Capa da publicação Medidas atípicas para satisfação dos direitos do credor
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A imposição das medidas atípicas como alternativa na satisfação dos direitos fundamentais do credor

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As medidas atípicas são alternativas concedidas ao magistrado para a realização da justiça.

INTRODUÇÃO

Um dos maiores problemas enfrentados pelo Poder Judiciário brasileiro, no que tange à execução, é a falta de efetividade na persecução do crédito, pois se arrasta por anos e anos, sem que o credor tenha êxito na satisfação do seu crédito.

Essa demora, em grande parte dos casos, se perfaz pela ocultação dos devedores, bem como a impossibilidade de localização dos bens.

No que se refere a essa impossibilidade, em sua grande maioria, são comprovadas por condutas ilícitas que se utilizam os devedores, pois estes escondem seus bens em nome de “laranjas”, para que eles não sejam penhorados judicialmente, e com isso, se veem livres, não cumprindo com as obrigações assumidas.

O Código de Processo Civil, no capítulo que trata das normas fundamentais e da aplicação das normas processuais, estabelece garantia às partes sobre o direito de obtenção, em prazo razoável, da solução integral do mérito, incluindo a sua satisfação.

O ordenamento jurídico processual prevê um rol de possibilidades a partir do artigo 831, destinadas à satisfação do direito do credor, como a penhora de bens, adjudicação, alienação, dentre outras, que são denominadas de medidas típicas.

Entretanto, na prática, há pouca efetividade de tal norma, tendo em vista a inoperância do Poder Judiciário na via persecutória do crédito.

Assim, o Sistema Processual Civil brasileiro padece de uma realidade perversa quando o assunto é a efetividade das execuções, em razão de uma justiça ineficiente e que, de maneira geral, é feito para beneficiar o devedor, tendo em vista as inúmeras formas de ocultação de bens, além dos diversos atos processuais para procrastinação das ações de execução.

Com a promulgação da Lei 13.105, de 16 de março, de 2015, que instituiu o Código de Processo Civil, adveio uma inovação no que corresponde à probabilidade na eficácia da persecução do crédito, as denominadas medidas atípicas.

Essas novas medidas, previstas no artigo 139, IV, do Novo Código de Processo Civil, são formas diversas de aplicação para garantir o cumprimento das obrigações.

Desta forma, o presente trabalho tem como finalidade analisar a ineficiência do Poder Judiciário brasileiro, em virtude das dificuldades enfrentadas pelos credores na satisfação de seus créditos, haja vista que o atual cenário dos processos de execução, na sua grande maioria, é moroso.

Além disso, busca-se demonstrar que, por não serem as medidas típicas efetivas em sua integralidade, houve a implementação das medidas atípicas com o advento do Novo Código de Processo Civil de 2015, essas previstas no artigo 139, inciso IV, a fim de que auxilie e contribua em uma maior concretização das garantias de direitos dos credores nas execuções.

Trata-se de uma pesquisa qualitativa, baseada em doutrinas e entendimentos jurisprudenciais.

1.  DA EXECUÇÃO CIVIL

A Execução, em aspectos gerais, é uma atividade processual que promove a transformação prática do direito, satisfazendo seu titular, independentemente de sua origem ser um título judicial, que hoje recebe o nome de cumprimento de sentença, ou ser a de um título extrajudicial.

Desse modo, para que se tenha um entendimento completo do processo de execução, faz-se necessária a noção preliminar do que seja execução civil, com enfoque na Teoria Geral da Execução.

À vista disso, o processo é o meio pelo qual o Estado, por intermédio do Poder Judiciário, ampara as partes para solucionar lides, o que faz por meio da atividade de cognição; já quando concretiza o direito de uma das partes e modifica a situação da outra, utiliza-se a atividade da execução (THEODORO JÚNIOR, 2016, p. 739).

Assim, processo é a via pela qual o Estado substitui o indivíduo na tutela de seus interesses. Nesse caso, a execução pode ser considerada dentro do Direito Processual Civil, como uma das partes que mais necessitam de ser bem esclarecidas e assimiladas, pois há um uso muito frequente e uma complexidade maior no que tange a matéria.

