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O porte de arma de fogo no Brasil: efeitos e requisitos especiais

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20/12/2019 às 11:47
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3. REQUISITOS E TESTES LEGAIS PARA O PORTE DE ARMA DE FOGO NO BRASIL

Após uma análise acerca da história das armas de fogo, sua evolução histórica em paralelo com a também evolução das leis penais, e sobre a indústria bélica do país, o presente capítulo adentra a respeito das exigências do nosso ordenamento jurídico para que o cidadão brasileiro tenha acesso ao registro e até mesmo ao direito de portar uma arma de fogo, exigências que recaem tanto ao civil quanto para o agente de segurança, como para a própria polícia.

Em primeiro lugar, se apresenta os requisitos em sentido amplo, onde existe um comparativo com a lei armamentista anterior e a nova lei, destacando alguns aspectos que foram mantidos e outros que foram incorporados com a vigência da nova lei, além disso, apresenta uma perspectiva a respeito da atuação do SINARM (Sistema Nacional de Armas) no território brasileiro.

Por fim, exterioriza a respeito das diferenças do porte e da posse de arma de fogo, tanto no significado linguístico, quanto a respeito dos efeitos que gera ao indivíduo, realizando uma comparação da modificação de sua norma reguladora da lei anterior para a lei vigente.

3.1. Estudo em relação aos requisitos para o porte de arma no ordenamento brasileiro

Com a nova lei de armas, a Lei 10.826/03, a chamada Lei do Estatuto do Desarmamento, houve uma nova redação acerca do porte de armas de fogo no território brasileiro, e é claro que muita coisa foi incorporada da lei reguladora anterior, se mantendo o que vinha funcionando e apenas acrescentando novas atribuições visando um controle ainda mais satisfatório a fim de se evitar a existência e o uso irresponsável de armas de fogo no país.

A legislação anterior, a Lei 9.437/97, já havia trazido disposição a respeito do trabalho do SINARM (Sistema Nacional de Armas), atrelado ao Ministério da Justiça no âmbito da Polícia Federal e com ampla atuação em todo o território nacional, além disso, a lei também estabeleceu as condições para o registro e o porte de armas de fogo, e foram definidos quais seriam os crimes decorrentes de sua desobediência.

O SINARM consistia em uma forma de controle especializado das armas de fogo, criando bancos de dados a respeito das armas de fogo e usuários no país, em seu 2º artigo a referida lei dispunha das atribuições do sistema:

I – identificar as características e a propriedade de armas de fogo, mediante cadastro;

II – cadastrar as armas de fogo produzidas, importadas e vendidas no País;

III – cadastrar as transferências de propriedade, extravio, roubo e outras ocorrências suscetíveis de alterar os dados cadastrais, inclusive as decorrentes de fechamento de empresas de segurança privada e de transporte de valores;

IV – identificar as modificações que alterem as características ou funcionamento de arma de fogo;

V – integrar no cadastro os acervos policiais já existentes;

VI – cadastrar as apreensões de armas de fogo, inclusive as vinculadas a procedimentos policiais e judiciais. (BRASIL, LEI 9.437/97).

Deste modo, nota-se o empenho do Governo Federal em instituir políticas publicas, com o objetivo de controlar as armas de fogo no país, e tornar mais seletivo a autorização para que se possa obtê-las dentro da legalidade:

Mas é importante ressaltar, por outro lado, os avanços e pontos positivos proporcionados pelo Sinarm, que, por si só, representa um passo importante no controle de armas no Brasil, o que, por seu turno, poderá contribuir para a reversão da própria “cultura impune de armas” no país: um dos fatores responsáveis pelo elevado número de assassinatos com armas de fogo. (FONSECA, et al. 2006, p.36).

A lei armamentista de 2003 manteve o sistema, o qual já vinha trazendo resultados satisfatórios, e deste modo, o legislador ainda optou por abranger ainda mais a sua área de atuação, acrescentando cinco novas atribuições voltadas principalmente a respeito de quem atua no comércio, manutenção e utilização de armas de fogo, reforçando sempre a necessidade do controle da expedição de novas autorizações e da participação da Polícia Federal em tal trabalho:

III – cadastrar as autorizações de porte de arma de fogo e as renovações expedidas pela Polícia Federal;

VIII – cadastrar os armeiros em atividade no País, bem como conceder licença para exercer a atividade;

IX – cadastrar mediante registro os produtores, atacadistas, varejistas, exportadores e importadores autorizados de armas de fogo, acessórios e munições;

X – cadastrar a identificação do cano da arma, as características das impressões de raiamento e de microestriamento de projétil disparado, conforme marcação e testes obrigatoriamente realizados pelo fabricante;

XI – informar às Secretarias de Segurança Pública dos Estados e do Distrito Federal os registros e autorizações de porte de armas de fogo nos respectivos territórios, bem como o cadastro atualizado para consulta. (BRASIL, LEI 10.826/03).

