Capa da publicação Inquérito policial: investigação legítima x temerária
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O papel do inquérito policial no Estado Democrático frente aos direitos fundamentais.

Os limites entre a investigação legítima e a temerária

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31/12/2022 às 11:45

Resumo:


  • O inquérito policial é uma fase preliminar do processo penal, conduzido pelo delegado de polícia no Brasil.

  • Apesar de ser dispensável para a propositura da ação penal, o inquérito policial é essencial como fonte de informações para o sistema de justiça penal.

  • Os direitos fundamentais do investigado durante o inquérito incluem o sigilo, o direito à assistência de advogado e o direito ao silêncio, entre outros.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

O inquérito policial deve garantir a ordem pública e as garantias fundamentais constitucionais.

INTRODUÇÃO

Em linhas gerais, a maioria dos sistemas processuais penais adotados no mundo, sobretudo o sistema europeu e americana, reconhecem a necessidade de uma fase preliminar, que precede o processo penal propriamente dito. No Brasil, a atribuição de conduzir o inquérito policial, que constitui a aludida fase preliminar é do delegado de polícia. Em hipóteses excepcionais e taxativas o Ministério Público poderá instaurar investigação e apurar os fatos, em caráter subsidiário.

O inquérito policial, formado pelos elementos de informações colhidos na fase de investigação preliminar, culmina com a produção de um relatório juridicamente orientado do resultado dessas investigações, que poderá ser utilizado como base para a propositura (ou não) da ação penal.

Isso mesmo, em relação a propositura da ação, o inquérito trata-se de uma mera faculdade, posto ser um instrumento dispensável. Isso porque, no caso da ação penal pública, quando o Ministério Público já contar com informações suficientes para a sua propositura, poderá propor a ação, independentemente da existência de inquérito policial ou, se existindo, dos elementos deste. É o que ensina o artigo 27 do CPP.

Art. 27 - Qualquer pessoa do povo poderá provocar a iniciativa do Ministério Público, nos casos em que caiba a ação pública, fornecendo-lhe, por escrito, informações sobre o fato e a autoria e indicando o tempo, o lugar e os elementos de convicção.

Contudo, o que interessa ao presente artigo é investigar a necessidade da existência ou não de justa causa para a instauração do inquérito policial, além de analisar o tipo penal previsto no artigo 27 da Lei de Abuso de Autoridade. Nesse contexto, tendo o inquérito como elemento dispensável, mas essencial como elemento de informação ao sistema de justiça penal na maioria esmagadora dos processos judiciais, urge debater as dificuldades e também os limites da investigação policial, frente aos direitos fundamentais das pessoas investigadas.

O inquérito policial surge como um instrumento garantidor da ordem pública e das garantias fundamentais, previstas na Constituição Federal. A realização da investigação policial e elaboração do inquérito são tarefas que exigem uma amplitude de saberes. São necessários recursos "relacionais" desenvolvidos por policiais civis, no sentido de superar dificuldades existentes, sejam elas pela falta de recursos materiais e humanos para a realização da investigação de todos os crimes que chegam ao conhecimento da Polícia Civil ou, mesmo, pelas dificuldades de comunicação entre os diferentes operadores do Sistema de Justiça Criminal (AZEVEDO, VASCONCELOS, 2011).

É imperioso ter-se uma definição clara dos requisitos para a requisição ou instauração do inquérito (bem como de termos circunstanciados e procedimentos para adolescente infrator) de modo a não se reprimir a atividade investigatória (ALBECHE, 2020), mas sem perder de vista o respeito aos direitos e garantias fundamentais do investigado, haja vista que a mera instauração do inquérito policial, que entrega ao individuo a pecha de investigado, produz verdadeiro constrangimento e transtornos, por vezes, insuperáveis. Deve-se ter atenção aos princípios que norteiam as atividades estatais (artigo 37 da CF), além dos princípios previstos nos tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário, além daqueles insculpidos na própria Carta Magna, entre eles a presunção de inocência e a dignidade da pessoa humana.


Os elementos mínimos para a instauração de inquérito policial: a aludida justa causa no procedimento preliminar.

