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Princípio da reserva do possível e o direito à saúde diante da pandemia do novo coronavírus

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02/02/2023 às 18:35
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5. PRINCÍPIO DA RESERVA DO POSSÍVEL

Conforme abordado anteriormente, a existência do Mínimo Existencial retrata um núcleo essencial de direitos necessários para a garantia da vida com dignidade. Como consequência, cabe ao Estado se manter de forma negativa no que couber, mas também atuar de forma positiva sempre que necessário para efetivação de tais direitos.

Nesse sentido, além da análise de um Mínimo Existencial a ser garantido pelo poder estatal, deve-se considerar a condição orçamentária do Estado. Desse modo, muitos direitos fundamentais não são efetivados de forma plena e digna em razão da Reserva do Possível.

A discussão acerca da limitação orçamentária do Estado para fazer cumprir os direitos previstos no ordenamento jurídico brasileiro ainda é presente em muitas demandas judiciais. Cabe mencionar a existência de um rol de garantias e direitos fundamentais que são estendidos a todos nos termos da Carta Magna, e, que devem ser garantidos pelo Estado, além de se destacar o Princípio do Mínimo Existencial.

Para Pers; Pereira:

A abundante demanda por direitos proveniente em grande parte da camada mais fragilizada da sociedade, devido à intensa pobreza, que é um problema de importância estrutural a ser enfrentado no Brasil, acaba por converter-se numa justificativa utilizada pela administração pública, para que as garantias não sejam ofertadas integralmente aos cidadãos, haja vista a quantidade elevada de gastos necessários para tal efetivação e a indisponibilidade de recursos (PERS; PEREIRA, 2020, pág. 14).

Nesse viés, a sociedade precisa efetivar seus direitos e muitas vezes obtém como resposta a impossibilidade disso em razão de limitação orçamentária do Estado. Assim, em alguns casos, o Princípio da Reserva do Possível pode ser aplicado realizando uma limitação razoável a determinado direito em razão da finitude dos recursos financeiros estatais.

Ocorre que é importante destacar que muitos direitos possuem um núcleo intangível, o qual não pode ser limitado nem mesmo com a justificativa da Reserva do Possível. Isso porque exististe o Mínimo Existencial a ser preservado, pois não podem existir limitações que privem o ser humano de uma vida digna e de meios necessários para tê-la.

O entendimento sobre a Reserva do Possível na concepção alemã, é de que “refere-se àquilo que é razoavelmente concebido como prestação social devida, em decorrência da interpretação dos direitos fundamentais sociais, eliminando as demandas irrazoáveis, desproporcionais e excessivas” (NUNES JUNIOR, 2019, pág. 1269).

Por conseguinte, pode-se entender que é uma concepção razoável de Reserva do Possível que o Estado possui limitações para efetivar concretamente todas as garantias e direitos legalmente previstos para todos que necessitarem. Assim, é algo razoável que o Estado forneça meios proporcionais e equilibrados de acesso aos direitos.

Logo, o Estado tem o ônus de comprovar sua insuficiência financeira, não cabendo a simples alegação genérica da insuficiência de orçamento. Senão, vejamos:

AÇÃO CIVIL PÚBLICA - DIREITO À SAÚDE -RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERADOS - TRATAMENTO FORA DO DOMICÍLIO - CÂNCER - TRANSPLANTE DE MEDULA - AJUDA DE CUSTO - COMPROVAÇÃO, PELO MINISTÉRIO PÚBLICO, DOS FATOS CONSTITUTIVOS DO DIREITO DO PACIENTE - INEXISTÊNCIA DE ELEMENTOS IMPEDITIVOS, MODIFICATIVOS OU EXTINTIVOS - CONTESTAÇÃO QUE CONTÉM ARGUMENTOS GENÉRICOS. 1. Sendo solidária a responsabilidade dos entes federados no que tange à promoção da saúde, é de se concluir que todos detêm legitimidade passiva para responder, ainda que exclusivamente, pelo pedido de fornecimento de medicamentos. 2. Demonstrada a imprescindibilidade do tratamento fora do domicílio, diante da ausência de disponibilização do transplante de medula pelo réu, aliada à hipossuficiência de recursos do paciente, impõe-se a condenação do Município à ajuda de custo. 3. Alegações genéricas de insuficiência orçamentária não têm o condão de suplantar o direito constitucional à saúde. 4. Em reexame necessário, reformar em parte a r. sentença, somente para limitar a condenação ao período de permanência do paciente indicado no relatório médico.