Com a referida lei, veio à necessidade do recadastramento de todos os proprietários de armas que ainda não tinham seu registro no Sinarm:

Tal medida aponta para o aumento progressivo de registros do número de proprietários, assim como da criação de um procedimento obrigatório quanto aos novos registros. Isso potencialmente implicará a revalorização do Sinarm, e também o aumento de suas responsabilidades: quanto maiores forem essas maiores cobranças ocorrerão dos usuários (cidadãos e autoridades). (FONSECA, et al. 2006, p.35).

Ao analisar as novas disposições vigentes a respeito do controle armamentista, sob a ótica de Aleixo e Behr (2005, p.15), ressalvadas algumas exceções diante da particularidade de alguns casos, como a comprovação da real necessidade, fica o porte de arma restrito aos membros pertencentes às instituições que visam à soberania nacional, sendo as Forças Armadas, e a segurança pública e privada, como da própria polícia e de certos cargos do poder públicos dotados de tal direito pelo exercício de suas funções, a membros de entidades desportivas que utilizam as armas em suas modalidades, e aos caçadores de subsistência.

Com relação á expedição de autorizações, tal atribuição fica vinculada ao SINARM e a Polícia Federal, estando o requerente apto aos requisitos pertinentes, apresentando a documentação necessária e demonstrando a real necessidade da autorização para o exercício de profissão de risco ou ameaça a sua integridade física que possa exercer. Tal autorização possui validade em todo o território brasileiro, além disso, a mesma poderá ser revogada a qualquer tempo, constatado certos casos que não comportem com tal direito, como no caso do detentor ser encontrado em estado de embriaguez ou mesmo sob efeito de alucinógenos, com a autorização perdendo sua validade instantaneamente.

Ainda de acordo com Aleixo e Behr (2005, p. 14), o Estatuto do Desarmamento traz como novidade um controle mais rigoroso a respeito da comercialização tanto das armas como da própria munição, tornando os responsáveis pelo seu comercio responsáveis por manter atualizado o banco de dados, comunicando tanto as vendas, como as características das armas repassadas, e é claro respondem por tais artefatos enquanto sob seu poder.

No ordenamento atual, duas são as possibilidades de requerimento do porte de arma para cidadão fora do âmbito da Polícia e das Forças Armadas, são elas, a condição de civil que comprove a real necessidade de possuir tal direito e ao caçador de subsistência. São requisitos necessários para obtenção do porte de arma:

Para obter o porte de arma de fogo o cidadão deve seguir os seguintes passos:

1) Preencher o requerimento de porte de arma de fogo no link disponibilizado, escolhendo a categoria CIDADÃO.

2) Imprimir e assinar o requerimento de porte de arma de fogo.

3) Comparecer a uma unidade da Polícia Federal para entrega da documentação necessária, conforme lista abaixo:

(a) requerimento assinado;

(b) ter idade mínima de 25 anos, exceto para os cargos definidos no artigo 28 da Lei 10.826/03;

(c) 1 (uma) foto 3x4 recente;

(d) original e cópia do RG e CPF;

(e) comprovante de residência (água, luz, telefone). Caso o imóvel esteja em nome do cônjuge ou companheiro (a), apresentar Certidão de Casamento ou de Comunhão Estável. Se o interessado não for o titular do comprovante de residência, nem seu cônjuge ou companheiro(a), deverá apresentar DECLARAÇÃO com firma reconhecida do titular da conta ou do proprietário do imóvel, sendo que a assinatura presencial do titular do comprovante de residência dispensará o reconhecimento de firma;

(f) apresentação de documento comprobatório de ocupação lícita;

(g) comprovação de idoneidade, com a apresentação de certidões negativas de antecedentes criminais fornecidas pela Justiça Federal, Estadual (incluindo Juizados Especiais Criminais), Militar e Eleitoral, que poderão ser fornecidas por meios eletrônicos;

(h) comprovação de aptidão psicológica para o manuseio de arma de fogo, realizado em prazo não superior a 01 ano, que deverá ser atestado por psicólogo credenciado pela Polícia Federal;

(i) comprovação de capacidade técnica para o manuseio de arma de fogo, realizado em prazo não superior a 01 ano, que deverá ser atestado por instrutor de armamento e tiro credenciado pela Polícia Federal;

(j) cópia do certificado de registro de arma de fogo válido;

(l) demonstrar a efetiva necessidade para o porte de arma de fogo. (BRASIL, POLÍCIA FEDERAL, [recurso eletrônico], 2019).

