RESUMO
Nas relações de trabalho, muitas vezes surgem conflitos que dizem respeito a uma categoria de trabalhadores e podem envolver uma empresa ou categoria econômica. Esses conflitos coletivos podem ser solucionados por autocomposição, que é a negociação coletiva, ou por heterocomposição, que pode ser por mediação, arbitragem ou via judicial. A negociação coletiva permite às próprias partes acordarem as condições ideais e possíveis para o momento. No entanto, quando as partes não conseguem chegar a um acordo, torna-se necessária a intervenção do Estado para a pacificação do conflito pela via judicial, por meio da instauração de um dissídio coletivo. A Emenda Constitucional nº 45, de 8 de dezembro de 2004, trouxe inovações para a propositura dos dissídios coletivos de interesse, que são aqueles que versam sobre condições de trabalho. A nova redação do artigo 114, parágrafo segundo, da Constituição Federal estabeleceu que a propositura do dissídio, nesse caso, deve ser por "comum acordo". A inclusão da necessidade de comum acordo dificultou sobremaneira a propositura da ação, criando no ordenamento uma ação que depende da anuência da parte contrária para sua propositura. Por essa razão, entendeu-se que se está afastando um conflito da tutela jurisdicional. Admitir a necessidade de propositura em conjunto seria tirar do Estado um dever de pacificação social, deixando muitos conflitos sem solução. A única alternativa para os trabalhadores acabaria sendo o apelo à greve, para forçar a empresa ou a categoria econômica a negociar.
Abstract
In labor relationships, several disputes involving a role class of employees and a company, or even an economic group, may arise. These disputes may be resolved by an agreement among the parties, by mediation, arbitration or by a judicial claim. The parties understandings allow them to reach an agreement with the ideal statements for the moment. However, if the parties do not reach an agreement, a judicial claim is mandatory to solve the dispute. The Nation must intervene in the conflict. The Amendment 45 of the Constitution, dated of December 8, 2004, brought some innovations regarding the requirements to file class actions which discuss work conditions. One of these requirements is the imposition of previous agreement of both parties in filing the suit. This requirement renders obvious difficulty, since both parties must agree on filing a lawsuit. Therefore, it is understood that the right of action principle is being violated. To impose the need of previous agreement of the parties to file a law suit is the same of taking from the Nation its duty of providing social peace, allowing conflicts without solutions. Hence, the only way left to the employees is to strike, forcing the union and the company to enter in negotiations.
Palavras chaves: dissídio coletivo; conflito coletivo; direito de ação.
1 INTRODUÇÃO
Após um longo período de debates, a Reforma do Judiciário consubstanciou-se na Emenda Constitucional nº 45, aprovada em 8 de dezembro de 2004, que trouxe inúmeras alterações ao Poder Judiciário.
A Justiça do Trabalho sofreu grandes modificações, com ampliação de seu rol de competências e alterações de grande importância no âmbito dos dissídios coletivos. Novos requisitos foram instituídos para os dissídios de interesses, gerando controvérsias sobre o futuro da função normativa da Justiça do Trabalho.
A complexidade da matéria atraiu grande manifestação da doutrina e toda contribuição parece ser relevante, para que se consiga chegar rapidamente a uma harmonia doutrinária e jurisprudencial, visando solucionar a questão para as maiores interessadas, que são as categorias envolvidas, trabalhadores e empresas.
O presente estudo possui como proposta estudar as inovações para a propositura das ações coletivas de dissídios de interesses, especialmente a exigência de "comum acordo" para seu ajuizamento, e discutir a necessidade de participação do Estado na solução dos conflitos coletivos do trabalho.
Discute-se qual a natureza jurídica do consentimento da parte contrária e se sua obrigatoriedade para a instauração do dissídio pode afastar o conflito da tutela jurisdicional, ferindo o direito subjetivo de agir garantido constitucionalmente.
2 CONFLITOS COLETIVOS DO TRABALHO
2.1 Conceito de conflito coletivo do trabalho
Assim como ocorre em qualquer área da vida em sociedade, também nas relações de trabalho surgem conflitos, como fenômeno inerente ao convívio em coletividade. Os conflitos trabalhistas, no entanto, apresentam certas particularidades em relação aos conflitos na área cível, em razão de as partes, empregado e empregador, encontrarem-se no mundo fático em situação de desigualdade. Daí a relevância que deve ser dada às formas de organizações de trabalhadores, como instrumentos que buscam a redução dessa desigualdade.
