Capa da publicação Mulher: membro vulnerável de violência doméstica
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A evolução do papel da mulher e sua permanência como membro vulnerável de violência domestica sob análise de dados.

Historicidade da mulher como membro vulnerável na relação doméstica

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Questiona-se a efetividade da Lei Maria da Penha no combate à violência doméstica, propondo alternativas para resolver a situação de violência contra a mulher.

Resumo: O presente estudo busca analisar e compreender os mecanismos de prevenção e combate a violência praticada contra a mulher. Ao longo da história, a mulher sempre foi inferiorizada, subjugada e tratada como propriedade do homem, em decorrência a essas concepções arcaicas, a construção da mulher na sociedade sempre foi limitada pelo homem. Desde a formação do Brasil no século XV que a violência de todas as formas contra mulher está assentada baseada no modelo patriarcal. Em 1916, a mulher foi julgada incapaz de gerir sua vida civil por um Código Civil genuinamente machista, que colocava a mulher submissa ao pai e marido. Com passar do tempo foram se permitindo e “naturalizando” condutas violentas praticadas em desfavor da mulher. Nessa ótica frente a crescente violência e em decorrência da pressão por organismos internacionais, adveio a Lei Maria da Penha. A presente pesquisa buscou tecer algumas considerações sobre a Lei nº 11.340 de 2006, em especial questionando a sua efetividade no combate à violência doméstica e familiar, considerando que o índice de feminicídio e de violência doméstica e familiar contra a mulher tem aumentado nos últimos anos, e propondo alternativas que possam contribuir para a resolução da situação de violência e para evitar a prática ou a reincidência da violência doméstica ou da ocorrência do feminicídio.

Palavras-chave: Violência doméstica. Papel da mulher. Lei Maria da Penha. Grupo vulnerável. Combate.

Sumário: 1. ​Introdução. 2. Relação de gênero no Brasil. 3. Mudanças legislativas relacionadas à proteção da mulher e das vítimas de violência doméstica e familiar​. Conclusão​.


1. INTRODUÇÃO

O presente trabalho terá por objetivo demonstrar as mudanças e continuidades do papel da mulher na sociedade, no qual a violência contra elas sempre esteve presente na história da humanidade, as agressões que milhares de mulheres vivenciaram diariamente, por muitos séculos, sequer era considerado crime, fruto de paradigmas sociais que aceitavam este comportamento agressor.

Este contexto social mudou nos últimos séculos, em que a mulher passou a laborar fora do lar e assumir – ao menos formalmente – sua condição igualitária na sociedade.

Todavia, a prática da violência doméstica como uma imposição do gênero masculino sobre o feminino ainda persiste, o que culminou, no caso do Brasil, na criação da Lei nº 11.340 de 2006, que objetivou proteger juridicamente as mulheres contra a violência doméstica e familiar. Em que pese estar há quase 15 (quinze) anos em vigor, ainda existem muitos questionamentos sobre a efetividade da Lei Maria da Penha, considerando que, nos últimos anos, os índices de violência contra a mulher e feminicídio têm aumentado (RELATÓRIOS DINÂMICOS, 2019).

Baseado nessa ótica, a violência doméstica pode ser uma modalidade inerente ás relações de afeto e que se baseia no subsídio do poder, agredindo física, mental, moral, patrimonial ou sexualmente a vítima.

No estudo que se propõe, será utilizada a pesquisa descritiva, pois examinará as características gerais do fenômeno sob estudo, a saber, a efetividade da Lei Maria da Penha no combate à violência doméstica, a as relacionará às discussões teóricas sobre a questão encontras na literatura jurídica apurada por meio de coleta de dados bibliográficos e examinados por meio de análise de conteúdo.

Para isso, a pesquisa é de cunho bibliográfico e artigos científicos buscando através das discussões teóricas refletirem sobre a referida temática.


2. RELAÇÃO DE GÊNERO NO BRASIL

A formação familiar, no âmbito social, se consolidou através dos séculos por uma perspectiva predominantemente patriarcal, centrada na figura do homem com o poderio do poder familiar. Aos homens é associado à força física, razão e equilíbrio que são considerados positivos na personalidade masculina. A mulher é sempre apresentada como frágil emotiva e dócil, sendo essas características desvalorizadas socialmente em relação às características apresentados pelos homens. Conveniente dizer que ao longo dos anos isso está mudando, mas, ainda sim, as mulheres sofrem com essa diferenciação de gênero.

Historicamente, conforme Azevedo (1976),

A mulher ficou subordinada ao poder do homem, tendo a função de criar da prole, manutenção do lar e a educação dos filhos. No Brasil colônia cabia à Igreja a educação dos filhos, contudo, as aulas ministradas pela Igreja, na época, não incluíam as mulheres, pregava ainda que a mulher devesse obediência ao pai, aos irmãos mais velhos, ao marido e à religião. (AZEVEDO, 1976).

