O delegado de polícia e a análise das excludentes de ilicitude na prisão em flagrante

02/03/2020 às 16:46
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É possível a autoridade policial analisar as excludentes de ilicitude na prisão em flagrante ou se trata de ato jurisdicional?

 

RESUMO

A presente monografia tem o objetivo de estudar a atuação do delegado de polícia na documentação da prisão em flagrante frente a celeuma que envolve o artigo 310, parágrafo único do Código de Processo Penal, é dizer, indaga-se se é possível a autoridade policial analisar as excludentes de ilicitude na prisão em flagrante ou se se trata de ato jurisdicional. Após examinar a legislação brasileira (Constituição da República e leis infraconstitucionais) e identificar os diferentes posicionamentos doutrinários a respeito do tema, por meio de levantamento bibliográfico e pesquisa na rede mundial de computadores, chegou-se à conclusão de que o delegado de polícia não só pode, mas deve fazer o exame das causas de justificação na prisão em flagrante.

Palavras-chave: prisão em flagrante; excludentes de ilicitude; auto de prisão em flagrante; delegado de polícia.

 

 

SUMÁRIO

 

INTRODUÇÃO

1. ASPECTOS LEGAIS DA PRISÃO EM FLAGRANTE

1.1. CONCEITO DE PRISÃO EM FLAGRANTE

1.2. ESPÉCIES DE FLAGRANTES DO ARTIGO 302 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL

1.3. AUTO DE PRISÃO EM FLAGRANTE (APF) E SUA LAVRATURA

1.4. DIFERENÇA ENTRE: NÃO RATIFICAÇÃO, RELAXAMENTO OU LIBERDADE PROVISÓRIA

2. EXCLUDENTES DE ILICITUDE E A PRISÃO EM FLAGRANTE

2.1. NATUREZA DAS EXCLUDENTES PENAIS

2.2. ESPÉCIES DE EXCLUDENTES DE ILICITUDE PREVISTAS NO CÓDIGO PENAL

2.3. INCIDÊNCIA DAS EXCLUDENTES NO AUTO DE PRISÃO EM FLAGRANTE: EXEMPLOS

3. ANÁLISE DAS EXCLUDENTES DE ILICITUDE PELO DELEGADO

3.1. O PROBLEMÁTICO ARTIGO 310, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL

3.2 ARTIGO 282 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL E A ANÁLISE DAS EXCLUDENTES PELO DELEGADO

3.3. POSIÇÃO DOS TRIBUNAIS SOBRE O TEMA

CONCLUSÃO

REFERÊNCIAS

 

INTRODUÇÃO

 

O objetivo desta monografia é estudar a atuação do delegado de polícia na documentação da prisão em flagrante, ou seja, quando da lavratura do auto de prisão em flagrante, uma vez que há controvérsias se ele pode ou não examinar as excludentes de ilicitude de uma suposta conduta criminosa. As discussões giram em torno do artigo 310, parágrafo único do Código de Processo Penal. Para tanto foi feito uma intensa pesquisa tanto bibliográfica quanto na rede mundial de computadores para se conhecer os diferentes posicionamentos a respeito do tema e, assim, chegar a resposta do problema apresentado.

Levando-se em conta que o crime é um fato típico, ilícito e culpável, conforme seu conceito analítico e que a divisão do delito nestes elementos é somente para efeitos didáticos, pois o crime é um todo unitário, é inconcebível que o delegado de polícia diante de uma patente causa de justificação não a reconheça e autue em flagrante um inocente, uma vez que o próprio artigo 23 do Código Penal diz que não há crime quando o agente pratica o fato acobertado por excludente de ilicitude.

Pois bem, por mais ilógico que pareça, este é o entendimento de parte da doutrina, de que o exame das justificantes na prisão em flagrante constitui reserva de jurisdição por força do artigo 310, parágrafo único do Código de Processo Penal. Todavia, vale ressaltar que esta norma não proíbe o delegado de polícia de examinar as justificantes na prisão em flagrante, o que ela regula são os procedimentos que serão adotados pelo juiz ao receber o Auto de Prisão em Flagrante.

O artigo 304 é que regula os atos do delegado de polícia, a serem praticados, quando é apresentado a ele uma pessoa em possível flagrante delito. E o parágrafo primeiro deste artigo confere poder à autoridade policial para avaliar a legalidade da prisão e isso significa dizer que ele deve fazer o exame das excludentes de ilicitude.

Feitas estas considerações, esta monografia está dividida em três capítulos, sendo que o primeiro tratará dos aspectos legais da prisão em flagrante, seu conceito, requisitos, espécies de flagrante previstas no artigo 302 e outros desdobramentos que a envolve.

O segundo capítulo se dedica ao estudo das excludentes de ilicitude e a prisão em flagrante, a natureza das excludentes penais, incidência das excludentes no Auto de Prisão em flagrante e excludentes como causa de não ratificação.

Por fim, o terceiro e último capítulo estudará a análise das excludentes de ilicitude pelo delegado, as discussões que envolvem o problemático artigo 310, parágrafo único do Código de Processo Penal e a Posição dos Tribunais sobre o tema.

 

1. ASPECTOS LEGAIS DA PRISÃO EM FLAGRANTE

 

A liberdade de locomoção está prevista no artigo 5º, inciso XV da Constituição Federal de 1.988 e se revela como um direito fundamental individual. Todavia, é consenso no meio jurídico que nem mesmo os direitos fundamentais são absolutos, tendo como ressalva, conforme a melhor doutrina, a vedação à prática da tortura e àescravidão.

 Seguindo este entendimento, o direito de ir e vir confere ao indivíduo a garantia de não ser preso, salvo nas hipóteses previstas na própria Constituição da República.A prisão em flagrante está prevista no artigo 5º, inciso LXI da Constituição da República, in verbis: “LXI - ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei.”

Além da previsão constitucional supracitada, com as mudanças feitas pela L.12.403/11, que foi criada, além de outros objetivos, para ajustar o decreto-lei nº 3.689/41 (Código de Processo Penal), elaborado e promulgado na vigência de um Estado Ditatorial (Estado Novo), que se iniciou em 1.937, à Constituição da República atual (que veio para estabelecer um Estado Democrático de Direito) alterou a redação do artigo 283 que passou a ter o seguinte enunciado:

 

Art. 283.  Ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva.

 

Isto posto, percebe-se que a institucionalização da prisão em flagrante parte da premissa que o Estado, na tutela de direitos do cidadão, tem o dever de prender aqueles que estão cometendo ou que acabam de cometer uma infração penal e qualquer do povo tem a faculdade de assim agir, vale dizer, funciona como instrumento de autodefesa da sociedade.

 

1.1. CONCEITO DE PRISÃO EM FLAGRANTE

 

A palavra flagrante vem do latim flagrare, que significa queimar, logo, flagrante delito é uma expressão usada para designar aquele crime que está ocorrendo ou que acabou de acontecer, que ainda queima, é dizer, aquele delito que é evidente, visível, manifesto. Na precisa lição de Ana Flávia Messa (2014, p.570) “Flagrante vem do latim ‘flagrare’, que significa ‘queimar’; a expressão ‘flagrante’ é usada para designar o crime que está acontecendo, ainda queimante, evidente; é a certeza visual do crime”.

A prisão em flagrante é medida privativa de liberdade que funciona como ato administrativo num primeiro momento, pois é dispensável autorização judicial para que ela se realize. Num segundo momento, ela se converte em ato judicial a partir da sua comunicação ao Poder Judiciário, consoante preconiza o art. 306, §1º do Código de Processo Penal, in litteris:

 

Art. 306.  A prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre serão comunicados imediatamente ao juiz competente, ao Ministério Público e à família do preso ou à pessoa por ele indicada. 

§ 1o Em até 24 (vinte e quatro) horas após a realização da prisão, será encaminhado ao juiz competente o auto de prisão em flagrante e, caso o autuado não informe o nome de seu advogado, cópia integral para a Defensoria Pública.

                              

 

            Assim ensina Noberto Avena (2014, p.857):

 

Inicialmente, funciona como ato administrativo, dispensando autorização judicial. Portanto, apenas se converte em ato judicial no momento em que ocorre a sua comunicação ao Poder Judiciário, a fim de que seja analisada a legalidade da detenção e adotadas as providências determinadas no art. 310 do CPP.

 

            Entende-se que em relação à prisão em flagrante delito, a expressão “delito” abrange a prática de crime, bem como a de contravenção penal. Segundo pontua Renato Brasileiro de Lima (2014, p.859):

 

A expressão “delito” abrange não só a prática de crime, como também a de contravenção. Nesse caso, todavia, tratando-se de infração de menor potencial ofensivo, não se procede à lavratura de Auto de Prisão em Flagrante, mas sim de Termo Circunstanciado de Ocorrência, caso o agente assuma o compromisso de comparecer ao Juizado ou a ele compareça imediatamente (Lei nº 9.099/95, art. 69, parágrafo único).

 

 

            Há divergência doutrinária no que tange a natureza jurídica da prisão em flagrante;uns entendem que ela tem caráter precautelar, tendo em vista que não se serve para garantir o resultado final do processo, é dizer, outrora, quando do início da vigência do Código de Processo Penal, a prisão em flagrante, por si só, era fundamento para se manter o réu preso durante toda a persecução penal, todavia, com as alterações trazidas pela Lei nº 6.416/77, que introduziu um parágrafo único ao artigo 310 do Código de Processo Penal, retirou da prisão em flagrante a sua natureza cautelar, verbo ad verbum:

 

Art. 310.Quando o juiz verificar pelo auto de prisão em flagrante que o agente praticou o fato, nas condições do artigo 19, I, II e III, do Código Penal, poderá, depois de ouvir o Ministério Público, conceder ao réu liberdade provisória, mediante termo de comparecimento a todos os atos do processo, sob pena de revogação.

Parágrafo único. Igual procedimento será adotado quando o juiz verificar, pelo auto de prisão em flagrante, a inocorrência de qualquer das hipóteses que autorizam a prisão preventiva (artigos 311 e 312).

 

 

As alterações feitas ao Código de Processo Penal pela Lei nº 12.403/11 veio para reforçar o entendimento de que a prisão em flagrante delito tem natureza precautelar, conforme se extrai do artigo 310, inciso II do Código de Processo Penal, in verbis:

 

Art. 310.  Ao receber o auto de prisão em flagrante, o juiz deverá fundamentadamente: 

II - converter a prisão em flagrante em preventiva, quando presentes os requisitos constantes do art. 312 deste Código, e se revelarem inadequadas ou insuficientes as medidas cautelares diversas da prisão;

 

 

            Neste sentido ensina Renato Brasileiro de Lima (2014, p.862):

 

Sem embargo de opiniões em sentido contrário, pensamos que a prisão em flagrante tem caráter precautelar. Não se trata de uma medida cautelar de natureza pessoal, mas sim precautelar, porquanto não se dirige a garantir o resultado final do processo, mas apenas objetiva colocar o capturado à disposição do juiz para que adote uma verdadeira medida cautelar: a conversão em prisão preventiva (ou temporária), ou a concessão de liberdade provisória, com ou sem fiança, cumulada ou não com as medidas cautelares diversas da prisão.

 

 

Compartilha do mesmo entendimento Aury Lopes Jr. (2014, p.586) “A prisão em flagrante está justificada nos casos excepcionais, de necessidade e urgência, indicados taxativamente no art. 302 do CPP e constitui uma forma de medida pré-cautelar pessoal que se distingue da verdadeira medida cautelar pela sua absoluta precariedade.”

