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Compliance, diversidade e inclusão da pessoa com deficiência

Cultura de integridade na diversidade

09/10/2020 às 15:28
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A evolução do sistema de compliance permite a ampliação do horizonte para além de políticas de prevenção de atos de corrupção e fraude. O compromisso com a integridade compreende a adoção de uma cultura organizacional em prol da diversidade e inclusão.

É notório o crescimento do interesse das organizações pelos programas de Compliance e de Diversidade e Inclusão (D&I), porém, existem muitas barreiras para que as pessoas com deficiência sejam, de fato, incluídas no ambiente organizacional como seus pares.

Por razões culturais, as barreiras atitudinais e comunicacionais ainda são os maiores obstáculos para promoção da equidade (respeito à igualdade de direitos), por isso, busca-se aplicar as boas práticas do programa de Compliance para a transformação da cultura empresarial, envolvendo a alta liderança, articulando ações entre as diversas áreas da empresa, compartilhando tarefas e responsabilidades decorrentes dos valores da inclusão, por vezes, deixadas exclusivamente a cargo das áreas de Recursos Humanos e Marketing.

A expressão Compliance surge do verbo em inglês to comply que pode ser traduzido como “agir de acordo”, ou seja, atuar em conformidade com as normas (leis e regulamentos) e as políticas internas determinadas pela organização, porém, um sistema de Compliance vai muito além do cumprimento de normas, pois visa implantar a cultura de integridade.

Se a cultura organizacional é o “jeito” de fazer as coisas, a cultura de integridade pode ser entendida como o jeito ético de fazê-las, que adota valores como a honestidade, moralidade, conformidade, sustentabilidade e equidade nas tomadas de decisões e nas relações com todas as partes interessadas nas atividades da organização (investidores, colaboradores, consumidores, fornecedores, órgãos reguladores etc).

Um bom programa de Compliance desenvolve e acompanha a execução de mecanismos de controle para prevenir, detectar e remediar desvios de conduta, atos de corrupção e fraudes corporativas, ou seja, afastar o maléfico “jeitinho” na condução dos negócios para garantir a longevidade e a boa reputação da organização.

Os projetos de diversidade e inclusão visam incluir os grupos minoritários e vulneráveis no ambiente organizacional, atendendo aos postulados da responsabilidade social e de respeito aos direitos humanos, e como estratégia para fomentar a inovação, a fidelização do público-alvo, atrair, engajar e reter talentos, melhorar a saúde organizacional etc., alinhados aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da Agenda 2030 da ONU (ODS nº 8 – Trabalho Decente e Crescimento Econômico). A construção de um ambiente inclusivo passa pelo combate ao “jeitão” machista, racista, homofóbico, capacitista e segregador. Capacitismo é a discriminação dirigida às pessoas com deficiência.

“Jeitinho” e “jeitão” são comportamentos instintivos, atávicos, que realizamos de forma consciente ou inconsciente para manutenção de privilégios sociais e poder econômico. Buscamos nossos semelhantes e segregamos os diferentes para ter maior previsibilidade e conforto nas relações interpessoais, afinal, não há nada mais inovador ou disruptivo que interagir, de forma construtiva, com o outro diferente.

O compromisso com os valores da equidade e inclusão compreende a adoção de medidas efetivas que contemplem a acessibilidade e os direitos da pessoa com deficiência no ambiente de trabalho, com a adequada avaliação dos riscos e seus efeitos positivos ou negativos, relacionados à reputação e à saúde financeira da organização em razão da conformidade, ou não, com as políticas públicas que promovem a igualdade, a diversidade e a não-discriminação no ambiente laboral.

Nesse contexto, a garantia da acessibilidade (prevista em nossa Constituição, na Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, ratificada com status de emenda constitucional, na Lei Brasileira de Inclusão – Lei nº 13.146/2015) e as demais leis que consolidam as políticas públicas de ações afirmativas com a imposição cotas para a contratação de pessoas com deficiência (Lei de Cotas - Art. 93, Lei nº 8.213/91, Lei do Menor Aprendiz – Lei nº 10.097/2000 e a Lei de Estágio – Lei nº 11.788/2008), devem ser interpretadas apenas como pontos de partida na busca para equilibrar desigualdades decorrentes da segregação histórica a que foram submetidas as pessoas com deficiência.

Portanto, o trabalho em ambientes acessíveis e inclusivos, em igualdade de condições e oportunidades, ou seja, sem discriminação na admissão, remuneração permanência e ascensão profissional deve ser reconhecido para todos, independentemente de suas características pessoais, afinal, o que deve imperar sãos as capacidades, competências, funcionalidades e sua contribuição para os objetivos perseguidos pela organização.

Quando adotamos a cultura de integridade não há espaço para “jeitinho ou jeitão” e cumprir a lei é o mínimo razoável. A cota é o piso e não o teto para a promoção da equidade, em busca da igualdade de condições e oportunidades, e para que a organização usufrua dos benefícios da diversidade humana.

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Sobre o autor
César Lavoura Romão

advogado sócio do escritório Aversa Araújo Advogados, responsável pela área de Inclusion Compliance. Mestre em Direito das Relações Sociais pela PUC-SP. Professor na Faculdade de Direito da FMU. Professor na Pós-Graduação de Governança Corporativa e Compliance da FMU. Instrutor do IN Movimento Inclusivo. Membro da Comissão de Direitos das Pessoas com Deficiência da OAB/SP. Membro do Comitê Jurídico da Federação Brasileira das Associações de Síndrome de Down.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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