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A objeção de não-executividade

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01/12/2000 às 00:00
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7. OBJEÇÃO DE NÃO-EXECUTIVIDADE EM LUGAR DE EMBARGOS DO DEVEDOR?

A objeção de não-executividade não pode ser vulgarizada ao ponto de ser usada em substituição aos embargos. Seu cabimento é restrito às situações especiais em que, pela própria ausência de título, ou outro pressuposto processual subjetivo ou objetivo, o processo executivo tende à extinção futura. Então, nada mais lógico que antecipar seu aniquilamento induvidoso.

Casos há em que a emissão do título pelo devedor de próprio punho (como no exemplo do cheque, ou da nota promissória) ou por instrumento público, onde confessa a dívida, consolidam uma certeza inicial de validade da dívida que não pode ser afastada por mera alegação de invalidade em objeção de não-executividade.

Em situações tais, os embargos são a modalidade necessária para investigação das provas e razões que levaram o executado ao inadimplemento da pretensão deduzida. Admitir-se discutir o mérito em casos análogos, seria vulnerar os princípios que informam a execução, instaurando um inexistente contraditório em terreno impróprio que é o processo executivo.

O juiz, atento aos preceitos processuais, somente deferirá o pedido em objeção de não-executividade quando, de plano ou pela prova suscinta produzida pelo demandado, vislumbrar a inexorável improcedência da execução encetada. Havendo a mínima dúvida, ou sendo a matéria afeta ao mérito da causa debendi, com possibilidade de manutenção do título executivo ou reconhecimento da relação jurídica que lhe deu origem, deverá, por prudência, reservar a discussão da matéria para os competentes embargos.

Essa atuação deve ser tratada com status de premissa ao bom desempenho da atividade judicante, pois a viciação do título executivo, que a rigor goza da presunção de liquidez, certeza e exigibilidade, tem caráter excepcional.

ARAKEN DE ASSIS, discorrendo sobre o controle dos pressupostos processuais e da pretensão de executar, assinala que, em geral, sua análise "envolve ‘assunto que o juiz deve examinar de ofício’ ao lhe ser apresentada a inicial." (...) "Embora não haja previsão legal explícita, tolerando o órgão judiciário, por lapso, a falta de algum pressuposto, é possível o executado requerer seu exame, quiçá promovendo a extinção da demanda executória, a partir do lapso de 24 hs., assinado pelo art. 652. Tal provocação de matéria passível de conhecimento de ofício pelo juiz independe de penhora e, a fortiori, do oferecimento de embargos (art. 737, I)."(26)

HUMBERTO THEODORO JÚNIOR é criterioso ao tratar deste delicado pormenor, quando aduz, textualmente: "É claro, porém, que tal incidente só pode ser eficazmente promovido quando a causa de nulidade ou de inviabilidade da execução for absoluta e notória, pelos próprios elementos dos autos. Se para alcançá-la for necessário revolver fatos e provas de maior complexidade, somente por via dos embargos a defesa será argüível. Não é admissível que, a pretexto de exceção de pré-executividade, pretenda o devedor a instauração de uma dilação probatória contenciosa, sem observar os pressupostos dos embargos à execução". (27)

O que se vê, na maioria dos casos, é a movimentação da máquina judiciária, mesmo em sede de embargos, com fito meramente procrastinatório, o que deve ser evitado.

A jurisprudência, atenta às mostras contumazes de esperteza por parte dos devedores, tem sido coerente nos seus julgados, não admitindo os expedientes tendentes a driblar o roteiro traçado pelo Código para a oposição ao débito constituído no título, conforme adiante se vê:

EXECUÇÃO POR TÍTULO EXTRAJUDICIAL – SUSPENSÃO DO PROCESSO – SUSPENSÃO ANTES DA PENHORA – IMPOSSIBILIDADE – Execução por título extrajudicial, suspensa antes da penhora, para aguardar-se pelo exeqüente oferecida em ação declaratória do valor do débito, em outra Vara ajuizada. Não se inscrevem o ajuizamento da declaratória e a exceção como causas de suspensão da execução. De previsão estrita (art. 791, do C.P.C.) Nem incide a hipótese do art. 265, IV, ´, consoante prevalente orientação jurisprudencial. Não se configura exceção de preexecutividade. Em tema de execução, a defesa do devedor se exerce por meio de embargos (art. 741) ou de exceção de incompetência, se for o caso (art. 742) Agravo provido para prosseguir-se a execução. (28)

AGRAVO REGIMENTAL – EXECUÇÃO – COMPARECIMENTO ESPONTÂNEO DO RÉU – DESNECESSIDADE DE CITAÇÃO – ART. 214, § 1.º DO CPC – EXCEÇÃO DE PREEXECUTIVIDADE – MATÉRIAS IMPERTINENTES - O comparecimento espontâneo do réu torna desnecessária a sua citação – Excesso de execução oriundo da cobrança de juros acima do limite constitucional é matéria a ser suscitada em embargos e não em exceção de preexecutividade.(29)

Assim, resta claro o alcance do instituto denominado objeção de não-executividade. Pode ser utilizado para dar conhecimento ao juízo da execução, de circunstância que fulmina o processo executivo e pode ser conhecida de ofício por este.


