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Aplicação de phantom share aos contratos de trabalho

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04/04/2021 às 16:10
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5. Exigências.

Não obstante seja juridicamente viável a aplicação da phantom share para contratos de trabalho no Brasil, envolve riscos, ainda mais considerando a falta de regulamentação própria no País. Assim, apresentam-se algumas recomendações exigíveis para que o referido pagamento não seja descaracterizado, tornando-se, consequentemente, inviável para a gestão empresarial.

É importante que as partes formalizem esta tratativa por meio de acordo para pagamento de unidades de participação e pactuar diversas obrigações. Abaixo, segue um rol exemplificativo de cláusulas e obrigações que devem constar no referido acordo:

(i) prazo de permanência: para que receba a remuneração variável, o empregado pode se comprometer a permanecer na empresa por período certo. Isto poderá ser celebrado em razão da intenção da empresa em manter este profissional por ser essencial ao desenvolvimento da atividade empresarial.

(ii) forma de pagamento e resgate: as partes poderão atribuir determinados valores às ações e valorização, por exemplo, pode ser estipulado que cada ação vale R$ 10,00 (dez reais), não sendo necessário que este valor reflita o valor real de mercado. Se as partes decidirem que as unidades de participação poderão ser resgatadas a cada 12 (doze) meses, caso as ações tenham valorizado 20% (vinte por cento) até o mês do resgate, o empregado poderá resgatar o valor de R$ 2,00 (dois reais) por ação “concedida”. É possível estipular que o empregado poderá optar por não resgatar a valorização do ano e manter o valor para resgate no próximo período, sendo que a valorização poderá integralizar o valor da ação e sobre este novo valor ser calculada a valorização do próximo período. Assim, no mesmo exemplo, as ações que no primeiro ano correspondiam o valor de R$ 10,00 (dez reais), passarão a valer R$ 12,00 (doze reais) e sobre este montante é que será calculada a valorização das ações.

(iii) vigência: a vigência poderá iniciar quando da assinatura do termo entre as partes e vigorar por prazo determinado. Caso exista a possibilidade de o empregado optar por não resgatar a valorização do ano e manter o valor para resgate no próximo período, será necessário estipular um prazo máximo desta opção, ocasião em que, em não sendo os valores resgatados, o direito será extinto.

(iv) da rescisão do contrato de trabalho: caso a empresa demita o empregado durante a vigência do termo, deverá se comprometer a efetuar o pagamento proporcional dos valores devidos, se realmente devidos. Se o empregado rescindir o contrato, nada terá direito a requerer, diante do inadimplemento do compromisso em permanecer na empresa pelo período previsto no termo.

(v) da execução judicial: como o termo se trata de título executivo extrajudicial, caso uma das partes não cumpra com as obrigações assumidas no documento, poderá propor medida judicial cabível para resguardar seus direitos.

(vi) pagamento antecipado: em caso de venda, fusão ou aquisição da empresa, as partes poderão estipular o pagamento antecipado dos valores de acordo com os valores vigentes.

(vii) limitação de pagamento de valorização: é possível estabelecer limite para a quantidade de remuneração variável que será paga, considerando que a valorização da ação não significa rentabilidade empresarial.

Tais recomendações tem o condão de facilitar o uso da phantom share para pagamento aos empregados, evitando que sua finalidade última seja interpretada equivocadamente pelo judiciário.


6. Vantagens e desvantagens.

Apesar de ser uma boa alternativa de retenção de talentos entre os principais colaboradores de alto escalão da empresa, esta ferramenta apresenta vantagens, mas também algumas desvantagens.

Como principais vantagens pode-se destacar:

(i) a valorização do profissional por meio de pagamento de remuneração variável que dependerá do resultado da valorização efetiva das ações;

(ii) maior comprometimento do profissional beneficiário da remuneração variável e sua equipe com os resultados da empresa, considerando que o valor da remuneração variável está vinculado à valorização da ação;

(iii) não há alteração do capital social, já que não há transferência efetiva de ações;

(iv) não existem regras legais determinadas para a confecção do plano, possibilitando a ampla negociação entre as partes;

(v) os custos com a administração dos termos não é considerável e não precisará ser estendida a todos os profissionais da empresa;

(vi) os empregados não precisam adquirir as unidades de participação e não dependem da liquidez do mercado.