Em sentido contrário, existem doutrinadores que entendem que a prisão em flagrante tem natureza cautelar, com caráter administrativo, exigindo apenas aparência da tipicidade do delito, é dizer, não é necessário, para que seja efetivada, exame da ilicitude e da culpabilidade do crime. Ensinam, ainda, que por ser uma medida cautelar, está condicionada à demonstração dos requisitos da cautelaridade.

Adota o posicionamento supracitado Guilherme de Souza Nucci (2014, p.556), a saber:

 

é medida cautelar de segregação provisória, com caráter administrativo, do autor da infração penal. Assim, exige apenas a aparência da tipicidade, não se exigindo nenhuma valoração sobre a ilicitude e a culpabilidade, outros requisitos para a configuração do crime. É o fumus boni juris (fumaça do bom direito). Tem, inicialmente, natureza administrativa, pois o auto de prisão em flagrante, formalizador da detenção, é realizado pela Polícia Judiciária, mas se torna jurisdicional, quando o juiz, tomando conhecimento dela, ao invés de relaxá-la, prefere mantê-la, pois considerada legal, convertendo-a em preventiva. Tanto assim que, havendo a prisão em flagrante, sem a formalização do auto pela polícia, que recebe o preso em suas dependências, cabe a impetração de habeas corpus contra a autoridade policial, perante o juiz de direito. Se o magistrado a confirmar, no entanto, sendo ela ilegal, torna-se a autoridade coatora e o habeas corpus deve ser impetrado no Tribunal. Quanto ao periculum in mora (perigo na demora), típico das medidas cautelares, é ele presumido quando se tratar de infração penal em pleno desenvolvimento, pois ferida estão sendo a ordem pública e as leis. Entretanto, cabe ao juiz, após a consolidação do auto de prisão em flagrante, decidir, efetivamente, se o periculum existe, permitindo, ou não, que o indiciado fique em liberdade.

 

Na mesma esteira preleciona Renato Marcão (2014, p.639):

 

A prisão em flagrante é ato de natureza administrativa, muito embora o auto respectivo possa eventualmente ser presidido por autoridade judiciária. Configura modalidade de medida cautelar de natureza pessoal, privativa da liberdade, e como tal está condicionada à demonstração dos requisitos da cautelaridade. Reclama-se, portanto, a presença de fumus boni juris, que será evidenciado na tipicidade da conduta imputada e na existência de indícios da autoria (fumus comissi delicti), e do periculum in mora, que é presumido nos casos típicos de flagrância tratados no art. 302 do CPP. O objetivo da prisão em flagrante – por nós identificado como a colheita da prova ardente – é que justifica a necessidade dos requisitos apontados, visto que, assim compreendida, tem por escopo garantir o resultado final do processo ou ao menos influenciar positivamente na colheita da prova (ou parte dela) que servirá de base para sua instauração.

 

 

Ante o exposto, parece sermais acertado o entendimento daqueles que compreendem tratar a natureza jurídica da prisão em flagrante como medida precautelar, pois, conforme se extrai do artigo 306, §1º combinado com o artigo 310, inciso II, ambos do Código de Processo Penal, a prisão em flagrante não se serve para assegurar a investigação ou o processo, haja vista que será o juiz, após ser comunicado, no prazo de até 24h, que poderá determinar uma medida cautelar, seja convertendo a prisão em flagrante em preventiva, quando presentes os requisitos do art. 312 do Código de Processo Penal; seja, decretando outras medidas cautelares previstas no art. 319 do Código de Processo Penal.

 

 

1.2.ESPÉCIES DE FLAGRANTES DO ARTIGO 302 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL

 

 

            As hipóteses que permitem a prisão em flagrante de um delinquente estão previstas no art. 302, incisos I, II, III e IV do Código de Processo Penal e constitui rol taxativo, tendo em vista que normas que restringem direitos devem ter interpretação restritiva.

            O art. 302 do Código de Processo Penal tem a seguinte redação:

 

Art. 302.  Considera-se em flagrante delito quem:

 I - está cometendo a infração penal;

 II - acaba de cometê-la;

III - é perseguido, logo após, pela autoridade, pelo ofendido ou por qualquer pessoa, em situação que faça presumir ser autor da infração;

IV - é encontrado, logo depois, com instrumentos, armas, objetos ou papéis que façam presumir ser ele autor da infração.

 

            A doutrina traz diversas outras modalidades de prisão em flagrante, no entanto, ater-se-á as espécies de flagrante previstas no Código de Processo Penal, quais sejam, flagrante próprio, perfeito, real ou verdadeiro; flagrante impróprio, imperfeito, irreal ou quase-flagrante e o flagrante ficto, presumido ou assimilado.

            As situações fáticas que ensejam o flagrante próprio, perfeito, real ou verdadeiro estão elencadas no art. 302, incisos I e II do Código de Processo Penal, é dizer, incorrerá nesta hipótese de flagrante o agente que for preso cometendo um delito (crime ou contravenção) ou que acaba de cometê-lo. Neste último caso, há uma relação de imediatidade entre o término da prática do delito e a captura do delinquente em flagrante, é dizer, não pode haver um lapso temporal entre o fim da conduta delituosa e a prisão. Se o agente, na hipótese do inciso I, for interrompido por terceiro durante os atos executórios, poderá incorrer em tentativa, contudo, no inciso II isto não é possível, pois o crime já estará consumado. Assim ensina Noberto Avena (2014, p. 862):

 

Na hipótese do inciso I, havendo a interferência de terceiros no momento em que o agente está praticando o fato típico, é comum a figura da tentativa, o que não ocorre no caso do inciso II, contemplando hipótese na qual o delito já foi consumado. Observe-se que, neste último caso, a expressão “acaba de cometê-la” deve ser interpretada de forma total-mente restritiva, contemplando a hipótese do indivíduo que, imediatamente após a consumação da infração, vale dizer, sem o decurso de qualquer intervalo temporal, é surpreendido no cenário da prática delituosa.

 

            Percebe-se que, na acepção técnica da palavra, estar-se-á diante de flagrante propriamente dito somente nas hipóteses dos incisos I e II, ou seja, o inciso III (flagrante impróprio, irreal ou quase flagrante) e o inciso IV (flagrante presumido, ficto ou assimilado) trata – se de ficção jurídica uma vez que nestes casos não há uma relação de imediatidade, é dizer, o delito não foi evidente, manifesto, visível, mas sim são situações que fazem presumir ser alguém autor da infração penal.

            No que se refere ao flagrante impróprio, incorrerá nesta modalidade de flagrante o agente que é perseguido, logo após o cometimento da infração penal, em situação que faça presumir ser ele o autor da infração penal. Neste sentido, posiciona-se Renato Brasileiro de Lima (2014, p.865):

 

O flagrante impróprio, também chamado de imperfeito, irreal ou quase-flagrante, ocorre quando o agente é perseguido logo após cometer a infração penal, em situação que faça presumir ser ele o autor do ilícito (CPP, art. 302, inciso III). Exige o flagrante impróprio a conjugação de 3 (três) fatores: a) perseguição (requisito de atividade); b) logo após o cometimento da infração penal (requisito temporal); c) situação que faça presumir a autoria (requisito circunstancial).

           

Percebe-se que no flagrante impróprio pouco importa se o agente consumou ou não o delito, ou seja, se ele foi interrompido durante os atos de execução ou se concluiu a ação criminosa, é dizer, o que caracteriza este flagrante é a fuga empreendida pelo autor da infração penal e, logo após, a sua perseguição pelo ofendido, por terceiros ou pela autoridade.

            Para que se configure perseguição ao infrator, é necessário que ela seja contínua, nos termos do artigo 290, parágrafo 1º do Código de Processo Penal:

 

Art. 290.  Se o réu, sendo perseguido, passar ao território de outro município ou comarca, o executor poderá efetuar-lhe a prisão no lugar onde o alcançar, apresentando-o imediatamente à autoridade local, que, depois de lavrado, se for o caso, o auto de flagrante, providenciará para a remoção do preso. § 1o - Entender-se-á que o executor vai em perseguição do réu, quando:                                                       

a) tendo-o avistado, for perseguindo-o sem interrupção, embora depois o tenha perdido de vista;

b) sabendo, por indícios ou informações fidedignas, que o réu tenha passado, há pouco tempo, em tal ou qual direção, pelo lugar em que o procure, for no seu encalço.

 

            Há um equívoco do senso comum ao acreditar que alguém estará em flagrante num lapso temporal de até 24h a contar da prática do crime, pois, logo após a prática do crime - que compreende um intervalo de tempo maior entre a prática do delito, a apuração dos fatos e o início da perseguição, assim ensina Fernando Capez (2014, p.247) “ ‘logo após’ compreende todo o espaço de tempo necessário para a polícia chegar ao local, colher as provas elucidadoras da ocorrência do delito e dar início à perseguição do autor”- o autor poderá ser perseguido, desde que ininterruptamente, podendo a perseguição durar horas ou até mesmo dias, pouco importando o tempo decorrido entre o momento do crime e a prisão dos seus autores.

            O flagrante ficto, presumido ou assimilado é a última modalidade de flagrante prevista no art. 302, inciso IV do Código Processo Penal. Nesta hipótese de flagrante,o agente é preso, logo depois de cometer a infração penal, com instrumentos, armas, objetos ou papéis que façam presumir ser ele o autor do delito. Difere do flagrante impróprio, tendo em vista que neste caso é dispensável a perseguição, exigindo apenas que o delinquente seja encontrado com os materiais supracitados oriundos da conduta criminosa.

Todavia, entende parte da doutrina que é preciso que quem encontre o suposto delinquente, com os produtos do crime, saiba da ação delituosa previamente, ou seja, é preciso que haja uma procura ou perseguição por parte de alguém ao infrator. Assim ensina Aury Lopes Jr. (2014, p.590):

 

Fazendo uma interpretação sistemática em relação aos incisos anteriores, pode-se afirmar que esse “encontrado” deve ser causal e não casual. É o encontrar de quem procurou, perseguiu e depois, perdendo o rastro, segue buscando o agente. Não se trata de um simples encontrar sem qualquer vinculação previamente estabelecida em relação ao delito. Assim, não há prisão em flagrante quando o agente que acabou de subtrair um veículo é detido, por acaso, em barreira rotineira da polícia, ainda que esteja na posse do objeto furtado. Isso porque não existiu um encontrar de quem procurou (causal, portanto). Não significa que a conduta seja impunível, nada disso. O crime, em tese, existe. Apenas não há uma situação de flagrância para justificar a prisão com esse título.

                                                                                                         

Faz-se necessário entender a expressão “logo depois”, alguns doutrinadores entendem que ela indica um lapso temporal maior que “logo após”, todavia, parece mais lógico aqueles que defendem que a diferença não está no lastro temporal, exigindo tanto no flagrante impróprio como no presumido uma relação de imediatidade, sob pena de banalizar a prisão em flagrante. Neste sentido ensina Renato Brasileiro de Lima (2014, p.867):

 

Segundo parte da doutrina, a expressão logo depois constante do inciso IV não indica prazo certo, devendo ser compreendida com maior elasticidade que logo após (inciso III). Deve ser interpretada com temperamento, todavia, a fim de não se desvirtuar a própria prisão em flagrante. Com a devida vênia, pensamos que a expressão logo depois (CPP, art. 302, IV) não é diferente de logo após (CPP, art. 302, III), significando ambas uma relação de imediatidade entre o início da perseguição, no flagrante impróprio, e o encontro do acusado, no flagrante presumido. Na verdade, a única diferença é que, no art. 302, III, há perseguição, enquanto que, no art. 302, IV, o que ocorre é o encontro do agente com objetos que façam presumir ser ele o autor da infração.

