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Reeleição provoca desvios de despesas públicas

06/11/2021 às 15:00

Resumo:


  • A reeleição é um instituto que vem sendo criticado por trazer problemas desde sua introdução no governo FHC.

  • Governantes que tentaram um segundo mandato consecutivo enfrentaram desafios, como o impeachment da Presidente Dilma e a ameaça de impeachment do Presidente Lula.

  • A busca pela reeleição muitas vezes leva a medidas populistas, violações orçamentárias e estratégias questionáveis para se manter no poder, como o aumento de programas sociais e a manipulação de gastos públicos.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

Empobrecer a população para, ao depois, socorrer parte dela, por meio de programas de inclusão social que causam desarranjos nas finanças públicas, não é coisa de estadista.

A reeleição é um dos institutos que merece ser extirpado, com urgência,  de nosso ordenamento constitucional pelos males que vem representando ao longo de sua existência, desde que introduzida durante o governo FHC.

No dizer de Marcelo Paiva: “O dólar não valia R$ 1. Uma farsa para baratear o custo de vida. Na real, o real era uma moeda irreal. Deram um golpe de Estado, inventando um segundo mandato” (O Estado de São Paulo do dia 22-10-2021, p. C16).

De fato, nenhum governante realizou uma boa gestão no segundo mandato consecutivo. A Presidente Dilma no segundo mandato acabou sendo afastada pelo impeachment decretado pelo Congresso Nacional, sob a acusação de ter atentado contra normas orçamentárias. Pergunta-se, qual o governante, desde o advento da República, que não violou os preceitos orçamentários no decorrer da execução do orçamento? Nenhum! Inventou-se um pretexto legalmente válido para afastar a Presidente que estava caminhando para a ingovernabilidade.

O próprio Presidente Lula esteve à beira do impeachment durante o seu segundo mandato.

Inteligente e esperto que é, o presidente Lula conseguiu provocar um fato novo para desviar o foco.

E a mídia passou a noticiar diariamente sobre esse fato novo inusitado. Trata-se da prisão espetaculosa do Senhor Paulo Maluf e de seu filho em circunstâncias peculiares. Sob a cobertura da imprensa pai e filho foram presos sendo que o filho do senhor Maluf veio pilotando o helicóptero (sem algemas) para, ao chegar ao destino - São Paulo -, ser algemado e conduzido juntamente com o pai, igualmente, algemado para o presídio da Polícia Federal. Pai e filho ficaram na mesma cela.

O singular episódio gerou muitos comentários. Anos depois o STF aprovava a Súmula proibindo o uso de algemas a não ser em casos excepcionais aí relacionados.

Tão estranha foi essa prisão que o então Ministro, Carlos Velloso, do Supremo Tribunal Federal concedeu de ofício o habeas corpus ao filho do ex governador e ex Prefeito Paulo Maluf, o último prefeito da capital a realizar obras de infraestrutura de grande envergadura.

Digo isso com conhecimento de causa, pois servi por 20 anos ao longo das administrações municipais  que se sucederam, como Procurador do Município exercendo as funções de chefia, de direção e de assessoramento.

Tudo indica que a reeleição está merecendo um aperfeiçoamento para o pior. Novos meios políticos, econômicos e financeiros estão sendo engendrados e burilados pelo detentor do poder em meio a seu mandato, para assegurar a sua reeleição.

Na segunda metade do mandato nada mais caminha dentro da normalidade institucional. Tudo é canalizado para gerar notícias de cunho populista para aparecer melhor nas pesquisas.

Para tanto violam-se normas orçamentárias e, às vezes, promove-se alteração legislativa a nível constitucional e a nível da legislação ordinária.

Foi assim que o atual Presidente, Senhor Jair Bolsonaro, conseguiu acumular mais de 130 pedidos de impeachment cuidadosamente guardados nos escaninhos da Câmara dos Deputados pelo seu fiel escudeiro, o Presidente Arthur Lira, que vem  usando  e abusando do seu poder discricionário para colocar em votação um desses pedidos.

Esse fato acaba agravando o fraco desempenho do Chefe do Executivo, refém do Congresso Nacional no exercício da política de “dá cá e toma lá”.

Para rechear programas sociais que dão visibilidade na mídia o atual governo está promovendo o calote de R$ 89 bilhões de dívidas oriundas de condenação judicial (precatórios) com sérios desgastes da imagem do País no âmbito interno e externo, provocando o despencamento da Bolsa e elevação da cotação do dólar nos primeiros dias de seu anúncio. Acelerou a retração da economia provocando o reaquecimento da inflação, que não mais pára de crescer por conta sucessivas medidas populistas, ora buscando receitas extras, ora promovendo desvio de recursos orçamentários.