Os conflitos trabalhistas podem ser classificados em conflitos individuais e coletivos. Amauri Mascaro Nascimento (2002, p. 4) entende que são coletivos os conflitos que envolvem um grupo abstrato, "pessoas não determinadas unidas em torno de um ponto comum", e são individuais aqueles que envolvem "pessoas determinadas agindo no interesse próprio, direto e imediato".
Segundo Wagner D. Giglio (2002, p. 381), devem ser analisados três critérios para diferenciar os conflitos coletivos dos individuais: partes, objeto e finalidade. Nos conflitos coletivos, pelo menos uma das partes (trabalhadores) é uma coletividade, composta por número indeterminado de indivíduos, enquanto nos individuais sempre estão indivíduos determinados. O objeto dos conflitos coletivos são interesses abstratos e o dos individuais são interesses concretos. O conflito coletivo tem como finalidade a criação, modificação ou interpretação de uma norma, ao passo que o conflito individual visa a aplicação de norma preexistente ao caso concreto.
Assim, os conflitos coletivos surgem quando um grupo de trabalhadores indeterminados defende interesses abstratos, pertencentes a toda categoria, com o fim de criar, modificar ou interpretar uma norma.
Os conflitos coletivos podem ser classificados em conflitos econômicos e jurídicos. Os conflitos econômicos, também chamados de conflitos de interesse, são "aqueles em que os trabalhadores reivindicam novas condições de trabalho ou melhores salários". Os conflitos jurídicos, ou de direito, visam a "interpretação ou aplicação de determinada norma jurídica ao caso em exame" (MARTINS, 2005, p. 77).
A expressão "conflito econômico" é largamente usada pelos doutrinadores, mas Amauri Mascaro Nascimento (1989, p. 259) orienta que "pode prestar-se a equívocos, uma vez que dá a idéia de um bem econômico, quando não é essa a sua função no problema, mas a de indicar que o conflito é de natureza constitutiva de novo conteúdo normativo para as relações coletivas de trabalho mantidas entre os sujeitos conflitantes".
Fábio Túlio Correia Ribeiro (1997, p. 231) completa que basta que a pretensão "signifique a conquista de novos direitos para a classe trabalhadora, ou o incremento dos já reconhecidos, ainda que sem expressão em pecúnia".
Os conflitos coletivos econômicos são, dessa forma, as controvérsias que surgem entre um grupo de trabalhadores ou a categoria profissional e uma empresa ou a categoria econômica, em busca de novas condições de trabalho, com o fim de criar, modificar ou extinguir normas.
2.2 Formas de solução dos conflitos coletivos do trabalho
Em busca da harmonização das relações entre patrões e empregados, surgem vários meios de composição dos conflitos coletivos do trabalho.
Amauri Mascaro Nascimento (2002, p. 5) destaca três formas de solução dos conflitos: autodefesa, autocomposição e heterocomposição.
A autodefesa manifesta-se quando há "solução direta entre os litigantes pela imposição de um sobre o outro" (NASCIMENTO, 2002, p. 5). É uma forma primitiva de solução de conflitos, pois uma parte impõe sua vontade sem o consentimento da outra. Os principais exemplos de autodefesa na esfera trabalhista são a greve e o lockout, sendo o lockout vedado pela legislação brasileira.
Na autocomposição, o conflito também é solucionado pelas próprias partes, mas há um ajuste de vontades (NASCIMENTO, 2002, p. 6), os opositores chegam a um entendimento. Quando apenas um consente no sacrifício do próprio interesse, há a renúncia, forma de autocomposição unilateral, e quando ambos consentem, há a transação, que é autocomposição bilateral.
Christóvão Piragibe Tostes Malta (2000, p. 21) considera a existência de três meios de autocomposição, que pode ocorrer pela desistência (renúncia à pretensão), pela submissão (renúncia à resistência oferecida à pretensão) ou pela transação (concessões recíprocas). A desistência e a submissão são, em verdade, formas de renúncia, de autocomposição unilateral.
A terceira forma de solução de conflitos – heterocomposição – é uma solução por uma "fonte suprapartes, que decide com força obrigatória sobre os litigantes" (NASCIMENTO, 2002, p. 6).
Alguns doutrinadores, no entanto, não incluem a autodefesa como forma de solução dos conflitos.
