A tutela provisória pode ser revogada ou modificada a qualquer tempo, conforme redação do artigo 296, caput, do CPC.

Finalmente, a terceira característica é que a tutela provisória é “inapta a tornar-se indiscutível pela coisa julgada” (DIDIER JR, 2015: 568), exatamente por ser uma decisão precária, assentada em cognição sumária.


Espécies

A tutela provisória pode ser classificada como cautelar ou satisfativa; de urgência ou de evidência; ou ainda antecedente ou incidental.

A tutela provisória satisfativa, tratada no CPC como tutela provisória antecipada, é aquela na qual o juízo provê antecipadamente à parte o direito pleiteado, no todo ou em parte. Há uma relação de identidade entre a tutela buscada provisoriamente e a pleiteada definitivamente.  Para se obter esta espécie de tutela, deve-se demonstrar a reversibilidade de seus efeitos, embora esta não seja uma condição absoluta. “A superação da proibição da concessão de antecipação da tutela cujos efeitos são irreversíveis pressupõe a demonstração de que a vedação, acaso observada no caso concreto, frustrará o direito à tutela adequada, efetiva e tempestiva do direito do autor” (MARINONI et al., 2015: 205).

A tutela provisória cautelar, por sua vez, é aquela em que se busca resguardar o bem da vida objeto da lide, sem conceder sua fruição antecipada à parte. O juízo o provê em caráter assecuratório. Diferentemente da relação de identidade presente na tutela provisória satisfativa, a tutela cautelar não se confunde com a tutela definitiva buscada, guardando com ela uma relação de referibilidade (MARINONI et al., 2015: 197).

Urgência e evidência dizem respeito aos fundamentos para a concessão da tutela provisória. (DIDIER JR, 2015: 569). Uma tutela fundamentada na urgência deve demonstrar, nos termos do artigo 300 do CPC, a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo. Marinoni et al (2015) alerta ainda que, apesar da escolha do legislador pelo termo “perigo de dano”, faz-se mister interpretar esta expressão de maneira a abarcar também o perigo de ilícito, que pode ocorrer, continuar ocorrendo ou voltar a ocorrer.

A evidência como fundamento de tutela provisória encontra-se regrada pelo artigo 311 do CPC. Traz este dispositivo as seguintes condições para concessão de tutela de evidência: ficar caracterizado o abuso do direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório da parte; as alegações de fato puderem ser comprovadas apenas documentalmente e houver tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em súmula vinculante; se tratar de pedido reipersecutório fundado em prova documental adequada do contrato de depósito, caso em que será decretada a ordem de entrega do objeto custodiado, sob cominação de multa; a petição inicial for instruída com prova documental suficiente dos fatos constitutivos do direito do autor, a que o réu não oponha prova capaz de gerar dúvida razoável. “O denominador comum capaz de amalgamá-las é a noção de defesa inconsistente. A tutela pode ser antecipada porque a defesa articulada pelo réu é inconsistente ou provavelmente o será” (MARINONI et al, 2015: 200). Nestes casos, se justifica redistribuir o ônus do tempo do processo.

Cabe ressaltar que a tutela de evidência será sempre satisfativa, enquanto a tutela de urgência poderá tanto ser satisfativa quanto cautelar (DIDIER JR, 2015: 570).

O caráter incidental ou antecedente diz respeito à forma de requerimento da tutela. “Essa classificação considera o momento em que o pedido de tutela provisória é feito, comparando-o com o momento em que se formula o pedido de tutela definitiva. Em ambos os casos, a tutela provisória é requerida dentro do processo em que se pede ou se pretende pedir a tutela definitiva” (DIDIER JR, 2015: 571).

A tutela provisória incidental é aquela que é pedida subsequentemente ou contemporaneamente ao pedido de tutela definitiva. A parte pode apresentá-la em sua petição inicial (ou contestação), no decorrer do processo, em petição simples, ou ainda em sede de recurso, configurados os seus pressupostos.

“A tutela provisória antecedente é aquela que deflagra o processo em q u e se pretende, no futuro, pedir a tutela definitiva. É requerimento anterior à formulação do pedido de tutela definitiva e tem por objetivo adiantar seus efeitos (satisfação ou acautelamento). Primeiro, pede-se a tutela provisória; só depois, pede-se a tutela definitiva” (DIDIER JR, 2015: 571).

Neste caso, deve posteriormente o autor aditar a petição inicial, formulando o pedido de tutela definitiva. O prazo para a realização deste aditamento depende do provimento ou não da tutela antecedente. Caso provida, este será de quinze dias, ou outro fixado pelo juiz. Caso desprovida, o autor terá cinco dias. Em o autor não realizando este aditamento, o processo será extinto sem julgamento do mérito (MARINONI et al, 2015: 215).

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Note-se que só é cabível a tutela provisória antecedente em pedidos fundamentados na urgência, não sendo admissível para tutelas de evidência. Ora, é a urgência que justifica a formulação de pedido de tutela provisória antes mesmo que o pedido de tutela definitiva. Já a tutela provisória incidental admite tanto fundamentos de urgência quanto de evidência. 