                       

            Existem outras modalidades de flagrante criadas pela doutrina, contudo, limitar-se-á as hipóteses legais previstas no artigo 302 do Código de Processo Penal, tendo em vista que a intenção é saber quando alguém estará ou não em flagrante delito, consoante a legislação em vigor.

 

 

1.3.AUTO DE PRISÃO EM FLAGRANTE (APF) E SUA LAVRATURA

 

            Ao ser apresentado o preso em flagrante à autoridade policial, esta procederá a formalização da prisão em flagrante, seguindo o que preconiza os artigos 304 a 309 do Código de Processo Penal.

            A prisão em flagrante se divide em quatro etapas: a) captura do delinquente; b) condução coercitiva à autoridade competente; c) auto de prisão em flagrante; d) encarceramento. Ao entregar o preso à autoridade competente, ter-se-á concluídas duas etapas da prisão em flagrante (captura e condução), restando a parte da documentação (APF) e o recolhimento ao cárcere.

            Todas as formalidades previstas em lei, quando da documentação da prisão em flagrante, devem ser seguidas, sob pena da prisão ser ilegal, ocasionando, por conseguinte, o seu relaxamento pelo juiz, conforme se extrai do artigo 310, inciso I do Código de Processo Penal, in litteris: “Ao receber o auto de prisão em flagrante, o juiz deverá fundamentadamente: I – relaxar a prisão ilegal”.

            Antes de analisar os requisitos formais de documentação da prisão em flagrante, a autoridade deverá analisar a legalidade da prisão, no entanto, não é razoável que se exija daqueles que participam das duas primeiras etapas (captura e condução coercitiva) um domínio da ciência jurídica, tendo em vista que qualquer um do povo pode prender alguém em flagrante delito (flagrante facultativo) e até mesmo dos agentes policiais, haja vista que o conhecimento jurídico destes é perfunctório, pois, não desempenha atividade jurídica e não se exige, pelo menos por enquanto, formação acadêmica em Direito para ingresso na carreira como agente policial (seja militar ou civil), vale dizer, a análise da legalidade da prisão, feita por qualquer um do povo ou pelo agente policial, deve se restringir a tipicidade da conduta criminosa.

Se a conduta do suposto delinquente não for típica e verificado que o condutor agiu com dolo quanto a prisão ilegal, a autoridade não ratificará a prisão contra aquele e autuará este em flagrante, entretanto, depois de colhidos os depoimentos e constatado que não houve dolo do condutor, a autoridade não o autuará e determinará a soltura do conduzido. Nesta esteira preleciona Guilherme de Souza Nucci (2014, p.565):

 

Não é crível que a autoridade policial comece, formalmente, a lavratura do auto de prisão em flagrante, sem se certificar, antes, pela narrativa oral do condutor, das testemunhas presentes e até mesmo do preso, de que houve, realmente, flagrante em decorrência de um fato típico. Assim, quando se inteira do que houve, ao ser apresentada uma pessoa presa, inicia a lavratura do auto. Afinal, se a prisão foi nitidamente ilegal, deve dar voz de prisão em flagrante ao condutor e lavrar contra este o auto. Mas, excepcionalmente, pode ocorrer o descrito neste § 1.º, isto é, conforme o auto de prisão em flagrante desenvolver-se, com a colheita formal dos depoimentos, observa a autoridade policial que a pessoa presa não é culpada. Afastada a autoria, tendo constatado o erro, não recolhe o sujeito, determinando sua soltura. É a excepcional hipótese de se admitir que a autoridade policial relaxe a prisão. Ao proceder desse modo, pode deixar de dar voz de prisão ao condutor, porque este também pode ter-se equivocado, sem a intenção de realizar prisão ilegal. Instaura-se, apenas, inquérito para apurar, com maiores minúcias, todas as circunstâncias da prisão.

                                                                             

            As formalidades iniciais a serem observadas na elaboração do auto de prisão em flagrante estão descritas no artigo 304 do Código de Processo Penal que estabelece que ao ser apresentado o preso à autoridade policial, primeiro ouvirá o condutor (quem realizou a prisão ou conduziu o delinquente), depois as testemunhas que o acompanharem e, por último, o interrogatório do acusado, consoante redação legal:

 

Art. 304. Apresentado o preso à autoridade competente, ouvirá esta o condutor e colherá, desde logo, sua assinatura, entregando a este cópia do termo e recibo de entrega do preso. Em seguida, procederá à oitiva das testemunhas que o acompanharem e ao interrogatório do acusado sobre a imputação que lhe é feita, colhendo, após cada oitiva suas respectivas assinaturas, lavrando, a autoridade, afinal, o auto.

§ 1o Resultando das respostas fundada a suspeita contra o conduzido, a autoridade mandará recolhê-lo à prisão, exceto no caso de livrar-se solto ou de prestar fiança, e prosseguirá nos atos do inquérito ou processo, se para isso for competente; se não o for, enviará os autos à autoridade que o seja.

§ 2o A falta de testemunhas da infração não impedirá o auto de prisão em flagrante; mas, nesse caso, com o condutor, deverão assiná-lo pelo menos duas pessoas que hajam testemunhado a apresentação do preso à autoridade.

§ 3o Quando o acusado se recusar a assinar, não souber ou não puder fazê-lo, o auto de prisão em flagrante será assinado por duas testemunhas, que tenham ouvido sua leitura na presença deste.

                     

            O auto será assinado pela autoridade competente e pelo preso, sendo anexado a ele os termos de oitiva do condutor e das testemunhas. Se o flagrado não souber assinar ou se recusar, esta lacuna poderá ser completada pela assinatura por duas testemunhas, que tenha ouvido a leitura do auto na presença do conduzido, conforme redação do artigo 304, parágrafo 3º do Código de Processo Penal.

            No prazo de até 24 horas da realização da prisão, a autoridade policial deverá adotar os seguintes procedimentos: entregar ao preso a nota de culpa (serve para assegurar a garantia constitucional prevista no artigo 5º, inciso LXIV da Constituição Federal, onde constará os motivos da prisão, o nome do condutor e das testemunhas, sendo assinada pela autoridade); comunicar ao juiz, ao Ministério Público e à família do preso ou pessoa por ele indicada, sendo, outrossim, encaminhado neste mesmo prazo o auto de prisão em flagrante ao juiz competente; encaminhar cópia integral do auto de prisão em flagrante para a defensoria pública, caso o autuado não informe o nome do seu advogado. Assim está previsto no artigo 306 do Código de Processo Penal:

 

Art. 306.  A prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre serão comunicados imediatamente ao juiz competente, ao Ministério Público e à família do preso ou à pessoa por ele indicada.        

§ 1o Em até 24 (vinte e quatro) horas após a realização da prisão, será encaminhado ao juiz competente o auto de prisão em flagrante e, caso o autuado não informe o nome de seu advogado, cópia integral para a Defensoria Pública.

 § 2o No mesmo prazo, será entregue ao preso, mediante recibo, a nota de culpa, assinada pela autoridade, com o motivo da prisão, o nome do condutor e os das testemunhas.

        

            Ressalte-se que, não obstante o artigo 306, caput, do Código de Processo Penal relatar que a prisão de qualquer pessoa deva ser comunicada imediatamente ao juiz competente, ao Ministério Público e a família do preso ou à pessoa por ele indicada, na prática esta comunicação é feita em até 24 horas.

           

 

1.4. DIFERENÇA ENTRE: NÃO RATIFICAÇÃO, RELAXAMENTO OU LIBERDADE PROVISÓRIA

 

Há divergências na doutrina se a autoridade que preside o auto de prisão em flagrante, ao colher os depoimentos do condutor, das testemunhas e do preso, certificando-se de que o fato não constitui crime ou que o conduzido não é o autor do delito, poderia relaxar a prisão. Uma parte entende que sim, que a autoridade policial, ao entender pela ilegalidade da prisão, deve relaxá-la (auto de prisão em flagrante negativo), não recolhendo ao cárcere o conduzido. Neste sentido, Guilherme de Souza Nucci (2015, p.560):

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A norma processual penal (art. 304, § 1.º, CPP) não está bem redigida, a nosso ver. Não é crível que a autoridade policial comece, formalmente, a lavratura do auto de prisão em flagrante, sem certificar-se, antes, pela narrativa oral do condutor, das testemunhas presentes e até mesmo do preso, de que houve, realmente, flagrante por um fato típico. Assim, quando se inteira do que houve e acreditando haver hipótese de flagrância, inicia a lavratura do auto. Excepcionalmente, no entanto, pode ocorrer a situação descrita no § 1.º do art. 304, isto é, conforme o auto de prisão em flagrante desenvolve-se, com a colheita formal dos depoimentos, observa a autoridade policial que a pessoa presa não é, aparentemente, culpada. Afastada a autoria, tendo sido constatado o erro, não recolhe o sujeito, determinando sua soltura. É a excepcional hipótese de se admitir que a autoridade policial relaxe a prisão. Ao proceder desse modo, pode deixar de dar voz de prisão ao condutor, porque este também pode ter-se equivocado, sem a intenção de realizar prisão ilegal. Instaura-se, apenas, inquérito para apurar, com maiores minúcias, todas as circunstâncias da prisão.

 

            Em sentido contrário, outra parte da doutrina entende que ao constatar a ilegalidade da prisão, a autoridade não ratificará a prisão em flagrante, é dizer, a prisão em flagrante sequer se completará, tendo em vista que ela se completa com a lavratura do auto de prisão em flagrante e com o recolhimento ao cárcere do conduzido, ou seja, a prisão em flagrante se aperfeiçoa com a captura, condução coercitiva, confecção do auto e encarceramento.

 Defende, ainda, que o relaxamento da prisão ilegal está previsto no artigo 5º, inciso LXV da Constituição Federal: “a prisão ilegal será imediatamente relaxada pela autoridade judiciária” e, que, portanto, constitui reserva de jurisdição, ou seja, apenas a autoridade judiciária tem competência para fazê-lo. Neste sentido, ensina Renato Brasileiro de Lima (2014, p.880):

 

A nosso ver, não se trata propriamente de relaxamento da prisão em flagrante. A uma porque, como ato complexo que é, a prisão em flagrante somente estará aperfeiçoada após a captura, condução coercitiva, lavratura do auto e recolhimento à prisão, sendo inviável falar-se em relaxamento da prisão em flagrante se todas essas fases ainda não foram cumpridas. Ademais, a própria Constituição Federal, ao se referir ao relaxamento da prisão ilegal, deixa claro que somente a autoridade judiciária tem competência para fazê-lo (CF, art. 5, LXV). Enxergamos, pois, no art. 304, §1°, do CPP, não uma hipótese de relaxamento da prisão em flagrante, mas sim situação em que a autoridade competente deixa de ratificar a voz de prisão em flagrante dada pelo condutor por entender que não há fundada suspeita contra o conduzido.

 

Parece ser mais acertado o entendimento de que a autoridade, que é responsável pela documentação da prisão, ao constatar que é ilegal, não a relaxa - pois este é um ato jurisdicional praticado num momento posterior a efetivação da prisão em flagrante - mas sim deixa de ratificá-la (lavrando o auto de prisão em flagrante negativo), não recolhendo, assim, o conduzido ao cárcere.

            Diferentemente da não ratificação da prisão em flagrante pela autoridade policial e do relaxamento da prisão ilegal, que é ato jurisdicional, se o juiz verificar que não há necessidade de conversão da prisão em flagrante em preventiva, concederá ao preso liberdade provisória, com ou sem fiança, in verbis: “Art. 310.  Ao receber o auto de prisão em flagrante, o juiz deverá fundamentadamente: III - conceder liberdade provisória, com ou sem fiança”.

