SUMÁRIO: 1- INTRODUÇÃO; 2- CONCEITO; ESPÉCIES DE PROCEDIMENTO MONITÓRIO; 4- PROVA DOCUMENTAL E OBJETO DO PROCEDIMENTO MONITÓRIO; 5- PETIÇÃO INICIAL NO PROCEDIMENTO MONITÓRIO; 6- CITAÇÃO NO PROCEDIMENTO MONITÓRIO; 7- PROCEDIMENTO,NATUREZA JURÍDICA DO PROVIMENTO INICIAL E MANDADO MONITÓRIO; 8- EMBARGOS MONITÓRIOS:CONCEITO,NATUREZA JURÍDICA E PROCEDIMENTO; 9- RELEVÂNCIA PRÁTICA DA DEFINIÇÃO DA NATUREZA DOS EMBARGOS MONITÓRIOS; 10- REFERÊNCIAS.
1. Introdução
Em 1985, uma comissão nomeada pelo então Ministro da Justiça apresentou anteprojeto de modificação do CPC. Entre as inovações sugeridas, estava o procedimento monitório. Só em 1995, com a reforma do Código de Processo Civil, da qual fez parte a Lei 9.079, de 14-07-95, foram introduzidos três artigos no CPC regulando a ação monitória. O procedimento da ação monitória é chamado de procedimento monitório ou de injunção, e está regulado nos artigos 1.102 a, 1.102 b e 1.102 c.
Há uma crise na efetividade dos processos. São muitos os direitos garantidos, inclusive constitucionalmente, que não se efetivam, ou, quando muito, isso se dá após longas batalhas judiciais.
Decididamente não é por falta de instrumentos processuais que continua tão insatisfatória a situação nacional nesse terreno. Escusado insistir em que nem tudo pode ficar na dependência da atuação dos mecanismos da Justiça. Há que contar com uma ação enérgica das instâncias administrativas; e há que contar , sobretudo, com a colaboração constante dos próprios membro da comunidade. [01]
Por conta dessas dificuldades, a reforma do Código de Processo Civil importou do direito europeu o procedimento monitório, que confere ao autor, rapidamente, um título executivo judicial, sem retirar do devedor suas garantias, mas regrando sua utilização de maneira mais concentrada, dispensando o moroso processo de conhecimento.
Antes, credores que possuíam apenas começo de prova escrita teriam que enfrentar todo um processo de conhecimento para somente então poderem executar seus créditos; com a Ação Monitória, esse começo de prova escrita torna-se título executivo mediante célere e abreviado processo.
2. Conceito
"Pode-se conceituar o procedimento monitório como o procedimento especial destinado a permitir a rápida formação de título executivo judicial" [02]. Em linhas gerais, é o instrumento processual que permite ao credor de quantia certa, coisa fungível ou móvel determinada a expedição de mandado de pagamento ou de entrega de coisa. No Brasil, exige-se que o credor tenha prova material escrita (documento) da dívida, o STJ já se pronunciou a esse respeito.
A cognição é sumária, ou não - exauriente, porque o juiz expede o mandado monitório initio litis. O juiz só poderá expedir o mandado de pagamento ou de entrega de coisa após formar um juízo de probabilidade acerca da existência do direito afirmado pelo autor em sua petição inicial. O juiz tem que verificar se o documento do autor mostra que o direito por ele invocado é de existência provável. Se o juiz achar que o demandante tem o direito de crédito, ele expedirá o mandado monitório. Se achar que não, deverá indeferir a petição inicial, por falta de interesse de agir, já que o procedimento monitório não é a via processual adequada para a obtenção da tutela pretendida pelo autor.
No procedimento monitório, o contraditório é eventual. O procedimento ordinário inicia-se segundo o princípio do contraditório com a citação do demandado, o juiz só se pronuncia depois de ouvida a parte demandada. No procedimento monitório, o autor pede diretamente ao juiz a expedição do mandado monitório sem prévio contraditório, dando o juiz um prazo para o demandado, se quiser, provocar o contraditório mediante oposição. Se o demandado não se opuser, o mandado monitório adquire, ao fim do prazo, eficácia de título executivo. A eficácia imediata do título está sujeita ao não oferecimento de embargos pelo réu. Essa inversão do contraditório se dá porque o procedimento monitório é utilizado nas hipóteses em que a possibilidade de o demandado nada opor é grande.
