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Associação de Proteção e Assistência aos Condenados: solução e esperança para a execução da pena

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INTRODUÇÃO

A idéia de que o Sistema Penitenciário atual está longe de alcançar seus objetivos não é incorreta, haja vista que pouco destaque se dá à humanização da pena e valorização da pessoa humana. A reincidência é hoje um problema crônico em todo o mundo, tornando-se uma barreira ao convívio pacífico e harmonioso entre as pessoas.

Porém, no ano de 1972, através de estudos e experiências com os condenados, um grupo de pessoas voluntárias lideradas por Mário Ottoboni, em São José dos Campos-SP, instituiu um Método revolucionário e eficiente no modo de execução de pena que hoje, decorridos mais de trinta anos, se tornou conhecido e adotado em grande parte do Brasil e em diversos países do mundo. É o Método APAC, que veio trazer condições ao condenado de se recuperar e ressocializar-se, tornando aquilo que parecia ser impossível de ser alcançado em realidade.

O objetivo central deste trabalho, é o de trazer informações sobre o Método APAC, buscando-se com isso ajudar na divulgação do Método e analisar suas vantagens em relação ao Sistema Penitenciário atual. Para tanto, o presente estudo será apresentado em 4 partes, sendo que na primeira se pretende dar uma rápida noção da origem da pena de prisão e qual é a sua finalidade em nosso ordenamento jurídico.

Na segunda parte, analisar-se-á os dilemas enfrentados pelos Sistemas Penitenciários no Brasil, a fim de termos base para uma comparação com os estabelecimentos prisionais onde se implantou a metodologia apaqueana.

Na terceira parte, verificar-se-á brevemente como foi o surgimento da Associação de Proteção e Assistência aos Condenados e como foi sua expansão.

A quarta e última parte se refere aos elementos nos quais se baseia o Método APAC, que devem ser aplicados em conjunto, para se obter a sua finalidade perspícua, a de "matar o criminoso e salvar o homem".


1. A origem da pena de prisão

Ao longo dos tempos e da evolução, fundamentalmente, três teorias chegaram a ditar normas e conceitos acerca da maneira de se cobrar por um delito cometido. Faremos apenas referências sobre elas, as quais são:

1.1. Teoria dos Absolutistas

Essa teoria da Escola Clássica recomendava a punição de acordo com o erro cometido. A finalidade da pena era o castigo, o pagamento pelo mal cometido. Não se preocupava com a pessoa do criminoso.

1. 2. Relativas ou Utilitárias

Para a Escola Positiva, o homem era o centro do Direito Penal; a pena não se caracterizava apenas como castigo, mas acima de tudo, visava a prevenção geral e defendia a oportunidade de socialização do delinqüente.

1. 3. Mistas

Aqui se atribui à pena uma dupla finalidade: primeira, a de natureza retributiva, pelo seu aspecto moral, mas seu objetivo não se limita apenas à prevenção, pois recomenda, ao mesmo tempo, a punição, segregando o infrator sentenciado; segunda, emendar, socializando.

O ideal se insere nas Teorias Mistas, desde que a finalidade pedagógica da pena não seja transformada em letra morta da legislação.

A palavra pena vem do latim "poena" que, por sua vez, deriva do grego poene, que quer dizer: expiação, punição, sofrimento.

A pena, além do efeito intimidativo por meio dos castigos impostos ao criminoso, de sua segregação do meio social e da família, traz em seu bojo, como essencial, a preocupação que o Estado deve ter um dispensar ao preso a atenção especial, para ajudá-lo a refletir sobre o delito cometido e dar-lhe condições que possam torná-lo útil.

A pena de prisão, que teve sua origem nos mosteiros da Idade Média sofreu modificações de toda espécie ao longo da história, buscando a garantia da segurança. Na prisão o Estado tenta realizar durante o cumprimento da pena, tudo quanto deveria ter propiciado ao cidadão, em época oportuna e não o fez.