Amador Paes de Almeida (1998, p. 341) considera haver três espécies de solução dos conflitos coletivos do trabalho: livre negociação, arbitragem e jurisdição. A livre negociação é a autocomposição e a arbitragem e a jurisdição são formas de heterocomposição.
Christóvão Piragibe Tostes Malta (2000, p. 21) explica que também rejeita a autodefesa e entende que ou há autocomposição ou as partes buscam a heterocomposição.
A autocomposição ou livre negociação é aquela estabelecida pelas próprias partes interessadas e é conhecida como negociação coletiva.
A negociação coletiva é considerada a melhor forma de solução de conflitos pela Organização Internacional do Trabalho (GIGLIO, 2002, p. 382), pois somente as próprias partes sabem exatamente os limites de negociação. A regulamentação ocorre pelo consenso e, assim, a negociação admite maior flexibilidade e possibilidade de adaptação a circunstâncias e conjunturas.
Russomano (2006) explica que a negociação coletiva é a "função primordial do sindicato na sociedade moderna, [...] constitui o instrumento doutrinariamente preferencial no processo de flexibilização do Direito do Trabalho".
Por essa razão, a legislação trabalhista brasileira vem acolhendo cada vez mais a autocomposição, reconhecendo os acordos e as convenções coletivas de trabalho como formas de negociação coletiva.
Wagner D. Giglio explica, contudo, que a implantação do sistema de autocomposição dos conflitos pressupõe requisitos inexistentes entre nós, especialmente a autenticidade da vida sindical. Nas palavras do autor, "a liberdade para negociar exige posição de igualdade entre os contendores, somente alcançada por sindicatos fortes, independentes, com poder de arregimentação da categoria" (GIGLIO, 2002, p. 383).
Assim, quando as partes não conseguem a autocomposição, podem buscar uma solução por intermédio de um terceiro, que está fora do conflito.
Amauri Mascaro Nascimento (2002, p. 13) e Sérgio Pinto Martins (2005, p. 79) consideram haver três técnicas heterocompositivas: mediação, arbitragem e jurisdição.
A mediação é "técnica de composição dos conflitos caracterizada pela participação de um terceiro suprapartes, o mediador, cuja função é ouvir as partes e formular propostas" (NASCIMENTO, 2002, p. 13). As partes, no entanto, não são obrigadas a aceitar as propostas, o mediador apenas interfere para aproximar as vontades divergentes dos litigantes, o que gera alguma divergência na doutrina quanto à natureza da mediação, se é técnica de autocomposição ou de heterocomposição.
A arbitragem é forma de heterocomposição, em que um terceiro, não investido de poder jurisdicional, decide o conflito pelas partes. Para Amador Paes de Almeida (1998, p. 342), a arbitragem voluntária surge quando as partes, por consenso, livremente escolhem um árbitro, que dirime o conflito e fixa as soluções que entender cabíveis.
No Brasil, a arbitragem é facultativa e ainda não faz parte dos costumes do sistema de relações de trabalho como ocorre em outros países.
O sistema jurisdicional é meio de heterocomposição dos conflitos trabalhistas e é função do Estado, exercido pela Justiça do Trabalho. A jurisdição deve ser ampla e geral, pois não se pode negar a solução dos conflitos pelo Poder Judiciário.
No caso dos conflitos coletivos do trabalho, é imprescindível que tenha sido esgotada a negociação coletiva para a propositura da ação coletiva, como exigência constitucional com vistas a incentivar a autocomposição dos conflitos coletivos.
Os conflitos coletivos submetidos ao Judiciário são chamados de dissídios coletivos, que são de competência originária, em regra, dos Tribunais Regionais do Trabalho.
De acordo com a definição de Sergio Pinto Martins (2005, p. 600), dissídio coletivo é "o processo que vai dirimir os conflitos coletivos do trabalho, por meio de pronunciamento do Poder Judiciário, criando ou modificando condições de trabalho para certa categoria ou interpretando determinada norma jurídica".
Apesar de ser comumente definido como processo, o dissídio deve ser entendido como o próprio conflito instaurado judicialmente. Assim, o dissídio dá origem à ação.
Eduardo Gabriel Saad (1994, p. 427) alerta que "difundiu-se o uso da expressão ‘dissídio coletivo’ para designar a ação coletiva. Esta tem como finalidade a solução do dissídio coletivo [...]".