Com isso a mulher estava sempre presa dentro de casa sem contato com o mundo, pois os únicos motivos para viver eram o lar e a igreja.

De acordo com o Código Civil de 1916 sustentou os princípios conservadores mantendo o homem como o “todo poderoso” limitando a capacidade da mulher a determinados atos como, por exemplo, a emancipação que será concedida pelo pai, ou, pela mãe apenas no caso do pai estar morto.

Esse preconceito e submissão se reafirmam na leitura do art. 242. do Código Civil de 1916, vejamos:

Art. 242. A mulher não pode, sem autorização do marido (art. 251):

I - Praticar os atos que este não poderia sem o consentimento da mulher (art. 235);

II - Alienar ou gravar de ônus real os imóveis de seu domínio particular, qualquer que seja o regime dos bens (arts. 263, II, III e VIII, 269, 275 e 310);

III - Alienar os seus direitos reais sobre imóveis de outrem;

(...)

IV ​- Contrair obrigações que possam importar em alheação de bens do casal. (BRASIL, 1916).

Como exemplos da construção da posição desigual de homens e mulheres na sociedade, a legislação do Brasil Colônia dava aos maridos o direito de assassinar as mulheres. E o Código Civil que vigorou de 1916 a 2002 considerava mulheres casadas como “relativamente incapazes”.

Assim como ocorreu com a escravidão, que legalizava o tratamento a seres humanos negros como “coisas”. O que na atualidade é reconhecidamente absurdo, já foi aceitável legalmente, conforme entendimento de Maria Berenice Dias:

O Código Civil de 1916 era uma codificação do século XIX, pois foi no ano de 1899 que Clóvis Beviláqua recebeu o encarrego de elaborá-lo. Retratava a sociedade da época, marcadamente conservadora e patriarcal. Assim, só podia consagrar a superioridade masculina. Transformou a força física do homem em poder pessoal, em autoridade, outorgando-lhe o comando exclusivo da família. Por isso, a mulher ao casar perdia sua plena capacidade, tornando-se relativamente capaz, como os índios, os pródigos e os menores. Para trabalhar precisava da autorização do marido. (DIAS, 2014, p. 6)

Contudo a partir da década de 40 o feminismo começa a dar os primeiros passos, tendo como marco jurídico o Estatuto da Mulher Casada de 27 de agosto de 1962 com a Lei nº 4.121, que alterou o Código Civil de 1916, concedeu o exercício do pátrio poder a ambos os pais, prevalecendo à vontade do homem no caso de discordância do casal, contudo a mãe tinha o direito de recorrer ao juiz para solução da divergência.

Art.380. Durante o casamento compete o pátrio poder aos pais, exercendo- o marido com a colaboração da mulher. Na falta ou impedimento de um dos progenitores, passará o outro a exercê-lo com exclusividade.

Parágrafo único. Divergindo os progenitores quanto ao exercício do pátrio poder, prevalecerá a decisão do pai, ressalvado à mãe o direito de recorrer ao juiz para solução da divergência. (BRASIL, 1916).

Com o advento do regime Republicano Brasileiro veio o Decreto nº 181, de 24 de janeiro de 1890, em seu art. 56, que dispõe sobre os efeitos do casamento, manteve o domínio patriarcal, no entanto, de forma mais suave quando dispôs sobre o casamento civil e retirou do marido o direito de impor castigo corpóreo a mulher e os filhos, mas ainda cabia ao marido à autorização da profissão da mulher, conforme §3º art. 56. (Brasil, 1890).

Pela primeira vez, em 1934, no seu art. 113. CR/34, o constituinte se preocupa com a situação da mulher de forma a proibir distinções e privilégios em razão do sexo. (Brasil, 1934).

A Constituição, outorgada, em 1937, na qual em visível retrocesso, extingue a referência expressa à igualdade entre os sexos, retornando a ideia das Constituições promulgadas no século anterior.

Na Constituição de 1946 o legislador apenas reproduziu o texto anterior.

Contudo apenas em 1988, diante de nossa atual carta Magna o legislador tirou a controvérsia:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

I - Homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição. (BRASIL, 1988)

Assim, a Constituição de 1988 em manifestação da democracia, alcança seu objetivo de não distinguir homens e mulheres de qualquer natureza, incluindo aqui a distinção de gênero, como ocorreram em outras constituições passadas.

Diante de todo esse processo histórico, conforme entendimento de Margarita Dias e Francisco Cabral, “gênero refere-se às relações sociais desiguais de poder entre homens e mulheres que são o resultado de uma construção social do papel do homem e da mulher a partir das diferenças sexuais.” (DIAS et al, 1998).