A Igreja Católica chamava de penitenciário a clausura onde se recolhiam os pecadores arrependidos para cumprirem penitência, refletirem sobre o erro praticado e abominá-lo. Daí a origem do termo penitenciária, empregado para denominar estabelecimentos penais de maior porte.

Em nosso Ordenamento Jurídico vigente a pena possui finalidade dupla: punitiva e recuperativa. Dispõe o artigo 1º da Lei nº 7.210/84 (lei de execução penal), que "a execução penal tem por objetivo efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar condição para a harmônica integração social do condenado e do internado." Esta lei trata, de modo amplo, da execução das penas e das medidas de segurança privadoras de liberdade.


2. Dilemas do Sistema Penitenciário no Brasil

Não são poucos os indicadores que espelham a precariedade do sistema penitenciário brasileiro. Embora as condições de vida no interior das penitenciárias sejam heterogêneas quando consideradas sua inserção nas diferentes regiões do país, traços comuns denotam a má qualidade da vida: superlotação; condições sanitárias rudimentares; alimentação deteriorada; precária assistência médica, judiciária, social, educacional e profissional; violência incontida permeando as relações entre os presos, entre estes e os agentes penitenciários; rebeliões, fugas, seqüestros ocorrentes quase diariamente na maioria das prisões, enfim, o criminoso se aperfeiçoa cada vez mais no universo do crime.

A superlotação é uma realidade presente na maior parte das prisões brasileiras. Se torna origem imediata de muitos problemas, sobretudo a promiscuidade que promove toda sorte de contaminação – patológica e criminógena. Esse quadro agrava-se devido ao expressivo contingente de população encarcerada nos distritos e delegacias policiais, nos quais se encontram indiferenciados presos primários e reincidentes, detidos para averiguações ou em flagrante e cidadãos já sentenciados pela justiça criminal. Tais condições propiciam trajetórias e carreiras delinquenciais. Outro problema causado é a má conservação da saúde individual e coletiva dos presos. Nas celas superlotadas faz-se presente o sistema de rodízio, a fim de que todos os reclusos possam dormir, uma vez que não há nem espaço nem camas suficientes para todos, o que obriga inclusive a que muitos se sujeitem a dormir no chão de cimento, na companhia de insetos e roedores, altamente prejudiciais à saúde.

As instalações sanitárias são precárias; é muito comum a ausência de água corrente para banhos e para asseio pessoal. A iluminação precária, a má ventilação, a circulação de odores fétidos, a concentração de águas insalubres originárias da mistura de poças de chuvas ou de encanamentos desgastados com lixo e o acúmulo de gases ensangüentadas por cima do parco mobiliário traduzem o quadro crescente de deterioração das condições de vida dos presos.

Os problemas gastrointestinais são causados pela má alimentação fornecida, às vezes alimentos já deteriorados. Nos distritos e xadrezes policiais não se utilizam talheres, por questões de segurança, os quais são substituídos por tampões de marmitas ou pelas próprias mãos.

Quanto aos vestuários, as necessidades são, em geral, supridas pelos familiares, o que denota desigualdades: alguns detentos bem vestidos outros vestidos com camisetas rasgadas e calças ou calções gastos.

É normal a existência de epidemias de tuberculose, além de várias doenças sexualmente transmissíveis. Trata-se de uma população de alto risco, vulnerável a toda sorte de doenças infecto-contagiosas, fato ainda mais agravado pela AIDS. Os recursos médicos, sejam eles clínicos, ambulatoriais ou hospitalares são escassos. Há insuficiência de médicos e de atendentes de enfermagem, e os equipamentos são obsoletos.

Em suma, os presos vivem em condições subumanas, o que propicia a violência. Tudo é passível de querela: confrontos entre quadrilhas; suspeitas de delação; envolvimento no tráfico de drogas, na exploração de atividades internas, no tráfico de influências sobre os poderosos, sejam aqueles procedentes da massa carcerária ou da equipe dirigente; posse de objetos pessoais; obtenção de favores sexuais, o que compromete não apenas os presos, sobretudo os mais jovens e primários, muitas vezes comercializando no interior da população, mas também suas esposas, suas companheiras e suas filhas; manutenção de privilégios conquistados ou cedidos; disputas de postos de trabalho.