Já para o caso do caçador de subsistência, os requisitos são em sua maioria semelhantes, se diferenciando em alguns aspectos, em especial da desnecessária apresentação de comprovantes de capacitação como de teste de aptidão psicológico ou técnico. Dentre as principais diferenças destacam-se a própria ficha de requerimento que é voltada para tal destinação e ao argumento comprobatório, que nesse caso consiste na necessidade do emprego de arma de fogo para promover sua subsistência e de sua família.

O art. 6º da Lei 10.826/03 deixa expressa proibição ao porte de arma de fogo em todo o território brasileiro, salvo os casos excepcionais. Deste modo, é facultado à Polícia Federal verificar a constatação das exceções, onde o candidato comprove efetivamente a necessidade da obtenção do direito:

Art. 6º- É proibido o porte de arma de fogo em todo o território nacional, salvo para os casos previstos em legislação própria e para:

I – os integrantes das Forças Armadas;

II - os integrantes de órgãos referidos nos incisos I, II, III, IV e V do caput do art. 144 da Constituição Federal e os da Força Nacional de Segurança Pública (FNSP);

III – os integrantes das guardas municipais das capitais dos Estados e dos Municípios com mais de 500.000 (quinhentos mil) habitantes, nas condições estabelecidas no regulamento desta Lei;

IV - os integrantes das guardas municipais dos Municípios com mais de 50.000 (cinqüenta mil) e menos de 500.000 (quinhentos mil) habitantes, quando em serviço;

V – os agentes operacionais da Agência Brasileira de Inteligência e os agentes do Departamento de Segurança do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República;

VI – os integrantes dos órgãos policiais referidos no art. 51, IV, e no art. 52, XIII, da Constituição Federal;

VII – os integrantes do quadro efetivo dos agentes e guardas prisionais, os integrantes das escoltas de presos e as guardas portuárias;

VIII – as empresas de segurança privada e de transporte de valores constituídas, nos termos desta Lei;

IX – para os integrantes das entidades de desporto legalmente constituídas, cujas atividades esportivas demandem o uso de armas de fogo, na forma do regulamento desta Lei, observando-se, no que couber, a legislação ambiental.

X - integrantes das Carreiras de Auditoria da Receita Federal do Brasil e de Auditoria-Fiscal do Trabalho, cargos de Auditor-Fiscal e Analista Tributário;

XI - os tribunais do Poder Judiciário descritos no art. 92 da Constituição Federal e os Ministérios Públicos da União e dos Estados, para uso exclusivo de servidores de seus quadros pessoais que efetivamente estejam no exercício de funções de segurança, na forma de regulamento a ser emitido pelo Conselho Nacional de Justiça - CNJ e pelo Conselho Nacional do Ministério Público - CNMP. (BRASIL, LEI 10.826/03).

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Ao se deparar com o artigo destacado, é nítido que o porte de arma é voltado principalmente de segurança, pois atribui uma condição muito peculiar onde o indivíduo ficaria apto a transitar com uma arma em seu poder de forma direta, e assim, requerer uma responsabilidade muito mais significativa.

Ademais, para se obter o direito ao porte de arma, o candidato deverá, além de preencher os requisitos já mencionados, comprovar a sua efetiva necessidade por exercício de atividade profissional de risco ou que possa causar-lhe ameaça à sua integridade física. Tal requisito encontra amparo legal no artigo 10, §1º da Lei 10.826/03:

Art. 10. A autorização para o porte de arma de fogo de uso permitido, em todo o território nacional, é de competência da Polícia Federal e somente será concedida após autorização do Sinarm.

§ 1º A autorização prevista neste artigo poderá ser concedida com eficácia temporária e territorial limitada, nos termos de atos regulamentares, e dependerá de o requerente:

I – demonstrar a sua efetiva necessidade por exercício de atividade profissional de risco ou de ameaça à sua integridade física;

II – atender às exigências previstas no art. 4º desta Lei;

III – apresentar documentação de propriedade de arma de fogo, bem como o seu devido registro no órgão competente. (BRASIL, LEI 10.826/03).

Após a realização de todos os procedimentos, e adquirida à autorização, o porte de arma tem natureza jurídica de autorização, não sendo definitivo, podendo ser revogado a qualquer momento, é ato unilateral concedido apenas pelo Poder Público, discricionário e precário, não dependendo da vontade da parte que o adquire para sua manutenção, mas sim de quem o concede.