 Nesse ínterim, a doutrina nos traz que o processo de conhecimento, em regra, transforma o fato em direito. Já o papel da execução civil é pegar esse direito que foi declarado à parte no processo de conhecimento e transformá-lo em fato, ou seja, impor ao devedor de uma obrigação reconhecida em um título judicial ou extrajudicial o cumprimento forçado da mesma, através de meios e poderes colocados à disposição do juiz para fazê-lo cumprir tal obrigação.

Com essa noção geral da função executiva, faz-se essencial a compreensão de como se perfaz, na prática, a aplicação dos princípios norteadores que regem o sistema de execução civil brasileiro.

1.1   Princípios específicos da execução  

Sob o ponto de vista processual civil, a execução contém característica de autônoma, realizada através de um processo próprio, sendo regida pelo Princípio da Autonomia Estrutural ou Autonomia da Execução.

O Princípio da Responsabilidade Patrimonial indica que toda a execução é real, ou seja, no âmbito civil vão responder pela execução, os bens do devedor e não a sua própria pessoa.

Importante frisar que tal entendimento decorre de uma evolução humanística do direito, tendo em vista que, em alguns momentos da história, se executava o próprio devedor, tendo as medidas executórias da época caráter perverso e desumano, chegando-se ao ponto do credor cobrar suas dívidas com a cota de sofrimento do devedor.

No entanto, não se verifica mais a utilização desta medida, sendo a responsabilidade patrimonial o princípio que norteia e rege a execução civil.

Tal princípio, que está previsto no art. 789 do CPC, diz que o devedor responde com todos os seus bens presentes e futuros para o cumprimento de suas obrigações, salvo as restrições estabelecidas em lei.

Portanto, o que vai servir para cobrir um eventual débito em uma execução civil, seja ela por título judicial ou extrajudicial, vão ser os bens do devedor, ressalvando apenas as situações previstas na legislação.

Outro princípio importante aplicável à execução é o Princípio do Resultado ou da Satisfatividade, que impõe ao executado o dever de arcar com todos os ônus financeiros que decorram do processo de execução ou da fase executiva.

Destarte, entende-se que, somente após o devedor arcar com todos esses ônus financeiros, como o valor exequendo, as custas processuais, os honorários advocatícios, entre outros que advirem do processo, é que considerar-se-á satisfeita a sua obrigação.

Logo, em se tratando de tutela satisfativa[3]

A execução chegará ao seu final normal quando for bem-sucedida, ou seja, quando se verificar a entrega ao exequente exatamente aquilo que receberia se não necessitasse do processo de execução”, logo, o processo de execução tem por objetivo central a entrega ao exequente “dentro da maior proximidade possível, da tutela idêntica à que obteria sem o processo.

Busca-se, assim, na execução o que se chama de desfecho único, tendo em vista a satisfação única do direito do credor.

Na mesma esteira de pensamento, o Princípio da Utilidade expressa que a execução deverá ser útil ao credor, não podendo ser um mero instrumento de castigo ou de sacrifício para o devedor.

Além disso, em decorrência do Princípio do Resultado, não se justifica um processo de execução que apenas vislumbre lesar o executado, sem auferir proveito ao exequente.

Assim, a ideia central do Princípio do Resultado trata da proteção ao credor, que prevê o direito do mesmo em receber exatamente aquilo que contratou, de outro lado haverá também a forma de proteção ao direito do devedor, que será resguardada através da limitação da atuação do poder judiciário.

Portanto, o Princípio da Utilidade assegura que a execução funcione como um mecanismo judicial para que o credor possa haver seus direitos em uma busca incessante pela satisfação, sem o iminente prejuízo completo ao réu.

Faz-se importante analisar também o Princípio da Disponibilidade da execução, onde caberá ao credor analisar se irá prosseguir ou não com o processo. Assim, através deste princípio, a execução se torna disponível.

Dessa maneira, a execução não pode visar satisfazer quaisquer reivindicações do devedor, pois, em concordância com o acima alegado, com a execução busca-se a mera satisfação do credor.

No entanto, o mesmo pode dispor desse direito de ver cumprida aquela obrigação como bem lhe aprouver, podendo inclusive desistir da execução, ou de apenas alguma medida executiva, não dependendo para tal ato, da concordância do devedor.

Em relação ao Princípio da Menor Onerosidade, previsto no artigo 805, do CPC, quando por vários meios o exequente puder promover a execução, o juiz mandará que faça pelo modo menos gravoso ao executado.

