Aplicação da teoria da ressocialização na progressão de regime dos crimes hediondos sob a ótica do pacote anticrime

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6.PACOTE ANTICRIME

 No dia 24 de dezembro de 2019 foi publicada no Diário Oficial da União a Lei 13.964/2019, também conhecida como “Pacote Anticrime”. Proposta legislativa apresentada pelo Ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro.

A presente lei promove alterações em diversas legislações, como por exemplo, o Código Penal, o Código de Processo Penal, a Lei de Crimes Hediondos, a Lei de Execução Penal, dentre outras. Foi objeto de bastante discussão nas casas legislativas, sendo alterada diversas vezes. Além disso, foram ajuizadas quatro Ações Diretas de Inconstitucionalidade, sendo elas: ADI 6.298, ADI 6.299, ADI 6.300 e a ADI 6.305. Onde visa aumentar a eficácia no combate ao crime organizado, ao crime violento e à corrupção, e há um recrudescimento penal.

6.1.Alterações na Progressão de Regime em Crimes Hediondos

O pacote anticrime promoveu uma mudança substancial na progressão de regime prevista na Lei de Execuções Penais. Anteriormente, o art. 112 da LEP, estabelecia que a progressão seria aplicada com o sistema de frações.

Havia a progressão com o cumprimento de 1/6 da pena em casos de crimes diversos dos hediondos e equiparados, sendo irrelevante se era primário ou reincidente. Nos crimes hediondos ou equiparados a hediondos, a progressão de regime operava quando houvesse o cumprimento de 2/5 da pena, caso fosse primário, ou 3/5 em caso de reincidência. (METZKER, 2020, pag. 86/87).

 Atualmente, o novo texto legislativo passa a disciplinar uma série de percentuais escalonados para a progressão de regime. Além disso, há uma diferenciação entre ser primário ou reincidente; crimes praticados com violência ou grave ameaça, resultado morte, entre outras. Conforme demonstrado abaixo:

Art. 112. A pena privativa de liberdade será executada em forma progressiva com a transferência para regime menos rigoroso, a ser determinada pelo juiz, quando o preso tiver cumprido ao menos:

I - 16% (dezesseis por cento) da pena, se o apenado for primário e o crime tiver sido cometido sem violência à pessoa ou grave ameaça; 

II - 20% (vinte por cento) da pena, se o apenado for reincidente em crime cometido sem violência à pessoa ou grave ameaça:

III - 25% (vinte e cinco por cento) da pena, se o apenado for primário e o crime tiver sido cometido com violência à pessoa ou grave ameaça:

IV - 30% (trinta por cento) da pena, se o apenado for reincidente em crime cometido com violência à pessoa ou grave ameaça:

V - 40% (quarenta por cento) da pena, se o apenado for condenado pela prática de crime hediondo ou equiparado, se for primário:

VI - 50% (cinquenta por cento) da pena, se o apenado for

a) condenado pela prática de crime hediondo ou equiparado, com resultado morte, se for primário, vedado o livramento condicional;

b) condenado por exercer o comando, individual ou coletivo, de organização criminosa estruturada para a prática de crime hediondo ou equiparado;

c) condenado pela prática do crime de constituição de milícia privada

VII - 60% (sessenta por cento) da pena, se o apenado for reincidente na prática de crime hediondo ou equiparado;

VIII - 70% (setenta por cento) da pena, se o apenado for reincidente em crime hediondo ou equiparado com resultado morte, vedado o livramento condicional.(BRASIL, 1984).

 As inovações demonstradas acima tiveram como objetivo dificultar as saídas dos apenados, trazendo para o sistema penal a perspectiva de combate ao inimigo mantendo-o no cárcere. Percentuais tão elevados, tornaria, na prática, alguns crimes impossíveis de progressão.

6.2.O critério de ressocialização e o Pacote Anticrime

A punição aplicada pelo Estado deve ir além de uma simples sanção penal. É necessário acreditar e trabalhar para que o infrator, ao sair do sistema prisional, tenha atitudes diferentes das anteriores. A ressocialização tem como objetivo a prevenção de crimes e também a humanização da passagem do detento na instituição carcerária, em outras palavras, busca preparar o detento para o retorno a sociedade. Nesse sentido, Cezar Roberto Bitencourt preleciona:

Ao mesmo tempo que com a execução da pena se cumprem os objetivos de prevenção geral, isto é, de intimidação, com a pena privativa de liberdade busca-se a chamada ressocialização do delinquente. (BITENCOURT, 2020, pag. 355).

Conforme fora mencionado, o pacote anticrime veio com o objetivo de recrudescimento penal. Assim, alguns crimes, pela sua gravidade, terão uma penalidade maior e, consequentemente, uma progressão de regime mais demorada, sendo quase impossível esta ressocialização.