Por previsão legal, sabe-se que para instauração de ação penal é necessária a existência de justa causa (elementos de materialidade e autoria) a ser aferida por investigação e/ou documentos preliminares. De regra, realiza-se por Inquérito Policial (CPP, artigo 4º e seguintes), o qual é procedimento administrativo, não jurisdicional, a cargo da Polícia Judiciária Estadual ou Federal (LOPES JR, DA ROSA, 2015) que servirá de base para eventual denúncia ou queixa. Contudo, surge o questionamento acerca dos elementos para a instauração do inquérito: em que consiste a justa causa no inquérito policial?

A Lei de Abuso de Autoridade (Lei 13.869/2010) cuidou de prever a criminalização da requisição ou instauração de investigação de forma temerária ou maliciosa, informando a necessidade de indícios da pratica de crime. Para alguns autores, não há necessidade da comprovação da justa causa para a instauração do inquérito.

Para Thiago Solon Gonçalves Abeche é importante para que não se confunda a justa causa, que é formada pelo binômio indícios de autoria prova da existência do crime com o indício da prática de crime. Para a requisição ou instauração do inquérito policial, basta o indício de que um fato criminoso tenha ocorrido, sem a necessidade, sequer, de que seja apontada a mera suspeita de quem tenha sido o seu autor (ABECHE, 2020).

Em todo caso, a doutrina majoritária concorda que a justa causa, embora não seja exigida para instauração do inquérito, é exigida para a decisão de indiciamento do investigado e para o oferecimento da ação penal.

Sem a justa causa para o indiciamento, o cidadão ficaria à mercê dos órgãos de investigação do estado, podendo ser vitima de investigações temerárias e infundadas que, ainda que fossem posteriormente arquivadas, conduziriam a uma verdadeira devassa na vida profissional e pessoal do indivíduo, causando muito mais do que mero aborrecimento ou dissabor.


Os direitos e garantias fundamentais do investigado frente a instauração do inquérito policial.

Entre os direitos fundamentais do acusado, destacamos inicialmente o direito ao sigilo. Nos termos do artigo 20 do CPP, o inquérito policial será sigiloso, não devendo ser publicizado à sociedade num geral. A autoridade assegurará no inquérito o sigilo necessário à elucidação do fato ou exigido pelo interesse da sociedade (BRASIL, 1948). Vale lembrar que o sigilo pode ser externo (ausência de acesso de toda a sociedade ao inquérito policial e as informações ali contidas) e interno (relacionado ao próprio investigado e à impossibilidade deste ter conhecimento do que está ocorrendo na investigação).

Outro importante e inafastável direito fundamental da pessoa investigada é o de estar acompanhado e se fazer representar por advogado de sua confiança. É direito do advogado e garantia do investigado examinar, em qualquer instituição responsável por conduzir investigação, mesmo sem procuração, autos de flagrante e de investigações de qualquer natureza, findos ou em andamento, ainda que conclusos à autoridade, podendo copiar peças e tomar apontamentos, em meio físico ou digital (artigo 7°, XIV do Estatuto da OAB). Reforçando o entendimento e aplicabilidade do referido dispositivo legal, o STF editou a Súmula Vinculante n° 14, cuja redação diz que É direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos de prova que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência de polícia judiciária, digam respeito ao exercício do direito de defesa. Portanto, não se tem dúvida que o acesso do causídico se restringe aos elementos informativos já concluídos e documentados que se refiram ao exercício de defesa de seu cliente, sendo excluídas as diligências em andamento, e que se refiram ao exercício de defesa. Contudo, deve-se atentar para eventuais abusos cometidos pela autoridade policial, que, visando burlar a norma, indique como diligência em andamento ato já findo.

Registramos o alerta para uma situação específica: quando a investigação envolver mais de um indivíduo, a autoridade não poderá invocar a intimidade dos demais acusados para impedir o acesso aos autos. Por isso, a autoridade que investiga deve, mediante expedientes adequados, aparelhar-se para permitir que a defesa de cada paciente tenha acesso, pelo menos, ao que diga respeito ao seu constituinte. (STF. HC 88190 RJ. Ministro Relator Cezar Peluso. 2ª Turma. Data do julgamento: 29.08.2006). dito de outro modo, pode ser imposto sigilo ao causídico, em relação aos investigados que não são constituintes deste, de modo que não configuraria abuso de autoridade, conforme posição Supremo Tribunal Federal. Vejamos:

(...) O direito assegurado ao indiciado (bem como ao seu defensor) de acesso aos elementos constantes em procedimento investigatório que lhe digam respeito e que já se encontrem documentados nos autos, não abrange, por óbvio, as informações concernentes à decretação e à realização das diligências investigatórias, mormente as que digam respeito a terceiros eventualmente envolvidos." (STF, EDcl no HC 94.387/RS, 1.ª Turma, Rel. Min. RICARDO LEWANDOWSKI, DJe de 21/05/2010).

