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O Provedor de Justiça em Moçambique

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23/03/2022 às 14:25
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Apresentam-se propostas para repensar a figura do Provedor de Justiça no contexto moçambicano, a partir de análise das suas atribuições constitucionais.

Resumo: Pretende-se neste artigo, analisar a figura do Provedor de Justiça em Moçambique. A questão surge com particular interesse de compreender, no contexto moçambicano, enquanto Estado de Direito Democrático, o papel do Provedor de Justiça na concretização dos direitos dos administrados e na garantia da legalidade. São tomadas como bases de perquirição, a legislação em vigor no país, nomeadamente, a Constituição da República de Moçambique, texto de 2018 e a Lei nº 6/2007, de 16 de Agosto (Lei que estabelece o âmbito de actuação, Estatuto, as competências e o processo de funcionamento do Provedor de Justiça na República de Moçambique. A perquirição da competência atribuída ao Provedor de Justiça, traduzida na emissão de pareceres para a Administração Pública, constitui objecto principal das abordagens a desenvolver. A questão suscita particular interesse por se constatar que maioritariamente, a Administração Pública na maioria das vezes não responde às notificações do Provedor de Justiça e, noutras vezes, não acata às recomendações contidas em seus pareceres, facto que impõe uma reflexão e compreensão sobre a natureza jurídica do próprio órgão, dos seus pareceres e o seu grau de importância no ordenamento jurídico moçambicano. O estudo permitiu aferir que, presentemente, em Moçambique, o Provedor de Justiça é um órgão do Estado ainda em processo de consolidação razão pela qual ainda não conseguiu se impor de modo a persuadir a Administração Pública no acatamento das suas notificações e pareceres como mecanismo de materialização das garantias dos direitos dos administrados e de garantia da legalidade, premissa da boa actuação de quem tem a responsabilidade de gerir a coisa pública.

Palavras-chave: Provedor de Justiça, natureza jurídica, garantia de direitos e defesa da legalidade.


Introdução

Propõe-se no presente artigo, estudar a figura do Provedor de Justiça em Moçambique, tema que se enquadra no Direito Constitucional, posto que se pretende em primeiro linha, analisar a natureza jurídica do retro mencionado órgão, se é político, administrativo/executivo ou judicial. Seguidamente, procurar-se-á compreender o regime jurídico que lhe é aplicável (essencialmente, a Constituição da República de 2018 e a Lei nº 7/2006, de 16 de Agosto) e por último, compreender os mecanismos colocados pelo Estado à disposição do Provedor de Justiça para fazer valer as suas intervenções no âmbito das suas competências. Destarte, o artigo 255 da Constituição moçambicana define o Provedor de Justiça como órgão cuja função primordial é zelar pela garantia dos direitos dos cidadãos, pela defesa da legalidade e da justiça na actuação da Administração Pública. Depreende-se desta definição que o legislador constituinte, à par dos mecanismos instituídos juntos de outros órgão do Estado, como por exemplo, o Ministério Público, acometido na defesa dos interesses que a lei determina e no controlo da legalidade[2]; o Tribunal Administrativo, que tem como parte da sua missão controlar a legalidade dos actos administrativos e da aplicação das normas regulamentares emitidas pela Administração Pública, bem como fiscalizar a legalidade das despesas públicas, de entre outras funções, como se impõe no nº 2 do artigo 227 da Constituição, institucionalizou o Provedor de Justiça, talvez com o propósito de reforçar, no geral, o controlo da legalidade. Nesta vertente, o Provedor de Justiça aparece como órgão singular e de assessoria à Administração Pública. Outra das particulares que decorre da Constituição da República é que, o Provedor de Justiça, estando embora adstrito apenas a obedecer à Constituição e às lei na sua actuação, feita com independência e imparcialidade no exercício das suas funções, caracteriza-se por ser um órgão e não concretamente um poder do Estado, porquanto, não está investido do privilégio de tomar decisões.[3] Resulta ainda da perquirição dos artigos 7, 9, 10 e 11, todos da Lei nº 7/2006, de 16 de Agosto, que o legislador ordinário moçambicano institucionalizou o Provedor de Justiça como órgão para-judicial, porquanto, goza dos privilégios atribuídos aos magistrados, faltando-lhe apenas o poder decisório. A efectividade de funções do Provedor de Justiça em Moçambique é um fenómeno novo. O primeiro Provedor de Justiça em Moçambique, José Ibraimo Abudo, Juiz de Carreira e antigo Ministro da Justiça entre 1994 e 2004, foi eleito no dia 15 de Maio de 2012, num processo de votação pela Assembleia da República, por uma maioria de 175 votos. A novidade da efectividade de funções do Provedor de Justiça em Moçambique e a necessidade de compreender as dinâmicas da sua actuação, constituem o móbil do interesse na sua investigação. Para efeito, a presente pesquisa seguirá o enfoque qualitativo, sendo de tipo exploratório, alicerçando-se no método interpretativo/hermenêutico, com base na bibliográfica e legislação. Por conseguinte, são tomados como temas principais: O Provedor de Justiça: Ideia Geral; Competências do Provedor de Justiça; Natureza Jurídica do Provedor de Justiça no Ordenamento Jurídico Moçambicano; Acção do Provedor de Justiça na Actividade Forense; Valor Jurídico das Recomendações do Provedor de Justiça; e Considerações Finais.