Ísis de Almeida (1998, p. 365) ressalta, ainda, que se deve diferenciar a ação coletiva da ação individual plúrima. Ação coletiva é originada em dissídio coletivo, em que são discutidos interesses abstratos de uma categoria. Na ação individual plúrima, são debatidos interesses concretos individuais de mais de um trabalhador, formando um litisconsórcio ativo.
Os dissídios coletivos também recebem uma classificação doutrinária conforme o conflito coletivo em questão. Roberto Barretto Prado (1971, p. 741) classifica em dissídios de direito, quando têm "por objeto a interpretação de cláusula de convênio coletivo de trabalho ou de dispositivo legal de natureza trabalhista" e dissídios de interesse quando têm "por finalidade criar novas normas".
Os dissídios de direito são também conhecidos por dissídios jurídicos e os dissídios de interesses por dissídios econômicos, visto que versam, respectivamente, sobre os conflitos coletivos jurídicos e econômicos.
Amauri Mascaro Nascimento (2002, p. 645) e Wagner D. Giglio (2002, p. 384) preferem classificá-los em processos coletivos constitutivos, quando criam ou constituem novas normas, e declaratórios, quando se limitam a interpretar norma coletiva convencional ou legal.
Eduardo Gabriel Saad explica que "no dissídio coletivo, o interesse é abstrato e as partes envolvidas no litígio não são limitadas; a respectiva sentença produz efeitos que atingem aos que, no momento, sejam empregados das empresas, como também os que vierem a ser admitidos depois, mas durante o prazo de vigência da mesma sentença" (SAAD, 1994, p. 441).
Dessa forma, a sentença em ações coletivas possui características específicas. No dissídio coletivo jurídico, a sentença tem natureza declaratória da existência ou inexistência de relação jurídica. No dissídio coletivo de natureza econômica, sua natureza é constitutiva, visto que cria novas regras para a categoria. (MARTINS, 2005, p. 600).
Ísis de Almeida (1998, p. 293) explica que "a ação coletiva constitutiva [...] contém elemento ‘declarativo’, mas nunca poderia assumir a condição de condenatória, pois não se extrai, da sentença pretendida, um título executório. A decisão, antes de tudo, é ‘normativa’, abstrata, referindo-se a uma categoria, sem identificação pessoal dos destinatários".
Por ser uma decisão que institui normas, a sentença que põe fim a um processo de dissídio coletivo econômico chama-se sentença normativa. Francesco Carnelutti trazia que essa sentença tem "alma de lei em corpo de sentença" (VIDAL NETO, 1983, p. 126). Conforme Renato Fleischmann (1995, p. 60), a sentença normativa "tem natureza híbrida, com característica de ato jurisdicional, assim como de ato legislativo".
A sentença normativa é a manifestação do poder normativo concedido ao poder judiciário trabalhista. Assim, o poder normativo surge nos dissídios de natureza econômica, quando os Tribunais do Trabalho têm a possibilidade de estabelecer normas e condições de trabalho, oponíveis erga omnes à categoria profissional e à categoria econômica ou empresa envolvida no litígio.
2.3 Da importância da participação do Estado na solução dos conflitos coletivos
A função normativa surgiu inicialmente na Itália, sob o regime fascista, numa época em que as greves e os lockouts eram vedados e punidos, confiando-se à magistratura do trabalho a incumbência de dirimir os dissídios coletivos que surgiam (BATALHA, 1995, p. 398).
A Carta del Lavoro, de 1927, estabelecia, em seu artigo V [01], a competência da magistratura do trabalho para regular as controvérsias, tanto com relação aos conflitos jurídicos, como na determinação de novas condições de trabalho.
No Brasil, os conflitos econômicos sempre foram, via de regra, solucionados pela via jurisdicional. O poder normativo nasceu junto com a Justiça do Trabalho, ainda em sua fase administrativa (GARCIA, 2002, p. 122).
O Decreto 21.396, de 12 de maio de 1932, foi o primeiro dispositivo legal a prever uma intervenção estatal na solução dos conflitos trabalhistas, instituindo as Comissões Mistas de Conciliação e a Arbitragem, que podia ser realizada pelo Ministério do Trabalho.
Desde a Constituição de 1934, é conferida aos Tribunais do Trabalho a possibilidade de proferirem, nos dissídios coletivos, sentenças normativas, fixando normas e condições de trabalho (BATALHA, 1995, p. 406). A Constituição de 1937 consagrou o poder normativo e somente na Constituição de 1946 foram fixados limites ao exercício do poder normativo. Todas as Constituições posteriores também trouxeram previsão expressa da função normativa na Justiça do Trabalho.