No mês de abril do ano de 2019, a Polícia federal lançou o chamado SINARM II, o novo sistema de armas brasileiro, e de acordo com as próprias diretrizes da Polícia Federal (2019), o novo sistema traz a possibilidade de fazer requerimento, aquisição, transferência, emissão, renovação de registro de porte de arma e muito mais via internet pelo próprio portal, tendo o cidadão pleno acesso para acompanhar seu requerimento, seja no e-mail ou pela internet, além disso, ganhou a possibilidade de verificação de autenticidade na internet dos documentos gerados por parte do SINARM, no entanto ressalta-se que o sistema é novo e ainda é difícil ter por base se o mesmo teve resultado satisfatório ou não.

3.2 Avaliações nos testes técnicos e psicológicos para o porte de arma de fogo

Com relação à capacitação para o porte de arma, tanto o civil, quanto um agente de segurança pública ou privada, precisa apresentar documentos probatórios que comprovam que o mesmo teria realizado e sido aprovado nos testes tanto técnicos, quanto psicológicos, testes que são requisitos obrigatórios para que o mesmo possa adquirir uma arma de fogo, e sua condição está expressa na própria lei reguladora:

Art. 4º Para adquirir arma de fogo de uso permitido o interessado deverá, além de declarar a efetiva necessidade, atender aos seguintes requisitos:

III – comprovação de capacidade técnica e de aptidão psicológica para o manuseio de arma de fogo, atestadas na forma disposta no regulamento desta Lei. (BRASIL, LEI 10.826/03).

A prova técnica aplicada pela Polícia Federal possui tanto a capacitação teórica quanto a prática, ambas vitais para ser aprovado. A prova teórica consiste em uma avaliação objetiva, contendo 20 questões, e de acordo com o regulamento da Polícia Federal (2017), possui quatro conteúdos cada um contendo suas questões, sendo 6 questões referentes as normas de segurança, 6 questões referentes ao funcionamento e a nomenclatura de peças, 3 questões sobre a conduta no estande e 5 sobre a própria legislação armamentista atual, a Lei 10.826/03. Obterá a aprovação àquele que tiver 60% de aproveitamento nesta avaliação.

A avaliação prática consiste basicamente no treinamento com o armamento em punho, e de acordo com as normas da Polícia Federal (2017), se divide no treinamento destinado ao registro, aquisição ou transferência de arma de fogo, e no treinamento destinado ao porte de arma de fogo. No primeiro treinamento mencionado, o candidato deverá realizar treinamento com arma de fogo curta, que se divide em lisa e raiada, ambos os conceitos referentes ao cano, este último dando maior poder de estabilidade ao projétil, com relação a sua aprovação:

Será aprovado o candidato que obtiver, no mínimo, 60% (sessenta por cento) da pontuação máxima do alvo, ou seja, 30 (trinta) pontos em cada distância, do total dos 50 (cinquenta) pontos possíveis. Para a prova teórica adotar-se-á o mesmo percentual de acertos (60%). Da reprovação: o candidato dará ciência de sua reprovação em campo próprio do formulário de aferição de habilidade de tiro real, podendo requerer nova avaliação após 30 (trinta) dias. (POLÍCIAL FEDERAL, [recurso eletrônico], 2017).

O candidato também deverá realizar o treinamento com a arma longa, a qual também deverá obter ao menos 60% de pontuação no alvo. Já a segunda modalidade de treinamento mencionado é destinada ao porte de arma, bem semelhante ao treinamento geral, no entanto, traz algumas especificações, como a divisão do treinamento para defesa pessoal, o qual o indivíduo porta a arma casualmente e o treinamento para o uso institucional, no qual o indivíduo, porta a arma devido ao cargo ou função que exerça, por exemplo, a própria polícia.

Em ambos os treinamentos, será auferida a capacidade do candidato por meio de aproveitamento na realização de disparos nas chamadas silhuetas humanoides, que são utilizados como alvos. A capacitação técnica é imprescindível, pois prepara o candidato para sua atuação na sociedade e o instrui com o conhecimento necessário para o manejo das armas de fogo.

Além da capacitação técnica, a capacitação psicológica também se tornou requisito para o manuseio de arma de fogo no Brasil, onde se passou a exigir o documento de comprovação de aptidão psicológica tanto para portar quanto para possuir uma arma de fogo, tendo validade apenas se atestado por psicólogo do quadro da Polícia Federal ou credenciado por ela. A avaliação psicológica foi incorporada ao processo para a obtenção do porte de armas através do Decreto 5.123/04 que a reconheceu como necessário para a obtenção do porte de arma.