3. Espécies de procedimento monitório
3.1 Existem duas espécies:
3.1.1 Procedimento monitório puro, adotado por quase todas as legislações do direito romano-germânico, não é aceito no Direito Brasileiro. O demandante não precisa alegar com base em documentos. O juiz analisa as alegações produzidas pelo autor, a cognição é superficial, fundada em juízo de verossimilhança. O demandado tem três opções: 1- cumprir a obrigação no prazo; 2- oferecer defesa, convertendo o mandado de pagamento em mandado de citação, passando a seguir o procedimento ordinário; 3- pode o demandado nem cumprir o mandado de pagamento, nem oferecer defesa, caso em que se forma o título executivo.
3.1.2 Procedimento monitório documental, adotado pelo Direito Brasileiro. Difere do procedimento monitório puro porque o demandante tem que fazer suas alegações baseado em prova material escrita da dívida ou crédito. "O procedimento identificado como documental encontra suas origens, ao contrário do puro, no procedimento documental-executivo desenvolvido na Idade Média, também com raízes no direito italiano". [03] O mandado de pagamento expedido pelo juiz é fundado em cognição sumária. O demandado tem as mesmas opções do réu do procedimento monitório puro, a diferença é que no procedimento monitório documental a resposta do demandado não converte o mandado de pagamento em citação, como ocorre no procedimento monitório puro. Em vez disso, o oferecimento de resposta suspende a eficácia do mandado de pagamento, convertendo o procedimento monitório em procedimento ordinário.
4. Prova documental e objeto do procedimento monitório
A prova tem que ser escrita e sem eficácia executiva, pois nosso procedimento monitório é documental. Não pode ser qualquer prova documental, ela tem que ser escrita. Não caberá, portanto, prova sonora ou visual. A prova escrita pode ser constituída de qualquer documento que mereça fé quanto à autenticidade e tenha eficácia probatória do fato constitutivo do direito, como por exemplo,
os títulos de crédito (nota promissória ,cheque) depois de prescrito o direito cambiário que corporificam. A cártula é documento que oferece excelente probabilidade da existência do crédito subjacente ainda não prescrito. Outro exemplo é a sentença meramente declaratória em que, reconhecida definitivamente a existência do direito, não se contém a criação de título executivo (v.g., a que julga improcedente uma ação declaratória de inexistência de obrigação cambial). [04].
A lei brasileira nada diz a respeito, mas o documento a ser utilizado no procedimento monitório não pode ser produzido unilateralmente pelo credor. Quanto maior a participação do devedor na construção do documento escrito, maior a sua força probatória. No entanto,
as contas expedidas pelas empresas de água, luz e telefone, os saldos bancários,com prova do contrato do correntista são também, exemplificativamente, formas hábeis de se presumir, em um primeiro momento, a existência da dívida e permitir a instauração do procedimento monitório. [05]
A prova escrita desprovida de eficácia executiva pode ser chamada de título monitório ou título injuntivo. Não é necessário que haja apenas um documento para provar o direito de crédito do demandante, podem ser juntados vários documentos que, reunidos, permitam ao juiz valorar a prova.
A prova escrita está vinculada à obrigação de: pagar dinheiro (a obrigação tem que ser líquida ); entregar coisa móvel determinada. Bens imóveis não podem ser reivindicados através do procedimento monitório. Os semoventes são bens móveis com movimento próprio, enquanto os outros bens são removidos por força alheia. Importante ressaltar que o domínio das coisas móveis não se transfere pelo contrato antes da tradição. Se o demandante objetiva, através do procedimento monitório, a entrega de determinado bem móvel que ainda se encontre com o vendedor, isso não será admitido; coisa fungível, ou seja, coisa móvel que pode ser substituída por outra da mesma espécie, qualidade e quantidade.
A obrigação tem que ser exigível, estar vencida. É assim não só no procedimento monitório, mas em qualquer outra via, exceto a meramente declaratória da existência da obrigação.
A obrigação tem que ser certa quanto à sua existência e determinada quanto ao seu objeto. Não é admitido o acertamento do débito no curso dos embargos eventualmente opostos pelo devedor.
Se faltar algum documento, ou algum não for idôneo, a petição inicial será indeferida e o processo, extinto, devendo o juiz dar oportunidade para o autor sanar o erro.
5. Petição inicial no procedimento monitório
Salvo raras exceções, o processo civil só se inicia com a demanda da parte. O autor provoca a jurisdição através de petição inicial, devendo esta estar de acordo com os artigos 282 e 283 do Código de Processo Civil. No procedimento monitório, a exordial se amoldará, no que for cabível, ao artigo 282 do CPC, que contém os requisitos da petição inicial no procedimento ordinário. O procedimento monitório nunca será instaurado de ofício, sempre começará por iniciativa da parte, desenvolvendo-se, no entanto, por impulso oficial.