Respondem os agentes institucionais com igual ou superior intensidade de violência. Os carcereiros, policiais, diretores, na maioria das vezes, agem com abuso e violência, chegando até a praticar extorsão.

A esse panorama que torna a vida nos presídios incerta e insegura, convém acrescentar a precária oferta de serviços de formação educacional e profissional. E a da prestação de serviços de assistência judiciária e social como por exemplo o não atendimento de direitos consagrados na legislação pertinente; a ausência de regular informação sobre o andamento de processos ou explicações consistentes a propósito do indeferimento de um recurso ou pedido de benefício penal.

Além deste imenso rol de problemas sofridos pelos condenados, ainda existe um problema maior, o da discriminação sofrida pela sociedade, a qual não pergunta o motivo que levou a pessoa estar em um estabelecimento penitenciário, mas sim, já a estigmatiza pelo fato de ter estado lá.

Neste cenário sombrio, em que a prisão intensifica sua face corruptora, estimulando a criminalidade e a reincidência, tem sido objeto de crescente atenção, não só no Brasil como no exterior, a experiência plena de êxito e única no mundo da Associação de Proteção e Assistência aos Condenados, a qual traz em seu método simples e eficiente, a realização do ideal buscado pelo legislador, ou seja, a recuperação do criminoso e sua ressocialização.


3. APAC - Origem e Expansão do Método

Após descrevermos um pouco da realidade do atual Sistema Penitenciário, o qual se mostra totalmente ineficiente e falido, trazendo-nos insegurança e incertezas de um futuro harmônico, traremos à luz algo de inteiramente novo, inusitado e revolucionário, em se tratando de humanização da pena e efetiva recuperação do preso: o Método APAC.

Em 1972, um grupo de quinze pessoas lideradas pelo advogado Dr. Mário Ottoboni, preocupados com o grave problema das prisões na cidade de São José dos Campos (SP), passou a pesquisar a situação em nível nacional. Freqüentava o presídio de Humaitá para evangelizar e dar apoio moral aos presos. Em 1974, o juiz da Vara de Execuções Criminais da comarca, Dr. Sílvio Marques Neto, considerando a necessidade de ofertar novas vagas para o crescente número de detentos, tomou a decisão ousada de transferir a gerência do presídio de Humaitá para aquela equipe, a qual instituiu a APAC – Associação de Proteção e Assistência aos Condenados, entidade jurídica, sem fins lucrativos, com o objetivo de recuperar o preso através de um método de valorização humana, protegendo a sociedade e promovendo a justiça. A APAC aceitou a tarefa de reformar a prisão de Humaitá e dirigi-la, com o apoio da comunidade, sem praticamente nenhum ônus para o Estado (incumbido apenas da alimentação e do pagamento da luz e da água), dispensando a figura do policial e do carcereiro.

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Responsáveis pela segurança e demais funções no presídio, os voluntários se orientavam por uma escala de emenda, dividida em três estágios (fechado, semi-aberto e aberto), oportunizando-se ao detento, o qual passou a ser chamado de recuperando, a cada estágio, um acesso maior ao mundo extramuros até alcançar o último, quando se lhe permitia residir em casa e assumir um trabalho externo, obrigando-se apenas a uma apresentação diária à prisão. Tudo isso baseado em alguns pontos básicos, como por exemplo: individualizar o tratamento tal como recomenda a lei; proporcionar assistência material, psicológica, médica, odontológica, jurídica e educacional; utilizar a religião, com liberdade de culto, como principal instrumento para a recuperação pretendida, visando "matar o criminoso e salvar o homem"; oferecer condições para que o preso ajude o próprio preso, aplicar os regimes progressivos nas dependências da mesma unidade, o que facilita a permanência do condenado junto aos familiares ao longo do cumprimento de toda a pena, acompanhado do voluntariado local, assim como sua reintegração na sociedade.