De acordo com o estudo apresentado por Caneda e Teodoro (2010) tal avaliação passou a fazer parte de diversos estudos pelos peritos da área, sobretudo pela preocupação com a falta de um perfil ideal para a análise, e dos instrumentos eficientes para essa aferição:

A Instrução Normativa 23/2005, que trata da aferição de avaliação psicológica para aquisição e porte de arma de fogo ampara o Sistema Nacional de Armas (Brasil, Lei Federal 9.437 de 1997). Este tem como finalidade estabelecer critérios para definição do perfil psicológico do candidato à aquisição e/ou porte de arma de fogo, assim como a avaliação psicológica e emissão de laudo para os candidatos. (CANEDA, TEODORO, 2010, [recurso eletrônico]).

Conforme Rafalski e Andrade (2015), a Avaliação Psicológica seria um processo de investigação por meio do qual o psicólogo busca adentrar ao íntimo do analisado, estabelecendo uma interação maior onde o mesmo possa transparecer um possível trauma ou desvio que possivelmente o impeça de exercer a função a qual esteja se candidatando.

No entanto, a Avaliação Psicológica é alvo de muitos debates dentre os especialistas da área de psicologia, pela sua necessidade de aprimoramento, pois se realizada de forma errônea, poderia trazer resultados infrutífero, principalmente, se considerando pela má utilização dos instrumentos psicológicos para sua realização, o que não atingiria sua finalidade primordial:

Foram descritos como exemplos de mau uso dos instrumentos a avaliação incorreta por parte do psicólogo, a falta de clareza na aplicação, o erro de aplicação e o erro de avaliação. Erros como os citados impactam não somente a atuação dos psicólogos, mas também sua credibilidade perante a sociedade, que desqualifica a utilização dos testes psicológicos com base nas ações de profissionais que por falta de conhecimento prejudicam a qualidade das informações obtidas. (RAFALSKI, ANDRADE, [recurso eletrônico], 2015).

Com o advento da Lei 10.826/03 que passou a legislar a respeito das armas de fogo no país, apesar de incluir a avaliação psicológica no rol necessário para a obtenção do direito, a referida lei não institui qual seria o aparato legislativo o qual deveria ser seguido na área preponderante à atuação do psicólogo nessa avaliação. Deste modo, houve a necessidade em que fosse delimitada a atuação do profissional na realização desse requisito:

O Conselho Federal de Psicologia (CFP), diante da falta de legislações que normatizassem ou respaldassem a atuação do psicólogo, promulgou em 2008 a resolução no 18 (CFP, 018/2008), dispondo sobre o trabalho do profissional de Psicologia na Avaliação Psicológica para concessão de registro e/ou Porte de Arma de Fogo. Considera, ao promulgar a resolução, a necessidade de normatizar e qualificar os procedimentos relativos ao registro e porte de arma de fogo, adicionando em conta a importância da avaliação psicológica como processo obrigatório e eliminatório. Tal legislação visa prevenir que candidatos que possuam características incompatíveis com o porte de arma não obtenham esta autorização por meio da avaliação de traços de personalidade e atenção. (RAFALSKI, ANDRADE, [recurso eletrônico], 2015).

A partir da resolução, sob o estudo de Caneda e Teodoro (2010), o teste psicológico passou a ter um caráter determinante na concessão ou não do porte de arma, sendo sua palavra, se negativa, elemento já suficiente para negar tal direito. No entanto, a falta de instrumentos para esse trabalho ainda dificulta e muito essa aferição, pior ainda quando não se vislumbram muitos estudos nessa área, sobre esse aspecto, sobretudo a respeito da criação de um perfil ideal, tornando o trabalho do profissional responsável pelo teste mais penoso e com menor índice de eficácia.

Outro fator que requer destaque é a baixa quantidade de profissionais capacitados para aplicarem os testes psicológicos, e a concentração dos mesmos nas regiões mais populosas do país:

Atualmente estão cadastrados 1.088 profissionais Psicólogos Peritos em Avaliação para Concessão de Porte de Arma de Fogo, divididos de forma desigual entre os Estados de nossa Federação. Em divisão regional, estão cadastrados 82 profissionais na Região Norte, 166 na Região Nordeste, 200 na Região Centro-Oeste, 374 na Região Sudeste e 266 na Região Sul. (POLÍCIA FEDERAL apud RAFALSKI, ANDRADE, 2015).

