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A distopia entre a eficiência e a ineficácia judicial

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11/05/2020 às 15:51
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Breve análise do cenário judiciário brasileiro, da justiça e sua composição terminológica, sobre a ótica das partes nos processos e seus resultados exitosos, tendo como contexto os dados apresentados pelos órgãos de consulta e publicidade.

Resumo: Passando uma análise do ponto de vista de quem vivencia o dia a dia e a realidade de movimentação dos diversos foros do Judiciário brasileiro, levando em conta a efetividade trazida para as partes envolvidas no aspecto processual e assim estabelecendo uma crítica sobre a divulgação de informações relacionada a eficiência da justiça. São apresentados no texto alguns aspectos introdutórios sobre esse funcionamento já retratado e a partir dessa iniciação parte-se aos estudos históricos sobre o uso do termo “justiça” e sua subdivisão nos diversos conjuntos sociais históricos, desde os usos bíblicos até a sociedade romana e a criação do aspecto do Direito. Além do panorama histórico do termo justiça, o texto faz um breve apontamento sobre o comportamento social e a assimilação que os componentes, o povo, tomam para si, e as consequências do apego exacerbado ao entendimento, levando a uma decepção e por causa disso, uma aversão a novas discussões sobre melhorias e ferramentas que visem inovar os trabalhos. Usando como base o estudo de Émile Durkhaim sobre a sociedade como um organismo formador do indivíduo, passa-se a entender melhor o motivo da decepção externada pela população quando constatado que o Poder Judiciário não é o sonho que muitos nutriam, pois, como qualquer outro, está fadado a erros e falhas, tendo que ser construído e adaptado a cada dia. Nos últimos suspiros do texto são citados e colacionados alguns trechos do relatório do Conselho Nacional de Justiça, sobre o funcionamento do Judiciário no Brasil e a demonstração do tempo de tramitação dos processos, onde se passa a entender o porquê da decepção já exemplificada, pois, ao ingressar com um processo buscando a resolução de um conflito as partes levam em conta principalmente a solução rápida para que possam usufruiu daquilo que almejam e se não houver esse êxito não há sentido em buscar esse modo de conclusão. Ao final são elencadas algumas disposições e alternativas para a população e para o próprio sistema judiciário brasileiro a fim de solucionar os dilemas existentes no atual cenário de divergências.


INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem por intuito primordial tratar de temas relevantes acerca da efetivação da justiça e da relativização dos direitos. Para isso, há que se fazer certos questionamentos e acima de tudo, buscar respondê-los. Pois, sendo presente na nossa contemporaneidade a ideia de que, para se obter um direito se faz necessário o ingresso no âmbito judicial, surge então a primeira e norteadora dúvida dessa composição textual, essa máxima difundida é realmente concretizada e objetivada ou é apenas disseminada para “encantar” a população?

São diversos os relatos de indivíduos que buscam obter a efetivação de um direito, porém, ao adentrar as portas do sistema judiciário brasileiro se veem travados diante da burocracia e consequente morosidade dos atos administrativos desse poder constitucionalmente determinado e de igual equivalência com base na teoria dos freios e contrapesos do grande Charles-Louis de Secondat, Baron de La Brède et de Montesquieu, na sua obra “O Espírito das leis”.

Quando se busca um bem jurídico ou um direito, seja ele em qualquer de suas formas, palpável ou não, a primeira circunstância que se leva em consideração é a de que o resultado será ágil ou não, e aí onde surge a necessidade do reforço do profissional, único diga-se de passagem, que pode realmente atender ou pelo menos providenciar para que sejam atendidos os anseios das partes, o advogado.

Figura essencial e indispensável à administração da justiça e a defesa do direito, advogado sempre foi e sempre será a “ferramenta”, às vezes escudo, às vezes espada, intercede um favor da sociedade e do cidadão, mesmo com os percalços de em certas situações ser maquiavelicamente transformado em vilão.

No decorrer desse texto serão abordadas diversas temáticas judiciais e extrajudiciais, comuns no dia a dia dos cidadãos e advogados, todos com reflexo e consequentes da legislação constitucional e infraconstitucional, relacionadas a obtenção ou a garantia dos direitos.