            Todavia, nada impede que o juiz, ao relaxar a prisão ilegal, decrete prisão preventiva quando presentes os seus pressupostos, noutro giro, se não há motivos para a preventiva e a prisão em flagrante for legal, o juiz deverá conceder liberdade provisória, com ou sem fiança.

 

2. EXCLUDENTES DE ILICITUDE E A PRISÃO EM FLAGRANTE

 

Entende-se que o objetivo do direito positivado é conferir maior segurança na aplicação da lei, é dizer, evitar entendimentos desconexos com o ordenamento jurídico de um povo. Todavia, não se sabe por qual razão, presencia-se interpretações dos operadores do direito totalmente incoerente com o sistema jurídico, pois fazem interpretações isoladas de uma norma, é dizer, não a confrontando com as demais leis para saber qual é a vontade do legislador ao criar aquela norma.

É inconcebível uma norma determinar que se pratique certa conduta (estrito cumprimento de dever legal), ou que permita que se pratique (legítima defesa), ou incentive a praticar (exercício regular de direito), ou autorize (estado de necessidade) e ter uma outra punindo alguém que assim haja. É justamente isto o que tem acontecido, na prática, com aqueles que agem “amparado” por uma excludente de ilicitude, mais precisamente com a legítima defesa.

Imagine-se que alguém é preso em flagrante delito por qualquer um do povo (exercício regular de direito) ou por um policial (estrito cumprimento de dever legal) e é apresentado à autoridade policial, para aqueles que defendem que o delegado de polícia não pode fazer o exame das causas que excluem o crime, com base no art. 310, parágrafo único do Código de Processo Penal, em tese, tanto o primeiro (qualquer um do povo) quanto o segundo (o policial) teriam que ser presos em flagrante “delito”, pois, ao prender alguém, poderiam cometer o crime de constrangimento ilegal ou cárcere privado.

Entretanto, não é o que acontece na prática em relação a essas excludentes supracitadas (estrito cumprimento de dever legal e exercício regular de direito), até mesmo os que defendem o entendimento acima exposto, não aprovam que se deve prender alguém que age amparado por estas excludentes. É dizer, não se presencia, no caso concreto, o delegado de polícia dar voz de prisão a um policial que prendeu alguém em flagrante delito, uma vez que agiu amparado pela descriminante estrito cumprimento de dever legal. Pois, caso contrário, inviabilizar-se-iaa persecução penal.

Todavia, quando se trata de legítima defesa há divergências, então, percebe-se que a dificuldade daqueles que defendem tal entendimento é aceitar que o delegado de polícia possa analisar se o suposto autor agiu amparado pela excludente de ilicitude legítima defesa, vale dizer, comumente, depara-se com a prisão de policiais que agem em legítima defesa própria ou de terceiros sendo presos em flagrante delito, revelando-se uma monstruosidade jurídica.

 

 

2.1. NATUREZA DAS EXCLUDENTES PENAIS

 

A ilicitude ou antijuridicidade (alguns doutrinadores preferem o uso deste termo), na estrutura do crime, levando-se em conta o seu conceito analítico, é o segundo elemento e traduz uma relação de contrariedade entre o fato típico e o ordenamento jurídico como um todo. Nas lições de Rogério Greco (2015, p.369):

 

Ilicitude, ou antijuridicidade, é a relação de antagonismo, de contrariedade entre a conduta do agente e o ordenamento jurídico. Quando nos referimos ao ordenamento jurídico de forma ampla, estamos querendo dizer que a ilicitude não se resume a matéria penal, mas sim que pode ter natureza civil, administrativa, tributária etc. Se a conduta típica do agente colidir com o ordenamento jurídico penal, diremos ser ela penalmente ilícita.

 

Para se chegar ao exame da ilicitude, primeiro verifica-se se a conduta é típica, pois caso contrário, tratar-se-á de um indiferente penal. Há várias teorias que discutem a relação da tipicidade com a ilicitude, sendo adotada pela legislação brasileira a teoria da ratio cognoscendi ou da indiciariedade, é dizer, ao concluir que o fato é típico, há uma presunção que ele também é ilícito, logo, a defesa é que deve provar que o autor da conduta criminosa agiu amparado por uma excludente de ilicitude. Nas palavras de Rogério Sanches Cunha (2013, p.233), in verbis:

 

De acordo com a doutrina majoritária, o Brasil seguiu a teoria da indiciariedade ou da ratio cognoscendi. Assim, provada a tipicidade, há indícios de ilicitude (ou antijurididdade). Essa suspeita provoca uma consequência importante: o ônus da prova sobre a existência da causa de exclusão da ilicitude é da defesa (de quem alega).

 

Todavia, percebe-se que não é razoável – não obstante a legislação penal ter adotado a teoria da indiciariedade, é dizer, cabendo o ônus da prova à defesa – a acusação, mesmo diante de provas contundentes de que o autor do suposto delito agiu acobertado por alguma causa de justificação, ainda, assim, oferecer a denúncia e, por conseguinte, pedir a condenação do acusado, pois neste caso estará acusando um inocente. Afinal, os órgãos que compõem a persecução penal não podem cometer abusos na sua atuação, violando direitos humanos, mas sim atuar em busca de um objetivo maior que é o ideal de justiça. Logo, a teoria da indiciariedade deve ser temperada para que este objetivo seja alcançado.

A regra é que todo fato típico, também, seja ilícito. Sabendo que a ilicitude é antagônica ao ordenamento jurídico, vale dizer, se o fato for típico, mas a conduta é permitida pelo ordenamento jurídico (por qualquer ramo do ordenamento, direito penal, civil, administrativo), não haverá ilicitude e, por conseguinte, não haverá crime. Caso contrário, se a conduta não for permitida, haverá crime.

Isto posto, concluiu-se que a natureza das excludentes penais é de causa de exclusão de crime.

 

2.2. ESPÉCIES DE EXCLUDENTES DE ILICITUDE PREVISTAS NO CÓDIGO PENAL

 

As espécies de excludentes de ilicitude, previstas no Código Penal, estão elencadas no artigo 23, verbo ad verbum:

 

Art. 23 - Não há crime quando o agente pratica o fato:

I - em estado de necessidade; 

II - em legítima defesa;

III - em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito.

 

O conceito e os elementos do estado de necessidade estão previstos no artigo 24 do Código Penal, in litteris:

 

Art. 24 - Considera-se em estado de necessidade quem pratica o fato para salvar de perigo atual, que não provocou por sua vontade, nem podia de outro modo evitar, direito próprio ou alheio, cujo sacrifício, nas circunstâncias, não era razoável exigir-se. 

§ 1º - Não pode alegar estado de necessidade quem tinha o dever legal de enfrentar o perigo. 

§ 2º - Embora seja razoável exigir-se o sacrifício do direito ameaçado, a pena poderá ser reduzida de um a dois terços. 

 

Conforme se extrai do artigo 24, parágrafo segundo, o Código Penal Brasileiro adotou a teoria unitária ou unificadora do estado de necessidade, ou seja, o estado de necessidade será sempre justificante (estado de necessidade justificante), excluirá a ilicitude do delito, desde que a ação do necessitado seja necessária para a conservação do seu bem e o seu sacrifício não era razoável exigir-se, ou seja, esta teoria não trabalha com a ponderação de bens ou interesses, é dizer, não há comparação de valores, ou a situação reveste-se de razoabilidade, ou não há estado de necessidade. A teoria unitária não diferencia estado de necessidade justificante de estado de necessidade exculpante, assim se posiciona Fernando Capez (2015, p.295), in litteris:

 

Unitária:adotada pelo Código Penal. O estado de necessidade é sempre causa de exclusão da ilicitude. Dessa forma, para o nosso Código Penal, ou a situação reveste-se de razoabilidade, ou não há estado de necessidade. Não existe comparação de valores, pois ninguém é obrigado a ficar calculando o valor de cada interesse em conflito, bastando que atue de acordo com o senso comum daquilo que é razoável. Assim, ou o sacrifício é aceitável, e o estado de necessidade atua como causa justificadora, ou não é razoável, e o fato passa a ser ilícito.

 

No mesmo sentido ensina Rogério Greco (2015, p. 377-378):

 

Para a teoria unitária, adotada pelo nosso Código Penal, todo estado de necessidade é justificante, ou seja, tem a finalidade de eliminar a ilicitude do fato típico praticado pelo agente. Esclarecedora é a rubrica do art. 23 do Código Penal que, anunciando o tema a ser cuidado, refere-se à exclusão da ilicitude. Para essa teoria, não importa se o bem protegido pelo agente é de valor superior ou igual àquele que está sofrendo a ofensa, uma vez que em ambas as situações o fato será tratado sob a ótica das causas excludentes da ilicitude. A teoria unitária não adota a distinção entre estado de necessidade justificante e estado de necessidade exculpante. Para ela, todo estado de necessidade é justificante. Assim, se para salvar a sua vida o agente vier a causar a morte de outrem, ou mesmo na situação na qual, para garantir a sua integridade física, o agente tiver de destruir coisa alheia, não importando que a sua vida tenha valor igual à do seu semelhante, ou que a sua integridade física valha mais do que o patrimônio alheio, ambas as hipóteses serão cuidadas sob o enfoque da exclusão da ilicitude da conduta, e não sobre a ausência de culpabilidade.

                                                                                                                   

            Diferentemente da teoria unitária, a teoria da diferenciação ou diferenciadora traz a distinção entre o estado de necessidade justificante e o estado de necessidade exculpante, é dizer, esta teoria trabalha com a ponderação de bens e interesses em conflito, valorando qual deles é de maior ou menor valor. Nesta toada, estará em estado de necessidade justificante (causa de exclusão apenas da ilicitude) quem pratica determinada conduta para salvar bem próprio ou alheio de maior valor que o sacrificado.

Noutro giro, estará em estado de necessidade exculpante (causa de exclusão supralegal da culpabilidade, exclui a exigibilidade de conduta diversa) aquele que pratica determinado comportamento para salvar bem próprio ou alheio de menor ou igual valor ao sacrificado. Em suma, se o bem preservado for de maior valor que o sacrificado (estado de necessidade justificante), se o bem preservado for de menor ou igual valor ao bem sacrificado (estado de necessidade exculpante).