Com relação às pesquisas brasileiras para o aprimoramento na área, apesar de em pequena escala considerando a importância do tema, ainda caminham, e tem se concentrado principalmente nos testes de personalidade. No já supracitado trabalho de Caneda e Teodoro (2010), destacam-se também o estudo de outros autores nessa área, a respeito da personalidade dos candidatos e os impactos que o porte de arma poderia trazer a mesma:

As autoras utilizaram a forma reduzida do Teste de Apercepção Temática (TAT) e encontraram que os traços agressivos das pessoas investigadas contribuem para a escolha da atividade de policial civil, além de confirmar que a arma de fogo permite que eles expressem de forma socialmente aceita sua agressividade. (SILVA, DUARTE, MARIUZA apudCANEDA, TEODORO, [recurso eletrônico], 2010).

Para auferir a capacitação psicológica dos candidatos ao direito de portar uma arma de fogo, existem alguns instrumentos que vem sendo utilizados pelos profissionais da área, e entre tais instrumentos destacam-se as chamadas “técnicas projetistas” que de acordo com o trabalho de Pellini (2006), seriam métodos mais produtivos para essa finalidade, buscando mapear a personalidade do candidato:

O termo “técnica projetista” foi proposto em 1939, por L.K Frank (apud Anzieu, 1978), que publicou um artigo intitulado: “Os métodos projetivos para estudo da personalidade”. Seu objetivo era caracterizar o elo existente entre um grupo de testes, a saber: o teste de Associação de Palavras de Jung (1904), o Teste de Rorschach (1921) e o Teste de Apercepção Temática – TAT (1935). Ele afirmava que estes métodos formavam o protótipo de uma investigação dinâmica e global de personalidade, sendo esta abordada como uma estrutura em evolução, cujos elementos constitutivos encontram-se em constante interação. (PELLINI, 2006, p.18).

Dentre os testes supracitados, com a finalidade da capacitação psicológica para o porte de armas, destaca-se o Teste de Rorschach, que de acordo com o trabalho apresentado por Pellini (2006), consiste no método mais adequado para testar a maturidade e o controle emocional de um indivíduo, atributos que são essenciais para portar uma arma de fogo, assim como possíveis tendências a um comportamento violento:

O Rorschach é um método de investigação da personalidade, sendo sua principal virtude fornecer um padrão integrado de personalidade global e, em seguida, articular esse padrão de maneira quantitativa específica, em numerosas dimensões da personalidade. (PELLINI, 2006, p.23).

Ainda sob a égide do estude de Pellini (2006), o Método de Rorschach aplica sobre o indivíduo diversos estímulos, sendo compostos por dez pranchas com borrões de tinta pouco estruturados, que basicamente pouco ou nada significam, e a partir da resolução desse estímulo, com a identificação de pessoas, cenas, objetos, animais, entre outros, para se examinar o paciente, e assim, com os dados colhidos de análises desse teste, e que se busca um diagnóstico sobre a condição psicológica do examinado.

3.3. Posse e porte de arma: disparidade formal

A Lei 9437/97 versava em seu capítulo II a respeito do registro de arma de fogo, que era obrigatório e devia ser realizado no órgão competente, que na mesma lei já instituía o SINARM, no âmbito da Polícia Federal, como detentor de tal controle. Em seu art. 4º, a referida lei trazia disposição a respeito da validade territorial do registro, que seria em todo o país, e em especial, dispunha sobre a esfera a qual o detentor poderia ter a arma a sua disposição, a qual seria apenas dentro de sua própria casa, ou local de trabalho, desde que o mesmo fosse o proprietário da empresa ou responsável legal. Claramente está disposição já trazia a modalidade de posse de arma de fogo.

Já em seu capítulo III, a referida lei trazia expressa disposição a respeito do porte de armas, o qual era facultada, a sua concessão, pela devida autorização do órgão competente, ressalvadas as exceções expressas em lei. Deste modo, o porte de arma era tacitamente liberado, desde que fosse autorizado, além disso, trazia disposição a respeito de sua autorização tanto em âmbito federal, para todo o país, quanto estadual, tendo sua validade territorial sujeita aos limites do estado:

Art. 6° O porte de arma de fogo fica condicionado à autorização da autoridade competente, ressalvados os casos expressamente previstos na legislação em vigor.

Art. 7° A autorização para portar arma de fogo terá eficácia temporal limitada, nos termos de atos regulamentares e dependerá de o requerente comprovar idoneidade, comportamento social produtivo, efetiva necessidade, capacidade técnica e aptidão psicológica para o manuseio de arma de fogo.