(TJ-MG - AC: 10637100068526001 São Lourenço, Relator: Áurea Brasil, Data de Julgamento: 09/02/2012, Câmaras Cíveis Isoladas / 5ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 24/02/2012) (Grifo meu).

Dessa forma, o Princípio da Reserva do Possível não pode ser utilizado de modo indiscriminado como justificativa para a ausência de acesso à saúde no Brasil, cabendo ao Estado garantir a razoável efetivação desse direito.


6. DIREITO À SAÚDE E A SUA LIMITAÇÃO FUNDADA NO PRINCÍPIO DA RESERVA DO POSSÍVEL

É importante destacar que os direitos assegurados pelo texto constitucional geram ao indivíduo o poder de exigir sua aplicação efetiva. Diante da análise sobre o poder de exigir a efetivação de seus direitos e a limitação orçamentária do Estado, surge o ideal de aplicação da razoabilidade para garantir um equilíbrio nessa relação.

Porém, existem direitos e garantias que, se limitados, podem gerar prejuízos irreparáveis, pois se tratam de direitos indispensáveis ao Mínimo Existencial. É o caso do Direito à saúde, amplamente conhecido e garantido no texto constitucional e que no contexto da pandemia do novo corona vírus sofreu excesso de limitações como será demonstrado.

Limitar um direito fundamental para manutenção da vida é de fato algo a ser feito com muita cautela. Primeiro, deve-se verificar que é necessário utilizar de razoabilidade na efetivação de direitos, pois é materialmente difícil cumprir no grau máximo de excelência todos os direitos e garantias. Segundo, deve-se ter atenção ao núcleo essencial do direito à saúde no que se relaciona com a manutenção da vida, pois restringir esse direito ao ponto de ser incompatível com a vida não seria razoável.

O entendimento de que o Princípio da Reserva do Possível não tem aplicação ilimitada quando a demanda se tratar de Direito à saúde já é firmado em tribunais, nesse sentido:

PROCESSO Nº: 0800563-35.2019.4.05.8401 - APELAÇÃO CÍVEL APELANTE: ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE APELADO: JOSE REGINALDO DA FONSECA ADVOGADO: Carlos Paccelli Silva RELATOR(A): Desembargador(a) Federal Francisco Roberto Machado - 1ª Turma JUIZ PROLATOR DA SENTENÇA (1° GRAU): Juiz(a) Federal Arnaldo Pereira De Andrade Segundo EMENTA: PROCESSUAL CIVIL, CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO. LEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM DOS ENTES FEDERADOS. DIREITO À SAÚDE. INTERNAMENTO EM UTI. NECESSIDADE COMPROVADA. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA ISONOMIA. INEXISTÊNCIA. PRINCÍPIO DA RESERVA DO POSSÍVEL. INAPLICABILIDADE. APELAÇÃO IMPROVIDA.

[...]

8. A Administração não pode negar-se a fornecer um tratamento comprovadamente essencial à vida do requerente, usando como argumento a sua excessiva onerosidade. Logo, incabível a alegação da "reserva do possível", pois mesmo sendo indiscutível que o fornecimento de medicamentos ou tratamento de alto custo requer a existência de recursos orçamentários, sabe-se que tal alegação não ampara o apelante. [...] (PROCESSO: 08005633520194058401, APELAÇÃO CÍVEL, DESEMBARGADOR FEDERAL FRANCISCO ROBERTO MACHADO, 1ª TURMA, JULGAMENTO: 14/05/2020).

Nesse sentido, não tem sido aceita pelos tribunais a limitação do exercício ao direito à saúde com exclusiva alegação do Princípio da Reserva do Possível. Isso em decorrência da importância desse direito como garantia ao Mínimo Existencial, sendo primordial o acesso à saúde sempre que necessário.

Nesse contexto, não se pode falar que entes públicos estão limitados à Reserva do Possível, pois se trata de uma alegação vaga, e quando se relaciona essa limitação ao direito a saúde e a vida, tem-se direitos que estão além de prejuízos causados ao Estado.