Os infratores, reincidentes em crimes hediondos ou equiparados com resultado morte, por exemplo, terão que cumprir 70% (setenta por cento) da pena para terem direito ao instituto da progressão de regime. Tanto tempo no cárcere, em regime fechado, dificultará a ressocialização e a educação do preso para que retorne ao convívio social. Acredita-se que quanto mais rígida for a lei, menos crimes serão cometidos. Contudo, a Lei de Drogas no ano de 1998 foi alterada, houve um endurecimento na pena para o crime de tráfico de drogas, mas, mesmo assim, a taxa de crimes aumentaram e mais pessoas passaram a ficar presas por mais tempo.

É necessário estudar o problema, elaborar diagnósticos, entendermos a segurança pública. O endurecimento da legislação penal não vai diminuir a incidência criminal. Trata-se de algo muito maior que vai além do quantum penal.


CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante dessa explanação, verificamos a necessidade de estudar, analisar e mudar a estrutura penal como um todo. O Estado não dispõe de políticas públicas efetivas e duradouras no sentido de integrar socialmente os egressos.

Como mencionado, deve-se primeiramente identificar o problema e não somente buscar soluções rápidas e ineficazes. A resposta para a redução da criminalidade é muito maior que apenas o quantum penal, maior que apenas aumentar o tempo que o infrator ficará no cárcere. Foi demonstrado que o endurecimento da Lei de Drogas não foi suficiente para a redução desses crimes.

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Assim, nota-se que somente a aplicação de penas mais severas não são o único caminho para que haja uma possibilidade de diminuição na prática de crimes e na efetiva ressocialização do agente na sociedade. Infelizmente, o sistema carcerário brasileiro não possui métodos ativos que contribuem para que, ao longo do cumprimento da pena, o agente infrator busque e deseje se tornar um cidadão melhor. Pelo contrário: a situação em que se encontram aqueles que estão reclusos contribui para que se tornem cada vez mais seres humanos de alta periculosidade, o que o torna, cada vez menos aceito e ressocializado na sociedade em que vivia.

É necessário um planejamento que envolve entender a atual situação de calamidade na segurança pública, investir na qualificação policial e, principalmente, investir em educação, que é a base de todo ser humano. Assim, um dos pontos essenciais em se tratando de prevenção de crimes, é a educação, principalmente das crianças, pois esta é a fase de maior importância para o desenvolvimento de um ser humano com pensamentos e atitudes diferentes, daqueles que infelizmente não a tiveram.


REFERÊNCIAS

BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal - v. 1: parte geral (arts. 1 a 120). 24. ed. São Paulo: Saraiva Jur, 2018.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988: promulgada em 05 de outubro de 1988. 31. Ed. São Paulo: Saraiva, 2021.

______. Código Penal. Decreto Lei 2.848 de 07 de dezembro de 1940. 31. Ed. São Paulo: Saraiva, 2021.

______. Lei nº 7210, de 11 de julho de 1984: Institui a Lei de Execução Penal. Brasília, DF: Presidência da República, 31. Ed. São Paulo: Saraiva, 2021.

______. Lei nº 8072 de 25 de julho de 1990: Dispõe sobre Crimes Hediondos. Brasília, DF: Presidência da República, 31. Ed. São Paulo: Saraiva, 2021.

______. Lei nº 13.964 de 24 de dezembro de 2019: Aperfeiçoa a legislação penal e processual penal. Brasília, DF: Presidência da República, 31. Ed. São Paulo: Saraiva, 2021.

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL E DOS TERRITORIOS. Circunstâncias Judiciais. Disponível em: <https://www.tjdft.jus.br/consultas/jurisprudencia/jurisprudencia-em-temas/a-doutrina-na-pratica/circunstancias-judiciais-1>. Acessado em: 29 de março de 2021.

ESTEFAM, André; GONÇALVES, Victor Eduardo Rios.Direito penal esquematizado: parte geral - 9. ed. – São Paulo: Saraiva Educação, 2020.

GRECO, Rogério. Crimes Hediondos: Comentários à lei 8.072/1990 – 3. ed.- Niterói, RJ: Impetus, 2020.

GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal - 17. ed.-Rio de janeiro: lmpetus, 2015.

IPEA (INSTITUTO DE PESQUISA ECONÔMICA APLICADA). Reincidência Criminal no Brasil. CNJ, 2015. Disponível em: <https://www.cnj.jus.br/wpcontent/uploads/2011/02/716becd8421643340f61dfa8677e1538.pdf>. Acesso em: 13 de março de 2021.

MASSON, Cleber. Direito Penal: parte geral (arts. 1º a 120) – v.1– 14. Ed. – Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2020.

METZKER, David. Lei Anticrime (Lei 13.964/2019): Comentários às modificações no CP, CPP, LEP, Lei de Drogas e Estatuto do Desarmamento.- Edição Revista e Atualizada / David Metzker-Timburi, SP: Editora Cia do eBook, 2020.

PACELLI, Eugênio; CALLEGARI, André Callegari. Manual de Direito Penal -5. Ed.- São Paulo: Atlas, 2019

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Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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Autoria: Jennifer Stephanie Carques Venades e Bruna Luiza Moreira dy Carvalho, Acadêmicas de Direito

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