Dispõe a Súmula 147 do STJ:
Compete à Justiça Federal processar e julgar os crimes praticados contra funcionário público federal, quando relacionados com o exercício da função.
Entenda-se que o verbete de número 147 da Súmula daquela Corte Superior foi editado, tendo por precedentes os acórdãos proferidos por ocasião do julgamento do RHC 3.668-RJ (Relator Ministro Pedro Acioli), do Conflito de Competência 3.593-SC (Relator Ministro José Dantas) e do Conflito de Competência 1.964-DF (Relator Ministro Edson Vidigal), e apenas ratificou o entendimento já sustentado pelo verbete nº 98 da Súmula do extinto Tribunal Federal de Recursos.
A violação do serviço, para a caracterização de crime da competência da Justiça Federal, atinge o agente público federal, no exercício de suas funções, e por motivo às funções ligado. No passado, tivermos decisão do extinto Tribunal Federal de Recursos, RC 649 – SP:
“Crime contra a honra de funcionário público federal, em virtude de atos por ele praticados no exercício de suas funções.
Assim, tinha-se, antes da edição da Constituição de 1988, à luz da Súmula 98 do extinto TFR: "Compete à Justiça Federal processar e julgar os crimes praticados contra servidor público federal, no exercício de suas funções e com estas relacionadas.
Disse bem Vladimir Souza Carvalho (Competência da Justiça Federal, 2ª edição, pág. 176) que, “importante ressaltar que, não basta, para firmar a competência da Justiça Federal, para o crime cometido contra o servidor público federal, seja o delito praticado contra servidor público federal no exercício de suas funções. É preciso, para tanto, que haja relação entre a prática criminosa e as funções exercidas pelo funcionário (Ministro Costa Leite, HC 6.991 – MGS, DJU 22.10.87, pág. 22.973). Ou seja, à Justiça Federal somente compete julgar os crimes cometidos contra o servidor público federal quando o funcionário estiver no exercício de suas funções e o crime com ela se relacionar (juiz Nelson Gomes de Silva, AC 90.01.14629-5 – MT, DJU – II 25.11.91, pág. 29.777).”
Sendo assim, a competência da Justiça Federal, a teor do artigo 109, IV, da CF, se firma quando há relação entre a prática de crime e o exercício de função pública. Não basta, portanto, seja o delito praticado contra o servidor público no exercício de suas funções. É necessário que haja relação entre a prática e as funções exercidas pelo funcionário.
Dois, portanto, são os aspectos importantes para deslinde da questão: a) que o crime seja praticado contra servidor público federal no exercício de suas funções; b) com estas relacionadas (Min. José Dantas, CC 3593 – 3, SC, DJU – I 23 de agosto de 1993, pág. 16.556, extinto TFR).
Recentemente, observo o que se disse no CC 148162 – SP:
“O que norteia a fixação da competência da Justiça Federal é sempre a proteção aos interesses, serviços e bens da União e, no caso, de suas autarquias federais. Por óbvio, um delito praticado por servidor público federal no exercício de suas funções e com elas relacionado mancha a imagem do serviço público, gerando desconfiança na honestidade e higidez da máquina estatal, o que culmina em sério prejuízo ao Estado.”
Sobre o assunto, cumpre trazer à baila a lição de Renato Brasileiro de Lima:
“Em regra, crime praticado contra funcionário público federal, em razão do exercício de sua função, afeta o serviço público federal, atraindo, por conseguinte, a competência da Justiça Federal (…). Acerca do tema, o extinto Tribunal Federal de Recursos chegou a editar a súmula n. 98, segundo a qual “compete à Justiça Federal processar e julgar os crimes praticados contra servidor público federal, no exercício de suas funções com estas relacionados”. Com redação quase idêntica é a súmula n. 147 do STJ: “Compete à Justiça Federal processar e julgar os crimes praticados contra funcionário público federal, quando relacionados com o exercício da função”. Da leitura das duas súmulas, conclui-se que a condição de vítima de funcionário público federal na ativa, por si só, não desloca a competência para a Justiça Federal, sendo indispensável que haja relação entre infração penal e as funções exercidas pelo funcionário público federal (propter officium), a fim de que seja atraída a competência da Justiça Federal.” (Competência Criminal. Salvador: JusPODIVM, 2010, p. 264/265).