Wilson Ramos Filho (1999, p. 216) conceitua poder normativo como "a possibilidade que o ordenamento jurídico nacional atribui aos Tribunais do Trabalho de criar normas coletivas aplicáveis erga omnes a todos os integrantes de determinada categoria profissional".
Para Amador Paes de Almeida (2005, p. 432), poder normativo é "a faculdade atribuída à Justiça do Trabalho de estabelecer, nos dissídios coletivos de natureza econômica, normas e condições de trabalho".
A atribuição de função normativa ao Judiciário, como instrumento de composição dos conflitos coletivos, está presente apenas na Justiça do Trabalho. Essa solução jurisdicional dos conflitos coletivos de trabalho existente no direito brasileiro, contudo, sempre foi objeto de muitas discussões entre os doutrinadores.
Orlando Teixeira da Costa (1983, p. 141) explica que essas fontes normativas, à margem do Poder Legislativo, são admitidas "com a finalidade de garantir um perfeito entrosamento dos ritmos de vida do trabalho e da vida jurídica da sociedade".
Segundo Ives Gandra Martins Filho (2003, p.12), a função normativa na Justiça do Trabalho é explicada pelo "dinamismo das relações econômico-trabalhistas". Como há uma rápida evolução e alteração nas condições da prestação de serviços, a regulamentação jurídica também deve ser rápida.
O mesmo autor, no entanto, faz uma análise crítica da função normativa, ao considerar que "a intervenção estatal na solução dos conflitos coletivos, tal como praticada no Brasil através do Poder Normativo da Justiça do Trabalho, tem apresentado uma série de inconvenientes, que colocam em xeque a própria eficácia e oportunidade do sistema" (MARTINS FILHO, 2003, p. 35).
Como desvantagens, o autor cita o enfraquecimento da liberdade negocial, o desconhecimento real das condições do setor, a demora nas decisões, a generalização das condições de trabalho, a incompatibilidade com a democracia pluralista e representativa e o maior índice de descumprimento da norma coletiva. Por outro lado, elenca duas justificativas para a manutenção do Poder Normativo da Justiça do trabalho: a ausência de um sindicalismo forte no Brasil e a necessidade social de superar o impasse na ausência de autocomposição (MARTINS FILHO, 2003, p. 35-37).
Na visão de Pedro Carlos Sampaio Garcia (2002, p. 125), a função normativa "inibe a negociação coletiva entre os atores sociais, que se acomodam com a intervenção judicial e não procuram a solução autônoma para os conflitos laborais econômicos".
Carlos Henrique Zangrando (1994, p. 23), por sua vez, defende que a função normativa é necessária à Justiça do Trabalho:
[...] temos que o Poder Normativo é uma necessidade prática, uma vez que permite ao órgão judiciário adequar suas decisões à capacidade e ao desenvolvimento econômico das classes envolvidas no dissídio. Assim, a Justiça do Trabalho tem poderes para ‘acomodar’ a rigidez da legislação trabalhista nacional aos desníveis existentes entre as diferentes áreas econômicas e geopolíticas da Nação [...].
Bento Herculano Duarte Neto (1994, p. 23) também defende a intervenção estatal na solução dos conflitos, ao expor que:
é para proteger os trabalhadores desamparados, sem uma retaguarda sindical eficaz, que se impera a necessidade de um determinado intervencionismo estatal, em relação inversamente proporcional à força dos obreiros enquanto componentes de uma categoria profissional respectiva. Quanto mais forte a categoria, menor deve ser o intervencionismo; quanto menos forte, maior deve ser a ação do Estado.
O Brasil ainda não possui um sindicalismo forte, capaz de efetivamente pressionar as empresas à negociação coletiva. Torna-se imperativo, por essa razão, que o Estado possa intervir sempre que acionado. Além disso, ainda que as categorias busquem uma autocomposição, em muitas questões a negociação coletiva pode restar frustrada, e o Estado é o único meio disponível para a pacificação das relações de trabalho.
O debate sobre a necessidade da função normativa na Justiça do Trabalho tornou-se ainda mais acirrado com as inovações trazidas pela Emenda Constitucional 45 de 2004, que alguns entendem como tendo colocado fim ao poder normativo.