(vii) nas palavras de Charléne Fouché, destaca-se que não é necessário criar uma relação de confiança entre as partes envolvidas e não há divulgação de informações sensíveis ou confidenciais da empresa e é de fácil implementação[16].

Por outro lado, como principais desvantagens pode-se destacar:

(i) como o momento do resgate é definido pelo empregado, a empresa deverá observar a necessidade de organização do fluxo de caixa para possibilitar o pagamento. Para evitar problemas, a empresa poderá determinar um período para pagamento após a opção do empregado;

(ii) a remuneração variável sofrerá incidência de imposto de renda;

(iii) é difícil estimar os valores que serão pagos ao empregado porque o critério de valorização das unidades de participação pode variar em ritmo irregular;

(iv) os empregados beneficiários recebem a remuneração variável e não efetivamente os lucros das ações, o que significa que a inserção do profissional neste plano não o conecta com a empresa da mesma maneira como se fosse um acionista efetivo;

(v) é possível que não haja o engessamento nas decisões ousadas por parte dos executivos, em razão de que não haverá também a aquisição efetiva das ações e uma possível desvalorização das ações em tempo posterior, como pode ocorrer na stock options, conforme será verificado no tópico seguinte.

Portanto, cabe à empresa analisar, em seu modelo de gestão, se a phantom share pode ser uma boa alternativa de remuneração variável, devendo, entretanto, atentar-se para a formalização adequada deste pagamento.


7. Comparação com plano de stock options.

Em que pese a phantom share não ser muito utilizada ainda no Brasil, existe outro plano mais conhecido e utilizado, o stock options. Apesar de terem algumas semelhanças, estes dois planos são diferentes.

Como afirmado, o plano de stock options é mais frequentemente utilizado e conhecido pelas empresas e consiste na efetiva opção de compra de ações da empresa pelos empregados. Estes profissionais recebem a opção de compra de ações a um preço fixo pré-determinado, após um determinado período previamente pactuado. Findo este prazo, os empregados poderão exercer, ou nã,o o direito de compra. Se exercerem o direito de compra de ações, e se a cotação destas for superior ao preço de compra acordado, o profissional receberá a diferença entre ambos os valores.

Assim, já se verifica que a principal diferença entre a stock options e a phantom share é a aquisição efetiva das ações; enquanto na a stock options o empregado compra as ações, na phantom share estas não são adquiridas, mas utilizadas como parâmetro para pagamento de remuneração variável.

Em que pese a modalidade acima descrita ser a mais comumente utilizada, vale salientar que há diversos métodos na prática internacional, listados abaixo[17]:

(i) planos de opções de ações a empregados, em que o empregado permite ao empregador reter uma parte do seu salário mensal para adquirir ações da empresa empregadora, com desconto. Essa aquisição pode acontecer mensalmente ou, alternativamente, pode ser acumulada para permitir a aquisição de ações em uma data futura.

(ii) plano de ações de propriedade do empregado, em que ao empregado da empresa é dada a opção de adquirir ações da empresa a um preço pré-determinado depois de certo período. Essas ações poderão ser adquiridas ou distribuídas a partir da empresa direta ou indiretamente, através de uma relação de confiança.

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(iii) plano de compra de ações pelo empregado, em que a empresa oferece ações para o empregado como parte de uma emissão pública ou a um preço pré-determinado.

(iv) plano de opção de compra de ações, em que a empresa concede opções para seus empregados para comprar um determinado número de ações a um preço especificado durante um período específico.

(v) plano de direito de ações valorizadas, em que os funcionários são premiados com ações equivalentes a um valor pré-determinado e, após certo período mínimo estipulado, os funcionários estão autorizados a cobrar tais direitos.