A abordagem dos diversos fatos, pretéritos e presentes, correlacionados com as já citadas legislações constitucional e infraconstitucional, terá o condão de elucidar os pontos controvertidos que surgem com bastante frequência nos meios sociais.


ORIGEM TERMINOLÓGICA E DESENVOLVIMENTO TEMPORAL DO TERMO JUSTIÇA

Para se chegar a um entendimento comum, deve ser feita uma análise sobre a justiça de uma forma generalizada, buscando seus diversos conceitos e aplicações históricas, já que a própria origem e uso do termo vem sendo desde os primórdios da formação da sociedade como conhecemos hoje, e após essa observação, buscar um exame específico do termo como relacionamos atualmente.

Usado por muitos como o conceito mais aproximado do termo, temos o patrão determinado pelo filósofo Christoph Lumer em sua obra Enciclopédia da Filosofia, dispõe o seguinte: “ Justiça é um conceito abstrato que se refere é um estado ideal de interação social em que há um equilíbrio, que por si só, deve ser razoável e Imparcial entre os interesses, riquezas e oportunidades entre as pessoas envolvidas em determinado grupo social”. LUMER, Christoph. Encyclopedia philosophy. Meiner: Hamburg 2005 (464b).

Por ser um conceito mais aproximado do entendimento geral sobre o termo, é por muitos adotado, o que também será feito nesse texto, assim, passando-se adiante a busca da origem e difusão sociais históricos.

A origem etimológica vem do latim iustitia, que pode ser relacionada a dois termos, iutus e ius, iuris. O primeiro podendo ser concernente ao adjetivo justo, e o segundo se acertando do termo direito. Portanto, o vocábulo pode tanto fazer alusão a qualidade de ser justo, como paralelamente fazer referência a ideia de um sistema legal.

Fazendo uma breve busca nos veículos de informação sobre os registros antigos e históricos, como livros ou na própria internet (ferramenta mais acessível no período de quarentena do ano de 2020, onde o mundo enfrenta sua maior adversidade do século), alguns apontamentos podem ser trazidos à mostra.

Um resumo básico pode ser transladado do endereço eletrônico https://etimologia.com.br/justica/, onde se encontram referências ao termo “justiça” na Bíblia e no Tanakh, dispondo que o judaísmo e o cristianismo têm em comum o Antigo Testamento, no qual um de seus diversos livros relatam uma decisão do Rei Salomão aplicando a “justiça” no caso de duas mulheres que disputavam a maternidade de uma criança.

No código de Hamurabi, escrito por volta de 1750 antes de Cristo, onde estão descritas as normas da civilização mesopotâmica, também há referência ao termo aqui citado bem como a origem de diversos conceitos aprendidos na faculdade de Direito como: a presunção de Inocência, a responsabilidade profissional e o aumento das penalidades segundo a gravidade dos crimes atribuídos.

Na sequência, podemos observar a referência ao termo anteriormente citado, nas leis de Manu, onde provenientes da vontade de diversas divindades, as normas regulamentam situações cotidianas da tradição hindu, em textos escritos em sânscrito.

Na última das referências históricas temos o direito romano, base do direito contemporâneo, onde observa-se a Justiça assumindo sua verdadeira interpretação em relação aos textos legais, um exemplo básico seria o ius gentium e a denominada Lei das Doze Tábuas que serviram de fundamento para o Corpus Iuris Civilis, que ficou conhecida como a jurisprudência da sociedade romana.


“DESENCANTO” CONTEMPORÂNEO COM O JUDICIÁRIO

Tomando por base esse contexto histórico e analisando a situação brasileira vigente, podemos entender que o povo, no sentido geral da palavra, amor como ideal, a justiça que resolve todos os problemas, que tem solução para tudo, aquela onde o indivíduo só procura quando tem certeza que vai obter o que deseja e que o indivíduo alvo da sua interposição se sentirá temeroso só de saber que foi promovida uma ação judicial contra si.