Dessa forma, assevera Daniel Amorim de Assumpção Neves[4] que gravames desnecessários à satisfação do direito do credor devem ser evitados sempre que for possível tal satisfação, vejamos

Gravames desnecessários à satisfação do direito do credor devem ser evitados sempre que for possível tal satisfação por meio de outros mecanismos. Entretanto, o credor tem direito à satisfação de seu crédito, e no caminho para sua obtenção naturalmente cairá gravames ao devedor. O que se pretende evitar é o exagero desnecessário de tais gravames.

Vale lembrar que não há que se falar em execução sem que um título que a legitime. Tal entendimento vem da expressão nulla executio sine titulo, ou seja, para que se possa iniciar um processo de execução ou fase executória, exige-se a existência de um título, seja ele judicial ou extrajudicial.

Desse modo, finalmente, conclui-se que se faz necessária a prévia existência de um título executivo, para que se veja demonstrado ao menos a probabilidade de que o valor exequendo realmente exista.

1.2   Do Título Executivo

O título executivo, temática de grande relevância dentro do procedimento executório, pode ser considerado um dos pontos mais importantes quando tratamos de uma execução, pois sem ele não é possível a existência de uma relação jurídica processual.

Vale ressaltar que o fato de ser necessário a presença de um título executivo, se torna um meio de garantia para o próprio demandado, pois caso não existisse a referida exigência, qualquer pessoa poderia demandar ação de execução, dizendo ser credora sem qualquer prova, podendo, assim, invadir o patrimônio do devedor, causando-lhe graves consequências.

Portanto, por se tratar de um tema imprescindível, faz-se necessário uma maior compreensão conceitual acerca da matéria.

Segundo Alexandre Câmara

Título executivo é o ato jurídico capaz de legitimar a prática dos atos de agressão a serem praticados sobre os bens que integram um dado patrimônio, de forma a tornar viável sua utilização na satisfação de um crédito (CÂMARA, 2016, p. 319).

Desta forma, podemos considerar o título executivo uma peça fundamental para o procedimento executório, sendo, portanto, elemento indispensável.

No entanto, não basta apenas a existência de um título executivo, mas também que a obrigação seja certa, líquida e exigível.

Segundo Alexandre Câmara 

Obrigação certa é aquela que define os elementos objetivos e subjetivos da obrigação, isto é, quem é o credor, quem é o devedor, o que se deve, quanto se deve e quando se deve. Obrigação exigível é aquela que não está sujeita a qualquer tipo de condição ou termo. E a obrigação líquida é aquela quantificada ou, pelo menos, quantificável. Trata-se da possibilidade de verificação do valor da obrigação (CÂMARA, 2016, p. 320).  

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Assim, não é propriamente o título que deverá preencher esses requisitos, mas sim a obrigação contida nele. Por outro lado, a doutrina entende que, caso seja demandada execução sem que haja a comprovação de um dos requisitos acima expostos, configurado estará a falta do interesse de agir do demandante.

Importante dizer que só será considerado título executivo aquilo que estiver previsto na lei como título executivo, ou seja, o título executivo somente pode ser criado por lei.

Assim, diante do exposto, vale realizar, à luz do que traz a legislação, a separação quanto ao tratamento das diferentes espécies de título executivo, com previsão dos títulos judiciais no capítulo do cumprimento de sentença, bem como dos títulos extrajudiciais no capítulo de processo de execução (ASSUMPÇÃO, 2015. p. 500).

Dito isso, podemos afirmar que a execução do título executivo judicial se procede através do cumprimento de sentença, declarada em processo de conhecimento, procedimento realizado com a presença do contraditório.

Já em relação ao título executivo extrajudicial, a execução se dá por meio de um processo autônomo de execução.

Assim, uma grande distinção entre esses títulos reside na forma do procedimento, qual seja o título executivo judicial se submete ao cumprimento de sentença, enquanto a execução do título executivo extrajudicial, ao processo de execução.

Por fim, no que tange à forma de defesa dos demandados, pode-se afirmar que no cumprimento de sentença se faz por meio da impugnação e no processo de execução, mediante apresentação de embargos (GAIO JR, 2017, p. 690).

1.3   Das Partes no Processo Executivo

No que se refere à legitimidade das partes no processo de execução, faz-se necessário entender como funciona a dinâmica de quem pode figurar no polo ativo e passivo dos procedimentos executivos, passando a tratar neste subtítulo dos denominados sujeitos processuais.