O método foi sendo aperfeiçoado e hoje tem alcançado grande repercussão no Brasil e no exterior. Apresentando índices de reincidência inferiores a 5% (no sistema comum a média de reincidência é de 86%), são aproximadamente 100 unidades em todo o território nacional, e várias já foram implantadas em outros países, como as APAC’s de Quito e Guaiaquil no Equador, Córdoba e Concórdia na Argentina, Arequipa no Peru, Texas, Wiora e Kansas nos EUA, e muitas outras estão em fase de implantação como África do Sul, Nova Zelândia, Escócia, etc.

Em 1986, a APAC filiou-se à PFI – Prision Fellowslrip International, órgão consultivo da ONU para assuntos penitenciários. Desde então o Método passou a ser divulgado e aplicado com sucesso em todo o mundo.


4. Elementos Fundamentais do Método APAC

O método APAC se baseia em doze elementos fundamentais, e o seu êxito depende da efetividade deste conjunto de elementos, os quais estão elencados logo a seguir.

4.1. A participação da comunidade

O Estado, infelizmente, não reúne condições de atuar eficazmente na execução da pena e recuperar o condenado. Por isso o legislador, na Lei de Execução Penal, em seu artigo 4º, dispôs que "O Estado deverá recorrer à cooperação da comunidade nas atividades de Execução da Pena e da medida de segurança."

A APAC conta com a participação da comunidade na execução da pena e esta participação se faz necessária, uma vez que é ela, a própria comunidade, a maior interessada em um ambiente seguro, até porque o criminoso não nasce criminoso, é a comunidade quem o torna assim.

4.2. O recuperando ajudando o recuperando

O recuperando é levado a descobrir que possui valores e isto o faz viver com um sentimento de ajuda mútua e colaboração com outro recuperando. O sentido de ajuda - acudir o irmão que está doente, ajudar os mais idosos, etc. – é muito salutar e devolve ao recuperando muita tranqüilidade, pois à medida que ele coopera, terá um retorno de ajuda.

Para que ocorra uma melhora na disciplina, na segurança do presídio, na busca de soluções práticas e econômicas para os problemas internos, o Método APAC adota a Representação de Cela e o CSS – Conselho de Sinceridade e Solidariedade.

A representação de cela propicia a disciplina e a harmonia entre os recuperandos, a limpeza e higiene pessoal da cela, o treinamento de líderes, uma vez que a representação é dividida entre os próprios recuperandos, acentuando o rompimento do "código de honra" existente entre a população prisional, em que os mais fortes subjugam os mais fracos.

O Conselho de Sinceridade e Solidariedade é órgão auxiliar da administração da APAC. O presidente do CSS é escolhido pela diretoria da APAC e os demais membros são escolhidos pelo presidente, de acordo com a população prisional. Sem poder de decisão, o CSS colabora em todas as atividades, opinando acerca da disciplina, segurança, distribuição de tarefas, realização de reformas, promoção de festas, celebrações, fiscalização do trabalho para o cálculo de remição de pena, etc. Semanalmente, o CSS reúne-se com toda a população prisional sem a presença de membros da APAC, para discutir as dificuldades que estão encontrando, buscar soluções para os problemas encontrados e reivindicar da diretoria medidas que possam ajudá-los a tornar harmonioso e saudável o ambiente prisional.

4.3. Trabalho

Somente o trabalho não é suficiente para recuperar o infrator. O trabalho deve fazer parte do contexto, mas não deve ser o elemento fundamental no cumprimento da pena.

No Método APAC, o regime fechado é o tempo para a recuperação, o semi-aberto para a profissionalização, e o aberto, para a inserção social. Neste sentido o trabalho, é aplicado em cada um dos regimes de acordo com a finalidade proposta.