Note-se ainda que o entendimento de Tribunais de Justiça vem neste sentido:

MANDADO DE SEGURANÇA. DIREITO À SAÚDE. MEDICAMENTO. FORNECIMENTO. Autora portadora de hipertensão arterial, necessitando de medicamentos de uso contínuo. Necessidade do uso atestada em prescrição médica idônea, que não cabe ao judiciário contestar. Hipossuficiência. Inadmissível a recusa de fornecimento. Dever constitucional do Estado de garantir a saúde de todos os cidadãos, nos termos do art. 196 da Constituição Federal. Atividade jurisdicional que não expressa ingerência indevida na área de competência do Poder Executivo. Inaplicabilidade do princípio da reserva do possível. Sentença de procedência confirmada. Negado provimento ao recurso voluntário e oficial. (TJ-SP - APL: 00049593720128260505 SP 0004959-37.2012.8.26.0505, Relator: Djalma Lofrano Filho, Data de Julgamento: 05/08/2015, 13ª Câmara de Direito Público, Data de Publicação: 12/08/2015).

APELAÇÃO E REEXAME NECESSÁRIO. DIREITO À SAÚDE. MEDICAMENTO. RANIBIZUMABE (LUCENTIS OU AVASTIN). Fornecimento gratuito de medicamento para pessoa idosa, hipossuficiente e acometida de degeneração da mácula do olho direito e visão 20/80 com correção. Necessidade do uso atestada em prescrição médica idônea, suficiente para comprovação do direito da autora. Inadmissível a recusa de fornecimento. Dever constitucional do Estado de garantir a saúde de todos os cidadãos, nos termos do art. 196 da Constituição Federal. Desenvolvimento da atividade jurisdicional que não expressa qualquer ingerência indevida na área de competência do Poder Executivo. Responsabilidade solidária dos entes públicos, nos termos do art. 23, II, daCR. Inaplicabilidade do princípio da reserva do possível. Necessidade, contudo, de renovação periódica do receituário. Sentença confirmada. Negado provimento aos recursos, com observação. (TJ-SP - APL: 10049946120148260132 SP 1004994-61.2014.8.26.0132, Relator: Djalma Lofrano Filho, Data de Julgamento: 30/09/2015, 13ª Câmara de Direito Público, Data de Publicação: 07/10/2015)

Portanto, por se tratar de um direito ligado diretamente à vida, é evidente que não se mostra razoável a aplicação de excesso de limitações ao seu exercício. Assim, em casos relacionados ao direito essencial à saúde, se mostra necessária razoabilidade e ponderação entre o Mínimo Existencial e a aplicação de limitação com fundamento no Princípio da Reserva do Possível.


7. DIREITO À SAÚDE EM MEIO A PANDEMIA E O PRINCÍPIO DA RESERVA DO POSSÍVEL

A pandemia do coronavírus até a data de 13/10/2021 causou 601.574 (seiscentas e uma mil, quinhentas e setenta e quatro) mortes no Brasil e contaminou 21.597.949 (vinte e uma milhões, quinhentas e noventa e sete mil, novecentas e quarenta e nove) pessoas, conforme informações colhidas no Painel Coronavírus. Tal fato é reflexo de diversos fatores como, por exemplo, limitação de estrutura médico-hospitalar para atender à crescente demanda.

Fonte: Boletim Epidemiológico Especial 71.

O gráfico acima é um demonstrativo de Óbitos causados por Síndrome Respiratória Aguda Grave). Os dados são referente ao casos no Brasil, em períodos dos anos de 2020 a 2021, contando com informações até a Semana Epidemiológica 27.

Em decorrência dos graves sintomas causados pelo vírus, houve uma maior necessidade de suporte médico e internação para manutenção da vida. Isso é visível ao se analisar dados referentes ao quantitativo de internações durante a pandemia.

No ano de 2021 até a Semana Epidemiológica 27, do total de 1.223.104 (um milhão, duzentas e vinte três mil, cento e quatro) de internações por Síndrome Respiratória Aguda, 896.731 (oitocentos e noventa e seis mil, setecentas e trinta e um) casos foram em razão do Coronavírus, de acordo com o Boletim Epidemiológico 71. Conforme demonstra a tabela abaixo, nas semanas epidemiológicas de 2021 retratadas, verifica-se o ápice da quantidade de internações por covid-19 nas semanas 9, 10 e 11, seguidas de períodos de oscilação.

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O gráfico abaixo demonstra os Casos de Síndrome Respiratória Aguda Grave que necessitaram de internação hospitalar. São dados relativos aos casos no Brasil, nos períodos referentes aos anos de 2020 a 2021, finalizando na semana epidemiológica 27.

Fonte: Boletim Epidemiológico Especial 71.