§ 1° O porte estadual de arma de fogo registrada restringir-se-á aos limites da unidade da federação na qual esteja domiciliado o requerente, exceto se houver convênio entre Estados limítrofes para recíproca validade nos respectivos territórios.

Art. 8° A autorização federal para o porte de arma de fogo, com validade em todo o território nacional, somente será expedida em condições especiais, a serem estabelecidas em regulamento. (BRASIL, LEI 9437/97).

Ao passo em que começou a vigorar a nova lei de armas, Lei 10.826/03, muitos preceitos da lei anterior foram mantidos, como a própria ampla atuação do SINARM, tendo inclusive recebido novas atribuições. No entanto, houve a alteração de alguns artigos, como a própria adição da necessidade de declarar a efetiva necessidade a qual será examinada sua validade pelo órgão competente, e que fossem atendidos diversos requisitos expressos na nova lei, requisitos esses já tratados no capítulo anterior, tais disposições sendo referentes à posse de arma, a qual ainda teve mantida a mesma esfera de permissão da lei anterior.

Destaca-se que o que mais sofreu alteração deva ser o porte de arma, que de acordo com a nova lei, se tornou proibido, sendo a sua concessão possível apenas às causas de exceção a este dispositivo, estando expresso no art. 6º da nova lei, onde o legislador elencou todas as exceções a esta proibição, em especial para as funções correspondentes aos agentes de segurança, deste modo, dando um caráter muito mais restritivo a esse direito em relação à lei anterior.

Apesar de ambos os conceitos serem extremamente diferentes, cada um identificando uma possível ação ou estado em que se encontra o indivíduo em relação ao armamento, a posse e o porte de arma ainda são extremamente confundidos, nas palavras de Ricardo Santolini:

...vislumbra-se que há uma grande diferença entre o porte e a posse, momento em que no primeiro a pessoa encontra-se em contato direto com o bem, enquanto no último a pessoa não possui contato direto com o objeto, mas possui o mesmo dentro de sua esfera de vigilância. (SANTOLINI, 2013 p.03).

Tais conceitos não podem ser de forma alguma confundidos, pois cada um traz um amparo legal pertinente, ambos encontrados na Lei 10.826/03. Ao se aprofundar na diferenciação de ambos, a própria nomenclatura pode servir como fonte, onde de acordo com definição destacada por Ricardo Santolini, no dicionário de língua portuguesa cada conceito significa:

Portar

1. Trazer consigo. = LEVAR, TRANSPORTAR

2. Estar vestido com. = TRAJAR, USAR, VESTIR

3. Ter determinado comportamento. = COMPORTAR-SE

Posse

1. Retenção ou fruição de uma coisa ou de um direito.

2. Estado de quem possui uma coisa, de quem a detém como sua ou tem o gozo dela.

3. [Jurídico, Jurisprudência] [Jurídico, Jurisprudência] Acção.Ação.Ação ou direito de possuir a título de propriedade.

(DICIONÁRIO PRIBERAM apud SANTOLINI, p. 3, 2013).

Em síntese, a posse diz respeito ao indivíduo ser possuidor da arma, não a trazendo diretamente consigo, o mesmo tem o direito de ter a arma dentro de sua casa ou empresa, não podendo exercer esse direito em local diverso, e para obter tal direito, deve além do registro, provar a efetiva necessidade de ter a arma e cumprir com os requisitos contidos na lei supracitada. Já no caso do porte, o indivíduo mantém a arma em seu poder direto, pode mantê-la consigo mesmo, e para isso, deve provar a necessidade por tal direito devido ao exercício da função q possa exercer e do perigo a sua integridade física, função muito comum principalmente aos agentes de segurança e aos membros do Ministério Público, elencados no mesmo capítulo já mencionado.

Observando a diferença de ambos, nota-se que o porte de arma oferece um direito muito mais explícito ao possuidor, podendo transitar com a arma, e deste modo, a pena para o exercício de tal direito sem a devida autorização é muito mais gravosa, visto que coloca em perigo diretamente a sociedade no caso em que possa fazer a utilização de forma indevida.

No ano de 2019, o novo governo brasileiro, buscando dar nova regulamentação ao art. 10. Parágrafo 1º, inciso I da Lei 10.826/03, que diz respeito ao rol dos possíveis candidatos a adquirir o direito ao porte de arma. Para esta alteração, foram expedidos os Decretos 9.785, 9.797 e 9.844, todos do mesmo ano, que pretendiam aumentar o rol de hipóteses de profissionais com a possiblidade de porte de armas.