Este entendimento, quanto a ponderação de bens, é adotado pela Alemanha. Diversamente, na Espanha, entende-se que quando o bem preservado for de valor maior ou igual ao sacrificado, a conduta lesiva estará acobertada pelo estado de necessidade justificante. Assim pontua Fernando Capez (2015, p.295):

 

Diferenciadora ou da diferenciação: de acordo com essa teoria deve ser feita uma ponderação entre os valores dos bens e deveres em conflito, de maneira que o estado de necessidade será considerado causa de exclusão da ilicitude somente quando o bem sacrificado for reputado de menor valor. Funda-se, portanto, em um critério objetivo: a diferença de valor entre os interesses em conflito. Quando o bem destruído for de valor igual ou maior que o preservado, o estado de necessidade continuará existindo, mas como circunstância de exclusão da culpabilidade, como modalidade supralegal de exigibilidade de conduta diversa (é o que a teoria chama de estado de necessidade exculpante). Somente será causa de exclusão da ilicitude, portando, quando o bem for de maior valor. Em contraposição a esse entendimento, pode-se lembrar o caso do náufrago que sacrifica a vida do seu companheiro para poder preservar a própria, ao tomar para si a única boia. As duas vidas têm igual valor, mas, mesmo assim, pode ser invocado o estado de necessidade. A teoria diferenciadora foi adotada pelo Código Penal Militar (arts.39 e 43), mas desprezada pelo nosso CP comum. Na Alemanha, onde tal teoria é preponderante, o estado de necessidade só será considerado excludente de ilicitude quando o bem jurídico preservado tiver maior valor. Sendo este equivalente, a exclusão será da culpabilidade (dirimente) e não da antijuridicidade. Em sentido contrário, na Espanha, prevalece a posição mais ampliativa, no sentido de que o estado de necessidade exclui a ilicitude, tanto no caso de o bem salvo ser do mesmo valor, quanto na hipótese de ter maior valor do que o sacrificado. A posição espanhola parece ser mais correta, pois eliminar uma vida alheia, quando imprescindível para preservar a própria (bens de idêntico valor), não pode ser considerada conduta antijurídica, pois decorre do natural instinto de sobrevivência humana, e o que está de acordo com a ordem natural deve ser tido como justificável juridicamente. Nosso ordenamento, porém, adotou a teoria unitária (CP, art. 24, §2º), pois, ou se trata de excludente de ilicitude ou de causa de diminuição de pena.

                                                                                                                                                                            

Do conceito legal de estado de necessidade, tem-se como requisitos: perigo atual – a discussão quanto a este primeiro requisito é se além do perigo atual, pode, outrossim, incluir o perigo iminente. Compreende-se que na expressão “perigo atual”, também, está incluído a iminência do perigo. Assim preleciona Francisco de Assis Toledo (p.184-185)apud Rogério Greco (2015, p.379-380): “perigo é a probabilidade de dano. Perigo atual ou iminente (a atualidade engloba a iminência do perigo) é o que está prestes a concretizar-se em um dano, segundo um juízo de previsão mais ou menos seguro. Se o dano já ocorreu, o perigo perde a característica da atualidade.”

O segundo requisito que se extrai é que a situação de perigo não tenha sido causada voluntariamente pelo agente. Entende-se que não é admitido, traduzindo a expressão “voluntariamente”, ao agente que provoca o perigo, de forma dolosa, invocar a supracitada causa de justificação, todavia, admite-se, quando ele age culposamente.

Nas palavras de Rogério Sanches Cunha (2013, p. 237), in litteris: “De acordo com as lições da maioria, a expressão “voluntariamente” é indicativa somente de dolo, não abrangendo a culpa em sentido estrito. Assim, diante do perigo gerado por incêndio, o seu causador doloso não invocar a descriminante, mas o negligente pode”.

O terceiro requisito é a exigência de inevitabilidade do dano, ou seja, se o dano causado pelo agente for evitável, não há que se falar em estado de necessidade. Pontua Francisco de Assis Toledo (p.183-184)apud Rogério Greco (2015, p.382):

 

na situação de conflito entre bens juridicamente protegidos, o sacrifício de um deles somente está autorizado quando a salvação do outro só possa fazer-se à custa desse sacrifício. Se houver alguma possibilidade razoável de salvação do bem ameaçado, de modo que evite ou que, pelo menos, reduza o dano a bem de outrem, a inevitabilidade do dano causado, ou do dano maior, desaparece. Quem mata ou fere, para salvar-se, quando podia fugir do perigo, mesmo com desprestígio para a sua fama de homem corajoso, não se ampara na excludente de ilicitude em exame, que não se confunde, neste aspecto, com a legítima defesa.

                                                        

O quarto requisito é salvar direito próprio (estado de necessidade próprio) ou alheio (estado de necessidade de terceiro). Neste ponto não há controvérsias, quanto a autorização do titular do bem, quando este for indisponível, para que terceiros o salve da situação de perigo. Discute-se se, quando o bem for disponível, alguém possa agir sem concordância do titular do direito ameaçado. Ensina Francisco de Assis Toledo (p. 187) apud Rogério Greco (2015, p. 384): “a intervenção de terceiros, contudo, quando se trate de bens disponíveis, não pode prescindir da aquiescência do titular do direito exposto a perigo de lesão, pois, nesse caso, o titular do direito pode preferir outra solução ou até, se lhe aprouver, sofrer o dano”.

Em sentido contrário pontua Flávio Monteiro (p.315-316)apud Rogério Sanches Cunha (2013, p. 237):

 

O estado de necessidade de terceiro inspira-se no princípio da solidariedade humana. Tratando-se, porém, de bens disponíveis, alguns autores sustentam a necessidade da aquiescência do titular do direito exposto a perigo de lesão. Não procede o raciocínio, pois a vontade do terceiro em perigo, como dizia La Medica, não é tomada em consideração; é substituída pela vontade do agente, juridicamente superior. Sobremais, em muitos casos não há nem tempo para pedir a concordância do terceiro.

 

O quinto requisito trata do dever legal de enfrentar o perigo, questiona-se se está incluído o dever jurídico. Preleciona Guilherme de Souza Nucci (2009, p. 255):

 

O dever legal é o resultante de lei, considerada esta em seu sentido lato. Entretanto, deve-se ampliar o sentido da expressão para abranger também o dever jurídico, aquele que advém de outras relações previstas no ordenamento jurídico, como o contrato de trabalho ou mesmo a promessa feita pelo garantidor de uma situação qualquer. Identicamente: Bento de Faria (Código Penal brasileiro comentado, v. 2, p. 197). No prisma da ampliação do significado, pode-se citar o disposto na Exposição de Motivos da Parte Geral de 1940 (não alterada pela atual, como se vê no item 23): ‘A abnegação em face do perigo só é exigível quando corresponde a uma especial dever jurídico’. Por isso, tem o dever de enfrentar o perigo tanto o policial (dever advindo da lei), quanto o segurança particular contratado para a proteção de seu empregador (dever jurídico advindo do seu contrato de trabalho). Nas duas situações, não se exige da pessoa encarregada de enfrentar o perigo qualquer ato de heroísmo ou abdicação de direitos fundamentais, de forma que o bombeiro não está obrigado a se matar, em um incêndio, para salvar terceiros, nem o policial a enfrentar o perigo irracional somente pelo disposto no art. 24, §1º. A finalidade do dispositivo é evitar que pessoas obrigadas a vivenciar situações de perigo, ao menor sinal de risco, se furtem ao seu compromisso.

                                                                                                     

Em sentido diverso pontua Damásio E. de Jesus (2002, p. 378):

 

A disposição do art. 24, §1º, restringe a aplicação da justificativa do estado de necessidade. Em face disso, não podemos empregar a analogia nem a interpretação extensiva, uma vez que viriam prejudicar a situação do agente (in malam partem). Assim, só é excluído o fato necessário quando o sujeito tem o dever legal de enfrentar o perigo. Quando se trata de dever contratual, p. ex., pode invocar a descriminante.

                                                                                                                                   

Além dos requisitos objetivos supracitados, há um de caráter subjetivo, é dizer, o necessitado deve agir consciente de que estar amparado pela causa de exclusão de crime (estado de necessidade).

            A segunda causa de exclusão de crime prevista no artigo 23 do Código Penal é a legítima defesa e está localizada no artigo 25 do mesmo diploma com a seguinte redação: “Entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem”.

Não obstante o Estado obter o monopólio do direito de punir e de aplicar o direito ao caso concreto, é sabido que ele não pode estar em todos os lugares ao mesmo tempo, sendo assim confere ao cidadão, diante de uma agressão injusta e para manutenção da ordem jurídica, que haja em legítima defesa própria ou de terceiros.

Todavia, este direito de autodefesa, delegado pelo Estado, sofre limitações trazidas pela lei para que não se torne em vingança privada. Nas palavras de Rogério Greco (2015, p. 395):

 

Contudo, tal permissão não é ilimitada, pois encontra suas regras na própria lei penal. Para que se possa falar em legítima defesa, que não pode jamais ser confundida com vingança privada, é preciso que o agente se veja diante de uma situação de total impossibilidade de recorrer ao Estado, responsável constitucionalmente por nossa segurança pública, e, só assim, uma vez presentes os requisitos legais de ordem objetiva e subjetiva, agir em sua defesa ou na defesa de terceiros.

 

            O primeiro requisito para a configuração da legítima defesa é que a agressão seja injusta. Agressão é um comportamento humano que causa lesão ou perigo de lesão ao bem jurídico tutelado. Será injusta quando este comportamento não for abarcado pelo ordenamento jurídico. Pontua Damásio E. de Jesus (2002, p. 386):

 

Exige-se que a agressão seja injusta, contrária ao ordenamento jurídico (ilícita). Se a agressão é licita, a defesa não pode ser legítima. Assim, não comete o fato acobertado pela causa de exclusão de ilicitude quem repele uma diligência de penhora em seus bens realizada por um oficial de justiça munido de mandado judicial. A conduta do oficial, se bem que constitua agressão, não é injusta.

 

            O segundo requisito é que a agressão injusta seja atual ou iminente. Ensina Guilherme de Souza Nucci (2009, p. 258):

 

Atual é o que está acontecendo (presente), enquanto iminência é o que está em vias de acontecer (futuro imediato). Diferentemente do estado de necessidade, na legítima defesa admitem-se as duas formas de agressão: atual ou iminente. Tal postura legislativa está correta, uma vez que a agressão iminente é um perigo atual, portanto passível de proteção pela defesa necessária do art. 25. Não é possível haver legítima defesa contra agressão futura, tornando-se forma imponderável de defesa, ou passada, que configura autêntica vingança, nem tampouco contra meras provocações, pois justificaria o retorno ao tempo do famigerado duelo. Em idêntico prisma: Bento de Faria (Código penal brasileiro comentado, v. 2, p. 204).

                                                                                                                               

O terceiro requisito é o uso moderado dos meios necessários, é dizer, quem se defende de uma agressão injusta deve utilizar do meio menos gravoso a sua disposição para a repelir, todavia, necessário e moderado, ou seja, o excesso no uso do meio necessário poderá ser punível. Preleciona Rogério Sanches Cunha (2013, p. 244):

 

O legislador, com o presente requisito, quer assegurar proporcionalidade entre o ataque e a defesa. Para repelir a injusta agressão (ataque), deve o agredido usar de forma moderada o meio necessário que servirá na sua defesa (contra-ataque). Entende-se como necessário o meio menos lesivo à disposição do agredido no momento da agressão, porém capaz de repelir o ataque com eficiência. Encontrado o meio necessário, deve ser ele utilizado de forma moderada, sem excessos, o suficiente para impedir a continuidade da ofensa. É obvio que o magistrado deverá julgar esse requisito objetivamente, sem desconsiderar as condições de fato, do caso concreto.

 

O quarto requisito é a proteção do direito próprio (legítima defesa própria) ou de terceiros (legítima defesa de terceiros). Leva-se em conta o titular do bem que está sendo agredido ou prestes a sofrer a agressão. Nas palavras de Cezar Roberto Bitencourt (2008, p. 321):

 

Qualquer bem jurídico pode ser protegido pelo instituto da legítima defesa, para repelir agressão injusta, sendo irrelevante a distinção entre bens pessoais e impessoais. Considerando, porém, a titularidade do bem jurídico protegido por esse instituto, pode-se classifica-lo em: legítima defesa própria, quando o repelente da agressão é o próprio titular do bem jurídico ameaçado ou atacado, e legítima defesa de terceiros, quando objetiva proteger interesses de outrem. No entanto, na defesa de direito alheio, deve-se observar a natureza do direito defendido, pois quando se tratar de bem jurídico disponível, seu titular poderá optar por outra solução, inclusive a de não oferecer resistência.