Inventou-se o PL nº 2.337/2021 para criar a tributação de dividendos e suprimir a dedução dos JCP que foi aprovada a toque de caixa, sob o rolo compressor acionado pelo Presidente Arthur Lira.

Porém, esse projeto, que não é bem visto pelos senadores, encontra-se em compasso de espera frustrando a estratégia do governo.

Como sucedâneo o governo tenta emplacar uma emenda para deixar fora do teto de gastos (congelamento das despesas públicas que só podem ser corrigidas por índices inflacionários de um exercício para outro) o valor de R$ 83,6 bilhões para rechear o “Auxílio Brasil”, a fim de posar como único governante que se preocupa com os vulneráveis.

Apesar de o Tesouro sabidamente não comportar tamanha benesse, o governo quer bancar o aumento desse programa “Auxílio Brasil” que irá substituir o Bolsa Família, uma criação de governantes anteriores, para conferir-lhe uma nova feição. Serão pagos R$ 400 reais para cerca de 16,9 milhões até o final de 2022, ano em que o Presidente Bolsonaro buscará a sua reeleição.

O ministro da Economia, Paulo Guedes, reconhece que é um “governo reformista e popular”,  mas nega que a determinação de furar o teto de gastos para viabilizar a turbinada no “Auxílio Brasil” tenha finalidade eleitoreira. Popular ou populista, pouco importa. A verdade é que sem a reeleição isso não estaria acontecendo.

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A ruptura do teto de gastos com o qual o Ministro Paulo Guedes concordou até com entusiasmo causou a debandada de quatro Secretários do Ministério da Economia que pediram demissão, agravando a frágil política econômica do governo Bolsonaro tomada por uma inflação sistêmica provocada, principalmente pela elevação constante dos preços de combustíveis. Em meio a boatos de que o Ministro Paulo Guedes iria se demitir do cargo ele concedeu uma entrevista no Ministério ao lado do Presidente Bolsonaro afirmando a firme disposição de permanecer à frente do Ministério da Economia até o fim. Bastante estusiasmado declarou: “não vamos deixar o pessoal passar fome para tirar 10 no fiscal”. Herdou o populismo de seu chefe, o que não é nada bom para a economia do País.

Em condições normais, o mais razoável seria o de conter os aumentos exorbitantes dos combustíveis, cujos preços mantêm paridade com a variação cambial e com a variação do preço do barril de petróleo no mercado internacional.

Seria o caso de utilizar os polpudos dividendos e fantásticos royalties que a União recebe da Petrobrás para subsidiar os preços do diesel e da gasolina que estão provocando inflação sem precedentes, anulando os esforços dos governos anteriores para conter a escalada inflacionária que tantos transtornos e sofrimentos traz à sociedade, principalmente, entre os de baixo poder aquisitivo. Forçoso reconhecer, entretanto,  que a Petrobras adotou o mecanismo do “Vale Gás” para abastecer com gás de cozinha a população carente. Mas, isso não basta para debelar os efeitos da alta dos combustíveis.

A população empobrecida pela corrosão do poder aquisitivo da moeda está partindo, inclusive, para o inusitado furto da carne, obrigando os proprietários de supermercados colocarem um dispositivo antifurto nas carnes.

Empobrecer a população para, ao depois, socorrer parte dela, por meio de programas de inclusão social que causam desarranjos nas finanças públicas, não é coisa de estadista. Isso tem outro nome. Populismo à custa dos pobres era o que faltava!

Concluindo, não fosse a tal de reeleição a sociedade estaria bem melhor com cada governante cumprindo ou se esforçando para  cumprir as metas governamentais, desde o primeiro dia de seu mandato até o último dia do exercício da governança. É verdade que em qualquer hipótese sempre haverá um esforço do governante para fazer o sucessor, até mesmo para assegurar que o novo governante vasculhe a gestão passada em busca de irregularidades, mas, nunca ao ponto de promover desvios orçamentários ou patrocinar uma PEC em prol da candidatura amiga.

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Sobre o autor
Kiyoshi Harada

Jurista, com 26 obras publicadas. Acadêmico, Titular da cadeira nº 20 (Ruy Barbosa Nogueira) da Academia Paulista de Letras Jurídicas. Acadêmico, Titular da cadeira nº 7 (Bernardo Ribeiro de Moraes) da Academia Brasileira de Direito Tributário. Acadêmico, Titular da cadeira nº 59 (Antonio de Sampaio Dória) da Academia Paulista de Direito. Sócio fundador do escritório Harada Advogados Associados. Ex-Procurador Chefe da Consultoria Jurídica do Município de São Paulo.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

HARADA, Kiyoshi. Reeleição provoca desvios de despesas públicas. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 26, n. 6702, 6 nov. 2021. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/94580. Acesso em: 22 dez. 2024.

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