3. A PRISÃO EM FLAGRANTE DE PESSOAS INIMPUTÁVEIS
Estando a autoridade de polícia de serviço numa Unidade Policial, sendo-lhe apresentado o suposto autor do crime, diante da existência de elementos suficientes de autoria e prova da materialidade do crime, resta-lhe ratificar a prisão e adotar as medidas legais decorrentes.
Se por exemplo, tratar-se de um autor de crime de homicídio, diante de todas as circunstâncias relacionadas acima, a autoridade policial lavrará o auto de prisão em flagrante, artigo 304 do CPP, in verbis:
Art. 304. Apresentado o preso à autoridade competente, ouvirá esta o condutor e colherá, desde logo, sua assinatura, entregando a este cópia do termo e recibo de entrega do preso. Em seguida, procederá à oitiva das testemunhas que o acompanharem e ao interrogatório do acusado sobre a imputação que lhe é feita, colhendo, após cada oitiva suas respectivas assinaturas, lavrando, a autoridade, afinal, o auto.
§ 1o Resultando das respostas fundada a suspeita contra o conduzido, a autoridade mandará recolhê-lo à prisão, exceto no caso de livrar-se solto ou de prestar fiança, e prosseguirá nos atos do inquérito ou processo, se para isso for competente; se não o for, enviará os autos à autoridade que o seja.
§ 2o A falta de testemunhas da infração não impedirá o auto de prisão em flagrante; mas, nesse caso, com o condutor, deverão assiná-lo pelo menos duas pessoas que hajam testemunhado a apresentação do preso à autoridade.
§ 3o Quando o acusado se recusar a assinar, não souber ou não puder fazê-lo, o auto de prisão em flagrante será assinado por duas testemunhas, que tenham ouvido sua leitura na presença deste.
§ 4o Da lavratura do auto de prisão em flagrante deverá constar a informação sobre a existência de filhos, respectivas idades e se possuem alguma deficiência e o nome e o contato de eventual responsável pelos cuidados dos filhos, indicado pela pessoa presa.
Destarte, resultando das respostas fundada a suspeita contra o conduzido, a autoridade mandará recolhê-lo à prisão, exceto no caso de livrar-se solto ou de prestar fiança, e prosseguirá nos atos do inquérito ou processo, se para isso for competente; se não o for, enviará os autos à autoridade que o seja.
E aqui, mesmo que a autoridade policial, com sua longa experiência laboral perceba que o autor possui sintomas de incapacidade mental, adotará as medidas de praxe, com o respectivo encaminhamento do autor a uma unidade prisional, podendo ainda adotar no curso das investigações as medidas conforme exposição no item seguinte.
4. DO INCIDENTE DE INSANIDADE MENTAL
Como visto no item anterior, sendo autuado em flagrante delito, a autoridade policial mandará recolher à prisão o autor do crime.
Em se tratando por exemplo de um crime de homicídio, artigo 121 do CP, a autoridade policial disporá de um prazo de 10 dias para conclusão das investigações.
Por expressa disposição legal, artigo 149, § 1º, Código de Processo Penal, o exame poderá ser ordenado ainda na fase do inquérito, mediante representação da autoridade policial ao juiz competente.
Mas a regra geral é que quando houver dúvida sobre a integridade mental do acusado, o juiz ordenará, de ofício ou a requerimento do Ministério Público, do defensor, do curador, do ascendente, descendente, irmão ou cônjuge do acusado, seja este submetido a exame médico-legal.
O exame não durará mais de quarenta e cinco dias, salvo se os peritos demonstrarem a necessidade de maior prazo.
Quem trabalha na área penal sabe que esse exame costuma demorar muito tempo para ficar pronto e enquanto isso, o autor fica recolhido numa Unidade Prisional aguardando vaga para submissão ao exame psicopatológico.
5. DA SENTENÇA PENAL ABSOLUTÓRIA IMPRÓPRIA
A doutrina costuma dividir a sentença penal absolutória em própria e imprópria. Assim, havendo provas que o autor agiu por exemplo em legítima defesa, ele será absolvido em face da existência da causa excludente de ilicitude, artigo 23 do Código Penal c/c artigo 386, inciso VI, do Código de Processo Penal.
Neste caso, a doutrina chama de sentença absolutória própria.
No caso de ser reconhecida a inimputabilidade por doença mental instalada ao tempo da ação ou omissão, tendo o autor praticado um injusto penal, fato típico e ilícito, mas não culpável, o juiz o absolve e aplica-se medida de segurança, seja ela detentiva ou restritiva.