Desse modo, pode-se dizer que os sujeitos processuais que figuram na execução na posição ativa, recebem o nome de exequente e os que figuram na posição passiva, executado.

Dito isso, os legitimados ativos são aqueles a quem a lei confere o título executivo, sendo, assim, denominado legitimado ativo por excelência.

Os Legitimados Originários são aqueles a quem a lei confere o título executivo, isto é, os denominados credores. Já os Legitimados Secundários ou Supervenientes são aquelas pessoas que podem promover ou prosseguir na execução que já tenha sido proposta em caso de morte do exequente original, como por exemplo, os herdeiros ou sucessores do credor.

Além disso, de forma extraordinária, o CPC aduz que o MP, nos casos previstos em lei, poderá figurar no polo ativo das execuções.

No que tange à legitimidade passiva, trata-se daquele devedor reconhecido como tal no título executivo, seja esse judicial ou extrajudicial.

Vale lembrar que tanto a legitimidade ativa quanto a legitimidade passiva poderá ser originária ou secundária. Na legitimidade passiva originária, denominamos como executado aquele legitimado previsto no título executivo como devedor.

Por outro lado, na legitimidade passiva secundária ou derivada tem-se como legitimado o espólio ou os sucessores do devedor original, tal como o novo devedor, que assumiu com o consentimento do credor a obrigação resultante.

Desta forma, conclui-se quem são os legitimados ativos e passivos que estão aptos a demandar e serem demandados em uma relação jurídica processual executiva, seja ela originária ou secundária, derivada de um título executivo judicial ou extrajudicial.

1.4   Da Competência

Dentro do Sistema Processual brasileiro, em se tratando de procedimento executivo, há a presença de dois diferentes regimes que regulam a competência, sendo uma específica para as execuções fundadas em títulos executivos judiciais e outras para as execuções derivadas dos títulos executivos extrajudiciais.

No que tange às execuções fundadas em título executivo judicial, ou seja, o cumprimento de sentença, esse efetuar-se-á perante os tribunais nas causas de competência originária, conforme previsão do artigo 516, inciso I do CPC.

Desta forma, quando o processo de conhecimento for originário do tribunal, como acontece com a ação rescisória, cuja tramitação se dá no segundo grau de jurisdição, o cumprimento da sentença será realizado pelo Tribunal do segundo grau de jurisdição.

Noutro plano, o artigo 516, inciso II, do CPC aduz que, nas demais ações, será competente o juízo que decidiu a causa no primeiro grau de jurisdição. Assim, nas ações que se iniciam no juízo de primeira instância, por mais que haja recursos para os tribunais superiores, a competência para o cumprimento da sentença será do juízo da causa originária do primeiro grau de jurisdição.

Ademais, o artigo prevê que o exequente poderá optar pelo juízo do atual domicílio do executado, pelo juízo do local onde se encontrem os bens sujeitos à execução ou pelo juízo do local onde deva ser executada a obrigação de fazer ou de não fazer.

É importante ressaltar que tais opções, disponibilizadas ao exequente, servem como vias facilitadoras para um bom e regular andamento do processo.

Portanto, uma vez definida a competência, o exequente manifestará a opção, devendo requerer ao juízo original do processo a remessa dos autos para onde tramitará a execução.

Entretanto, no que diz respeito aos títulos executivos extrajudiciais, aplica-se a regra geral, que é aquele determinado pelos critérios gerais de determinação interna, de acordo com o que está previsto no artigo 781, caput, do CPC.

Desse modo, a execução poderá ser proposta no foro de domicílio do executado, no foro de eleição constante do título ou, ainda, no foro de situação dos bens.

Caso haja mais de um executado, o exequente poderá optar pelo ajuizamento da execução em qualquer um dos domicílios.

Por fim, se o domicílio do executado for incerto ou não sabido, a execução poderá ser proposta no local onde o executado for encontrado ou no foro de domicílio do exequente, podendo também, sempre ser ajuizada a execução no local onde se praticou o ato ou fato que deu origem ao título.

Assim, para que se tenha um pleno e amplo conhecimento sobre a competência em sede de execução, fundamental se faz o conhecimento das regras gerais do processo civil que definem a competência, analisando-as conjuntamente com as especificidades e peculiaridades trazidas pelo procedimento executivo.