O Método APAC recomenda os trabalhos laborterápicos (artesanatos) para o regime fechado, pois nesta fase é necessário a descoberta dos próprios valores do recuperando, para que ele possa melhorar sua auto-imagem, valorizar-se como ser humano, transformar o próprio coração, torná-lo acolhedor, tolerante e pacífico, capaz de perdoar e em condições de, com perfeição, filtrar as mensagens que recebe rejeitando as negativas. Se não houver esta reciclagem dos valores não terá sentido dar serviço ou forçar o trabalho, porque ele vai ser um eterno revoltado. Estes trabalhos artesanais são: tapeçaria, pintura de quadros a óleo, pintura de azulejos, grafite, técnicas em cerâmica, confecção de redes, toalhas de mesa, cortinas, trabalhos em madeira e muito mais, permitindo ao recuperando exercitar a sua criatividade, a reflexão sobre o que está fazendo.

Em "Vamos matar o criminoso?" de Mário Ottoboni, podemos encontrar alguns depoimentos de recuperandos que passaram pela oficina laborterápica no presídio de Humaitá, dentre os quais destacamos um breve e profundo depoimento:

"Comecei a trabalhar na laborterapia da APAC sem muito interesse. Aos poucos fiz um pequeno barco e fui descobrindo como eu era importante, que podia fazer muito mais e melhor. Que podia ser feliz e fazer minha família feliz. As idéias de vingança e de ódio que tinha anteriormente foram cedendo espaço à criatividade e à paz. A serenidade passou a ser meu lema. O trabalho me modificou inteiramente, dando-me o sentido da responsabilidade. Descobri que não tenho vocação para viver atrás das grades e que o trabalho engrandece o ser humano. Tudo isso foi descoberto nas mesas de laborterapia." (R.D.C.)

No Regime semi-aberto é feita a preparação de mão-de-obra especializada, através de cursos profissionalizantes. A Lei de Execução Penal favorece as saídas para estudos, portanto, valendo-se deste dispositivo legal, é feito o encaminhamento do recuperando para estudos de formação em estabelecimentos da cidade, tais como: sapataria, padaria, alfaiataria, oficina mecânica, etc., objetivando sempre a reintegração ao comércio da sociedade, próximo de seu núcleo afetivo.

O Método APAC, para o Regime Aberto, propõe que o recuperando que pretende desfrutar do benefício tenha uma profissão definida, apresente uma promessa de emprego compatível com sua especialidade e tenha revelado no regime semi-aberto mérito e plenas condições para voltar ao convívio social.

4.4. A religião e a importância de se fazer a experiência de Deus.

O Método APAC proclama a necessidade imperiosa do recuperando fazer a experiência de Deus, ter uma religião, amar e ser amado, não impondo este ou aquele credo.

A religião é fundamental para a recuperação do preso, a experiência de amar e ser amado desde que pautada pela ética, e dentro de um conjunto de propostas onde a reciclagem dos próprios valores leve o recuperando a concluir que Deus é o grande companheiro, o amigo que não falha. Então Deus surge como uma necessidade, que nasce espontaneamente no coração do recuperando para que seja permanente e duradoura.

4.5. Assistência jurídica

Uma das maiores preocupações do condenado, se não a primeira, se relaciona com sua situação processual, e 95% da população prisional não reúne condições para contratar um advogado, especialmente na fase da execução penal, quando ele toma conhecimento dos inúmeros benefícios facultados pela lei.

O Método APAC recomenda uma atuação especial a este aspecto do cumprimento da pena advertindo que a assistência jurídica deve se restringir somente aos condenados envolvidos na proposta da APAC, evitando sempre que a entidade se transforme num escritório de advocacia e cuidando de prestar assistência jurídica aos recuperandos comprovadamente pobres.

4.6. Assistência à saúde

O Método APAC oferece assistência médica, odontológica, psicológica e outras de um modo humano e eficiente, uma vez que a saúde deve ser sempre colocada em primeiro plano, evitando preocupação e aflições do recuperando.

É lógico que não se consegue falar em recuperação, amor, arrependimento, a alguém, que se encontre abandonado nas grades com dor de dente, com úlcera, vítima de HIV etc.