O Provedor de Justiça: Ideia Geral

O Provedor de Justiça é o órgão que pela génese da sua origem e funções, corresponde ao Ombudsman, figura originária da Suécia, que remonta de 1809 e que igualmente inspirou o surgimento do Alto-comissário Contra a Corrupção e a Ilegalidade Administrativa, em Macau.[4]

O autor em citação refere ainda que uma das características da ordem constitucional dos Estados modernos é a incorporação nas suas Constituições, dos direitos, liberdades e garantias fundamentais dos cidadãos e, no leque dos princípios constitucionais e de direitos, liberdades e garantias, encontra-se o direito de acesso ao Provedor de Justiça, exercido através da apresentação de queixas e reclamações contra os actos ilegais na actuação da Administração Pública.

Assenta ainda o citado autor que, com a deposição do Rei Gustavo IV, o surgimento da figura de Ombudsman na Suécia em 1809, tornou-se o marco do termo do regime absolutista de concepção vertical e horizontal dos poderes na Coroa, fenómeno similar ao que ocorre em toda a Europa Continental e deu lugar a uma Constituição da qual floresceu o princípio de controlo do poder parlamentar sobre o exercício do poder executivo.

De maior relevância, como efeito da Revolução Sueca, foi a criação de um comissário parlamentar, o Ombudsman, tão independente da Coroa, do Governo e dos Tribunais, quanto do próprio órgão que o designara, com competências especiais para a fiscalização e investigação a partir das queixas dos cidadãos, órgão historicamente caracterizado pela actuação com independência e imparcialidade.

O provedor de Justiça encontra variadas denominações quanto o ilustram os exemplos que vão desde «ombudsmen regionais» a «ombudsmen nacionais». Em Espanha recebeu o nome de «Defensor del Pueblo»; em França, «Médiateur de la Republique»; em Itália, o «Difensore Civico», a nível apenas regional; em Inglaterra, o «Parliementary Commissioner»; no Quebeque, o «Protécteur des Citoyens» e na Venezuela, o «Fiscal General». Muitas outras ilustrações poderiam ser encontradas em Israel, nos Países Baixos, na Áustria, na Zâmbia, na índia, na Austrália, em Hong Kong ou no Papua-Nova Guiné.[5]

Conclui o autor referindo que os países que não adoptaram a figura do Provedor de Justiça, têm recorrido às denominadas Comissões Parlamentares de Petições, as quais estendem a sua actuação até bem perto do modelo do Provedor de Justiça.

Curiosamente, Moçambique agrega no seu ordenamento jurídico, quer a figura de Provedor de Justiça, bem como a Comissão Parlamentar de Petições, Queixas e Reclamações, que é uma Comissões da Assembleia da República, que actua sob o manto das disposições conjugadas da alínea h) do nº 1 do artigo 84 e artigo 92, ambos do Regimento da Assembleia da República, aprovado pela Lei nº 12/2016, de 30 de Dezembro.

