8.A repercussão do posicionamento do E. STF, a capitulação do C. TST e a reação dos Juízes do Trabalho.
No Seminário antes mencionado, extraímos do contato com juízes do trabalho de todo o país a impressão de certo desconforto e até ressentimento entre os mesmos, relativamente aos fundamentos e à conclusão da maior parte dos ministros do Supremo Tribunal Federal.
Alguns juízes do trabalho mostraram-se visivelmente decepcionados e desestimulados a persistir, em suas decisões, em declarar a competência da Justiça do Trabalho para apreciar as ações trabalhistas fundadas em acidente de trabalho, em conformidade com sua convicção. Diminui-lhes a disposição nesse sentido a iminente possibilidade de suas decisões serem anuladas, com desperdício de tempo e de atividade judicante. Vários cogitaram ressalvar o entendimento particular, para declinar da competência, em consonância com o julgado do STF.
É de bom alvitre ressaltar que ao reconhecer a própria competência, esses juízes estão, na prática, trazendo para sua responsabilidade a direção, instrução e julgamento de ações normalmente complexas, que demandam grande dispêndio de tempo e dedicação.
Trata-se, portanto, de juízes laboriosos e preocupados com a efetividade da justiça. Esses magistrados certamente ficaram ainda mais desestimulados com recente decisão do C. Tribunal Superior do Trabalho que, alterando entendimento anterior, prolatou acórdão assim ementado:
"INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAL E MATERIAL DECORRENTES DE ACIDENTE DE TRABALHO - LESÃO POR ESFORÇO REPETITIVO (LER) - INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA DA JUSTIÇA DO TRABALHO CONFIGURADA.
Na esteira da jurisprudência cediça do Supremo Tribunal Federal, a qual se adota por disciplina judiciária, tem-se que a Justiça do Trabalho é absolutamente incompetente para julgar pedido de indenização por danos moral e material decorrentes de acidente de trabalho, oriundo de lesão por esforço repetitivo (LER), adquirida no ambiente de trabalho em razão do desempenho da função de caixa bancária, que executava tarefa de digitação de documentos. Recurso de revista conhecido e provido." (RR 50260/2002-900-03-00, Ac. 4ª T., Rel. Min. Ives Gandra da Silva Martins Filho, j. 16.3.2005, pub. DJU 8.4.2005).
Nada obstante, não nos parece que se deva, ante os argumentos desfiados no curso desse estudo, desde logo declinar da competência para a questão posta. Afinal, por ora, o Supremo Tribunal Federal analisou a matéria uma única vez, não havendo motivo para duvidar da possibilidade de reversão da tendência ora sinalizada.
Além disso, ao menos por enquanto, a decisão do Supremo deu-se em controle difuso de constitucionalidade, sem vinculação. Não se prega aqui, genericamente, desapego, indiferença ou rebelião contas o conteúdo dos julgamentos do tribunais superiores, muito menos do Supremo Tribunal Federal. Nada obstante, desde que não seja editada súmula vinculante em sentido contrário, o compromisso dos juízes, firmado com sua posse no cargo, é com o cumprimento da Constituição da República, segundo os ditames de suas consciências.
Portanto, o momento é propício ao comportamento ativo, com rejeição à tese restritiva consagrada no julgamento do Supremo Tribunal Federal. Não custa lembrar, para alento dos juízes que comungam desse entendimento, que já tivemos pela frente situações até mais delicadas, em que a jurisprudência sumulada não refletia a melhor e mais justa interpretação legal. Ilustrativamente, recorde-se da redação original do Enunciado n. 330, do C. TST, alterada algum tempo depois, tantos foram os processos que chegaram ao C. TST, contendo acórdãos e sentenças repudiando o teor primeiro daquele verbete sumular.
O mesmo pode suceder com o caso em tela, para o qual há razões em profusão para convencimento e modificação do entendimento dos i. Ministros do Supremo Tribunal Federal. Portanto, o desânimo não se justifica. Antes devemos, os partidários da tese ora sustentada, lutar e argumentar, nos autos e onde nos for permitido expressar o pensamento, pela prevalência dessa tese, mais justa e conforme a Constituição Federal.
Notas
01 CESARINO JÚNIOR, Antônio Ferreira. "Direito Social". São Paulo: LTr, 1980. p. 479.
02 DINIZ, Maria Helena. "Curso de Direito Civil: Responsabilidade Civil", v. 7, 10 ed., Saraiva, São Paulo, 1996, p. 49.
03 MIRANDA, Pontes de. "Tratado de Direito Privado", Tomo XXII, 2 ed., Borsói, Rio de Janeiro, 1958, p. 208.
04Ob.cit., p. 51.
05Apud PEDREIRA DA SILVA, Luiz de Pinho. "A reparação do dano moral no Direito do Trabalho", LTr, São Paulo, 2004, p. 29.
06 CAPUTO BASTOS, Guilherme Augusto. "O dano moral no Direito do Trabalho", LTr, São Paulo, 2003, p. 21.
07 PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Dano Moral e Justiça do Trabalho. Mundo Jurídico, Rio de Janeiro. Disponível em: http://www.mundojuridico.adv.br. Acesso em: 25 abr. 2005.
08Apud COUTO, Osmair. Indenização por danos morais no direito do trabalho: justiça competente. Revista LTr, São Paulo, a. 60, n. 4, abr. 1996. p. 461-471. Abril de 1996, LTr, São Paulo, p. 461.
09 Em 18.4.2005, essa Orientação Jurisprudencial foi convertida na Súmula n. 392 do C. TST.
10 RODRIGUES PINTO, José Augusto. "Processo Trabalhista de Conhecimento", LTr, São Paulo, 1993, p. 113.
11 VALE, Vander Zambeli. "Acidente do trabalho – Culpa do empregador – Indenização – Competência da Justiça do Trabalho", in "Jornal Trabalhista", v. 13, n. 601, São Paulo, 1996, p. 392.
12 MELHADO, Reginaldo. Unidade de convicção e acidente do trabalho. Revista LTr, São Paulo, a. 69, n. 3, mar. 2005. p. 333-335, LTr, São Paulo, p. 334
13 Castelo, Jorge Pinheiro. "Dano Moral Trabalhista. Competência", in "Trabalho & Doutrina", n. 10, Saraiva, São Paulo, Setembro de1996, p. 39.
14 FLORINDO, Valdir, "Dano Moral e o Direito do Trabalho", 2. ed., São Paulo, LTr, 1996, p. 117
15 A referência às decisões "vacilantes" do STF, quer-se reportar a julgados em ambos os sentidos possíveis quanto à questão posta, conforme se abordará mais adiante.
16 PANCOTTI, José Antonio. "A nova competência da Justiça do Trabalho", in Revista LTr, Janeiro de 2005, LTr, São Paulo, p. 88).
17 TEIXEIRA FILHO, Manoel Antônio. "A Justiça do Trabalho e a Emenda Constitucional n. 45/2004", in Revista LTr, Janeiro de 2005, LTr, São Paulo, p. 19/20).
18 GIGLIO, WAGNER G. "Direito Processual do Trabalho", Saraiva, 12 ed., São Paulo, 2002 p. 121.
19 O brocardo traduz regra obsoleta de hermenêutica, sendo que hodiernamente compete ao intérprete um exercício exegético mais amplo, tendo em conta a disposição do art. 5º da LICC. A menção feita no artigo, portanto, deve ser analisada dentro dessa perspectiva.
20Ob. cit., p. 334/335.
21Apud PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Ob. Cit.
22Ob.cit., p. 335.