           

            Ainda há um requisito subjetivo, qual seja, o conhecimento da situação de fato justificante, ou seja, é necessário que aquele que repele uma agressão injusta saiba que está agindo amparado pela causa de justificação da legítima defesa, pois caso contrário a sua conduta será ilícita. Pontua Rogério Greco (2015, p. 407):

 

Para que se possa falar em legítima defesa não basta só a presença de seus elementos de natureza objetiva, elencados no art. 25 do Código Penal. É preciso que, além deles, saiba o agente que atua nessa condição, ou, pelos menos, acredita agir assim, pois, caso contrário, não se poderá cogitar de exclusão da ilicitude de sua conduta, permanecendo esta, ainda, contrária ao ordenamento jurídico.

                                                                                     

            A terceira causa de exclusão de crime prevista no artigo 23, inciso III do Código Penal é o estrito cumprimento de dever legal. A lei, diferentemente da legítima defesa e do estado de necessidade, não traz o conceito desta excludente, assim coube a doutrina defini-la. Neste sentido, preleciona Fernando Capez (2015, p. 310): “causa de exclusão da ilicitude que consiste na realização de um fato típico, por força do desempenho de uma obrigação imposta por lei. Exemplo: o policial que priva o fugitivo de sua liberdade, ao prendê-lo em cumprimento de ordem judicial”.

A regra é que agem amparados por esta causa justificante os agentes públicos, contudo, a divergência na doutrina gira em torno da possibilidade do particular invocar tal excludente, no que se refere àquele que exerce função pública, há um consenso de que é possível, e àquele que não exerce? Assim pontua Flávio Monteiro de Barros (p. 343) apud Rogério Sanches Cunha (2013, p. 246):

 

O advogado processado pelo delito de falso testemunho, porque se recusou a depor sobre fatos envolvendo segredo profissional, pode invocar a justificativa do estrito cumprimento do dever legal. Se, porém, o cliente havia autorizado a revelação do segredo, o advogado que, mesmo assim, recusa-se a depor pode invocar a excludente do exercício regular de direito.

           

            Para configurar a causa de exclusão de crime supracitada é necessário que se observem dois requisitos, que haja um comando normativo determinando que se pratique certa conduta, é dizer, o dever legal deve decorrer direta ou indiretamente de lei, ou seja, o comando normativo pode constar de decreto, regulamento ou qualquer ato administrativo infralegal, desde que originários de lei. Nas palavras de Fernando Capez (2015, p. 310):

                                                                                                        

Compreende toda e qualquer obrigação direta ou indiretamente derivada de lei. Pode, portanto, constar de decreto, regulamento ou qualquer ato administrativo infralegal, desde que originários de lei. O mesmo se diga em relação a decisões judiciais, que nada mais são do que determinações emanadas do Poder Judiciário em cumprimento da ordem legal. No caso, porém, de resolução administrativa de caráter específico dirigida ao agente sem o conteúdo genérico que caracteriza os atos normativos, como, por exemplo, na hipótese de ordens de serviço específicas endereçadas ao subordinado, não há que se falar em estrito cumprimento de dever legal, mas obediência hierárquica (a ser estudada dentro da culpabilidade).

 

            O segundo requisito é que aquele que cumpre um dever legal o faça estritamente dentro dos limites legais, é dizer, aquele que ultrapassá-los, responderá pelos excessos causados e a excludente não subsistirá. Na precisa lição de CezarRoberto Bitencourt (2008, p. 325-326):

 

Em outros termos, o limite do lícito termina necessariamente onde começa o abuso, pois aí o dever deixa de ser cumprido estritamente no âmbito da legalidade, para mostrar-se abusivo, excessivo e impróprio, caracterizando sua ilicitude. Exatamente assim configura-se o excesso, pois embora o “cumprimento do dever” se tenha iniciado dentro dos limites do estritamente legal, o agente, pelo seu procedimento ou condução inadequada, acaba indo além do estritamente permitido, excedendo-se, por conseguinte. Não há, convém que se destaque, qualquer ilogicidade ou paradoxo entre o reconhecimento de estrito cumprimento de dever legal e a configuração de excesso na sua execução, tanto que o Código Penal, no art. 23, parágrafo único, com a redação determinada pela Lei n. 7.209/84, consagra a punição do excesso para todas as modalidades de excludentes. Por isso, a incompatibilidade ou impossibilidade do excesso no estrito cumprimento do dever somente poderia ser defendida antes da Reforma Penal de 1984, quando o Código Penal, na sua versão original, só o prescrevia para a hipótese da legítima defesa.

                                                                                                                     

            A quarta e última causa de exclusão de crime prevista no artigo 23, inciso III, segunda parte, do Código Penal é o exercício regular de direito. Assim como o estrito cumprimento de dever legal, a lei não trouxe o conceito de exercício regular de direito, ficando a cargo da doutrina definir esta excludente. Assim define Fernando Capez (2015, p. 311): “causa de exclusão da ilicitude que consiste no exercício de uma prerrogativa conferida pelo ordenamento jurídico, caracterizada como fato típico”.

            Estará protegido pela justificante citada acima quem age protegido por um direito subjetivo oupor uma faculdade prevista em lei em sentido amplo. Nas palavras de Julio Fabbrini Mirabete e Renato N. Fabbrini (2015, p. 175):

 

Qualquer pessoa pode exercitar um direito subjetivo ou faculdade previsto na lei (penal ou extrapenal). É disposição constitucional que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma senão em virtude de lei (art. 5º, inciso II, da CF), excluindo a antijuridicidade nas hipóteses em que o sujeito está autorizado a esse comportamento. Há exercício regular de direito na correção dos filhos pelos pais, na prisão em flagrante por particular, no penhor forçado (art. 1.470 do CC), na defesa em esbulho possessório recente (art. 1.210, § 1º do CC), no expulsar, ainda que usando a força, pessoas que entram abusivamente ou permanecem em escritório, clube ou outro local em que lhe está vedado o acesso etc. Não age o sujeito ativo por dever, como na justificativa anterior, mas exercita uma faculdade de agir conforme o Direito. Prevê a lei penal, na Parte Especial, casos específicos de exercício regular de direito: a “imunidade judiciária” (art. 142, inc. I); o direito de crítica (art. 142, inc. II); a coação para evitar suicídio ou para a prática de intervenção cirúrgica (art. 146, § 3º) etc.

 

            Assim como nas demais excludentes penais, o excesso no exercício regular de direito poderá ser punido, devendo aquele que age acobertado por esta excludente respeitar os limites legais impostos. Ensina Cezar Roberto Bitencourt (2008, p. 326):

 

Regular será o exercício que se contiver nos limites objetivos e subjetivos, formais e materiais impostos pelos próprios fins do Direito. Fora desses limites, haverá o abuso de direito e estará, portanto, excluída essa causa de justificação. O exercício regular de um direito jamais poderá ser antijurídico. Deve-se ter presente, no entanto, que a ninguém é permitido fazer justiça pelas próprias mãos, salvo quando a lei permite (art. 345 do CP).

 

Após fazer uma breve explanação sobre as excludentes previstas no Código Penal, passar-se-á ao estudo da incidência das excludentes no auto de prisão em flagrante.

 

 

2.3. INCIDÊNCIA DAS EXCLUDENTES NO AUTO DE PRISÃO EM FLAGRANTE: EXEMPLOS.

 

            A incidência das excludentes penais no auto de prisão em flagrante acontece com frequência, sobretudo, quando se trata daquele que prende alguém em flagrante delito. Se for policial (estrito cumprimento de dever legal) o que é mais comum na prática, se for qualquer um do povo (exercício regular de direito) o que é não é comum.

            Percebe-se que, em relação às excludentes supracitadas, até mesmo aqueles que defendem que o delegado de polícia não pode analisar as excludentes de ilicitude na prisão em flagrante, entendem que, nestes casos supramencionados, não haverá crime, ou seja, não se presencia o delegado prender um policial em flagrante que conduziu um delinquente até a delegacia, pois, em tese, aquele comete um fato típico (constrangimento ilegal ou cárcere privado), todavia a sua conduta está acobertada por uma causa de justificação.

Pode-se citar Guilherme de Souza Nucci (2015, p.560), que é contra o exame das causas de exclusão de crime pela autoridade policial, que ao criticar a redação do artigo 304, parágrafo 1º do Código Penal, escreve:

 

Excepcionalmente, no entanto, pode ocorrer a situação descrita no § 1.º do art. 304, isto é, conforme o auto de prisão em flagrante desenvolve-se, com a colheita formal dos depoimentos, observa a autoridade policial que a pessoa presa não é, aparentemente, culpada. Afastada a autoria, tendo sido constatado o erro, não recolhe o sujeito, determinando sua soltura. É a excepcional hipótese de se admitir que a autoridade policial relaxe a prisão. Ao proceder desse modo, pode deixar de dar voz de prisão ao condutor, porque este também pode ter-se equivocado, sem a intenção de realizar prisão ilegal. Instaura-se, apenas, inquérito para apurar, com maiores minúcias, todas as circunstâncias da prisão.

 

            Compreende-se que o autor supracitado defende que a autoridade policial deve relevar o erro daquele que prendeu alguém de forma ilegal, é dizer, quando não há o dolo em realizar a prisão ilegal. Logo, se o doutrinador mencionado faz uma interpretação para mais, entende-se que, apesar de não estar expresso em seu livro, muito menos defenderá que o delegado de polícia deva prender quem age em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito. Nesta toada, é difícil imaginar um entendimento em sentido contrário e se tivesse certamente não iria prevalecer, uma vez que inviabilizaria a persecução criminal.

            O estado de necessidade é uma excludente não muito comum de acontecer na prática. Já a legítima defesa é uma causa de justificação que ocorre com mais frequência no cotidiano das pessoas, sendo assim tem grande incidência no Auto de Prisão em Flagrante. É justamente quanto a esta justificante, pelo que se percebe, que há resistência por parte de alguns operadores do direito em aceitar que a autoridade policial a identifique, quando evidente, e, assim, deixe de ratificar a voz de prisão àquele que agiu amparado por ela, ou seja, o mesmo raciocínio quanto as demais excludentes (estrito cumprimento de dever legal, exercício regular de direito) deve ser aplicado aqui, é dizer, quem age amparado por qualquer uma das excludentes elencadas no artigo 23 do Código Penal não comete crime e, portanto, é inocente.

            Imagine um policial que avista “B” com uma arma apontada para “A” prestes a ceifar a sua vida, conforme o artigo 13, parágrafo 2º, alínea a, do Código Penal, ele tem o dever de agir, portanto não tem escolha, saca sua arma e dispara contra “B” para repelir a injusta agressão perpetrada contra “A”, vindo “B” a morrer em razão do disparo. Pode-se dizer que o policial agiu amparado por duas excludentes de ilicitude: estrito cumprimento de dever legal, pois tinha o dever legal de agir e legítima defesa de terceiros.

Num primeiro momento, o policial será capturado e conduzido até a presença do delegado de polícia, vale dizer, não é razoável exigir, daqueles que participam das duas primeiras etapas da prisão em flagrante, exame das causas justificantes, mas sim da tipicidade da conduta, tendo em vista que qualquer um do povo pode prender alguém em flagrante, logo, não tem conhecimento jurídico para tanto e no caso dos agentes policiais (civis ou militares), sendo mais comum a prisão em flagrante ser realizada por eles, outrossim, por enquanto, não exige formação acadêmica em Direito para ingresso na carreira, exigindo-se, do mesmo modo, apenas análise da tipicidade.