8. CONCLUSÃO

Para assegurar a eficácia dos títulos executivos, sejam eles judiciais, resultantes de processo movimentado para solucionar conflitos de interesses resistidos, ou extrajudiciais, nos casos que a lei prevê, o credor dispõe do processo de execução, em suas diversas modalidades.

A regra é que, após garantido o juízo com bens bastantes à satisfação da pretensão deduzida pelo credor, o devedor movimente a jurisdição por meio de processo cognitivo oposto ao executivo, ou seja, os embargos à execução.

Casos há, porém, em que o devedor pode ingressar diretamente no processo de execução e aduzir questionamento que fulmina a execução, por ausência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido, o que a doutrina e a jurisprudência têm chamado de "exceção" ou "objeção de pré-executividade".

Tais expressões mostram-se tecnicamente inadequadas, preferindo-nos denominar o instituto de "objeção de não-executividade" ou "objeção à executividade".

A objeção de não-executividade (ou à executividade) tem lugar nas hipóteses em que caberia ao juiz, de ofício, conhecer da matéria, mesmo sem provocação da parte interessada, mais especificamente aquelas que importem em ausência de pressupostos de constituição e desenvolvimento válido e regular do processo de execução.

Decorre deste entendimento, que a objeção de não-executividade não tem o escopo de substituir os embargos do devedor, nem fornecer expediente temerário que permita frustrar a execução pela não constituição de garantia do juízo, uma vez que não se pode conceber a discussão de matérias de mérito ou que demandem produção de provas em sede de outra ação que não os embargos à execução.


NOTAS

1. MARQUES, José Frederico. Instituições de direito processual civil. Revista, atualizada e complementada por OVÍDIO ROCHA BARROS SANDOVAL. Vol. I, Campinas: Millennium, 1999, p.1.

2. CARNELUTTI, Francesco. Instituições do processo civil. Vol. I, Campinas : Servanda, 1999, p. 72.

3. Id., ib., p. 75.

4. Id., ib., p. 78.

5. juris dictio – dever/poder conferido ao juiz de "dizer o direito" aplicável ao caso concreto posto à apreciação jurisdicional.

6. ASSIS, Araken de. Manual do Processo de Execução. 2a ed., São Paulo : RT, 1995, p. 65.

7. Cf. op. cit. p. 79.

8. MIRANDA, Pontes de. Tratado das ações. Tomo 7, Campinas : Bookseller, 1999, p. 36.

9. CARMONA, Carlos Alberto et alie. Títulos Executivos Extrajudiciais no CPC. in Processo de Execução e Assuntos Afins. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998, p. 58.

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10. MARQUES, José Frederico. Instituições de Direito Processual Civil. Revista, atualizada e complementada por OVÍDIO ROCHA BARROS SANDOVAL. Vol. V. Campinas: Millennium, 1999, p. 17.

11. Dispõem os artigos em tela: Art. 741. Na execução fundada em título judicial, os embargos só poderão versar sobre: I – falta ou nulidade de citação no processo de conhecimento, se a ação lhe correu à revelia; II – inexigibilidade do título; III – cumulação indevida de execuções; IV – excesso de execução, ou nulidade desta até a penhora; VI – qualquer causa impeditiva, modificativa ou extintiva da obrigação, como pagamento, novação, compensação com execução aparelhada, transação ou prescrição, desde que supervenientes à sentença; VII – incompetência do juízo da execução, bem como suspeição ou impedimento do juiz.

Art. 745. Quando a execução se fundar em título extrajudicial, o devedor poderá alegar, em embargos, além das matérias previstas no art. 741, qualquer outra que lhe seria lícito deduzir como defesa no processo de conhecimento.

12. NERY JR., Nelson. Princípios do Processo Civil na CF, São Paulo: Revista dos Tribunais, 1992, p. 127).

13. MENEZES, Cláudio Armando Couce de, e BORGES, Leonardo Dias. Objeção de exceção de pré-executividade e de executividade no processo do trabalho. Síntese Trabalhista n.º 115 – jan/99, p. 05.

14. MOREIRA, José Carlos Barbosa. Exceção de pré-executividade: uma denominação infeliz. Informativo Semanal ADV/COAD, 05/2000, p. 086.

