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Aspectos negativos da nova lei de improbidade administrativa

29/11/2021 às 14:20
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A Lei 14.230/2021 enfraqueceu o parâmetro legal na dosagem do prazo de suspensão dos direitos políticos.

A Lei nº 8.429, de 2 de junho de 1992, parcialmente alterada pela Lei 14.230, de 25 de outubro de 2021, não só padece dos vícios de inconstitucionalidade por afronta ao princípio da razoabilidade, por ser fruto de legislação em causa própria, esvazia em parte a finalidade da lei à medida que abole a pena de suspensão de direitos políticos nas hipóteses de infrações previstas no art. 11 da Lei, ou seja, atos que atentam contra os princípios da administração pública que são exatamente as hipóteses mais recorrentes.

No que se refere aos demais casos dos arts. 9º e 10 o prazo de suspensão dos direitos políticos que era de oito a dez anos, e de cinco a oito anos, respectivamente, passaram a ser de até 14 anos e até 12 anos, respectivamente.

A inovação trazida enfraqueceu o parâmetro legal na dosagem do prazo de suspensão dos direitos políticos. Ficou a critério de o Juiz fixar esse prazo à sua discrição, desde que não ultrapasse o prazo máximo previsto para as hipóteses dos artigos 9º e 10. O prazo de suspensão dos direitos políticos poderá ser de 1, 2, 3, 4, 5, 6 até 12 anos ou 14 anos, conforme a hipótese.

De conformidade com o § 1º, do art. 12 na redação conferida por nova lei sob exame, a sanção da perda de função pública nas hipóteses dos incisos I e II (arts. 9º e 10) somente atinge o vínculo da mesma qualidade e natureza que o agente público ou político detinha com o poder público na época do cometimento da infração, podendo o magistrado na hipótese do inciso I (art. 9º), e em caráter excepcional, estendê-la aos demais vínculos, consideradas as circunstâncias do caso e a gravidade da infração.

Por meio desse casuísmo acentuado, praticamente, ficou abolida a pena de suspensão de direitos políticos.

De fato, um prefeito, por exemplo, que venha a ser condenado por ato de improbidade, antes de transitar em julgado a sentença condenatória poderá estar exercendo outro cargo, como o de governador, senador ou deputado, hipótese em esses mandatos não serão atingidos.

Nem se argumente que a nova lei ressalvou a possibilidade de extensão da sanção ao novo vínculo em caráter excepcional, consideradas “as circunstâncias do caso e a gravidade da infração”.

Mas isso é muito vago e impreciso, além de subjetivo. Eventual extensão da sanção ao novo vínculo será sempre objeto de recurso e o tribunal terá que lidar com esse mesmo conceito vago e impreciso, gerando uma sucessão de recursos intermináveis.

O astuto legislador, sob a capa de endurecimento da sanção política aumentando o prazo de suspensão para até 14 anos, introduziram condicionamentos que inviabilizam a efetiva aplicação dessa pena de suspensão de direitos políticos.

Assim, na mesma linha os espertos legisladores em causa própria poderiam ter fixado o prazo de inabilitação para o exercício de direitos políticos pelo prazo, não e 14 anos, mas pelo prazo de 140 anos para conferir maior impactos em seus propósitos moralizadores.

O texto normativo sob análise é confuso e ilógico, padecendo do vício da irrazoabilidade que é um limite imposto à ação do próprio legislador.

Sintomaticamente, no que tange às infrações do art. 11, que são aquelas hipóteses que envolvem atentados aos princípios da administração pública (art. 37 da CF) e que são mais recorrentes, não há pena de suspensão de direitos políticos.

Para as hipóteses dos arts. 9º e 10, que se caracterizam por infrações mais graves, com maior carga de lesividade ao interesse público, a perda da função pública não se estende a vínculo de outra qualidade de natureza, ficando restrito àquele vinculo sob cuja vigência foi praticada a infração.

Conclui-se que, tendo em vista o longo tempo de tramitação do processo judicial, bem como a temporariedade do mandato político, nenhum infrator perderá a função pública.

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Sobre o autor
Kiyoshi Harada

Jurista, com 26 obras publicadas. Acadêmico, Titular da cadeira nº 20 (Ruy Barbosa Nogueira) da Academia Paulista de Letras Jurídicas. Acadêmico, Titular da cadeira nº 7 (Bernardo Ribeiro de Moraes) da Academia Brasileira de Direito Tributário. Acadêmico, Titular da cadeira nº 59 (Antonio de Sampaio Dória) da Academia Paulista de Direito. Sócio fundador do escritório Harada Advogados Associados. Ex-Procurador Chefe da Consultoria Jurídica do Município de São Paulo.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

HARADA, Kiyoshi. Aspectos negativos da nova lei de improbidade administrativa. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 26, n. 6725, 29 nov. 2021. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/95200. Acesso em: 25 abr. 2024.

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