Ao nível do Direito Comunitário Europeu, merece especial destaque o Tratado de Maastricht, que instituiu a figura do Provedor de Justiça Europeu, com o assumido propósito de combater a má administração no âmbito da actividade das instituições e organismos comunitários, sendo de referenciar o postulado do artigo 43.º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia que igualmente consagra o direito dos cidadãos europeus de apresentarem petições ao Provedor de Justiça Europeu, com fundamento na má administração.[6]

Estatui a norma em referência que Qualquer cidadão da União, bem como qualquer pessoa singular ou colectiva com residência ou sede social num Estado-Membro, tem o direito de apresentar petições ao Provedor de Justiça Europeu, respeitantes a casos de má administração na actuação das instituições, órgãos ou organismos da União, com excepção do Tribunal de Justiça da União Europeia no exercício das respectivas funções jurisdicionais.

O direito de petição é igualmente alargado ao Parlamento Europeu porquanto se estabelece na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, que Qualquer cidadão da União, bem como qualquer pessoa singular ou colectiva com residência ou sede social num Estado-Membro, goza do direito de petição ao Parlamento Europeu.[7]

Para a experiência do Direito Comunitário Africano, denota-se que na maioria dos países da região austral, por exemplo, se acha previsto o órgão Provedor de Justiça, não obstante esse facto, ainda não foi aprovada a legislação especial sobre um Provedor de Justiça da Região, embora esta intensão seja presente nas reuniões dos Provedores de Justiça dos países da região, como sucedeu, por exemplo, na VI Sessão da Assembleia Geral da Associação dos Provedores de Justiça e Mediadores de África (AOMA) realizada em Kigali - Ruanda, no dia 30 de Novembro de 2018. A Associação integra os Provedores de Justiça da República de Angola, da República da África do Sul, da República do Botswana, da República do Lesoto, da República de Moçambique, da República do Malawi, da República do Quénia, da República da Namíbia, da República da Zâmbia e da República do Zimbabwe. [8]

O propósito desta associação, no que ao escopo histórico-natural do Provedor de Justiça diz respeito, assenta na promoção da boa governação, de acordo com os direitos humanos e a transparência administrativa.[9]

Na maioria dos casos dos países da região austral de África, o Provedor de Justiça é um órgão do Estado, eleito pelas respectivas Assembleias Nacionais, é independente e tem como função principal promover a defesa dos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos, através de meios informais, para assegurar a legalidade da administração pública.[10]

Conclui-se por conseguinte que as concepções africanas e europeias sobre o Provedor de Justiça têm um denominador comum que traduz a intenção de estabelecer um mecanismo adicional posto à disposição dos cidadãos para apresentarem as suas manifestações de repulsa nos casos em que a Administração Pública no lugar de cumprir a sua missão nos termos previamente angularizados pela lei, entende agir em oposição aos preceitos legais, desembocado tal actuação numa má administração que por via de consequência gera resultados adversos do interesse público, enquanto fundamento e essência da existência da Administração Pública.


Competência do Provedor de Justiça

No contexto jurídico moçambicano, o Provedor de Justiça afigura-se como um órgão do Estado, um Estado de Direito que se subordina à Constituição e se funda na legalidade.

No Estado de Direito, a existência, a organização estrutural e o funcionamento dos órgãos e instituições do Estado e de outras pessoas colectivas de direito público está intrinsecamente submetida ao princípio da legalidade, sem o qual, pelo menos do ponto de vista formal, a premissa de Estado de Direito seria uma inutilidade. Quer isso significar que, cada órgão com existência legal estrutura-se e funciona dentro de um parâmetro pré-estabelecido por normas-comandos que enformam os demais órgãos e instituições a não exercerem simultaneamente as atribuições e competências adstritas expressamente a um determinado órgão.

Legalmente, o Provedor da Justiça em Moçambique exerce as suas funções na estrita obediência às competências e poderes instituídos nos artigos 15 e 16 da Lei nº 7/2006, de 16 de Agosto.

São competências do Provedor de Justiça:

  1. endereçar recomendações aos órgãos competentes com vista à correcção dos actos ou omissões ilegais ou injustos dos poderes públicos ou melhoria dos procedimentos;
  2. assinalar as deficiências da lei que constatar, emitindo recomendações, para alteração ou revogação ou sugestões para a elaboração de nova legislação, ao Presidente da República, à Assembleia da República e Governo;
  3. emitir pareceres a pedido da Assembleia da República sobre quaisquer matérias relacionadas com a sua actividade;
  4. requerer ao Conselho Constitucional a declaração de inconstitucionalidade ou de ilegalidade de normas, nos termos da alínea f) do número 2 do artigo 244 da Constituição da República;
  5. promover a divulgação da legislação relativa aos direitos, deveres e liberdades fundamentais dos cidadãos;
  6. intervir, nos termos da lei aplicável, na tutela dos interesses colectivos ou difusos, quando estiverem em causa as entidades públicas.

