Rescisão Indireta em função do não fornecimento de equipamento de proteção individual dentro do panorama da pandemia do Coronavírus (covid-19)

23/01/2021 às 11:59
Leia nesta página:

Resumo: O presente artigo irá abordar sobre a possibilidade de aplicação da justa causa patronal pelo não fornecimento de equipamento de proteção individual (EPI) em especial dentro do panorama da pandemia por Coronavírus (covid-19).

A rescisão indireta é um instituto do direito do trabalho que nada mais é do que a dispensa do funcionário por uma falta grave do patrão, falta esta que resulta no rompimento do contrato de trabalho.

Como a falta é cometida pelo empregador, este que deu ensejo ao rompimento, o empregado faz jus a todos os direitos como se tivesse sido demitido sem justa causa.

A rescisão indireta possui um rol de hipóteses nas quais o empregado poderá pleitear o rompimento do vínculo contratual. Este rol está previsto no artigo 483 da Consolidação das Leis do Trabalho, como pode ser visto abaixo:

Art. 483 - O empregado poderá considerar rescindido o contrato e pleitear a devida indenização quando:

a) forem exigidos serviços superiores às suas forças, defesos por lei, contrários aos bons costumes, ou alheios ao contrato;

b) for tratado pelo empregador ou por seus superiores hierárquicos com rigor excessivo;

c) correr perigo manifesto de mal considerável;

d) não cumprir o empregador as obrigações do contrato;

e) praticar o empregador ou seus prepostos, contra ele ou pessoas de sua família, ato lesivo da honra e boa fama;

f) o empregador ou seus prepostos ofenderem-no fisicamente, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem;

g) o empregador reduzir o seu trabalho, sendo este por peça ou tarefa, de forma a afetar sensivelmente a importância dos salários.

No presente artigo trataremos da alínea c, que trata justamente da possibilidade de rescisão do contrato de trabalho com a devida indenização quando o funcionário correr perigo manifesto de mal considerável.

Nossa sociedade tem sido flagelada pela pandemia causada pelo coronavírus (covid-19), o que trouxe muitas alterações nas relações comerciais, interpessoais e de trabalho.

Os entes federados como estados e municípios têm editado medidas que visam reduzir o contágio e consequentemente a propagação da doença. Dentre as muitas medidas estão o isolamento social, restrição de abertura do comércio e serviços, e utilização de máscaras faciais para proteção.

Dentre os serviços considerados essenciais, temos alguns que mesmo com as restrições de frequentação, ainda seguem com um movimento considerável de atendimentos como os supermercados, padarias, casas lotéricas e farmácias.

Os funcionários que trabalham neste grupo de empresas estão inseridos no grupo de risco, haja vista que seu contato com pessoas que podem estar contaminadas é muito alto. Transformando-os assim em vetores de contaminação também.

As determinações dos executivos municipais para abertura deste tipo de comércio asseveram que os estabelecimentos deverão tomar todas as precauções para evitar a contaminação dos fregueses e seus funcionários pelo covid_19. Para isso as empresas têm que se adaptar, seja limitando a entrada de clientes, seja fornecendo equipamento de proteção individual para seus funcionários, como máscaras, luvas, álcool em gel, e demais EPI’s que eliminem ou mitiguem a propagação do vírus.

CLT, em seu art. 166, dispõe sobre a obrigação do fornecimento de equipamento de proteção individual, de forma gratuita, pela empresa aos empregados.

Constituição da República garante aos trabalhadores urbanos e rurais a redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança.

Muitos empregadores estão descumprindo este princípio fundamental, não fornecendo os EPI’s necessários para execução do trabalho de seus funcionários, colocando suas vidas em risco, o que vai de encontro à alínea c do artigo 483 da CLT.

Mesmo antes da pandemia, a falta de entrega do equipamento de proteção individual ao funcionário, em alguns casos, já configurava a justa causa patronal, conforme entendimento dos Tribunais pátrios abaixo:

PRESCRIÇÃO. AUXÍLIO DOENÇA. ACIDENTE DE TRABALHO. No presente caso, a ciência inequívoca da incapacidade laborativa deu-se em 30/03/2005 (fl.23), ou seja, posterior à Emenda Constitucional nº 45, a prescrição aplicável é a trabalhista, de 5 (cinco) anos (art. XXIXCRFB/88). Assim, prescrita está a pretensão do autor, em razão da manifesta incidência da prescrição qüinqüenal, haja vista que a ação somente foi ajuizada em 01/04/2013. Prescrição que há de ser acolhida, para extinguir o feito com resolução de mérito, conforme o disposto no artigo 269, inciso IV, do CPC. Recurso ordinário empresarial provido.

RESCISÃO INDIRETA. NÃO FORNECIMENTO DE EQUIPAMENTOS DE PROTEÇÃO INDIVIDUAL. CONFIGURAÇÃO DE HIPÓTESE ELENCADA NO ARTIGO 483 DA CLT. O não fornecimento de EPI necessário para as atividades do trabalhador, no caso, corte de carne, traduz descumprimento das normas gerais de segurança e medicina do trabalho, como exige o art. 157I, da CLT. Registre-se que a Norma Regulamentada nº 06, em seu item 6.3, dispõe que “a empresa é obrigada a fornecer aos empregados, gratuitamente, EPI adequado ao risco, em perfeito estado de conservação e funcionamento”. Portanto, entendo que a conduta do Reclamado é motivo suficiente para ensejar a rescisão indireta. Recurso obreiro provido quanto ao tema.

(TRT-6, RO: 0000439-19.2013.5.06.0016, Rel. DES. FÁBIO ANDRÉ DE FARIAS, 2ª Turma, 11/08/2015)

EMENTA: NÃO FORNECIMENTO DE EPI. RESCISÃO INDIRETA. CABIMENTO. O não fornecimento de EPI necessário para as atividades do trabalhador implica descumprimento das normas gerais de segurança e medicina do trabalho, como dispõe o art. 157, I, da CLT. Ademais, a Norma Regulamentadora N.º 6, em seu item 6.3, dispõe que “a empresa é obrigada a fornecer aos empregados, gratuitamente, EPI adequado ao risco, em perfeito estado de conservação e funcionamento”. Assim, entendo que a conduta da reclamada é motivo suficiente para ensejar a rescisão indireta.

(TRT18, RO – 0010138-77.2018.5.18.0128, Rel. ELVECIO MOURA DOS SANTOS, 3ª TURMA, 12/12/2018).

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O fornecimento de EPIs aos trabalhadores principalmente durante esta pandemia é fundamental para manutenção das condições de saúde e segurança do ambiente, garantindo assim a integridade física do funcionário e dos clientes os quais ele atende.

Conclusão:

Ante ao exposto, podemos concluir que a calamidade causada pela pandemia do coronavírus tem interferido diretamente nas relações de trabalho, agravando os riscos de muitas profissões, que necessitam mais do que nunca de condições de trabalho seguras e dignas, sendo que ao não fornecer o equipamento de proteção individual o empregador incorre em falta grave que pode ensejar a rescisão indireta.

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Sobre o autor
Eduardo Gregório Costa

Advogado e Consultor Jurídico

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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