1.5   Dos Requisitos

Sabe-se que a presença de um título executivo e a exigibilidade da obrigação são requisitos necessários para que seja possível a execução, ou seja, tais requisitos são considerados indispensáveis, pois a falta de um deles impedirá a execução.

À luz do artigo 783 do CPC, a obrigação representada no título executivo deverá ser certa, líquida e exigível.

Logo, a doutrina diz que quem não tem título executivo certo, líquido e exigível, não tem interesse de agir, faltando-lhe, assim, uma das condições da ação.

Portanto, a exigência do preenchimento dos requisitos essenciais para a validação de um título executivo é a da identificação que deverá contar a certeza de uma obrigação presente no título, quem é o seu devedor e credor e quando deverá haver o cumprimento.

Outra característica é a liquidez, o quanto deve o devedor ao credor, decorrente da expressão quantum debeatur. Desta forma, para que possa ser considerado um título executivo, faz-se indispensável que esse seja líquido.

No tocante à exigibilidade, o título será considerado exigível quando existir o direito a uma determinada prestação, isto é, um dever atual de cumprimento e quando essa obrigação não esteja sujeita a um termo ou a uma condição suspensiva.

Portanto, para que haja execução, seja ela proveniente de um título judicial ou extrajudicial, deverá existir a presença de todos os elementos constitutivos, estando devidamente indicados, tal como a demonstração da existência do débito.

Por outro lado, caso não haja a comprovação das características aventadas acima, poderá o devedor, em sede de título executivo extrajudicial apresentar embargos à execução para comprovar a inexistência ou o adimplemento da dívida. Já em relação ao título executivo judicial, deverá interpor impugnação.

2  DAS MEDIDAS TÍPICAS

Nos procedimentos executivos, o objetivo da cooperação processual é a busca incessante da satisfação do credor, haja vista que esse possui um direito assegurado por meio de um título executivo judicial ou extrajudicial.

Destarte, com a realização dos atos executivos à disposição do credor, esse pode fazer com que o devedor cumpra, voluntariamente, a obrigação contida naquele título, ou então, forçá-lo a cumprir, respeitando-se, assim, os seus direitos fundamentais. Tais ferramentas são denominadas de medidas típicas.

Faz-se importante ressaltar que tais medidas, em decorrência da obrigação presente no título executivo, ocorrerá por meio da expropriação de bens.

De acordo com o artigo, 824 do CPC: “A execução por quantia certa realiza-se pela expropriação de bens do executado, ressalvadas as execuções especiais”.

Assim sendo, o conceito de expropriação, consiste, basicamente, em retirar de alguém a propriedade ou a posse de algum bem, por conveniência ou necessidade pública.

Logo, em respeito ao Princípio da Tipicidade, o ordenamento jurídico processual civil brasileiro traz um rol de medidas típicas, como a penhora de bens, a adjudicação, a alienação, previstas no artigo 879, do CPC, dentre algumas outras oportunidades para efetivação da execução.

Todavia, quando as formas típicas não forem eficientes e satisfatórias, torna-se necessário flexibilizá-las, adotando medidas executivas atípicas, de acordo com as peculiaridades de cada caso concreto.

Portanto, as medidas atípicas, embora não estejam tipificadas na legislação processual civil, tem por finalidade atingir o resultado útil do processo, com a obtenção do fim pretendido pelo exequente e, consequentemente, a sua satisfação, alcançando-se, assim, o bem da vida almejado.

Por fim, como o CPC não especificou quais são as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias a serem impostas, faz-se necessária a análise de cada uma delas individualmente.

3   DAS MEDIDAS ATÍPICAS

Inicialmente, antes de ingressarmos na análise das medidas atípicas, faz-se importante uma abordagem acerca do tema em um plano constitucional, haja vista que o próprio CPC, em seu artigo 1º, nos remete à Carta Magna, aduzindo que a Lei Processual Civil estará ordenada, disciplinada e interpretada conforme os valores e normas fundamentais previstas na Constituição Federal.

Desta forma, os dispositivos constitucionais pertinentes a temática, mais precisamente aqueles que se referem à matéria processual, estão presentes no artigo 5º, incisos XXXV e LXXVIII, da Constituição Federal: Princípio do Acesso à Jurisdição e o Princípio da Razoável Duração do Processo.

