Conclusão
Com o advento da atual Carta Constitucional da República Federativa, o Brasil viu florescer um novo tempo, onde não mais seriam admitidos ataques à democracia e aos direitos individuais. Para tanto, toda estrutura estatal foi compelida à mudança e à adaptação a esses novos ditames.
No entanto, este processo de evolução e adequação não se encontra estanque ou mesmo finalizado, ao contrário, o momento é de estruturação e edificação de um novo modelo estatal brasileiro, no qual o respeito à dignidade humana deve ser a viga mestra e sustentáculo de toda atuação.
Da mesma forma, o arcabouço que compõe a persecução penal também foi conduzido a novos tempos, assumindo contornos garantistas, posicionando-se em defesa das garantias e ao lado do cidadão, não funcionando como aparelho a serviço do Estado, mas sim, empenhando-se na salvaguarda popular e na defesa do Estado Democrático de Direito.
Entretanto, atualmente, nosso ordenamento jurídico processual penal ainda causa, em especial no âmbito da atuação policial, embaraço à efetivação de garantias e direitos fundamentais do cidadão. Dentro de uma democracia constitucional deve-se abandonar a ideia do investigado figurando como mero objeto da investigação, mas como sujeito de direitos. Além dele, a vítima também deve ser protegida, assistida e ter sua voz ouvida, conferindo resposta estatal efetiva às violações, evitando que estas sejam novamente vitimizadas, desta feita pela burocracia morosa e a consequente ausência de tutela aos bens jurídicos.
A posição do Delegado de Polícia no arranjo da persecução penal brasileira coloca-o próximo ao calor dos eventos, impondo rápida, imparcial e precisa análise jurídica quando os envolvidos nos fatos ainda encontram-se severamente atingidos pelos efeitos oriundos da prática delituosa.
As primeiras deliberações exaradas pelas Autoridades Policiais produzirão enormes efeitos na vida das pessoas implicadas (vítimas, testemunhas, investigados etc.). Por essa razão, esses atos administrativos deverão encontrar lastro e fundamentação nos princípios e dispositivos basilares que norteiam o desempenho das práticas oficiais.
Portanto, o Delegado de Polícia, enquanto estudioso, aplicador da ciência jurídica, garantidor do respeito aos direitos fundamentais do cidadão, integrante das carreiras elementares ao exercício da justiça no Brasil, deve cuidar não somente da pesquisa técnica em sua área de conhecimento, mas, acima de tudo, deve buscar, a todo custo, a concretização diária do Direito no meio social em que se encontra inserido.
O Direito deve servir ao seu povo, entender seus anseios, proteger seus bens jurídicos mais caros, zelar e vigiar para que as garantias fundamentais do cidadão permaneçam intocadas, não permitindo (jamais) retrocessos sociais ou jurídicos de natureza antidemocrática.
Nesta toada, conforme expusemos, não há razão lógica ou jurídica que impeça o Delegado de Polícia de conceder a dispensa de fiança e a concessão de liberdade provisória ao preso em flagrante, quando este cidadão não puder arcar com o valor mínimo legalmente estabelecido, diante de sua hipossuficiência econômica.
Postular pelo adverso seria fomentar a latente seletividade do sistema penal brasileiro, permitindo que aquele que possui condições de proceder ao pagamento do valor arbitrado seja posto em liberdade e, de outro lado, determinando o encarceramento (ainda que por curto período) de um indivíduo tão somente por este não dispor do montante estabelecido como garantia para seu livramento condicional.
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