 Num segundo momento, a análise da prisão em flagrante será feita pelo delegado de polícia de quem se exigiu formação em ciência jurídica para a ocupação do respectivo cargo, ou seja, ele detém todo o conhecimento técnico para analisar todos os substratos do crime, portanto, ao colher os depoimentos do condutor, das testemunhas e perceber que o policial agiu acobertado pelas excludentes supracitadas, ele não deve ratificar a prisão em flagrante, pois caso contrário recolherá ao cárcere um inocente. Consoante se extrai do artigo 2º, parágrafo 6º da Lei n. 12.830/13:

 

Art. 2º As funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais exercidas pelo delegado de polícia são de natureza jurídica, essenciais e exclusivas de Estado.

§ 6º O indiciamento, privativo do delegado de polícia, dar-se-á por ato fundamentado, mediante análise técnico-jurídica do fato, que deverá indicar a autoria, materialidade e suas circunstâncias.

 

            Conforme se lê, a autoridade policial exerce atividade jurídica, portanto, está apta a fazer uma análise técnica do fato concreto, examinando os substratos do crime, para decidir ou não pela ratificação da prisão em flagrante.

 

 

3. ANÁLISE DAS EXCLUDENTES DE ILICITUDE PELO DELEGADO

 

Em observância aos direitos/princípios fundamentais/humanos, tais como a dignidade da pessoa humana, liberdade, legalidade, segurança jurídica, a autoridade policial, quando apresentado alguém preso em flagrante, deve fazer o controle da legalidade da prisão, é dizer, este controle não deve ser feito de forma perfunctória, deve o delegado analisar todas as circunstâncias do caso concreto para decidir ou não pela ratificação da prisão em flagrante.

Não se concebe a ideia de que o delegado de polícia deva fazer somente a análise da tipicidade da conduta, tendo em vista que o crime é um fato típico, ilícito e culpável. Logo, se o fato é típico, mas não é contrário ao direito, ou seja, não é ilícito, não há delito, é dizer, não há que se falar em prisão em flagrante delito. Recolher ao cárcere alguém que age amparado por uma causa de justificação é uma afronta grave à Constituição Federal de 1.988, pois encarcerar-se-á um inocente. Nas palavras de Luiz Flávio Gomes; Alice Bianchini e Flávio Daher (2015, p. 5-6), in litteris:

 

O direito penal do Estado Democrático de Direito (conjunto de normas que definem os crimes e as penas e fixam os limites do poder punitivo do Estado) não se confunde com o poder punitivo estatal (que é o exercício do ius puniendi de acordo com as regras e os princípios estabelecidos nas leis, constituição e tratados internacionais) nem muito menos com o estado policialesco (que é o exercício do poder punitivo fora ou além dos limites estabelecidos pelas normas do Estado Democrático de Direito). O poder punitivo estatal é um fato da realidade (e do direito). Quando exercido fora dos parâmetros fixados pelo Estado de Direito, ele se converte em atos policialescos, passíveis de anulação e, eventualmente, de sanção. É de se lamentar a distância que existe o que está programado pelas normas (limitadoras) do Estado de Direito e o que acontece na prática por força do estado policialesco (que significa a aplicação, ilegal inconstitucional ou desproporcional ou desarrazoada do direito vigente). Não existe Estado de Direito puro (Zaffaroni), é verdade. Todos são perturbados pelos estados policialescos (em maior ou menor grau). Isso comprova que o poder punitivo é inequívoca e tendencialmente bruto, atavicamente expansivo, animalesco, autoritário, arbitrário ou tirânico. O estado policialesco é fonte de deslegitimação dos órgãos encarregados da aplicação da lei penal.

                                                                                                                                    

            Feitas estas considerações, passar-se-á ao estudo dos controvérsias que envolvem o artigo 310, parágrafo único do Código de Processo Penal.

                                                                                                                                  

 

3.1.O PROBLEMÁTICO ARTIGO 310, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL

                          

            As divergências doutrinárias (se o delegado de polícia tem ou não atribuição para examinar as justificantes na prisão em flagrante) giram em torno do artigo 310, parágrafo único do Código de Processo Penal, verbo ad verbum:

 

Art. 310. Ao receber o auto de prisão em flagrante, o juiz deverá fundamentadamente:

Parágrafo único. Se o juiz verificar, pelo auto de prisão em flagrante, que o agente praticou o fato nas condições constantes dos incisos I a III do caput do art. 23 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, poderá, fundamentadamente, conceder ao acusado liberdade provisória, mediante termo de comparecimento a todos os atos processuais, sob pena de revogação.

                                                                                                             

            Veja-se que em momento algum a redação legal supramencionada proíbe o delegado de polícia de fazer a análise das excludentes de ilicitude na prisão em flagrante. O que se compreende é que caso a autoridade policial não se convença de que o suposto delinquente agiu amparado por uma causa de justificação e, assim, remeter o APFD (Auto de Prisão em Flagrante Delito) ao juiz competente, e este vislumbrar que a conduta estava acobertada por uma excludente, concederá ao indiciado liberdade provisória.

Contudo, é inegável que o legislador poderia, com a alteração feita ao artigo 310, parágrafo único do Código de Processo Penal pela Lei nº 12.403 de 2011, acabar com a celeuma que envolve esta norma, colocando de forma expressa o dever do delegado de polícia de examinar as causas de justificação na prisão em flagrante. Nas palavras de Eduardo Luiz Santos Cabette[1]:

Considera-se que o legislador certamente perdeu a oportunidade de colmatar essa lacuna odiosa, concedendo de maneira expressa à Autoridade Policial o poder de avaliar a presença de excludentes de criminalidade e dispensar a lavratura do Auto de Prisão em Flagrante e, principalmente, a custódia do cidadão. Ciente de que os Juízes não estão à disposição 24 horas tal qual os Delegados de Polícia, também Bacharéis em Direito, com formação jurídica, deveria o legislador haver aproveitado para fazer essa mudança profícua em prol dos direitos e garantias individuais, bem como da dignidade da pessoa humana, impedindo que um inocente (ao menos com grande aparência nesse sentido) seja encarcerado, nem mesmo por um segundo sequer, o que não ocorre mediante uma interpretação gramatical e fria do artigo 310, Parágrafo Único, CPP e do antigo artigo 310, “caput”, CPP.

 

            Parte da doutrina faz uma interpretação restritiva da norma em comento, alegando que cabe somente ao magistrado analisar as excludentes de ilicitude, depois de receber o Auto de Prisão em Flagrante, o que é um equívoco, uma vez que o artigo mencionado tutela direitos fundamentais, é dizer, o objetivo do artigo 310, parágrafo único do Código de Processo Penal é tutelar a liberdade de alguém que não cometeu nenhum delito, pois agiu amparado por uma justificante, logo, constitui-se tal entendimento numa flagrante inconstitucionalidade. Ao explicar a possibilidade da autoridade policial relaxar a prisão em flagrante, descreve Guilherme de Souza Nucci (2014, p. 565):

 

Afastada a autoria, tendo constatado o erro, não recolhe o sujeito determinando sua soltura. É a excepcional hipótese de se admitir que a autoridade policial relaxe a prisão. Ao proceder desse modo, pode deixar de dar voz de prisão ao condutor, porque este também pode ter-se equivocado, sem a intenção de realizar prisão ilegal. Instaura-se, apenas, inquérito para apurar, com maiores minúcias, todas as circunstâncias da prisão. Note-se que isso se dá no tocante à avaliação da autoria, mas não quando a autoridade policial percebe ter havido alguma excludente de ilicitude ou de culpabilidade, pois cabe ao juiz proceder a essa análise.

                                                                                   

            Este é o entendimento que prevalece na doutrina tradicional. Nas palavras de Eduardo Luiz Santos Cabette[2], in litteris:

 

Na temática das excludentes de antijuridicidade e sua análise na Prisão em Flagrante é necessário e urgente abordar a questão da impossibilidade de que a própria Autoridade Policial dispense a lavratura do Auto de Prisão em Flagrante quando patente a presença destas por inteligência do artigo 310, Parágrafo Único, CPP. Em geral, desde a redação anterior, pela letra fria da lei, caberia ao juiz e somente a ele, analisar a questão da presença ou não de excludentes aparentes de criminalidade, concedendo liberdade provisória após a lavratura do Auto de Prisão em Flagrante pela Autoridade Policial, a quem não caberia adentrar nesse mérito. Esta é inclusive a lição encontrável da doutrina tradicional. Espínola Filho, por exemplo, afirma que nessas condições cabe somente à Autoridade Policial prender em flagrante e apresentar o Auto de Prisão o mais rápido possível ao magistrado para este delibere sobre a concessão da liberdade provisória. Do mesmo entendimento comunga Tornaghi, alegando que a legislação brasileira foi prudente ao vedar a análise das excludentes pela Autoridade Policial executora do flagrante, devendo realmente tal mister caber somente ao Juiz. À Autoridade Policial só restaria comunicar a prisão ao magistrado, o qual procederia a devida avaliação.

 

            Outra parte da doutrina entende que é perfeitamente possível que a autoridade policial analise as excludentes na prisão em flagrante, desde que estas sejam notórias, o que se verificará com as informações colhidas. Vale dizer, na dúvida, deve-se ratificar a prisão em flagrante, pois nesta fase vigora o princípio do in dubio pro societate. Preleciona Fernando Capez (2014, p. 251):

 

O auto somente não será lavrado se o fato for manifestamente atípico, insignificante ou se estiver presente, com clarividência, uma das hipóteses de causa de exclusão da antijuridicidade, devendo-se atentar que, nessa fase, vigora o princípio do in dubio pro societate, não podendo o delegado de polícia embrenhar-se em questões doutrinárias de alta indagação, sob pena de antecipar indevidamente a fase judicial de apreciação de provas; permanecendo a dúvida ou diante de fatos aparentemente criminosos, deverá ser formalizada a prisão em flagrante.

                                                                                        

            Na mesma esteira Silvio Maciel (pág. 139) apud Francisco Sannini Neto[3]:

 

A verdade é que o Delegado de Polícia – autoridade com poder discricionário de decisões processuais – analisa se houve crime ou não quando decide pela lavratura do Auto de Prisão. E ele não analisa apenas a tipicidade, mas também a ilicitude do fato. Se o fato não viola a lei, mas ao contrário é permitido por ela (art. 23 do CP) não há crime e, portanto, não há situação de flagrante. Não pode haver situação de flagrante de um crime que não existe (considerando-se os elementos de informação existentes no momento da decisão da autoridade policial). O delegado de Polícia analisa o fato por inteiro. A divisão analítica do crime em fato típico, ilicitude e culpabilidade existe apenas por questões didáticas. Ao delegado de polícia cabe decidir se houve ou não crime. E o art. 23, I a III, em letras garrafais, diz que não há crime em situações excludentes de ilicitude.

 

Entende-se que a função essencial do juiz é garantir a efetividadedos direitos fundamentais previstos na Constituição Federal de 1.988. Logo, o magistrado se apresenta no contexto da interpretação e aplicação das leis penais e processuais penais como garantidor, ou seja, não pode permitir violações ou ameaças aos direitos fundamentais, os quais são inerentes a todos os cidadãos.

            Como bem sustenta Aury Lopes Jr. (2014, p. 197): “Essa é a posição que o juiz deve adotar quando chamado a atuar no inquérito policial: como garante dos direitos fundamentais do sujeito passivo”. Este, conforme explicação do aludido autor, no contexto do processo penal, é o réu, aquele contra quem recaem os diferentes constrangimentos e limitações impostas pelo poder estatal.