A petição inicial tem que conter os documentos indispensáveis à propositura da ação. No caso do procedimento monitório, tem que ter a prova escrita da obrigação. Na sua falta, o juiz determinará sua exibição no prazo de dez dias, sob pena de indeferimento da inicial. No caso dos títulos de crédito que perderam a eficácia executiva, a petição inicial tem que vir acompanhada com o título original, não podendo ser cópia xerográfica.
Caso a petição seja indeferida pelo juiz, cabe recurso de apelação a ser interposto no prazo de quinze dias, devendo-se fazer o respectivo preparo no momento da interposição do recurso.
Deverá o juiz verificar a capacidade processual e a regularidade da representação das partes em juízo. Caso alguém seja incapaz processualmente ou não esteja devidamente representado, o juiz suspenderá o processo e dará um prazo para as partes sanarem o defeito. Indeferida a peça inicial, a parte não poderá juntar novo documento em grau de recurso para melhor fundamentar sua pretensão.
A parte não pode propor a ação sem estar representado por um advogado, salvo se tiver habilitação legal.
5.1 Requisitos
O principal requisito é a existência de prova escrita sem eficácia de título executivo. "Precisamente porque a prova escrita de que trata o art. 1.1102a não é ‘título’, e o processo monitório não é ‘paraexecutivo’, não se pode usar ‘credor’ e ‘devedor’ para designar suas partes". [06]
Tem a petição inicial que indicar o juízo ao qual é dirigida, devendo o juízo ser competente para a causa, de modo que
o juiz fiscalizará também a sua própria competência absoluta, determinando a transferência do processo para o juiz que entenda competente - Justiça Federal ou Estadual, varas especializadas (CPC,art.113,caput e par 2.). A incompetência territorial, que em princípio é eminentemente relativa, não será objeto de controle nessa oportunidade - a não ser a competência fórum rei sitae, disciplinada no art. 95 do Código de Processo Civil, porque essa é absoluta.
A inicial tem que identificar as partes, qualificando-as e fornecendo seus endereços. O autor tem que indicar o endereço do réu para que ele seja citado, mas não precisa o demandante comprovar o endereço da parte contrária.
O demandante tem que indicar os fatos e os fundamentos jurídicos do pedido. Não precisa citar os artigos de lei, pois cabe ao juiz conhecê-los.
O autor deve pedir a expedição do mandado monitório no prazo de quinze dias. O pedido imediato é a condenação do réu; o mediato é a satisfação do crédito (ordem de pagamento ou entrega de coisa ).
À causa tem que ser atribuído um valor, ainda que ela não tenha conteúdo econômico imediato. No procedimento monitório não há espaço para nenhuma fase de liquidação. A inicial tem que conter o demonstrativo do cálculo da quantia devida. A falta de indicação do valor da causa determinará o indeferimento da inicial, se o demandante não cumprir a determinação do juiz de atribuir um valor à mesma. Se o demandado quiser impugnar o valor da causa, deverá fazê-lo nos embargos, em peça autônoma.
O autor tem que indicar os meios que utilizará para provar seu direito, pois se o réu embargar, poderá haver lugar para a produção de provas.
O autor tem que requerer a citação do réu, para que ele pague ou entregue a coisa objeto do pedido dentro de quinze dias, advertindo-o de que se ele não embargar, será considerado revel e constituir-se-á, imediatamente, um título executivo judicial.
6. Citação no procedimento monitório
O réu é cientificado do mandado monitório, é nesse momento que ele toma conhecimento da demanda. O demandado é citado para pagar ou entregar a coisa objeto da ação no prazo de quinze dias.
A citação pode ser feita pelo correio, caso em que a correspondência deve ser entregue diretamente ao demandado, ou por oficial de justiça, se o autor requerer de tal forma ou a citação pelo correio não se realizar.
É controvertido se cabe citação por edital na ação monitória. Há quem diga que não pode, porque se o réu embargar, não haverá problemas, mas se não embargar, será nomeado para ele Curador Especial, e este apresentará embargos, transformando o procedimento monitório em ordinário. Segundo João Roberto Parizatto, a citação por edital não é possível. "Se a monitória for ajuizada e não se conseguir a citação do réu, por correio ou por oficial de justiça, caberá a nosso ver, a extinção do processo (CPC, art.267, IV), pela impossibilidade de se determinar à citação por edital". [07]
Não há vedação legal, o CPC só não permite a citação por edital no rito executivo. A súmula no 282 do Superior Tribunal de Justiça diz que cabe citação por edital na ação monitória.