2. As recomendações e pareceres referidos nas alíneas b) e c) do número anterior são publicadas no Boletim da República.

A Constituição bem como a Lei nº 7/2006, de 16 de Agosto, não se referem de forma expressa sobre a forma ou natureza dos actos que traduzem a actuação do Provedor de Justiça, no entanto, pode-se inferir do postulado no nº 1 do artigo 258 em conjugação com o artigo 255, ambos da Constituição que, os actos dirigidos à Administração Pública, para observar a legalidade na sua actuação, toma a forma de recomendações, desprovidas do poder vinculativo. Ou seja, as recomendações emitidas pelo Provedor de Justiça perante a Administração Pública, não têm a propensão de, de per si, desencadear responsabilidade por seu desacatamento.

Uma questão de especial peculiaridade no Direito, prende-se com o conteúdo da norma da alínea b) do artigo 15 da Lei nº 7/2006, de 16 de Agosto, que estabelece a competência do Provedor de Justiça para emitir recomendações para alteração ou revogação ou sugestões para a elaboração de nova legislação ao Presidente da República, à Assembleia da República e ao Governo. Trata-se de uma norma de constitucionalidade duvidosa, posto que, o princípio orientador da actividade do Provedor de Justiça encontra-se esquadrinhado no artigo 255 da Constituição, nos termos do qual O Provedor de Justiça é um órgão que tem como função a garantia dos direitos dos cidadãos, defesa da legalidade e da justiça na actuação da Administração Pública.

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O legislador constituinte limitou de forma expressa, a actuação do Provedor de Justiça, a recair sobre os actos de actuação da Administração Pública que importam a violação dos direitos dos cidadãos, assentes em ilegalidade e injustiça. No entanto, através da alínea b) do artigo 15 da Lei nº 7/2006, de 16 de Agosto, o legislador ordinário veio conferir competências ao Provedor de Justiça para emitir recomendações aos órgãos que não estejam em exercício de actividade administrativa, facto que gera a suspeita de inconstitucionalidade desta norma.

Nos estudos sobre a constitucionalidade das normas, os constitucionalistas são unânimes em considerar que a ideia de controlo de constitucionalidade está ligada à supremacia da Constituição sobre todo o ordenamento jurídico e, também, à de rigidez constitucional e à protecção dos direitos fundamentais, de tal modo que se uma norma ordinária contrariar a Constituição será considerada como estando enferma do vício de inconstitucionalidade, devendo por isso ser irradiada do ordenamento jurídico[11].

Não sendo embora de interesse abordar com profundidade a questão da suspeita da inconstitucionalidade, por não subscrever o objecto da presente pesquisa, a matéria é sempre de recomendação para os juristas, por revestir a natureza de questão prévia em qualquer estudo, porquanto as consequências da inconstitucionalidade se assemelham grande medida com os efeitos da declaração da nulidade. Regra geral, a declaração da inconstitucionalidade propaga seus efeitos para o passado, salvo nos casos em que por necessidade de protecção de certos efeitos jurídicos, haja reserva relativamente aos efeitos já produzidos.

Atento aos limites constitucionais e da lei, o funcionamento do Provedor de Justiça traduz-se nas competências de dimanar recomendações apenas para a Administração Pública[12], emitir pareceres em matérias estritamente relacionadas com a sua actividade, quando solicitado[13], peticionar pela declaração de inconstitucionalidade e ilegalidade de normas[14] e realizar as demais acções tendentes a assegurar que a Administração Pública não viole os direitos e deveres fundamentais[15].


Natureza Jurídica do Provedor de Justiça no Ordenamento Jurídico Moçambicano

A Constituição da República de Moçambique fixa o quadro legal dos princípios recomendadores sobre o Provedor de Justiça nos artigos 255 à 259, sem embargo da reserva feita para o legislador ordinário, no artigo 260, para estabelecer a disciplina sobre os aspectos inerentes ao estatuto, procedimento e estrutura organizativa de apoio ao Provedor de Justiça.