Assim, entende-se que o termo sexo refere às características biológicas do ser humano, ou seja, relacionado aos órgãos genitais de ambos os sexos, os aparelhos reprodutores masculinos e femininos, respectivamente. Ao passo que gênero está direcionado as relações sociais entre os sexos, homem e mulher, e o poder dos homens perante as mulheres.

Essa sociedade na qual valorizava as características masculinas em detrimento das femininas, chamada de patriarcal, ainda exerce grande influência nas relações de gênero nos dias atuais, pois as mulheres muitas vezes ainda são vítimas de violência apenas pelo fato de ser mulher dependente financeiramente do patriarca.

Mesmo com a atual discussão a respeito da proteção a dignidade feminina e busca pela igualdade em todos os aspectos, ainda encontramos indícios, em pequenas atitudes que em primeira análise não parecem ofensivos ou preconceituosos, mas de fato representam a forte influência do patriarcado na nossa formação como indivíduos. (NOGUEIRA, 2018).

A desigualdade social entre os sexos é exteriorizada com a supremacia dos homens no contexto social, uma vez que, ao longo dos anos as mulheres foram submetidas às discriminações e não garantida a elas igualdade em relação aos homens, conforme pesquisa da revista Época (2015);

[...] segundo Saadia Zahidi, responsável pelo relatório, o ponto em comum entre todos os países é que, apesar de avançarem em escolaridade, as mulheres têm dificuldades enormes de ascensão a posições de alto escalão. "As empresas e os governos precisam programar novas políticas para evitar a perda contínua de talento. Políticas mais eficazes nesse sentido podem impulsionar o crescimento e a competitividade” (COSTA, 2015). (GRIFO NOSSO)

Nesse contexto de desigualdade pode se verificar que a mulher, quando vítima de violência, ainda sob influência da sociedade patriarcal, é discriminada.

Segundo Barsted (1999):

O quadro se agravou diante de um histórico de colonização e desenvolvimento econômico estrutural na qual tinha base em relações racializadas, passou, ainda, por duas ditaduras somente no período republicano, em que a violência, inclusive contra as mulheres que se inicializou. (BARSTED, 1999).

Desta forma, contribui para que os casos de violência de gênero ocorram e continuem acontecendo mesmo com o advento de leis protecionistas, assegurando que há algo de errado na aplicação destes direitos.

A violência contra a mulher, como foi dito, acaba sendo uma consequência do elemento constitutivo de relações sociais fundadas sobre as desigualdades entre os sexos, e o gênero é o primeiro motivo para fundamentar tal violência.

Diante disso, pode-se considerar que a mulher se encontra no grupo de pessoas vulneráveis, relativos a pessoas mais passíveis de terem seus direitos violados, devido ao seu próprio estereótipo.

Portanto, conforme Bastos (2002), grupo vulnerável é o “conjunto de pessoas pertencentes a uma minoria que por motivação diversa, tem acesso, participação e ou oportunidade igualitária dificultada ou vetada, a bens e serviços universais disponíveis para a população”.


3. MUDANÇAS LEGISLATIVAS RELACIONADAS À PROTEÇÃO DA MULHER E DAS VÍTIMAS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR

​Quanto às mudanças legislativas relacionadas à proteção da mulher e das vítimas de violência domestica e familiar destacamos a lei nº 11.340, denominada como Lei Maria da Penha, foi promulgada em 07 de agosto de 2006, a fim de propiciar meios para prevenir e reprimir violência doméstica e familiar contra a mulher. O texto da Lei versa sobre a criação de Juizados de violência doméstica e familiar contra a mulher, altera dispositivos do Código Penal e da Lei de Execuções Penais, além de estabelecer medidas de assistência e proteção às mulheres em situação de violência doméstica.

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​Conforme a CIDH (2001), a Lei Maria da Penha surgiu depois de recomendações feitas pela Corte Interamericana de Direitos Humanos.

Antes da criação da Lei 11.340/2006 não existia no ordenamento jurídico brasileiro nenhuma lei que visava coibir a violência contra as mulheres de forma específica. Entretanto, pode-se considerar que a Constituição Federal de 1988 trouxe significativa mudança nesse paradigma, garantindo que o Estado deve prestar a assistência a todos os integrantes da família, conforme dispõe seu art. 226, parágrafo 8º:

Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.

[...]

§ 8º - O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações. (BRASIL, 1988).

Nesse contexto, observa-se a imposição da carta Magna ao Estado de proteger as relações familiares de violência mediante a criação de mecanismos para coibi-la.