Neste caso, a sentença penal absolutória é chamada de imprópria.
6. ABUSOS DE INIMPUTÁVEIS NAS PRISÕES BRASILEIRAS
Acontece, que durante a tramitação de um longo processo, estando o autor do crime respondendo o processo na condição de preso, mesmo se apresentando com nítidos traços de inimputabilidade e dúvidas sobre sua integridade mental, ainda sem comprovação científica, pode o mesmo sofrer inúmeras agressões no interior de uma Unidade prisional.
Recentemente, na cidade mineira de Teófilo Otoni, no vale do Mucuri, há relatos divulgados em redes sociais de um preso com problemas mentais que teria sido estuprado no interior de uma cela de um estabelecimento penal, trazendo sérias consequências para a vítima, além das já existentes.
Um preso com problemas mentais recolhido numa Unidade prisional, é fator de sérios transtornos para a direção do estabelecimento penal, desde o seu recolhimento em cela separada até a rigorosa ministração de medicamentos apropriados.
7. A RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO
Quando o Estado cumpre a sua preensão executória, por meio da imposição de quaisquer das sanções penais, ele passa a assumir a responsabilidade pela segurança do indivíduo.
Havendo a comprovação da conduta do agente público, nexo de causalidade e evento danoso, deve o Estado responder objetivamente, a teor do artigo 37, § 6º da Constituição da República.
Estando provado que o inimputável sofreu violações em seus direitos assegurados por lei, deve o Estado assumir a responsabilidade pelos danos causados, com ação regressiva ao agente público que tenha agido com dolo ou culpa.
8. DAS CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os horrores da prisão provisória dos inimputáveis, fiel retrato de aberrações jurídicas no Brasil, começa com a inexistência da legislação brasileira da internação provisória do paciente que venha a comprovar a sua incapacidade penal em função de doença mental instalada ao tempo da ação ou omissão, e antes do processo final tenha que passar por situações de caos dentro do sistema prisional.
Infelizmente, mesmo constituindo direito fundamental assegurando a todo cidadão a solução processual num prazo razoável, artigo 5º, inciso LXXVIII, da Constituição da República, presenciamos casos de processos demorando dez, quinze e muito mais tempo, revelando falência do sistema de persecução penal e agressões a direitos fundamentais, como violação à dignidade da pessoa humana e ostentação da impunidade no Brasil, mesmo porque justiça tardia é mesmo que denegação da própria justiça já afirmava com exatidão o culto Professor Rui Barbosa.
Diante da ineficiência na prestação jurisdicional, que ao permitir que um portador de necessidades especiais permaneça preso no mesmo compartimento prisional com autores imputáveis, sofrendo toda sorte de vilipêndios, há que se responsabilizar, objetivamente, o Estado conforme reza o artigo 37, § 6º, da Constituição da República de 1988.
É importante salientar que àqueles que praticam injusto penal por serem portadores de doenças mentais, não podem ser considerados responsáveis pelos seus atos e, portanto, devem ser tratados e não punidos.
E mais que isso. A Lei de proteção das pessoas portadoras de transtornos mentais, Lei nº 10.216, de 06 de abril de 2001, assegura vários direitos a essas pessoas, no artigo 2º, dentre os quais, acesso ao melhor tratamento do sistema de saúde, consentâneo às suas necessidades, ser tratada com humanidade e respeito e no interesse exclusivo de beneficiar sua saúde, visando alcançar sua recuperação pela inserção na família, no trabalho e na comunidade, ser protegida contra qualquer forma de abuso e exploração, ser tratada em ambiente terapêutico pelos meios menos invasivos possíveis e ser tratada, preferencialmente, em serviços comunitários de saúde mental.
Para efetivação desses direitos o Estado torna-se o responsável pelo desenvolvimento da política de saúde mental, a assistência e a promoção de ações de saúde aos portadores de transtornos mentais, com a devida participação da sociedade e da família, a qual será prestada em estabelecimento de saúde mental, assim entendidas as instituições ou unidades que ofereçam assistência em saúde aos portadores de transtornos mentais.
DAS REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.
BOTELHO, Jeferson. Manual de Processo Penal; FERNANDES, Fernanda Kelly Silva Alves, Editora D´Plácido, BH, 1ª edição, 20015.
BOTELHO, Jeferson Botelho. Elementos do Direito Penal. Editora D´Plácido, BH, 1ª edição, 2016.
BRASIL. Lei nº 10.216, de 2001. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/leis_2001/l10216.htm. Acesso em 03 de julho de 20019.