Porém, como faz referência o dito popular “a vida não é um mar de rosas”, a realidade quebra muitos mitos, passou do tempo em que a maioria das pessoas temia uma ação judicial, pelo menos no Brasil. No cenário nacional brasileiro, algumas peculiaridades do Poder Judiciário que antes era o queridinho da nação, fizeram reduzir em grande monta o apoio popular, são algumas delas: a morosidade, a burocracia exagerada e a corrupção.

Deve-se entender que o funcionamento do Judiciário e a aplicação da Justiça, não se dá apenas com a simples criação e difusão de leis, mas sim sendo um reflexo comportamental de uma sociedade, ou seja, tudo deve estar interligado como se fosse um organismo vivo.

Esse termo, organismo vivo, é primeiro citado pelo autor e filósofo Émile Durkheim, sendo considerado por muitos o pai da sociologia moderna, tem como carro chefe desse pensamento, o entendimento de que o indivíduo é formado e consequente da sociedade e não o contrário.

Segundo a percepção de Durkheim a forma como o indivíduo atua será sempre fruto da sociedade, pois a sociedade é que explica o homem e não o contrário, e tomando por base sua obra Regras do Método Sociológico, chega-se a três formas de agir: Exteriores (provém da sociedade e não do indivíduo); coercitivos (impostas pela sociedade ao indivíduo); e, objetivas (têm uma existência independente do indivíduo).

O pensamento de Durkheim tem sua formação baseada em diversos filósofos famosos como Augusto Comte, sendo seu principal influenciador, mas além dele podem ser apresentados Herbert Spencer, Platão, Aristóteles, entre outros. Todos serviram, de certa maneira para fundamentar a formação do seu entendimento sobre a sociedade como um organismo social, onde o indivíduo está submetido e absorve no seu íntimo aquilo que é comum aos membros. 

Guardadas as devidas proporções, o pensamento pode ser correlacionado com a obra do francês Gustave Le Bon, Psicologia das Massas (Psichologie des Foules, 1895), onde de um ponto de vista psicossocial, ou seja, centrado no comportamento das pessoas em certas circunstâncias, argumenta que quando as pessoas fazem parte de um coletivo deixam de ser elas mesmas para fazerem parte do que ele chamou "alma da massa" ou espírito coletivo diferente do espírito individual de cada um dos indivíduos que fazem parte do fenômeno.


CASUÍSTICA DA MOVIMENTAÇÃO ADMINISTRATIVA DO JUDICIÁRIO E SEUS REFLEXOS

A partir desse embasamento, parte-se aos questionamentos propostos inicialmente: A justiça, enquanto ideal de cumprimento de objetivo, realmente se presta o seu papel? Se sim, em quais situações? Se não, quais as alternativas aos membros que compõem a sociedade?

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A resolução do primeiro questionamento, se levados em conta apenas os números divulgados pelo Judiciário nas mídias sociais e televisivas, seriam extremamente positivos, pois são milhares de despachos exarados pelos magistrados, milhões de movimentações entre outras procedimentos administrativos internos, mas aí é que surge uma nova dúvida, por que a sociedade não sente essa eficiência do Judiciário?

Isso se dá por um simples fator, essas movimentações, como já dito no parágrafo anterior, são procedimentos administrativos internos e todos têm pouca relevância fática para as partes, ou seja, para quem precisa de um resultado satisfatório, esse tipo de situação é praticamente irrelevante, pois quando sujeitos a uma explicação sobre, imaginam apenas que os processos ficaram “zanzando” de mesa para mesa.

Como exemplo básico desse não atendimento das necessidades da população podem ser citados os processos ajuizados nos juizados especiais criados com a promulgação da lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995, que em teoria funcionariam como alternativa aos litigantes que desejassem obter de forma mais célere algum resultado e assim poderiam interpor ações judiciais que versassem sobre qualquer das competências dispostas no seu texto, mais especificamente no artigo 3º e seguintes.

Mas a concretização desse “tiro”, saiu pela culatra, pois a realidade é que em sua maioria, as varas de justiça e em especial aquelas do interior, que são juízos únicos, tem seus prazos ultrapassando a estimativa do razoável, em algumas ocasiões passando vários meses para a simples marcação de uma audiência de conciliação.