O Comitê para a Eliminação de todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (CEDAW) foi adotado pela Assembleia Geral em 18 de dezembro de 1979, e entrou em vigor em 3 de setembro de 1981 que contém diretrizes de proteção do Estado à mulher que em seu art. 1º traz “a discriminação contra a mulher” como sendo:

Art. 1º (...) Toda distinção, exclusão ou restrição baseada no sexo e que tenha por objeto ou resultado prejudicar ou anular o reconhecimento, gozo ou exercício pela mulher, independentemente de seu estado civil, com base na igualdade do homem e da mulher, dos direitos humanos e liberdades fundamentais nos campos político, econômico, social, cultural e civil ou em qualquer outro campo. (CEDAW, 1979).

Segundo Helena Omena Lopes de Faria e Mônica de Melo, a Convenção sobre a Eliminação de todas as formas de Discriminação contra a mulher (CEDAW) de 1979 incentiva esse preceito constitucional de proteção no âmbito familiar, como observa na citação:

[...] prevê a possibilidade de adoção de medidas afirmativas ("ações afirmativas"), como importantes medidas a serem adotadas pelos Estados para acelerar o processo de obtenção da igualdade. Permite-se a "discriminação positiva", pela qual os Estados podem adotar medidas especiais temporárias, visando acelerar o processo de igualização de status entre homens e mulheres. Tais medidas cessarão quando alcançado o seu objetivo. São medidas compensatórias que visam remediar as desvantagens históricas, consequências de um passado discriminatório, buscando a pluralidade e diversidade social. (FARIA; MELO 2015) (grifo nosso)

A Lei nº 11.340/2006, Lei Maria da Penha, é exemplo pontual de medida afirmativa com intuito de possibilitar a igualdade de fato entre homens e mulheres. Diante desse contexto social, surgiu uma Cearense de Fortaleza, a senhora Maria da Penha Maia Fernandes, a inspiradora da Lei Maria da Penha:

Maria da Penha Maia Fernandes, uma farmacêutica brasileira nascida no Ceará em 1945, que sofreu diversas agressões por seu marido, Marco Antônio Heredia Viveros. Maria da Penha sofreu duas tentativas de homicídio no ano de 1983 cometidas por seu marido, que até mesmo tentou eletrocutá-la, o que acabou deixando-a paraplégica. Após anos de luta, em 2002 o agressor foi condenado a oito anos de prisão, porém, ficou preso apenas por dois anos e hoje está livre. (RAMALHO, 2017, p.8)

Segundo entendimento de Ramalho (2017), o caso concreto serviu de instrumento para que Maria da Penha, com apoio do CLADEM (Comitê Latino americano e do Caribe para a Defesa dos Direitos da Mulher) e CEJIL (Centro pela Justiça e o Direito Internacional), denunciasse o Brasil na Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA).

Após o processo e comprovação das denúncias, resultou na condenação do Estado brasileiro pela a inércia e pela falta de punições das agressões domésticas ocorridas no interior do território brasileiro, a cumprir determinações impostas pela Comissão Internacional e o pagamento de indenização à Maria da Penha, no valor de 20 mil dólares, pelo fato da demora do processo e da desproporção entre o fato e a pena aplicada ao agressor, além de exigir as seguintes recomendações, expostas no Relatório Anual 54/01, Caso 12.051, de 04 de abril de 2001:

VIII. RECOMENDAÇÕES

61. A Comissão Interamericana de Direitos Humanos reitera ao Estado Brasileiro as seguintes recomendações:

1. Completar rápida e efetivamente o processamento penal do responsável da agressão e tentativa de homicídio em prejuízo da Senhora Maria da Penha Fernandes Maia.

2. Proceder a uma investigação séria, imparcial e exaustiva a fim de determinar a responsabilidade pelas irregularidades e atrasos injustificados que impediram o processamento rápido e efetivo do responsável, bem como tomar as medidas administrativas, legislativas e judiciárias correspondentes.

3. Adotar, sem prejuízo das ações que possam ser instauradas contra o responsável civil da agressão, as medidas necessárias para que o Estado assegure à vítima adequada reparação simbólica e material pelas violações aqui estabelecidas, particularmente por sua falha em oferecer um recurso rápido e efetivo; por manter o caso na impunidade por mais de quinze anos; e por impedir com esse atraso a possibilidade oportuna de ação de reparação e indenização civil.

4. Prosseguir e intensificar o processo de reforma que evite a tolerância estatal e o tratamento discriminatório com respeito à violência doméstica contra mulheres no Brasil. A Comissão recomenda particularmente o seguinte:

a) Medidas de capacitação e sensibilização dos funcionários judiciais e policiais especializados para que compreendam a importância de não tolerar a violência doméstica;

b) Simplificar os procedimentos judiciais penais a fim de que possa ser reduzido o tempo processual, sem afetar os direitos e garantias de devido processo;

c) O estabelecimento de formas alternativas às judiciais, rápidas e efetivas de solução de conflitos intrafamiliares, bem como de sensibilização com respeito à sua gravidade e às consequências penais que gera;

d) Multiplicar o número de delegacias policiais especiais para a defesa dos direitos da mulher e dotá-las dos recursos especiais necessários à efetiva tramitação e investigação de todas as denúncias de violência doméstica, bem como prestar apoio ao Ministério Público na preparação de seus informes judiciais.

e) Incluir em suas planas pedagógicas unidades curriculares destinadas à compreensão da importância do respeito à mulher e a seus direitos reconhecidos na Convenção de Belém do Pará, bem como ao manejo dos conflitos intrafamiliares. (COMISSÃO INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS, 2000).