No entanto, ocorre que tais decretos sofreram diversos questionamentos, a respeito de sua ilegalidade, dentro do Congresso Nacional, e do próprio Poder Judiciário, deste modo, o então Presidente da República acabou por revogar tais decretos.

Nestes novos decretos haveria uma dilatação do seu rol de possíveis detentores, e assim, mais profissões passíveis a concessão desse direito, como a do próprio advogado, além disso, traria uma flexibilidade muito maior aos moradores da zona rural para sua concessão. Por fim, foi apresentado o derradeiro decreto presidencial acerca deste tema, o Decreto 9.847/19, o qual não fez previsão ao rol de categorias as quais poderiam ter o direito ao porte de arma, no entanto, existe um projeto de lei de autoria do executivo o qual deixaria a cargo de regulamentação presidencial, as categorias as quais poderiam obter tal direito.

3.3.1. O direito as armas de fogo a luz da Constituição brasileira

Extremamente divergente, é o debate acerca do direito ao porte de arma como garantia fundamental, onde reside a discussão a respeito das armas como garantia de proteção do indivíduo, e a sua influência nas taxas de violência em território brasileiro. A Constituição de 1988 em seu artigo 5°, relativo aos direitos fundamentais resguardados pela lei maior brasileira, dispõe em seu caput a respeito da segurança como garantia inviolável, “... garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade...”.

Deste modo, em tese, a segurança da população, inclusive em relação aos outros bens tutelados, como a vida, a liberdade, a igualdade, devam ser resguardadas pelo Estado, e para isso, determina no artigo 144 da Constituição Federal os agentes os quais serão responsáveis pela segurança da coletividade:

Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos:

I - polícia federal;

II - polícia rodoviária federal;

III - polícia ferroviária federal;

IV - polícias civis;

V - polícias militares e corpos de bombeiros militares. (CONSTITUIÇÃO FEDERAL, 1988).

No entanto, em um país tão grande e populoso, é notório que estes agentes não poderão resguardar toda a área tutelada, estes órgãos não podem ser onipresentes e deste modo, em certos casos o cidadão poderia se ver em situação de risco aos bens tutelados já supracitados e sem a proteção integral do Estado, sendo obrigado a defende-los, podendo caracterizar o instituto da legitima defesa, existente no ordenamento brasileiro, e pode ser definida como:

A legítima defesa constitui um dos aspectos do instinto de autoconservação. Ora, devemos preferir a nossa vida à do outro, pois cabe a cada um primeiro o dever para consigo. Contudo, o objeto da ação moral, isto é, o que se quer, não é a morte do indivíduo, mas sim a defesa da própria vida. O evento morte é tão somente um efeito indireto da ação de defesa, não querido, mas tolerado caso seja a única opção para salvar a própria vida pessoal ou comunidade, seja por um agressor interno, seja contra um agressor externo”. (MAGALHÃES apud COLEN, 2019, p.06)

Sendo assim, buscando a proteção de seus direitos fundamentais o cidadão tem o direito de zelar e lutar pessoalmente por eles, não podendo ser privado disso, nas palavras de Celso Antônio Bandeira de Mello:

Em face da Lei Magna do País, o cidadão jamais poderá ser proibido de tentar defender sua vida, seu patrimônio, sua honra, sua dignidade ou a incolumidade física de sua mulher e filhos a fim de impedir que sejam atemorizados, agredidos, eventualmente vilipendiados e assassinados, desde que se valha de meios proporcionais aos utilizados por quem busque submetê-los a estes sofrimentos, humilhações ou eliminação de sua existência. (MELLO, 2005, p.01).

No entanto, a discussão que se arrasta há algum tempo é em relação à disposição das armas de fogo para a proteção de tais direitos, inclusive considerando o direito a arma de fogo como parte do direito fundamental a liberdade do individuo, e sempre reacendendo as comparações com outros países os quais o acesso às armas é menos enrijecido, onde parte da doutrina tem por base e considera modelo para a flexibilização no Brasil, enquanto outra mantém a cautela, considerando os aspectos culturais, econômicos e da própria ineficiência da justiça brasileira em algumas áreas como latentes para a manutenção da política proibitiva de armas de fogo no Brasil. Atualmente este tema tem ganhado cada vez mais amplitude, tanto para com a fundamentação favorável, quanto para contrária, enriquecendo cada vez mais o debate acerca do tema.

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Trabalho de Conclusão do Curso, apresentado como requisito para graduação no curso de Direito na Universidade Luterana do Brasil/ Instituto Luterano de Itumbiara, Goiás.Orientador: Professor Carlos Eduardo de Oliveira Gontijo

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