Diante disso, quando tratamos do acesso à jurisdição, devemos observar a presença de duas vias, quais sejam a do direito de ingressar com uma demanda, quanto a de ver a obrigação reconhecida posteriormente pelo Poder Judiciário, buscando-se, assim, o direito de torná-la efetiva, com a satisfação dessa pretensão reconhecida no título executivo judicial.

Portanto, essa satisfação tem que se dá em um período razoável, com uma duração que não comprometa a própria eficácia da medida nem mesmo a credibilidade do Poder Judiciário.

Partindo desse pressuposto, para a concretização do disposto no artigo 139, inciso IV do CPC, percebe-se que o sistema anterior de penhora de bens com a consequente alienação judicial se revelou claramente ineficiente, demonstrando que aquele sistema de medidas de execução típicas, não era capaz de efetivar as obrigações reconhecidas pelo Poder Judiciário.

Assim, o legislador, diante da constatação da ineficácia do sistema anterior, implementou as medidas atípicas de execução, colocando-as à disposição do magistrado, que deverá analisa-las a cada caso concreto.

 Dito isso, a partir desse momento, trataremos sobre o objeto central desta pesquisa, realizando a análise da implementação das medidas atípicas, em virtude da falta de efetividade das medidas típicas.

Com isso, faz-se necessária a exposição da redação do artigo 139, inciso IV do CPC que aduz

Art. 139. O juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, incumbindo-lhe: (...) IV - determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária (...).

De acordo com o aludido artigo, as medidas atípicas são medidas indiretas, que não levam diretamente à satisfação da obrigação, mas que, de alguma forma, podem exercer uma pressão psicológica na pessoa do devedor, levando-o ao cumprimento da obrigação.

Segundo Edilton Meireles[5], as medidas sub-rogatórias são

Todas aquelas realizadas pelo juiz, por seus auxiliares ou por terceiro, em substituição ou sucessão do obrigado, seja praticando o ato que deveria ter sido realizado pelo devedor, seja adotando uma atividade que visa obter o resultado prático equivalente para obtenção da efetividade da tutela necessárias à satisfação do titular do direito reconhecido.

Assim sendo, como exemplo de medidas sub-rogatórias, temos a busca e apreensão, a imissão na posse, a alienação judicial do bem penhorado, com a entrega do dinheiro ou valor ao credor, bem como o fazimento ou desfazimento de obra, dentre outros.

Nessa perspectiva, sobre as medidas coercitivas, Edilton Meireles[6] leciona que: “O juiz deve adotar medidas que tendem a coagir o obrigado a satisfação da obrigação. Através destas medidas se pressiona o devedor de modo que ele pessoalmente desenvolva a conduta imposta pela decisão judicial. ”

Cita-se como exemplo das medidas coercitivas, a imposição de multas cominatórias ou astreintes, a prisões por dívida alimentar, a inclusão do nome do devedor nos cadastros de inadimplentes.

Além dessas, temos medidas coercitivas, que geram mais discussões, como a apreensão do Passaporte, da CNH, e o bloqueio dos cartões de crédito do devedor.

Em relação às medidas mandamentais, Edilton Meireles[7] afirma que

Mais úteis nas obrigações de fazer ou não fazer de natureza infungível. Elas, por sua vez, preferencialmente somente devem ser adotadas em casos extremos. Isso porque, se o juiz pode alcançar a satisfação da obrigação através da adoção de medidas sub-rogatórias, coercitivas ou indutivas, deve evitar a expedição de ordem mandamental, já que, o descumprimento da mesma, acarretará na prática de crime de desobediência. Contudo, não se pode descartar que, em determinadas situações, em juízo de ponderação e na busca da satisfação da obrigação de forma mais célere e até como ação pedagógica, preventiva e inibitória, é preferível que o próprio obrigado cumpra com a prestação. Daí porque a expedição de uma medida mandamental, sujeitando o obrigado à prática do crime de desobediência, caso descumprida a ordem, quando seja a mais conveniente para alcançar a efetividade da decisão judicial.

Como exemplo de tais medidas, temos a ordem para que o devedor indique bens passíveis à penhora, exibição de documento ou coisa, entre outros.