As maiores vantagens da stock options em relação à phantom share são:

(i) a maior proximidade entre o profissional que se torna acionista efetivo da empresa;

(ii) a valorização das opções de compra de ações ao longo do tempo é feita de modo objetivo e imparcial, por meio da evolução da cotação na Bolsa de Valores.

Em contrapartida, as maiores desvantagens da stock options em relação à phantom share são:

(i) somente é aplicável nas sociedades anônimas cotadas em bolsa;

(ii) como se trata de compra efetiva de ações, a evolução das cotações não depende unicamente do desempenho do negócio, mas também de fatores externos que não podem ser controlados por esta;

(iii) há diluição do capital social porque o exercício de opções implica na venda em bolsa das ações com preço pré-determinado.

É importante destacar que o stock options[18] nasceu há mais de 50 (cinquenta) anos, com o objetivo resolver o conflito existente entre os acionistas, que tendem a se preocupar com o crescimento a longo prazo, e os executivos, contratados para viabilizar este crescimento, mas que têm incentivos para focar no bônus pago anualmente. Com a adoção deste rendimento a longo prazo, os executivos teriam a opção de adquirir ações a longo prazo com preços menores e trabalhariam para valorizar as ações e lucrar com a compra futura.

Todavia, em estudo realizado na Universidade de Melbourne[19], publicado na Harvard Business Review, depois de obter dados de 9.143 empresas dos Estados Unidos, de 1996 a 2009, constatou-se que o stock options pode ter efeitos indesejados, ao passo que os executivos podem arriscar demais para que as ações sejam valorizadas[20], ou se acomodar quando as ações estiverem no patamar desejado[21].

Planos de ações, apontam os autores, podem estimular a acomodação quando for hora de manter o pé no acelerador. Ou, no outro extremo, incentivar riscos acima do tolerável. Os pesquisadores mostraram que, assim que recebem as opções de ações, quando precisam trabalhar pela valorização das ações, os executivos arriscam muito mais do que em outras situações. Eles querem, afinal, impulsionar o valor das ações quanto antes. Nessa fase, podem ser arrojados demais e colocar o negócio em risco. Mesmo que tudo dê certo e o valor das ações suba, as opções criam outro incentivo indesejado. Quando os ganhos acumulados já são muito altos e os executivos estão perto de receber a recompensa, eles tendem a se acomodar e se tornam conservadores demais – a ideia é arriscar o mínimo possível para garantir que as ações sigam no mesmo patamar[22].

Assim, para evitar os efeitos indesejados do stock options, no que tange à possibilidade de assunção de riscos pelos executivos, ou o engessamento de na tomada de decisões arrojadas, atualmente as companhias têm adotados outros bônus atrelados ao alcance de outras metas, bem como o pagamento de “prêmio a longo prazo atrelado à geração de caixa, ao valor de dividendos pagos aos acionistas e à cotação média das ações em determinado período do ano”[23]. Referido plano, apesar de não descrito claramente, pode-se tratar da phantom share, que não implica na compra das ações, mas somente utiliza a valorização das ações para a definição do incentivo a longo prazo.

Assim, entende-se que o stock options e a phantom share têm o mesmo objetivo de propiciar aos empregados de alta gestão maior remuneração baseada na valorização das ações da empresa e incentivar sua permanência nos quadros pessoais. Todavia, como cada um dos institutos possui procedimentos diferenciados, é necessário avaliar a intenção da empresa com o pagamento do benefício e se está disposta a conceder efetivamente as ações ou não para os profissionais.

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Sobre a autora
Simone Feuser

Advogada trabalhista inscrita na OAB/SC 28.077. Pós-graduada em direito do trabalho, processo do trabalho e previdenciário. Pós-graduanda em direito constitucional.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FEUSER, Simone. Aplicação de phantom share aos contratos de trabalho. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 26, n. 6486, 4 abr. 2021. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/89456. Acesso em: 26 abr. 2024.

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