Assim, a Constituição concebe o Provedor de Justiça como órgão cuja função é de garantir os direitos dos cidadãos, a defesa da legalidade e da justiça na actuação da Administração Pública, promanando da eleição por uma maioria de dois terços dos deputados da Assembleia da República.

Ainda sobre o manto da Constituição, na sua actuação, o Provedor de Justiça goza de independência e imparcialidade, estando subordinado apenas à Constituição e às leis que vinculam o Estado moçambicano.

Com feito, e por necessidade de garantir a efectividade da acção do Provedor de Justiça no exercício das suas competências, o legislador constituinte impôs aos órgãos e agentes da Administração Pública, o dever de respeitosa colaboração perante os requerimentos apresentados pelo Provedor de Justiça, embora inexista ao nível da Constituição a previsão sobre a cominação legal decorrente da violação desse dever de respeitosa colaboração. Grave ainda é que, a Constituição não cuidou sequer de recomendar o legislador ordinário a regulamentar a questão da violação do dever de prestar colaboração com o Provedor de Justiça.

Decorre daí a recorrência do Provedor de Justiça, nos seus Informes Anuais, a apresentação de reclamações sobre o baixo grau de colaboração dos Órgãos dos Poderes da Administração Pública e seus Titulares.

A título de exemplo, refere do Informe Anual de 2016 que, Alguma parte das autoridades públicas tem facultado o que é solicitado pelo Provedor de Justiça e manifestam disponibilidade para a prestação de esclarecimentos e explicações que se mostram necessários. Outra parte responde fora do prazo fixado, após ofícios de insistência de pedidos de resposta e outra parte opta pelo silêncio absoluto e até mostrando indisponibilidade na participação quando o Provedor de Justiça, em sede de mediação, promove reuniões entre elas e os queixosos ou peticionários com vista à concertação e conciliação de interesses envolvidos, para solucionar e ultrapassar o diferendo que opõe as partes litigantes.[16]

Esta questão já era objecto de colocação no Informe Anual do Provedor de Justiça apresentado em 2015.[17]

A norma do artigo 260 da Constituição unicamente autorizou o legislador ordinário a dispor sobre aspectos do estatuto do Provedor de Justiça, procedimentos de sua actuação e da estrutura organizativa dos respectivos serviços de apoio ao Provedor de Justiça.

O conceito do provedor de Justiça que é eminentemente de natureza funcional do órgão, é retomado no artigo 1 da Lei nº 7/2006, de 16 de Agosto, nos termos do qual O Provedor de Justiça é um órgão do Estado que tem como função a garantia dos direitos dos cidadãos, a defesa da legalidade e da justiça na actuação da Administração Pública.

Trata-se de funções apenas voltadas para a defesa da legalidade e da justiça sobre actividade da Administração Pública em toda a jurisdição do Estado moçambicano, incluindo a actividade das empresas públicas e concessionárias de serviços públicos, das sociedades com capital maioritariamente público e dos serviços de exploração de bens de domínio público.[18] Ora;

Nos artigos 9, 10 e 11, todos da Lei nº 7/2006, de 16 de Agosto, estão vertidas as incompatibilidades, imunidades, direitos e regalias do Provedor de Justiça, com expressa remessa para as incompatibilidades próprias dos magistrados.[19]

Perscrutando as incompatibilidades constantes do artigo 9, as imunidades do artigo 10, bem como os direitos e regalias, neste último caso, as alistadas nas alíneas do nº 1 do artigo 11, em sintonia com os princípios da independência e da inamovibilidade do artigo 7, e ainda a panóplia das competências e poderes contidos nos artigos 15 e 16, todas normas da Lei que temos vindo a citar, infere-se que o ordenamento jurídico moçambicano encontra no Provedor de Justiça, um órgão de natureza singular; de assessoria da Administração Pública e para-judicial.

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Sobre a autora
Helder Manuel Naife

Doutorando em Direito Público pela Faculdade de Direito da Universidade Católica de Moçambique em parceria com a Universidade Nova de Lisboa, Juiz de Direito - A no Tribunal Administrativo Provincial da Zambézia.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

NAIFE, Helder Manuel. O Provedor de Justiça em Moçambique. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 27, n. 6839, 23 mar. 2022. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/96908. Acesso em: 3 dez. 2024.

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