No inquérito policial também vigora o direito ao silêncio. A oitiva do indiciado (artigo 6º, IV do CPP) é também uma garantia deste de apresentar, querendo, sua autodefesa. O inquérito tem como objetivo a busca da verdade real e deve a todo custo proteger o inculpado. Nessa senda, o direito ao silencio tem previsão constitucional, dispondo que o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado (art. 5°, LXIII da CF). representa uma das implicações do princípio nemo tenetur se detegere, segundo o qual ninguém será obrigado a produzir provas contra si, modalidade de autodefesa passiva.

O investigado deverá ser advertido sobre seu direito de permanecer em silêncio, pelo que lhe será facultada a possibilidade de se calar quanto ao mérito, daí não podendo resultar qualquer prejuízo. Os Tribunais Pátrios firmaram entendimento de que a omissão do dever de informação dos direitos ao suspeito gera nulidade e impõe a desconsideração das informações incriminatórias obtidas e das provas que delas derivam, salvo se não evidenciado o nexo de causalidade entre elas ou quando puderem ser colhidas por uma fonte independente (nesse sentido: TJDFT. Acórdão 1116161, 20130310091140APR, Relatora: MARIA IVATÔNIA, 2ª Turma Criminal, data de julgamento: 09/08/2018, publicado no DJe: 15/08/2018)

O inquérito policial, por tratar-se de procedimento investigatório de natureza administrativa não está sujeito a algumas garantias inerentes ao processo penal. O contraditório, como componente de uma estrutura jurídica, princípio instituto do processo que encontra-se assentado na isonomia não existe nesta fase preliminar. Sendo o inquérito um procedimento inquisitivo, não há a garantia ao contraditório, que somente será assegurada por ocasião de eventual ação penal derivada daquele.

Contudo, não se pode olvidar a relevância da atuação do defensor no curso do inquérito na busca da verdade real, pois o causídico poderá auxiliar a dissipar as suspeitas, combater os indícios, explicar os fatos e auxiliar o investigado em todos os momentos, esteja este preso ou solto.  Nesse contexto, a investigação defensiva surge como verdadeira garantia ao investigado e prerrogativa profissional do advogado e defensor. Por meio do Provimento n° 188/2018 a OAB regulamentou a realização de diligências investigatórias para instrução em procedimentos administrativos e judiciais. A investigação defensiva orienta-se para a produção de prova para emprego em diversas situações, entre elas para instruir pedido de instauração ou trancamento de inquérito, rejeição ou recebimento de denúncia ou queixa, resposta a acusação, pedido de medidas cautelares, entre outros (art. 3° do Provimento OAB n° 188/2018).

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O indiciado também possui o direito de requerer, diretamente ou por seu representante, qualquer diligência no curso das investigações, como solicitar a inquirição de documentos, sugerir busca domiciliar em relação a terceiros, entre outros (artigo 14 do CPP). Contudo, a realização da diligência fica a critério da autoridade policial, que poderá ou não acatar o pedido.


Os limites da investigação preliminar frente ao Estado Democrático

Em um Estado Democrático de Direito a função do Estado é de operador processual, com o intuito de garantir uma ordem jurídica constitucional, de proteção dos direitos processuais, a ser concretizada com base nos princípios da democracia e do discurso por meio do processo legiferante (PERIM, 2014).

Nesse viés, surge o inquérito policial como elemento informativo preliminar, apto a levantamento de informações e documentos que poderão embasar eventual ação penal a ser proposta pelo Ministério Público. Mas o inquérito policial, de caráter investigativo e preparatório, não pode ser conduzido como um vale tudo, posto que sujeito a regras de ordem constitucional e infraconstitucional. Embora não haja a presença de um juiz de direito, nem se configure em processo, a investigação obedece também as regras insculpidas no Código de Processo Penal (artigos 4° a 23).