Legitimidade

“Todo aquele que alega ter direito à tutela jurisdicional (definitiva) está legitimado a requerer a antecipação provisória dos seus efeitos; essa é a regra, que não comporta exceções” (DIDIER JR, 2015: 572).

Assim sendo, são legitimados a requerer tutela provisória o autor, o réu e terceiros intervenientes, dentre esses inclusive o assistente simples (condicionado à vontade do assistido). Também é legitimado o substituto processual. 

O Ministério Público é legitimado quando for parte ou assistente diferenciado de incapazes. Na qualidade de custos legis, no entanto ele não possui legitimidade para requerer a tutela provisória, podendo apenas apoiar, repelir ou sugerir. 


Momento de requerimento e concessão

A tutela antecedente, por óbvio, somente pode ser solicitada in limni litis. Já a tutela incidental pode tanto ser solicitada liminarmente, quando fizer parte da petição inicial, quanto não possuir caráter liminar.

Ser solicitada em caráter liminar, no entanto, não significa que necessariamente a tutela (seja antecedente ou incidental) será concedida liminarmente, sem a oitiva do réu (DIDIER JR, 2015: 577). A concessão liminar da tutela provisória somente pode ser feita em casos de urgência e nos casos de evidência previstos nos incisos II e III do artigo 311 do CPC. Mesmo nas tutelas de urgência, não serão todas que poderão ser objeto de concessão liminar.

“A tutela provisória de urgência pode rá ser concedida liminarmente quando o perigo de dano ou de ilícito, ou o risco ao resultado útil do processo estiverem configurados antes ou durante o ajuizamento da demanda. Caso não haja risco de ocorrência do dano antes da citação do réu, não há que se concedê-la em caráter liminar, pois não haverá justificativa razoável para a postergação do exercício do contraditório por parte do demandado. Seria uma restrição ilegítima e desproporcional ao seu direito de manifestação e defesa. Somente o perigo, a princípio, justifica a restrição ao contraditório” (DIDIER JR, 2015: 579)

A tutela provisória também pode ser concedida em sentença, em sede de cognição exauriente, preenchidos seus pressupostos. Busca-se conferir eficácia imediata aos efeitos da sentença, nos casos de apelação com efeitos suspensivos em relação à sentença.


Estabilização da tutela provisória satisfativa antecedente

Conforme a redação do artigo 304 do CPC, ocorrerá a estabilização da decisão que concede tutela provisória antecipada (satisfativa) antecedente, caso contra a decisão não seja interposto recurso. Isso significa que “o processo será extinto e a decisão antecipatória continuará produzindo efeitos, enquanto não for ajuizada ação autônoma para revisá-la, reformá-la ou invalidá-la” (DIDIER JR, 2015: 604).

A estabilização não se confunde com a coisa julgada, tanto que é possível o ajuizamento de ação por qualquer das partes, no prazo de dois anos após a decisão. “Não tendo o réu se manifestado pelo exaurimento da cognição, qualquer das partes poderá dentro do prazo de dois anos (art. 304, ~ 5.°), propor ação visando a exaurir a cognição - isto é, com o objetivo de aprofundar o debate iniciado com a ação antecipada antecedente (art. 304, ~ 2.°)” (MARINONI et al., 2015: 216).


Recurso

A decisão que defere ou indefere o requerimento de tutela provisória constitui decisão interlocutória, portanto o recurso cabível é o agravo de instrumento. “Tendo havido o indeferimento do pedido, pode o autor requerer no agravo desde logo ao seu relator a antecipação da tutela recursal para o tribunal a fim de ver concedida a tutela negada em primeiro grau de jurisdição (art. 1.019,1). Tendo havido o deferimento, pode o réu no agravo desde logo requerer ao seu relator a suspensão dos efeitos da decisão que concedeu a tutela provisória (art. 1.019, I). Se, no entanto, a "tutela provisória" for confirmada, concedida ou revogada na sentença, o recurso cabível será unicamente o de apelação (art. 1.009, S 3.°).” (MARINONI et al., 2015: 206).

Em relação à estabilização da tutela satisfativa antecedente, no entanto, Marinoni et al. (2015) defendem que a contestação é apta a impedir seus efeitos: “É claro que pode ocorrer de o réu não interpor o agravo de instrumento, mas desde logo oferecer contestação no mesmo prazo - ou, ainda, manifestar-se dentro desse mesmo prazo pela realização da audiência de conciliação ou de mediação. Nessa situação, tem-se que entender que a manifestação do réu no primeiro grau de jurisdição serve tanto quanto a interposição do recurso para evitar a estabilização dos efeitos da tutela. (art. 1.009, S 3.°)”. (MARINONI et al., 2015: 216).


Bibliografia

DIDIER JR., Fredie - Curso de Direito Processual Civil, Vol.2, Salvador, JusPodivm, 2015 

MARINONI, Luiz Guilherme, ARENHART, Sérgio Cruz e MITIDIERO, Daniel  - Novo Curso de Processo Civil, Vol. 2, São Paulo, Revista dos Tribunais, 2015

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Sobre o autor
Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CUNHA, Walter. Tutela provisória. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 24, n. 5936, 2 out. 2019. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/74932. Acesso em: 19 abr. 2024.

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