15. Cf. MENEZES, Cláudio Armando Couce de, e BORGES, Leonardo Dias, op. cit., p. 05.

16.JUNIOR, Humberto Theodoro. Tutela Cautelar e Antecipatória em Matéria Tributária, RJ nº 245, mar/98, pg. 5.

17. WAMBIER. Tereza Arruda Alvim et al. Processo de Execução e Assuntos Afins, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1998, p. 410.

18. TJDF – AI 1998.00.02.001643-7 – (110625) – 3ª T. – Rel. Des. Angelo Canducci Passareli – DJU 08.12.1998 – p. 64 – in Juris Síntese, CD-ROM – verbete 310344.

19. STJ – 4a T., REsp 3.079, rel. Min. Cláudio Santos. Apud LUCON, Paulo Henrique dos Santos. O Controle dos atos executivos e efetividade da execução. Art. publicado na RJ nº 253 – Porto Alegre : Síntese, nov/98, pág. 5.

20. LUCON, Paulo Henrique dos Santos. O Controle dos atos executivos e efetividade da execução. Art. publicado na RJ nº 253 – Porto Alegre : Síntese, nov/98, pág. 10.

21. TRF 3ª R. – AI 51.242 – SP – 3ª T. – Rel. Juiz Manoel Álvares – DJU 18.11.1998 – p. 502 – in Juris Síntese, verbete 702880.

22. LUCON, Paulo Henrique dos Santos. Op. cit.

23. COSTA E SILVA, Antônio Carlos. Tratado do processo de execução. 2a ed., Rio de Janeiro : Aide, 1986, P. 534.

24. Cf. LUCON, Paulo Henrique dos Santos. Op. cit.

25. Cf. ASSIS, Araken de, op. cit., p. 426.

26. Cf. ASSIS, Araken, op. cit., p. 425/6.

27. JUNIOR, Humberto Theodoro. Tutela Cautelar e Antecipatória em Matéria Tributária. Art. Publicado na RJ nº 245 - MAR/98, p. 5.

28. TACRJ – AI 797/96 – (Reg. 485-2 – Cód. 96.002.00797 – 5ª C. – Rel. Juiz Luiz Roldão de F. Gomes – J. 19.06.1996 (Ementa 43748) in Juris Síntese, CD 19, verbete 11005862.

29. TJMS – AgRg – N. 56.857-8/01 – Campo Grande – 1ª T.C. – Rel. Des. Atapoã da Costa Feliz. – J. 06.03.1998- in Juris Síntese CD 19, verbete 2001549.


BIBLIOGRAFIA

ASSIS, Araken de. Manual do processo de execução. 2.ed. São Paulo : RT, 1995.

CARNELUTTI, Francesco. Instituições do processo civil. Campinas : Servanda, 1999. Vol. I.

CARMONA, Carlos Alberto et al. Títulos Executivos Extrajudiciais no CPC. in Processo de Execução e Assuntos Afins. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998.

COSTA E SILVA, Antônio Carlos. Tratado do processo de execução. 2. ed. Rio de Janeiro : Aide, 1986.

JUNIOR, Humberto Theodoro. Tutela cautelar e antecipatória em matéria tributária. Porto Alegre, Síntese, RJ, v. 245, mar.1998.

LUCON, Paulo Henrique dos Santos. O Controle dos atos executivos e efetividade da execução. Porto Alegre, Síntese, RJ, v. 253, nov. 1998.

MARQUES, José Frederico. Instituições de direito processual civil. Revista, atualizada e complementada por OVÍDIO ROCHA BARROS SANDOVAL. Campinas: Millennium, 1999. Vol. I.

MENEZES, Cláudio Armando Couce de, e BORGES, Leonardo Dias. Objeção de exceção de pré-executividade e de executividade no processo do trabalho. Síntese Trabalhista v.115, jan. 1999.

MIRANDA, Pontes de. Tratado das ações. Tomo 7, Campinas : Bookseller, 1999.

MOREIRA, José Carlos Barbosa. Exceção de pré-executividade: uma denominação infeliz. Informativo Semanal ADV/COAD, 05/2000.

NERY JR., Nelson. Princípios do processo civil na CF, São Paulo: Revista dos Tribunais, 1992.

WAMBIER. Tereza Arruda Alvim et al. Processo de execução e assuntos afins, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1998.

CD ROM JURIS SÍNTESE, n. 19, versão set. - out. 1999.

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Sobre o autor
Helder Martinez Dal Col

Advogado e Professor no Paraná, Especialista em Direito Civil e Processual Civil pela Fundação Getúlio Vargas (FGV/RJ), Mestre em Direito Civil pela Universidade Estadual de Maringá (UEM/PR)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

COL, Helder Martinez Dal. A objeção de não-executividade. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 5, n. 48, 1 dez. 2000. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/908. Acesso em: 11 mai. 2024.

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