PENAL. CONFLITO DE COMPETÊNCIA. CRIME CONTRA A HONRA. CALÚNIA. INTERESSE PRIVADO DAS PARTES. AUSÊNCIA DE OFENSA A BENS, SERVIÇOS OU INTERESSES DA UNIÃO. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL. 1. Se o ofendido é servidor público federal e se a ofensa à sua honra decorre do exercício de suas funções, a competência para processar e julgar a ação penal é da Justiça Federal (STJ, Súmula n. 147). Não ocorre a hipótese relativamente à representação formulada por querelante, que nem sequer é servidor público, na qual se afirma ter sido ofendido pelo querelado, que o acusou de lhe ter pago uma quantia em dinheiro para prestar “afirmações inverídicas em processos trabalhistas” para favorecer uma das partes. Nesses casos, a competência para processar e julgar a causa é da Justiça estadual, pois o ato dito como delituoso não foi praticado “em detrimento de bens, serviços ou interesses da União ou de suas entidades autárquicas ou empresas públicas” (CR, art. 109, IV) 2. Conflito conhecido para declarar competente o Juízo de Direito da 2ª Vara Criminal da Comarca de Londrina/PR, ora suscitante. (CC 122.433/PR, Rel. Ministro NEWTON TRISOTTO (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/SC), TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 26/11/2014, DJe 04/12/2014).
Observo o que foi dito no CC 172.923 – DF, relator ministro Reynaldo Soares da Fonseca:
“Compete à Justiça Federal processar e julgar os crimes praticados contra funcionário público federal, quando relacionados com o exercício da função. Ao se interpretar o comando das mencionadas Súmulas, deve-se ter em mente que o que norteia a fixação da competência da Justiça Federal é sempre a proteção aos interesses, serviços e bens da União, de suas autarquias federais ou de empresas públicas federais. A mera condição de funcionário público federal, por si só, não tem o condão de atrair a competência da Justiça Federal, sendo indispensável a existência de relação entre a infração penal e as funções exercidas pelo funcionário público, de modo a caracterizar interesse direto da União.
Isso porque, ao exercer um munus público, o servidor representa a Administração e, não raras vezes, até o Estado, imbuindo-se a atividade profissional por ele desempenhada de todas as características de dignidade, honestidade, retidão, eficiência e presunção de veracidade de que se reveste o ato administrativo. Assim sendo, o ataque à pessoa do servidor ou a seu desempenho, em razão da função pública por ele desempenhada, acaba por manchar, também, a imagem do serviço público, gerando desconfiança na honestidade e higidez da máquina estatal, o que culmina em sério prejuízo ao Estado.”
Ora, mas se no momento do delito o agente público federal não está em serviço, uma ofensa a ele proferida não é matéria de competência da Justiça Comum Estadual.
Anoto, para tanto, o CC 168.259 – PR, relatora ministra Laurita Vaz, em caso de possíveis crimes de difamação e injúria que teriam sido cometidos por policial civil contra policial rodoviário federal:
“De fato, o deslocamento da competência para a Justiça Federal exige que o delito tenha cometido contra o funcionário público federal em razão do exercício de suas funções, conforme preceitua o Enunciado 147 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça, ipisis litteris: "Compete à Justiça Federal processar e julgar os crimes praticados contra funcionário público federal, quando relacionados com o exercício da função."
Na hipótese, ao que se tem dos autos, as ofensas foram motivadas por anterior desentendimento em casa noturna, no qual tanto o querelante, quanto o querelado também estavam fora do exercício da função policial.
Como destacou o parecer do Ministério Público Federal, "da leitura do Termo Circunstanciado de Ocorrência e das decisões dos juízos, suscitante e suscitado, verifica-se que G..... proferiu xingamentos contra F.... em um estabelecimento comercial, ou seja, ambos fora do exercício dos cargos de policial civil e policial rodoviário federal, e tampouco em razão da função por ele desempenhada, não incidindo, portanto, a Súmula n.º 147/STJ" (fl. 252).
Para o caso, portanto, não haveria o interesse da União na lide, ainda que indiretamente, de modo a atrair a competência da Justiça Federal.
Mas, se a ofensa se dá em razão do cargo e da função pública federal, será caso de competência da Justiça Federal para instruir e julgar ilícito.