Pode-se considerar que a Lei 10.455, de 13 de maio de 2002, que modificou o art. 69. da lei 9099/95, criando assim uma medida cautelar, de natureza penal, ao admitir a possibilidade de o juiz decretar o afastamento do agressor do lar conjugal na hipótese de violência doméstica, e a Lei 10.886, de 17 de julho de 2004, que acrescentou a natureza violência doméstica ao artigo 129 do CP, pelo menos tentavam amenizar o problema social da violência doméstica. Mas não foram suficientes para prevenir, tampouco reprimir a atuação de autores de violência doméstica:

Violência Doméstica

§ 9º Se a lesão for praticada contra ascendente, descendente, irmão, cônjuge ou companheiro, ou com quem conviva ou tenha convivido, ou, ainda, prevalecendo-se o agente das relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade:

Pena – detenção, de 6 (seis) meses a 1 (um) ano.

§ 10. Nos casos previstos nos §§ 1o a 3o deste artigo, se as circunstâncias são as indicadas no § 9º deste artigo, aumenta-se a pena em 1/3 (um terço). (BRASIL, 2004)

Retornando ao marco fundamental da Lei Maria da Penha, a mesma foi aprovada por unanimidade na Câmara e no Senado Federal, e em 07 de agosto de 2006, transformado como Lei Federal nº 11340 - Lei Maria da Penha.

Foram convidados para participar de reuniões ou convocados para oitivas alguns grupos, como a Articulação de Mulheres Brasileiras (AMB), Rede Nacional Feminista de Saúde, Direitos Sexuais e Direitos Reprodutivos, representações de mulheres indígenas e negras, representantes da Magistratura, da Segurança Pública, do Ministério Público e da Defensoria Pública. Outra presença marcante foi a de um grupo de juízes integrantes do Fórum Nacional de Juizados Especiais (FONAJE). (CALAZANS & CORTES, 2011, p. 45).

Desta forma, houve uma alteração importante no cenário da proteção da mulher por meio da Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) número 19, proposta em 2007, pelo Presidente da República na época, Luiz Inácio Lula da Silva, e a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) número 4424, ajuizada pela Procuradoria-Geral da República em 2010.

A ADC número 19 tinha por objetivo a declaração da constitucionalidade da Lei Maria da Penha, uma vez que o artigo 1º, exclusivamente, protege à mulher, como observa na letra da lei:

Art. 1º Esta Lei cria mecanismos para coibir e prevenir a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do § 8o do art. 226. da Constituição Federal, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Violência contra a Mulher, da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher e de outros tratados internacionais ratificados pela República Federativa do Brasil; dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; e estabelece medidas de assistência e proteção às mulheres em situação de violência doméstica e familiar. (BRASIL, 2006) (grifo nosso)

Depois de análise do Supremo Tribunal Federal (STF), em 09 de fevereiro de 2012, foi julgada procedente a ADC, tendo em vista que o artigo 1º da Lei 11.340/2006 foi considerado constitucional, pondo fim nas discussões relativas à sua inconstitucionalidade, frente ao princípio da igualdade de tratar igualmente os iguais e desigualmente as situações desiguais.

Outra questão relevante da ADC número 19 foi que seu julgamento declarou, também, constitucional os artigos 33 e 41 da Lei Maria da Penha. A respeito do artigo 33, reconheceu a competência cumulativa das varas cíveis e criminais para processar e julgar violência doméstica e familiar contra a mulher, enquanto não estiverem estruturados os juizados de violência doméstica. Sobre o artigo 41, confirmou a letra da lei que diz sobre a não aplicação da lei nº 9099 de 26 de setembro de 1995, em crimes praticados com violência doméstica e familiar contra mulher.

Vejamos os votos;

[...] primeira a votar após o ministro Marco Aurélio, relator da ação, a ministra Rosa Weber disse que a Lei Maria da Penha “inaugurou uma nova fase de ações afirmativas em favor da mulher na sociedade brasileira”. Segundo ela, essa lei “tem feição simbólica, que não admite amesquinhamento”.