Por fim, quanto às medidas indutivas[8]

Se busca oferecer ao obrigado uma vantagem, um “prêmio”, como incentivo (coação premial) ao cumprimento da decisão judicial. Daí porque a doutrina denomina essa sanção como premial. Busca-se, com essas medidas, provocar, incentivar, a prática do ato de forma mais atraente, ainda que que com sacrifício à situação jurídica [mais favorável] de outrem.

No que tange às medidas indutivas, os meios viáveis para o cumprimento são diversos, como a redução pela metade dos honorários advocatícios devidos pelo executado, caso realize o pagamento integral da dívida fundada em título extrajudicial em três dias, bem como a autorização legal para que parcele o pagamento, desde que efetue o depósito de pelo menos 30% da dívida, reconhecendo-se, assim, a correção das contas.

Desta forma, a legislação processual civil prevê diversos benefícios para o caso de cumprimento da ordem judicial por parte do devedor.

Portanto, pode-se dizer que com a inserção de tais medidas, houve por parte do legislador uma permissão ao magistrado, para que esse possa aplicar não só as medidas da lei, como também aquelas que não estão tipicamente previstas, mas que, de alguma forma, possam significar a coerção do devedor para cumprir a obrigação.

Ademais, importante ressaltar que se tratam de meios indiretos de coerção, que auxiliam o credor na busca pela satisfação da obrigação contida no título executivo e, consequentemente, o respeito aos seus direitos e garantias fundamentais.

Com isso, o artigo 139, inciso IV, do CPC utilizou expressamente o vocábulo coerção e não coação, não podendo, assim, os dois termos serem confundidos, haja vista que a coação traz uma ideia de ilegalidade, de algo proibido que, consequentemente, o direito veda.

A coerção vai na via contrária da coação, pois aquela, no sentido exposto pelo artigo, trata-se de uma forma de obrigar alguém a fazer alguma coisa de modo legítimo.

No mais, vale ressaltar que as decisões que venham a ser proferidas com base na aplicação do artigo 139, inciso IV do CPC, devem ser feitas em conjunto com o disposto no artigo 8º do CPC.         

Vejamos então que o magistrado ao aplicar o disposto no artigo 139, inciso IV, do CPC, adotando tais medidas indiretas de coerção, não pode fugir do dispositivo supracitado, pois se trata de uma regra de interpretação do Código de Processo Civil. Sendo assim, as medidas de coerção indiretas não podem ser, de forma alguma, ilegais, desproporcionais, irrazoáveis e ineficientes.

Portanto, conclui-se que com o advento da nova redação do artigo 139, inciso IV, do CPC, restou clara a intenção do legislador em dar mais efetividade às obrigações reconhecidas em títulos judiciais ou extrajudiciais, haja vista que um processo não efetivo, além de violar o Estado Democrático de Direito, viola a dignidade da pessoa humana, que não tem o seu direito adimplido.

4. Da Duração da Tramitação da Execução no Brasil

Segundo levantamento realizado pelo CNJ[9], no ano de 2019, um processo de execução gasta o triplo de tempo em relação a um processo de conhecimento, sendo o tempo em média de quatro anos e nove meses para a execução e um ano e seis meses para a fase de conhecimento.

Desta forma, resta evidente que as execuções vêm sofrendo uma maior restrição no que tange à celeridade processual, pois no Sistema Processual Brasileiro, na maioria dos processos de execução, se tem a sensação de ganhar e não levar.

Na realidade, tem-se o sabor amargo de atuar meses ou até anos em um processo, que possui uma sentença favorável, mas que ao final não há êxito no recebimento do crédito, haja vista a dificuldade de se encontrar qualquer patrimônio do devedor para garantir o pagamento da dívida.

Nesse sentido, há a frustração de se ter um crédito e não conseguir dar efetividade à execução, vislumbrando-se, assim, a dificuldade de buscar bens do devedor que, muitas vezes, desvia todo o seu patrimônio para terceiro, comumente, denominado de “laranja”, ou também, pelo fato do Sistema Judiciário demorar demais no deferimento de suas decisões.

Com isso, perde-se o sentido de buscar “socorro” no Poder Judiciário, com o investimento de altas quantias no pagamento de custas, advogados e afins, já que ao final da demanda, o exequente não terá a satisfação do seu crédito.

Desta forma, o legislador entendendo a dificuldade enfrentada dentro de um procedimento executivo, implementou as medidas atípicas, previstas no artigo 139, inciso IV, do CPC.