Além disso, o inquérito policial deve ter objeto específico, atuando nos limites do que consta na portaria de instauração. O brilhante Erick da Rocha Spiegel Sallum explica que:

a investigação criminal caracteriza-se pela metódica coleta de informações direcionada a testar uma hipótese criminal. Essa hipótese criminal representa o objeto específico e bem determinado da investigação. Essa delimitação do fato a ser apurado deve constar expressamente na portaria inaugural do procedimento investigativo, seja no inquérito policial IP, conduzido pela Polícia Judiciária; seja no Procedimento de Investigação Criminal PIC, conduzido pelo Ministério Público (SALLUM, 2020).

Como dito, é imperioso a delimitação precisa do objeto da investigação e a obediência aos prazos previstos no CPP, constituindo estes verdadeiros limites ao Estado. O próprio sistema acusatório (caracterizado pela desconcentração das funções investigativa, acusatória e jurisdicional) funciona como instrumento de contenção (SALLUM, 2020).

A atuação do órgão de investigação estatal também encontra barreira no princípio da Reserva de Jurisdição, que consiste, nos dizeres do Ministro do STF, Celso de Mello, em submeter, à esfera única de decisão dos magistrados, a prática de determinados atos cuja realização, por efeito de explícita determinação constante do próprio texto da Carta Política , somente pode emanar do juiz, e não de terceiros, inclusive daqueles a quem haja eventualmente atribuído o exercício de poderes de investigação próprios das autoridades judiciais (MS 23452/RJ).

O principio delimita a atuação da investigação, que não poderá praticar atos jurisdicionais atribuídos exclusivamente aos membros do Poder Judiciário (juízes, desembargadores, ministros). Como exemplo, podemos citar a busca e apreensão domiciliar e a interceptação telefônica, onde a autoridade policial deverá solicitar ao juiz e, somente em caso de autorização por parte deste é que poderá proceder à realização das diligências. É certo que existem diversos atos que são praticados pelo delegado de policia sem necessidade de chancela da autoridade judicial, por exemplo, a requisição de perícias, objetos e documentos (artigo 2º, §2º da Lei 12.830/13), a prisão em flagrante (artigo 304 do CPP), o arbitramento de fiança (artigo 322 do CPP), a busca pessoal (artigo 240, §2º do CPP), a requisição de dados telefônicos de localização (relatório ERB), após o decurso do prazo previsto no parágrafo 4° do artigo 13-B do CPP). Embora sejam atos praticados por determinação da autoridade policial, ainda assim deverão observar os limites da portaria de instauração do inquérito e os mandamentos constitucionais.

Sabemos que as informações de caráter personalíssimos dos cidadãos são sigilosas, sendo certo que a Carta Magna protege a intimidade e a vida privada o que corresponde a proteção efetiva a uma série de dados, entre eles as informações bancárias, dados fiscais e de internet. Henrique Hoffmann Monteiro de Castro, delegado de Polícia Civil do Paraná preleciona que no caso das comunicações, a própria Constituição impõe a necessidade de ordem judicial para sua captação, existindo cláusula absoluta de reserva de jurisdição. Já quanto aos dados englobados pela intimidade e privacidade, o texto constitucional foi silente, sendo necessário conferir a legislação infraconstitucional. Em outras palavras, a cláusula absoluta de reserva de jurisdição limita-se à comunicação dos dados (artigo 5º, XII da CF informações dinâmicas), e não aos dados em si (artigo 5º, X da CF informações estáticas), que possuem proteção distinta, conforme entendimento dos Tribunais Superiores (DE CASTRO, 2017).

Sempre que houver o deferimento de uma quebra de sigilo, dado o caráter excepcionalíssimo da medida, a informação eventualmente obtida só poderá ser usada naquela investigação e com finalidade específica, sendo que se houver vazamento ou extrapolação dos limites do pleito a autoridade policial poderá ser responsabilizada. No inquérito, embora se adote o sistema inquisitivo, não se pode tudo. A busca sempre será a verdade real, os meios serão os disponíveis e legalmente válidos e as garantias dos investigados deverão ser respeitadas, sob pena de nulidade absoluta e comprometimento de todos os atos praticados.