No mesmo sentido, o ministro Luiz Fux disse que a lei está em consonância com a proteção que cabe ao Estado dar a cada membro da família, nos termos do parágrafo 8º do artigo 226 da Constituição Federal (CF). (STF, 2012)

Em relação a ADI número 4424, que também foi julgada procedente, o STF pacificou o entendimento da desnecessidade de representação da vítima de violência doméstica em casos de lesão corporal, ainda que seja de natureza leve. Pois se for condicionada a representação, poderia dificultar a eficácia e prosseguimento da ação penal atinentes a garantir os direitos da vítima. No sentido do pensamento de Maria Berenice Dias (2012):

O único voto discordante traduz a preocupação de alguns, de que a impossibilidade de estancar a ação penal inibiria a vítima de denunciar a violência, pois muitas vezes o registro era feito com intenção correcional. No entanto, não serve a lei a tal desiderato. Diante de um ato que configura violência física, sexual, moral, psicológica ou patrimonial cabe à busca de medida protetiva. No entanto, quando algumas dessas práticas tipificam delito que enseje o desencadeamento de ação penal pública incondicionada, não há como deixar ao exclusivo encargo da vítima a responsabilidade pela instalação da ação penal. É um ônus que não cabe ser imposto, a quem conseguiu romper a barreira do silêncio, venceu o medo e buscou a proteção estatal. Como os delitos domésticos não podem ser considerados de pequeno potencial ofensivo, impositivo que a tutela assegurada pela Lei se torne efetiva, cabendo ao agente ministerial assumir a Ação Penal. (DIAS, 2012).

Em contrapartida o pensamento em contramão da necessidade de garantir a proteção das mulheres vítimas de violência doméstica, o Ministro Cezar Peluso, o único a discordar da ADI, acredita que a Ação Pública Incondicionada poderá trazer outros problemas, já que as vítimas poderão fazer as pazes, conforme parte de seu posicionamento:

Isso significa o exercício do núcleo substancial da dignidade da pessoa humana, que é a responsabilidade do ser humano pelo seu destino. O cidadão é o sujeito de sua história, é dele a capacidade de se decidir por um caminho, e isso me parece que transpareceu nessa norma agora contestada. (STF apud PELUZZO, 2012).

Importante mencionar que as decisões emanadas pelo STF, definitivas de mérito, produzem eficácia erga omnes, relativamente ao Poder Judiciário e à Administração Pública, direta ou indireta, nos âmbitos federal, estadual e municipal, de acordo com o artigo 102, §2º, da Constituição da República (1988);

Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe:

(...)

§ 2º As decisões definitivas de mérito, proferidas pelo Supremo Tribunal Federal, nas ações diretas de inconstitucionalidade e nas ações declaratórias de constitucionalidade produzirão eficácia contra todos e efeito vinculante, relativamente aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal. (BRASIL, 1988)

Para a concretização dessa justiça, a norma jurídica tem papel fundamental, conforme relata a deputada Laura Carneiro (2016) apud Porto et al (2008):

As relações humanas prescindem de uma ordem previamente estabelecida, que traz normas de condutas à sociedade. Essas normas podem ser morais ou jurídicas. O elemento de distinção entre eles é o imperativo autorizante, ou seja, a coercibilidade da norma jurídica. (CARNEIRO, 2016 apud PORTO et al 2008).

Essas relações sociais de afeto ou familiares, palco de abusos e inúmeras formas de violência, não podem ser reguladas unicamente por normas morais, sob pena de se perpetuar a violência em prol da manutenção da família.

Assim, a Lei Maria da Penha transpões a violência contra a mulher do âmbito privado para o público, criando normas jurídicas dotadas de efetividade.

Com objetivo de proporcionar instrumentos adequados para enfrentar o problema da violência contra a mulher no Brasil, foi sancionada a Lei 11.340/06, conhecida como Lei Maria da Penha, cujo principal objetivo, conforme aduz a artigo 1º da Lei 11.340/06,

Art. 1º Esta Lei cria mecanismos para coibir e prevenir a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do § 8º do art. 226. da Constituição Federal, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Violência contra a Mulher, da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher e de outros tratados internacionais ratificados pela República Federativa do Brasil; dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; e estabelece medidas de assistência e proteção às mulheres em situação de violência doméstica e familiar. (BRASIL, 2006).

Para Evangelista (2020),

A meta da Lei Maria da Penha é a proteção máxima e integral da mulher, buscando o desenvolvimento da capacidade de enfrentamento da situação de violência por parte da própria mulher vítima, e não a mera busca de um culpado e de sua consequente punição focada em um endurecimento da intervenção penal, na criminalização de condutas e na imposição de penas mais gravosas.

A Lei Maria da Penha não contém um rol de crimes de violência doméstica, mas sim a referência às formas de violência praticadas contra a mulher, dada a sua condição peculiar (arts. 4º e 7º da Lei n. 11.340/2006).