Logo, o dispositivo visa garantir o cumprimento de uma ordem de pagamento, no qual o magistrado pode determinar todas as medidas indutivas e coercitivas que se mostrarem necessárias.

Ocorre que, para conseguir ter êxito nessas medidas, faz-se necessária a observação de dois elementos essenciais e fundamentais: o primeiro é o tempo (momento adequado de pedir essas medidas coercitivas); o segundo, é que a medida requerida deve ser coerente, razoável, não podendo ofender a dignidade do devedor.

Por fim, deve-se respeitar a ponderação, ou seja, saber a hora exata de realizar as postulações dentro da execução, com a análise de cada caso concreto, a fim de não existir qualquer meio de injustiça e nem tampouco infringência aos direitos e garantias fundamentais tanto do devedor, quanto do credor.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente artigo estabeleceu como objetivo central demonstrar o quão necessário se faz a imposição das medidas atípicas do artigo 139, inciso IV, do Código de Processo Civil na via persecutória do crédito nos processos de execução, seja ele fundado em título judicial ou extrajudicial. Entretanto, pode-se afirmar que em se tratando do referido dispositivo, não há uma pacificação exata sob a adoção ou não desta ou daquela medida, encontrando somente argumentações jurídicas razoáveis.

Desta forma, buscou-se demonstrar com a pesquisa ora realizada que em virtude de as medidas atípicas não serem efetivas em sua integralidade, a adoção das medidas atípicas é um caminho que se mostra viável para a tentativa de coação do devedor no cumprimento das obrigações.

Contudo, as medidas atípicas devem ser deferidas conforme análise específica de cada caso concreto, se atentando aos fatos e suas realidades e, respeitando por óbvio, os princípios da dignidade da pessoa humana por parte do devedor tal como a tutela efetiva jurisdicional por parte do credor, que por certo tem o direito de ter a recuperação de seu crédito concluída.

Por fim, constata-se que as medidas específicas do artigo 139, inciso IV, são vias que servem de auxílio para bloquear a cultura de favorecimento do mau pagador e buscarmos um modelo de sociedade que privilegie aqueles que honrem com suas obrigações.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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[3] NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Princípios da Execução. Disponível em: http://www.professordanielneves.com.br/assets/uploads/novidades/201011151812300.principiosdaexecucao.pdf. Acesso em: 08/10/20.

[4] NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Princípios da Execução. Disponível em: http://www.professordanielneves.com.br/assets/uploads/novidades/201011151812300.principiosdaexecucao.pdf. Acesso em: 08/10/20, p. 17.

[5] MEIRELES, Edilton. Tutela Executiva. Disponível em: http://www.mpsp.mp.br/portal/page/portal/documentacao_e_divulgacao/doc_biblioteca/bibli_servicos_produtos/bibli_boletim/bibli_bol_2006/RPro_n.247.09.PDF. Acesso. Em: 10/10/20, p. 03.

[6] Ibid, p. 05.

[7] Ibid, p. 7.

[8]Ibid,p. 8.

[9] Conselho Nacional de Justiça. Julgamento dos processos mais antigos reduz tempo médio do acervo. Disponível em: https://www.cnj.jus.br/julgamento-dos-processos-mais-antigos-reduz-tempo-medio-do-acervo/#:~:text=Conhecimento%20e%20execu%C3%A7%C3%A3o&text=Para%20receber%20uma%20senten%C3%A7a%2C%20o,4%20anos%20e%209%20meses. Acesso em: 15/10/20.

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Sobre os autores
Thaysa Navarro de Aquino Ribeiro

Mestra em Direito Processual pela UCP. Professora do Centro Universitário Unifaminas - Muriáe. Especialista em Direito Administrativo pela Universidade Anhanguera – Uniderp. Graduada em Direito pelas Faculdades Integradas Vianna Júnior. Advogada.

Leonardo Silva Rossi Filho

Bacharelando em Direito pelo Centro Universitário UNIFAMINAS - Campus Muriaé - MG.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

RIBEIRO, Thaysa Navarro Aquino ; ROSSI FILHO, Leonardo Silva. A imposição das medidas atípicas como alternativa na satisfação dos direitos fundamentais do credor. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 25, n. 6346, 15 nov. 2020. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/86638. Acesso em: 28 mar. 2024.

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