Eis algumas comparações dos distúrbios físicos encontrados na população prisional dos presídios comuns com aqueles onde há o Método APAC:

Distúrbios Físicos

Presídio comum %

Método APAC %

Resfriados Constantes

70%

9%

Úlcera Nervosa

54%

2%

Dor de ouvido

18%

3%

Dor de dente

44%

9%

Gastrite

34%

6%

4.7. Valorização Humana

O Método APAC tem por objetivo colocar em primeiro lugar o ser humano, e nesse sentido todo o trabalho deve ser voltado para reformular a auto-imagem do homem que errou. Chamá-lo pelo nome, conhecer sua história, interessar-se por sua vida, visitar sua família, atendê-lo em suas justas necessidades, permitir que ele se sente à mesa para fazer as refeições diárias e utilize talheres, tais medidas, dentre outras, adotadas pelo Método ajudam o recuperando a descobrir que nem tudo está perdido.

A educação e o estudo recebem especial atenção pelo Método APAC, uma vez que a nível mundial é grande o número de presos que têm deficiências neste aspecto.

Os voluntários especialmente treinados, em reuniões em cela, com a utilização de métodos psicopedagógicos e mediante palestras de valorização humana fazem com que o recuperando conheça a realidade na qual vive, bem como os próprios anseios, projetos de vida, as causas que o levaram à criminalidade, enfim, tudo aquilo que possa contribuir para a recuperação de sua auto-estima e da auto-confiança.

4.8. A Família

No Método APAC, a família do recuperando é muito importante. Aquilo que o sistema comum rompe, na APAC se faz de tudo para fortalecê-lo, ou seja, no Método APAC a pena atinge somente a pessoa do condenado, evitando o máximo possível que ela extrapole a pessoa do infrator atingindo a sua família. Neste sentido, é feito grande esforço para que não se rompam os elos afetivos do recuperando e sua família, por exemplo: o recuperando pode telefonar uma vez por dia para os seus parentes, escrever cartas, etc. No dia dos pais, das mães, das crianças, Natal e outras datas importantes, é permitido que os familiares participem com os recuperandos.

O Método APAC trabalha com a família dos recuperandos, que em 98% dos casos, são lares desestruturados, em todos os aspectos, vivem à margem da sociedade e por isso mesmo tornam-se fonte geradora de delinqüência. Não adianta recuperar o condenado e depois devolvê-lo à fonte que o gerou sem tê-la transformado.

Para alcançar este objetivo, o Método APAC oferece aos familiares Jornadas de Libertação com Cristo (retiros espirituais) e cursos de Formação e Valorização Humana, buscando ainda proporcionar todas as facilidades possíveis para o estreitamento dos vínculos afetivos. Aos familiares é dada orientação sobre a forma de se relacionarem com os recuperandos, evitando assuntos que provoquem angústia, ansiedade e nervosismo.

É adotado também pelo Método APAC as visitas íntimas familiares, feitas de forma organizada e bem elaborada para se evitar os inconvenientes relacionados à imoralidade, promiscuidade, agenciamento de mulheres e falta de respeito à equipe de voluntários. O encontro íntimo familiar objetiva manter os laços afetivos da família e, como conseqüência, diminui a tensão no presídio, pois oferece ao condenado a segurança de que ele continua a ser o chefe da família.

O Método também busca assistir as vítimas e suas famílias.

4.9. O Serviço Voluntário

O trabalho apaqueano é baseado na gratuidade, no serviço ao próximo. Por isto a comunidade desempenha papel importantíssimo no bom êxito da APAC. Os voluntários são primeiramente treinados, participando de um curso de formação de voluntários, normalmente desenvolvido em 42 aulas de 1:30hs de duração cada uma, durante o qual conhece a metodologia e desenvolve suas aptidões para exercer este trabalho com eficácia e observância de um forte espírito comunitário. Após algum tempo de atuação o voluntário participa de cursos de reciclagem e aperfeiçoamento dentro dos vários setores de atuação do método, tais como: relacionamento com as autoridades, com os recuperandos e entre a equipe, etc.