De acordo com o art. 7. da Lei 11.340/06, são considerada violência contra mulher, a violência física, psicológica, sexual e patrimonial:

Art. 7º São formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, entre outras:

I - a violência física, entendida como qualquer conduta que ofenda sua integridade ou saúde corporal;

II - a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da autoestima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, violação de sua intimidade, ridicularizarão, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação; (Redação dada pela Lei nº 13.772, de 2018)

III - a violência sexual, entendida como qualquer conduta que a constranja a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça coação ou uso da força; que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos;

IV - a violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades;

V - a violência moral, entendida como qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injúria. (Brasil, 2006).

A Lei Maria da Penha aumentou a pena máxima que era de um para três anos de detenção e acabou com o pagamento de cestas básicas como acontecia anteriormente com os agressores. É o que elenca a Lei no 11.340/2006, art. 17: “É vedada a aplicação, nos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, de penas de cesta básica ou outras de prestação pecuniária, bem como a substituição de pena que implique o pagamento isolado de multa”. (BRASIL, 2011, p. 20).

Para Garland (2012),

O Estado detém o poder de criar leis severas que buscam criminalizar condutas reprováveis, mas que são apenas simbólicas, e deixam de investir em uma política efetiva e de qualidade que não necessariamente seja a punitiva. O direito penal na busca de agir com rigor e dissipar a criminalidade pode estar cometendo um equívoco sobre ser a solução efetiva para os problemas sociais, pois gera por determinado prazo um sentimento de proteção a população, mas, seguidamente o resultado que se tem é impreciso.

Nesse sentido, o autor Sérgio Salomão Checaria, dispõe sobre esse arcabouço da punição no Brasil:

[...] legislações recentes criaram novos crimes, maximizaram penas de delitos já existentes, aumentaram as hipóteses de detenção provisória (26% das pessoas encarceradas no Brasil aguardam julgamento), dificultaram a progressão de regime e o livramento condicional. Criou-se uma cultura punitiva. Muitos acreditam que a punição seja a solução para todos os males da humanidade. Dois dos principais responsáveis legais por essa situação foram a Lei dos Crimes Hediondos (Lei 8072/90) e a Lei de Drogas (Lei 11.343/06).

O cunho imediatista do Direito penal simbólico não traz às mulheres que sofrem violência doméstica, mais do que severas normas simbólicas, assim como para drogas e o crime organizado pela diminuição das práticas criminosas, pois se criam normas rigorosas sem eficácia.

A intenção é que não haja normalidade sobre a violência das mulheres nos casos de crimes passionais que são vistos pelo Judiciário como menos graves com consequentemente penas mais leves ou até tolerância desses crimes.

Diante desse contexto, tem-se buscado adotar a existência de tipos de feminicídio para que assim possa ser demonstrado a motivação, e o contexto social vivido por cada mulher na sociedade e a reflexão de que há um problema complexo e individualizado.

Para Fernandes (2015) essa tipologia possui três classificações:

  • Feminicídio íntimo

São crimes perpetrados por homens, no qual as vítimas mantêm ou em algum momento já mantiverem relação íntima, familiar, de convivência ou afins. Fazem parte desse grupo também, crimes cometidos por parceiros sexuais ou pessoas com quem tiveram relações interpessoais como, por exemplo, maridos companheiros, namorados.

  • Feminicídio não íntimo

São aqueles praticados por homens que não fazem parte da convivência da vítima, ou não são da família, entretanto mantem uma relação de lealdade, subordinação e amizade, como por exemplo, colegas de profissão. Essa classificação pode ser separados em dois subgrupos, tais sejam a praticada com violência sexual ou sem o uso de violência sexual.

  • Feminicídio por conexão

São crimes em que uma mulher alheia a um conflito tenta impedir um crime contra outra mulher e se torna vítima fatal. É independente de vínculo entre o agressor e a vítima.

Fonte: Fernandes (2015).

A autora Shelma Lombardi de Kato (2008) propõe uma escala evolutiva, que pode ser assim representada:

ESCADA DA VIOLÊNCIA

  1. Morte

  2. Golpear com objetos, asfixiar, violar.

  3. Isolar, controlar, estapear, morder, dar pontapés.

  4. Criticar constantemente, empurrar, quebrar objetos queridos.

  5. Ameaçar, ironizar, fazer escândalos.

O caráter dos agentes é, para Magalhães Noronha (1967):

“esses assassinos são péssimos indivíduos: maus esposos e piores pais. Vivem sua vida sem a menor preocupação para com aqueles por quem deviam zelar, descuram de tudo, e um dia quando descobrem que a companheira cedeu a outrem, arvoram-se em juízes e executores. A verdade é que não os impele qualquer sentimento elevado ou nobre. Não. É o despeito de ser preterido por outro. É o medo do ridículo – eis a verdadeira mola do crime. (NORONHA, 1967).