O delito de requisição ou instauração de inquérito policial sem indício da prática de crime

A Lei 13.869/19 revogou a Lei 4.898/65, passando a disciplinar o Abuso de Autoridade, contendo a tipificação de crimes funcionais, cometidos pelo agente público que extrapola os limites de atuação, violando o interesse público.

Artigo 27  Requisitar instauração ou instaurar procedimento investigatório de infração penal ou administrativa, em desfavor de alguém, à falta de qualquer indício da prática de crime , de ilícito funcional ou de infração administrativa:

Pena detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa.

Parágrafo único. Não há crime quando se tratar de sindicância ou investigação preliminar sumária, devidamente justificada".

Primeiro, para a configuração dos crimes previstos na lei de abuso de autoridade é necessário que a conduta seja praticada (1) com a finalidade específica de prejudicar outrem; ou (2) com a finalidade de beneficiar a si mesmo ou a terceiro; ou (3) por mero capricho ou satisfação pessoal (GARCIA, 2020, p. 43). Além disso, não haverá crime no caso de divergência na interpretação de lei ou na avaliação de fatos e provas.

Percebe-se que o elemento subjetivo do tipo penal é o dolo, inexistindo previsão de crime na modalidade culposa.

Nota-se, também, que o Ministério Publico deverá analisar a existência ou não de indícios mínimos da prática de crime (juízo valorativo) para a promoção (ou não) da ação penal. Indício é definido como a circunstância conhecida e provada, que, tendo relação com o fato, autorize, por indução, concluir-se a existência de outra ou outras circunstâncias (artigo 239 do CPP). A avaliação a respeito da presença do indício há de se desenvolver no plano da racionalidade, estando alicerçada nos referenciais de argumentação, universalização e falibilidade (KAUFFMAN, 2004).

Simplificando, o que a lei exige é que exista alguma justificativa no plano probatório para que a investigação seja requisitada ou instaurada em detrimento de alguém. Nas palavras de GARCIA:

Esse aspecto evidencia que, para fins de configuração da infração penal, a requisição ou a instauração da investigação deve ser direcionada a alguma pessoa, que é vinculada, ainda que em caráter preliminar e provisório, ao ilícito. Portanto, não há que se falar na configuração do tipo do art. 27 quando se tiver notícia da infração penal, mas a autoria for desconhecida, tendo a investigação o objetivo de elucidá-la. Essa situação é substancialmente distinta daquela em que uma pessoa é investigada com o objetivo de se descobrir se praticou alguma infração penal, cuja existência, até então, não era corroborada por qualquer indício (GARCIA, 2020, p. 48-49).

Desse modo, resta evidenciado que a requisição ou instauração da investigação deve ser devidamente fundamentada, com indicação dos elementos probatórios mínimos que justifiquem o ato.

Frise-se que os crimes de abuso de autoridade, cometidos sem violência ou grave ameaça à pessoa, presentes os pressupostos do artigo 28 do CPP, admitirão o acordo de não persecução penal, salvo se a sua celebração não atender ao que seja necessário e suficiente para a reprovação e prevenção do crime (Enunciado 28 do CNPG).

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Sobre o autor
Jairo de Sousa Lima

Advogado. Professor da FAESF-PI. Mestre em Direito pela Universidade Federal do Piauí (UFPI). Bacharel em Direito pela Faculdade de Ensino Superior de Floriano. Pós-graduado em Direito Penal e Processual Penal, pela Uninovafapi. Advogado da ABECS-PI (Associação beneficente de cabos e soldados e bombeiros militares). Membro da ANACRIM. Presidente da Subcomissão de Relacionamento com o Poder Judiciário da OAB/PI. Palestrante. Autor de dois livros e mais de 70 artigos jurídicos publicados no Canal Ciências Criminais e outros portais e revistas.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LIMA, Jairo Sousa. O papel do inquérito policial no Estado Democrático frente aos direitos fundamentais.: Os limites entre a investigação legítima e a temerária. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 27, n. 7122, 31 dez. 2022. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/97158. Acesso em: 18 dez. 2024.

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