Ainda se observa que no artigo 27 da lei dos juizados especiais já citada, há a disposição para agilizar a audiência  de  instrução e julgamento, como dispõe:

“Art. 27.   Não  instituído  o  juízo  arbitral,  proceder-se-á  imediatamente  à  audiência  de  instrução e julgamento, desde que não resulte prejuízo para a defesa. Parágrafo  único.  Não  sendo  possível  a  sua  realização imediata, será a audiência designada para um dos quinze dias subsequentes, cientes, desde logo, as partes e testemunhas even tual-mente presentes.”

Porém, esse trecho é totalmente adverso da realidade e pode ser entendido com a leitura do relatório do Conselho Nacional de Justiça, denominado Justiça em Números, do ano de 2019, disponível no link https://www.cnj.jus.br/pesquisas-judiciais/justica-em-numeros/, onde são elencados os tempos médios de tramitação dos processos nos diversos foros do Brasil, levando em conta três indicadores: o tempo médio da inicial até a sentença, o tempo médio da inicial até a baixa e a duração média dos processo que ainda estejam pendentes.

O texto faz a devida perquirição quando afirma que para estabelecer o tempo de tramitação de um processo deve se levar em conta muitas variáveis e não se pode precisar com exatidão, mas apenas fazer uma média temporal, e diante disso são apresentados alguns gráficos e tabelas que demonstram cada seara especificamente e suas durações processuais, onde na vertical temos o tempo e na horizontal temos o ano de coleta dos dados para estabelecer uma comparação, segue-se:

Figura 1. Tempo de duração média de um processo em tramitação no primeiro grau das varas Estaduais, Federais e do Trabalho.

Figura 2. Tempo de duração média de um processo em tramitação no segundo grau dos Tribunais de Justiça Estaduais, Tribunais Regionais Federais, Tribunais Regionais do Trabalho, Tribunais Regionais Eleitorais e Tribunais de Justiça Militares.

Nessas duas figuras iniciais já podemos tomar um pouco de conhecimento sobre a realidade do Judiciário brasileiro e o porquê de muitas vezes as pessoas optarem por novas formas de resolução de conflitos, que serão abordadas ao final do texto.

Figura 3. Tempo de duração média de um processo em tramitação nos juizados especiais Estaduais e Federais.

Figura 4. Tempo de duração média de um processo em tramitação nos Tribunais Superiores.

Figura 5. Descreve o histórico de tempo médio de duração dos processos. O Conselho Nacional de Justiça observa que o tempo da inicial até a sentença e até a baixa estão em ascendência, enquanto o tempo do processo pendente diminuiu. E por esse motivo o resultado é positivo, pois significa que estão sendo solucionados casos mais antigos, reduzindo o tempo do acervo.

Esses dados, como já demonstrado nas próprias figuras, perfazem o tempo médio, porém, é aceitável esse resultado? Pois segundo o próprio relatório podem durar em sua totalidade, mais de oito anos, partindo da sua tramitação de origem até a conclusão, isso em média.

Deve-se atentar que no caso dos juizados especiais, onde o tempo deveria ser o menor possível, o prazo para participação em uma simples ação de conhecimento será em média em de nove meses, isso nos juizados especiais da seara estadual, nos juizados federais esse prazo aumenta para doze meses, mas é bom fazer referência que o relatório do Conselho Nacional de Justiça toma por base toda a cadeia do Judiciário, partindo do primeiro grau até os tribunais superiores, isso se demonstra nas figuras anexadas.

Um processo comum nos juizados especiais federais, a título de exemplo, são os processos previdenciários, em que se busca a concessão de algum tipo de benefício para um indivíduo que laborou durante um determinado período e no momento em questão necessita da cobertura da Previdência Social brasileira em virtude de estar acometido por um risco ou adversidade. Esse tipo de processo precisa de um grau de urgência maior que outros, pois geralmente pessoa que necessita do resultado tem três fatores que contam em seu desfavor, a saúde, a idade e a hipossuficiência.

Usando esse tipo de processo como exemplo, faz-se o seguinte questionamento, é justa a realidade da justiça brasileira quando nem mesmo os processos que devem correr com agilidade assim o fazem? E há alternativas para melhoria desse cenário?

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Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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