6.1 O demandado tem quinze dias para:
6.1.1 Pagar a quantia reclamada pelo autor ou entregar a coisa objeto da ação monitória, ficando, em ambos os casos, isento do pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios. O autor deverá pagar os honorários contratuais, não tendo o advogado direito a honorários de sucumbência;
6.1.2 Oferecer embargos, que suspenderão a eficácia do mandado inicial. Se a citação não disser o prazo que o demandado tem para opor embargos, ela será nula, a menos que o réu embargue a execução e alegue outras matérias de defesa. Também
deverá constar do ofício ou mandado, ficando o réu devidamente advertido,de que não sendo efetuado o pagamento (ou a entrega da coisa) e nem oferecido embargos no prazo de quinze (15) dias, contados da forma prevista pelo art.241 do Código de Processo Civil, constituir-se-á,de pleno direito, o título executivo judicial, convertendo-se o tal mandado inicial, em mandado executivo, com o prosseguimento da ação para entrega da coisa (CPC,art.621) ou penhora (CPC,art.652), sendo o caso, quando a ação prosseguirá sob forma de execução. [08]
O comparecimento espontâneo do réu supre a falta ou nulidade da citação feita sem observância das prescrições legais. Mas se o advogado do réu ingressar aos autos sem poderes especiais para receber a citação, esta não será dispensada. Se o réu morar no exterior, a citação será feita por meio de carta rogatória.
Se a citação for feita pelo correio, o prazo de quinze dias será contado da juntada aos autos do aviso de recebimento; se por oficial de justiça, da data da juntada aos autos do mandado de citação, pagamento ou entrega.
7. Procedimento, natureza jurídica do provimento inicial e mandado monitório
O procedimento é a seqüência de atos que compõem o procedimento monitório. Inicia-se quando o autor apresenta a petição inicial em juízo. O juiz verificará se estão presentes as condições da ação e os pressupostos processuais, mandando emendá-la se for necessário. Se estiver tudo certo, o juiz vai valorar a prova escrita. Se ela não for suficiente para convencê-lo, o juiz indeferirá a petição inicial, dando antes a oportunidade de o autor apresentar novos documentos que o ajudem no seu convencimento.
A sentença extintiva não fará coisa julgada, não ficando afastada a repropositura da mesma demanda.Isso porque a decisão do juiz é fundada em mero juízo de verossimilhança.
É controvertida a natureza jurídica do provimento judicial que determina a expedição do mandado monitório. Há varias correntes doutrinárias:
Há uma corrente doutrinária que entende ser o provimento inicial um despacho de mero expediente, que o mandado monitório não possui conteúdo decisório relevante. É a única corrente que acredita não haver conteúdo decisório; todas as outras concordam que há. Essa corrente não pode ser aceita, porque o juiz exerce cognição sumária sobre as alegações do autor, e só pode determinar a expedição do mandado monitório se considerar provável a existência do direito do autor.
Há quem entenda ser o provimento judicial inicial uma decisão interlocutória, pois só existem dois tipos de provimento judicial com conteúdo decisório, que são as sentenças e as decisões interlocutórias. A sentença põe termo ao processo; por exclusão, esse provimento inicial seria uma decisão interlocutória. Mas a lei define a decisão interlocutória como "o ato pelo qual o juiz,no curso do processo, resolve questão incidente" (art 162, § 2,do CPC). Mas o mandado monitório não é um incidente processual, é parte essencial do procedimento monitório. Nesse caso, essa corrente não pode ser aceita.
A terceira corrente entende que o provimento inicial é uma decisão interlocutória com conteúdo de sentença, sendo esta definitiva ou não; isso fica a depender de o devedor opor ou não embargos. Mas não pode se aceitar que a natureza jurídica do mandado monitório dependa do comportamento do demandado posterior à expedição do mandado.
Há quem diga que o mandado monitório é um provimento judicial destinado a dirigir uma ordem ao demandado. Os doutrinadores que defendem isso tentam definir a natureza do provimento inicial por seus efeitos, e não por seu conteúdo.
A quinta corrente entende que o provimento inicial tem natureza jurídica de sentença condenatória. Essa posição é insustentável, porque a sentença é o ato judicial que põe termo ao processo, e o procedimento monitório não se encerra com a expedição do mandado monitório.
Há doutrinadores que afirmam ser o provimento inicial uma sentença condenatória condicional, o que não é admissível, já que não é aceitável a prolação de sentenças condicionais.
A última corrente doutrinária diz que o provimento preambular tem natureza de sentença liminar. "O conceito de sentença liminar é encontrado na obra de notável jurista gaúcho, que define tal espécie de pronunciamento judicial como o provimento que, emitido antes do momento propício para a prolação de sentença final, resolve o mérito da causa." [09]