A remuneração restringe-se às pessoas que trabalham no setor administrativo, cuja característica principal foge da marca do voluntariado. A APAC vive de contribuições mensais de seus sócios (colaboradores da própria comunidade) e de algumas doações de empresas e admiradores, portanto, enquanto no sistema comum o Estado gasta mensalmente R$1.200,00 com cada preso, aproximadamente, o custo na APAC é de apenas R$350,00 por preso.

Os voluntários também podem ficar incumbidos de serem casais padrinhos, ou seja, um casal oriundo do matrimônio ou formado por pessoas solteiras ou viúvas, realizam a tarefa de ajudar o recuperando refazer as imagens desfocadas, negativas do pai, da mãe ou de ambos, com fortes projeções na imagem de Deus.

4.10. CRS – Centro de Reintegração Social

A lei de Execução Penal (artigos 91 a 92) disciplina o cumprimento da pena em regime semi-aberto, em colônia agrícola, industrial ou similar.

A APAC criou o Centro de Reintegração Social que tem dois pavilhões, um destinado ao regime semi-aberto e outro ao aberto, não frustrando, assim, a execução da pena.

O estabelecimento do CRS, oferece ao recuperando a oportunidade de cumprir a pena próximo de seu núcleo afetivo: família, amigos, parentes, facilitando a formação de mão-de-obra especializada, favorecendo assim, a reintegração social, respeitando a lei e os direitos do condenado.

O recuperando não se distanciando da sua cidade encontrará, logicamente, apoio para conquistar uma liberdade definitiva com menos riscos de reincidência.

4.11. Mérito

A legislação brasileira adota o modelo progressivo de cumprimento de pena e pugna pela progressividade tendo em vista o tempo de cumprimento da pena e a conduta do condenado. Ao expor os motivos afirma que o mérito deve sobrepor-se ao aspecto temporal do desconto da pena.

No Método APAC, o mérito – conjunto de todas as tarefas exercidas, bem como as advertências, elogios, saídas, etc., constantes da pasta-prontuário do recuperando – é o referencial do recuperando. Não basta que ele seja obediente às normas disciplinares. O Método deseja ver o recuperando prestando serviços em toda a proposta socializadora, como representante de cela, como membro do CSS, na faxina, na secretaria, no relacionamento com os companheiros, com os visitantes e com os voluntários. Não se trata apenas de uma conduta prisional, mas de um atestado que envolve o mérito do cumpridor da pena.

É formada uma Comissão Técnica de Classificação composta de profissionais ligados à metodologia para classificar o recuperando quanto à necessidade de receber tratamento individualizado, seja para recomendar quando possível e necessário, exames exigidos para a progressão de regimes e, inclusive, cessação de periculosidade e insanidade mental.

4.12. Jornada de Libertação com Cristo

A Jornada de Libertação com Cristo constitui-se no ponto máximo da metodologia. São três dias de reflexão e interiorização que se faz com os recuperandos. A Jornada nasceu da necessidade de se provocar uma definição do recuperando quanto à adoção de uma nova filosofia de vida, cuja elaboração definitiva demorou quinze anos de estudos, apresentando uma seqüência lógica, do ponto de vista psicológico, das palestras, testemunhos, músicas, mensagens e demais atos, com o objetivo precípuo de fazer o recuperando repensar o verdadeiro sentido da vida.

A Jornada se divide em duas etapas: a primeira preocupa-se em revelar Jesus Cristo aos jornadeiros. A parábola do filho pródigo é o fio condutor da Jornada, culminado com o retorno ao seio da família, num encontro emocionante do jornadeiro com seus parentes. A segunda etapa ajuda o recuperando a rever o filme da própria vida, para conhecer-se melhor. Nesta etapa o recuperando se encontra consigo mesmo, com Deus e com o semelhante.