            Neste diapasão, influi-se que o juiz não pode corroborar com entendimentos, interpretações que afrontam os direitos consagrados como indispensáveis ao ser humano como a vida, a liberdade, a intimidade, a honra, a imagem.

            Isto posto, não é razoável que o juiz, como garantidor, permita ou exija que o delegado de polícia, ao deparar com uma situação de um possível flagrante delito, não avalie, quando for patente, a presença de uma descriminante da suposta conduta criminosa, sob pena da autoridade policial efetivar uma prisão ilegal.            

 

3.2 ARTIGO 282 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL E A ANÁLISE DAS EXCLUDENTES PELO DELEGADO

           

            O título IX do livro I do Código de Processo Penal trata da prisão, das medidas cautelares e da liberdade provisória, onde está localizado o instituto da prisão em flagrante, mais precisamente dos artigos 301 a 310 do Código de Processo Penal.

            O título supramencionado inicia-se com o artigo 282 que traz expressamente os princípios da necessidade, da adequação e implicitamente o princípio da proporcionalidade em sentido estrito. Vale dizer, estes princípios na verdade constituem subprincípios do princípio da proporcionalidade em sentido lato.

            O princípio da proporcionalidade, em sentido amplo, visa informar ao operador do Direito, sobretudo em matéria de Direito Penal e Processual Penal, que ele deve sopesar os valores em conflito para que aplique a lei de forma justa, é dizer, este princípio trabalha com o garantismo negativo (proibição de excesso do Estado em relação ao indiciado/acusado) e o garantismo positivo (proibição de proteção insuficiente por parte do Estado à coletividade). Nas palavras de Renato Brasileiro de Lima (2014, p. 782), in verbis:

 

Afinal, não se pode perder de vista que o princípio da proporcionalidade possui um duplo espectro, representado por um âmbito negativo – de proteção contra o excesso –e por um âmbito positivo – de proibição de ineficiência, também chamado de vedação da proteção deficiente.

 

            O princípio da necessidade está previsto no artigo 282, inciso I do Código de Processo Penal, com a seguinte redação:

 

Art. 282. As medidas cautelares previstas neste título deverão ser aplicadas observando-se a:

I – necessidade para aplicação da lei penal, para a investigação ou a instrução criminal e, nos casos expressamente previstos, para evitar a prática de infrações penais.

 

            Ensina-se o subprincípio, acima mencionado, que o aplicador do direito deve escolher a medida menos onerosa ao direito fundamental (liberdade de locomoção) para alcançar o resultado pretendido. Nas palavras de Renato Brasileiro de Lima (2014, p. 783):

 

O segundo requisito (ou subprincípio) da proporcionalidade é o da necessidade. Por força dele, entende-se que, dentre várias medidas restritivas de direitos fundamentais idôneas a atingir o fim proposto, deve o Poder Público escolher a menos gravosa, ou seja, aquela que menos interfira no direito de liberdade e que ainda seja capaz de proteger o interesse público para o qual foi instituída. A título de exemplo, caso seja necessário o reconhecimento pessoal do investigado, tanto será idônea uma mera intimação para comparecimento à Delegacia, quanto a decretação de sua prisão temporária. Sem embargo de ambas as medidas, é evidente que, ante a diferença do grau de constrição à liberdade de locomoção, deve o juiz optar pela menos gravosa.

 

            O subprincípio da adequação tem previsão no artigo 282, inciso II do Código de Processo Penal, in verbis:

 

Art. 282. As medidas cautelares previstas neste Título deverão ser aplicadas observando-se a:

II – adequação da medida à gravidade do crime, circunstância do fato e condições pessoais do indiciado ou acusado.

                                                                                                                                    

Depreende-se que, por força do subprincípio supracitado, só será adequada uma medida restritiva à liberdade de locomoção, quando ela for indispensável para se alcançar o resultado pretendido. Preleciona Renato Brasileiro de Lima (2014, p. 783), in litteris:

 

O primeiro requisito intrínseco ao princípio da proporcionalidade em sentido amplo é o da adequação, também denominado de princípio da idoneidade ou da conformidade. Por força da adequação, a medida restritiva será considerada adequada quando for apta a atingir o fim proposto. Não se deve permitir, portanto, o ataque a um direito fundamental se o meio adotado não se mostrar apropriado à consecução do resultado pretendido.

                                                                 

            Pode-se extrair, implicitamente, o subprincípio da proporcionalidade em sentido estrito da redação do artigo 282, inciso II do Código de Processo Penal: “II – adequação da medida à gravidade do crime, circunstâncias do fato e condições pessoais do indiciado ou acusado”.

            Este subprincípio, após feito o juízo de adequação e necessidade, revela que os profissionais do Direito, que representam o Estado, devem aferir se a medida imposta é proporcional aos danos causados aos direitos fundamentais, ou seja, se o ônus imposto ao indiciado/acusado é proporcional ao resultado que se pretende alcançar, logo, deve prevalecer, dentre os valores em conflito (garantia da persecução penal x liberdade), o valor que preponderar. Ensina Renato Brasileiro de Lima (2014, p. 783-784):

                                                   

O terceiro subprincípio – proporcionalidade em sentido estrito – impõe um juízo de ponderação entre o ônus imposto e o benefício trazido, a fim de se constatar se se justifica a interferência na esfera dos direitos dos cidadãos. É a verificação da relação de custo-benefício da medida, ou seja, da ponderação entre os danos causados e os resultados a serem obtidos. Assim, por força do princípio da proporcionalidade em sentido estrito, entre os valores em conflito -  o que impele a medida restritiva e o que protege o direito individual a ser violado – deve preponderar o de maior relevância. Há de se indagar, pois, se o gravame imposto ao titular do direito fundamental guarda relação de proporcionalidade com a importância do bem jurídico que se pretende tutelar. Essa verificação supõe que se apresenta ao juiz uma situação concreta em que, já assentadas a adequação e a necessidade, seja necessário ainda analisar se o sacrifício a ser imposto ao direito fundamental guarda uma relação razoável e proporcional com a relevância do interesse estatal que se pretende assegurar. Para tanto, devem ser utilizadas as técnicas de contrapeso de bens e valores, de forma a escolher a medida mais justa nas circunstâncias do caso, o que, no terreno processual penal, implica resolver a tensão entre os interesses estatais relacionados à persecução e as garantias do acusado. Em sede de medidas cautelares de natureza pessoal, tem-se que a medida somente será legítima quando o sacrifício da liberdade de locomoção do acusado for proporcional à gravidade do crime e às respectivas sanções que previsivelmente venham a ser impostas ao final do processo. Isso porque seria inconcebível admitir-se que a situação do indivíduo ainda inocente fosse pior do que a da pessoa já condenada.

 

            Diante de tudo até aqui exposto, e considerando que estes princípios se aplicam a prisão em flagrante, compreende-se que a autoridade policial, que ratifica a prisão em flagrante de alguém que, com clarividência, agiu amparado por uma excludente de ilicitude, fere os princípios estudados acima, pois a medida não é adequada, uma vez que o fim pretendido é o posterior arquivamento do inquérito policial, outrossim não é necessária, tendo em vista que a única medida cabível nesta hipótese é a não ratificação da prisão em flagrante e, por fim, não é proporcional, pois a ofensa aos direitos fundamentais do cidadão  não se justifica, uma vez que encarcerar-se-á um inocente.

 

3.3.POSIÇÃO DOS TRIBUNAIS SOBRE O TEMA

 

            No que tange à justiça comum, os Tribunais ainda não se posicionaram sobre o tema. Todavia, há julgado do Tribunal de Justiça Militar de Minas Gerais no sentido de que é legal, pela autoridade de polícia judiciária militar,o examedas causas de justificação na prisão em flagrante, o que vale ser citado, tendo em vista que o raciocínio é o mesmo, ou seja, a estrutura do crime comum e do crime militar é a mesma. Pode-se citar o habeas corpus de processo nº 0001675-89.2014.913.0000[4]. Vale mencionar a parte do julgado em que o Meritíssimo Juiz Fernando Galvão da Rocha, em seu voto, concedeu ordem para trancar a ação penal, in litteris:

 

A discussão que ora nos ocupa se resume a saber se o agente, na condição de Comandante da unidade militar e presidente do APF, poderia ter deixado de impor a prisão em flagrante dos militares conduzidos por considerar a existência de excludentes de ilicitude. O § 2º do art. 247 do CPPM não deixa dúvida acerca do dever da autoridade, militar ou judiciária, de não efetuar a prisão em flagrante por fato que não se apresente como crime militar.

 

 

CONCLUSÃO

           

De tudo posto nesta monografia, depreende-se que o delegado de polícia não só pode, mas deve examinar as excludentes de ilicitude na prisão em flagrante.

Vale sempre registrar que o Estado, usando do seu monopólio de punir, não pode transpor os limites impostos pela lei. Vale dizer, sendo o crime um fato típico, ilícito e culpável, uma análise somente da tipicidade da conduta não pode defini-la como criminosa. Logo, ao ser apresentado um suposto delinquente à autoridade policial, esta deve ir mais além e analisar a ilicitude do fato, ou seja, se o fato é típico, mas não é contrário ao ordenamento jurídico, mas sim permitido por este, ele não será ilícito e, por conseguinte, não haverá crime.

Percebe-se que há uma incongruência muito grande daqueles que defendem que o delegado de polícia deve fazer somente o juízo da tipicidade da suposta conduta criminosa, pois, conforme análise nos capítulos anteriores, não se vê nenhum doutrinador defender que o delegado de polícia deva prender o policial que conduziu um delinquente preso em flagrante,uma vez que a conduta do policial é típica (constrangimento ilegal ou cárcere privado), tendo em vista que, caso fosse assim, inviabilizar-se-ia a persecução criminal. Percebe-se, então, que a resistência é em relação a algumas excludentes, mais precisamente em relação a legítima defesa, uma vez que se vislumbra agentes estatais, que agem em legítima defesa própria ou de terceiros, sendo autuados e encarcerados de forma abusiva e ilegal.

O entendimento de que somente o magistrado deve examinar as causas de justificação na prisão em flagrante delito não deve prevalecer. A uma porque este entendimento põe em risco demasiado a violação de direitos fundamentais, quando da prisão ilegal de alguém, como a liberdade, a honra, a imagem, a privacidade, tendo em vista que até que ele receba o Auto de Prisão em Flagrante, o indiciado estará encarcerado. A outra porque permitir que o delegado de polícia avalie as justificantes na prisão em flagrante não trará prejuízos à persecução penal, pois, de qualquer forma, o inquérito policial será confeccionado e, posteriormente, encaminhado ao magistrado que o remeterá ao Ministério Público que poderá concordar ou não, por exemplo, com o reconhecimento de uma excludente.

Portanto, as interpretações em prol da dignidade da pessoa humana, da legalidade, da segurança jurídica, devem prevalecer.

           

           

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Sobre o autor
Dioni Barbosa Cardoso

Policial Militar em Minas Gerais, integrante do quadro da ativa. Bacharel em Direito pelas Faculdades Unificadas de Teófilo Otoni, Minas Gerais, Pós-Graduado em Ciências Penais e Segurança Pública pela Faculdade de Direito Presidente Antônio Carlos em Teófilo Otoni, Minas Gerais. Aprovado no XVIII Exame de Ordem Unificado.

Informações sobre o texto

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Mais informações

Monografia apresentada ao Curso de Direito das Faculdades Unificadas de Teófilo Otoni. Área de Concentração: Direito Penal e Direito Processual Penal. Orientador: Gylliard Matos Fantecelle.

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