Com a nova Lei nº 13.104 de 2015, originou-se uma modalidade de homicídio qualificado, nomeado como feminicídio, “que ocorre quando uma mulher vem a ser vítima de homicídio simplesmente por razões de sua condição de sexo feminino”. Para que uma mulher seja vítima desse crime, precisa ter circunstância que leve a tipificação do delito do artigo 121 do Código Penal.

De acordo com o § 2º - A do artigo 121, o crime deverá ser praticado por razões de condição de sexo feminino, que será concretizado quando ocorrer:

I. Violência doméstica e familiar;

II. Menosprezo ou discriminação à condição de mulher.

A redação traz no artigo 121, inciso VI e parágrafo § 7º, a seguinte definição:

Feminicídio

VI. Contra a mulher por razões da condição do sexo feminino:

Pena - reclusão, de doze a trinta anos.

[...]

§ 7º A pena do feminicídio é aumentada de 1/3 (um terço) até a metade se o crime for praticado: (Incluído pela Lei nº 13.104, de 2015)

I. Durante a gestação ou nos 3 (três) meses posteriores ao parto; (Incluído pela Lei nº 13.104, de 2015)

II. Contra pessoa menor de 14 (quatorze) anos, maior de 60 (sessenta) anos ou com deficiência ou portadora de doenças degenerativas que acarretem condições limitantes ou de vulnerabilidade física ou mental; (Redação dada pela Lei nº 13.771, de 2018).

III. Na presença física ou virtual de descendentes ou ascendentes da vítima; (Redação dada pela Lei nº 13.771, de 2018).

IV. Em descumprimento das medidas protetivas de urgência prevista nos incisos I, II, III do caput do art. 22. da Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006. (Incluída pela Lei nº 13.771 de 2018).

Quanto à assistência, a Lei garante à mulher em situação de violência acesso à Assistência Social, ao Sistema Único de Saúde e ao Sistema Único de Segurança Pública (art. 9º da Lei 11.304/2006).

Essa alteração legislativa pode ser considerada como uma grande mudança, um avanço social na proteção aos direitos humanos atinentes às mulheres, bem como para toda sociedade.

Algumas alterações legislativas representaram ações afirmativas para minimizar a desigualdade entre homens e mulheres, dando-lhes oportunidades semelhantes. Assim, podem ser citados:

A Lei nº 9.029 (1995) que proíbe a exigência de atestados de gravidez, esterilização e outras práticas discriminatórias para efeito de admissão ou de permanência na relação jurídica de trabalho.

A lei nº 9.263, de 12 de janeiro de 1996, que trata do planejamento familiar.

O Decreto nº 6.387 de 2008 que tem as seguintes finalidades:

Autonomia econômica e igualdade no mundo do trabalho, com inclusão social; educação inclusiva; saúde das mulheres, direitos sexuais e direitos reprodutivos; enfrentamento de todas as formas de violência contra as mulheres; participação das mulheres nos espaços de poder e decisão; direito à terra, moradia digna e infraestrutura social nos meios rural e urbano; cultura, comunicação e mídias igualitárias, democráticas e não discriminatórias; enfrentamento do racismo, sexismo e lesbofobia; enfrentamento das desigualdades geracionais que atingem as mulheres, com especial atenção às jovens e idosas. (BRASIL, 2008).

Diante disso, percebemos a assistência do Estado em elaborar normas eficazes para dar amparo às mulheres vítimas de violência doméstica no Brasil.

Quanto aos aspectos mais relevantes sob o ponto de vista da agilidade e efetividade da proteção da mulher são:

  • a capacidade postulatória da vitima (art. 12, § 1º, da Lei n. 11.340/2006);

  • a extensão das medidas protetivas a testemunhas e familiares da vítima (art. 22, III, a e b, da Lei n. 11.340/2006);

  • tramitação célere, pois há o prazo de 48 horas para o encaminhamento do pedido pela autoridade policial (art. 12, III, da Lei n. 11.340/2006) e o mesmo prazo para o juiz decidir (art. 18 da Lei n. 11.340/2006);

  • caráter rebus sic stantibus das medidas, que a todo tempo podem ser substituídas ou revistas (art. 19, § 2º, da Lei n. 11.340/2006); e

  • possibilidade de decretação da prisão preventiva, inclusive no curso do inquérito policial (art. 20 da Lei n. 11.340/2006).

De fato, mesmo com amparo legislativo, a violência contra a mulher é cultural, social e histórica. Reflete padrões apreendidos, naturalizados e repetidos por pessoas de todas as classes sociais e idades. Por isso, seu enfrentamento deve resultar de uma visão multidisciplinar compatível com a complexidade do fenômeno.

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Sobre as autoras
Alexa Ramos Pires

Acadêmica do curso de Direito no Centro Universitário UNA Contagem

Uriane Dias da Silva

Acadêmica do curso de Direito no Centro Universitário UNA Contagem

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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