CONCLUSÃO

No período de 02 de março a 06 de julho de 2002, através da participação do Curso de Formação de Voluntários realizado na APAC de Itaúna/MG, pudemos ver de perto que todos os recuperandos trabalhavam e estudavam, preparando-se para a vida futura, como cidadãos úteis à sociedade da qual saíram desviados. As chaves do presídio, ou seja, do portão da entrada, das celas e dos alojamentos são guardadas pelos próprios recuperandos e que não existem policiais nem agentes carcerários no presídio. As celas são limpas e organizadas, assim como os pátios, os refeitórios, as oficinas. As paredes são pintadas e os recuperandos apresentam-se esperançosos e dispostos a provar para a comunidade que se recuperaram ou já estão se recuperando realmente.

Ao passo que no sistema comum 94% dos condenados não alimentam qualquer projeto de vida e 48% nutrem o desejo de suicídio, no Método APAC esses percentuais são reduzidos a 3,8% e 0%, respectivamente.

A APAC é uma entidade civil de direito privado, com finalidade de atuar na área de execução da pena, suprindo o Estado na preparação do preso para seu retorno ao convívio social, e busca na participação da sociedade a ajuda necessária ao seu processo de ressocialização. A finalidade pedagógica da pena aplicada pela APAC constitui-se num método próprio de reconhecido êxito e a atuação da entidade resume-se no seguinte:

  • Órgão auxiliar da Justiça na execução da pena;

  • Protetor da sociedade, preparando convenientemente o preso para voltar ao convívio social;

  • Proteção aos condenados, no sentido dos direitos humanos e, de assistência nos termos do que prevê a lei, estendendo-se o trabalho no que couber, aos seus familiares. É um método que já tem mais de trinta anos de experiência e é comprovadamente eficiente na recuperação e ressocialização do condenado.

No entanto, a APAC ainda é praticamente desconhecida no Brasil. Para a mídia, vende mais uma rebelião que a recuperação de milhares de presos ou a redução da taxa de reincidência. Mas tal situação tem de ser revertida.

Não existem condenados irrecuperáveis mas, tão somente, os que não receberam tratamentos adequados. Não se alcança a segurança social apenas com punição mas sim com trabalhos de recuperação e respeito à dignidade da pessoa humana. Desta forma estaremos ajudando na construção de um Estado em que os direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça deixem de ser utopia e passem a ser realidade.


BIBLIOGRAFIA

ADORNO, Sérgio. Sistema penitenciário no Brasil: problemas e desafios. Revista Cons. Nac. Pol. Crim. e Penit., Brasília, 1(2): 63-87, jul/dez 1993.

FRANCO, Eduardo. Vida refeita atrás das grades. Jornal de opinião. 7. a 13 de outubro de 2002.

LEAL, César Barros. A prisão em um perspectiva histórica e o desafio atual dos direitos humanos dos presos. Revista do Conselho Nacional de Polícia Criminal e Penitenciária., Brasília, 1(6) 13-30, jul/dez 1995.

LEAL, César Barros. Associação de proteção e assistência aos condenados: uma experiência brasileira que o mundo começa a descobrir. Revista do Conselho Nacional de Polícia Criminal e Penitenciária, Brasília, 1(7): 29-36, jan/jun 1996.

MIRABETE, Julio Fabbrini. A privatização dos estabelecimentos penais diante da lei de execução penal. Revista do Conselho Nacional de Polícia Criminal do MJ, Brasília, 1(1): 61-71, jan/jun 1993.

OTTOBONI, Mário. Ninguém é irrecuperável. São Paulo: Cidade Nova, 2001.

OTTOBONI, Mário. Vamos matar o criminoso? Método APAC. São Paulo: Paulinas, 2001.

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Sobre o autor
Geraldo Francisco Guimarães Júnior

advogado em Itaúna (MG)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GUIMARÃES JÚNIOR, Geraldo Francisco. Associação de Proteção e Assistência aos Condenados: solução e esperança para a execução da pena. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 884, 2 dez. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/7651. Acesso em: 22 nov. 2024.

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