Como abordado em momento anterior, a necessidade de internações em decorrência de complicações causadas pelo coronavírus gerou filas para atendimento e, inclusive, mortes durante a espera por suporte médico-hospitalar. Por meio do gráfico é possível perceber o grande número de pessoas que necessitaram de atendimento, principalmente nas semanas referentes ao ano de 2021.

Fonte: Observatório Covid-19. Boletim extraordinário

Mesmo com tantos atendimentos realizados, muitos infectados sequer puderam ter acesso ao tratamento de saúde exigido de acordo com a gravidade do caso. Isso como reflexo da limitação de estrutura e de profissionais habilitados para que o Estado fornecesse o acesso à saúde amplo como é previsto constitucionalmente.

Observando tais dados é possível compreender que o sistema de saúde brasileiro não possuía capacidade para fornecer o acesso à saúde que todos os contaminados pelo coronavírus precisavam. Como consequência, o direito de ter acesso à saúde foi violado em razão da limitação Estatal.

Além de tudo o que foi exposto sobre os diretamente lesados, cabe mencionar que ainda existem aqueles que tiveram sua limitação no acesso à saúde de forma indireta, como é o caso de internações consideradas eletivas que foram suspensas, conforme consta no boletim extraordinário emitido pela Fiocruz.

7.1 Resultados e discussões

De acordo com o que já foi abordado, pode-se chegar ao entendimento de que o Estado atraiu para si o dever de garantir o acesso à saúde a todos. Isso por tornar esse direito previsto de forma constitucional e também em normas infraconstitucionais, nesse sentido, conforme a Lei nº 8.080/90 “Art. 2º A saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício” (BRASIL, 2021).

Nesse viés, a cognição do arcabouço legal brasileiro permite compreender que na relação entre o Estado, a garantia fundamental e o direito à saúde, o Estado encontra-se vinculado ao dever de promover as condições necessárias para que seja efetivado de forma plena o direito à saúde.

Ocorre que no contexto atual da Pandemia causada pelo novo Coronavírus, diversos foram os casos noticiados de ausência de condições para que todos pudessem ter acesso ao tratamento médico-hospitalar necessário.

Em notícia publicada no dia 26/03/2021, pela Agência de notícias “O Globo”, foi afirmado que “6.370 brasileiros com Covid-19 estavam, na quinta-feira (25), à espera de um leito de UTI, de acordo com dados do Conselho Nacional de Secretários Estaduais de Saúde (Conass) obtidos com exclusividade pelo Jornal Nacional”. Esse fato noticiado exemplifica a situação de limitação de acesso ao tratamento médico necessário às vítimas da Covid-19.

Em relação a impossibilidade do Estado de garantir de forma plena o direito à saúde, já é entendimento firmado entre os tribunais que é dever do Estado prestar essa garantia, nesse sentido: “O direito à saúde é prerrogativa constitucional indisponível, garantido mediante a implementação de políticas públicas, impondo ao Estado a obrigação de criar condições objetivas que possibilitem o efetivo acesso a tal serviço” (AI 734.487 AgR, rel. min. Ellen Gracie, j. 3-8-2010, 2ª T, DJE de 20-8-2010).

Além disso, cabe destacar que é dever da União, Estados, Distrito Federal e Municípios gerir o sistema público de saúde de forma a garantir seu a acesso por todos indistintamente (art. 23, II, da Constituição Federal). Portanto “se uma pessoa necessita, para garantir o seu direito à saúde, de tratamento médico adequado, é dever solidário da União, do Estado e do Município providenciá-lo” (AI 550.530 AgR, rel. min. Joaquim Barbosa, j. 26-6-2012, 2ª T, DJE de 16-8-2012.)

Nesse sentido, é evidente que o direito à saúde faz parte de um núcleo essencial de direitos a serem garantidos para que se tenha vida com dignidade, se tratando de um mínimo a ser garantido. Assim, a Constituição, normas infraconstitucionais e a jurisprudência seguem o raciocínio de que é responsabilidade estatal fornecer os meios necessários para concretização desse direito.

Como abordado, no período de maior crise na saúde durante a pandemia causada pelo novo coronavírus, existiam filas para atendimento médico, inclusive ocorreram mortes enquanto se aguardava por atendimento médico-hospitalar.

De acordo com pesquisa feita pelo jornal El País, cerca de 4.000 (quatro mil) pessoas morreram no ano de 2020 apenas em 06 (seis) estados do Brasil enquanto aguardavam leito de terapia intensiva (EL PAÍS, 2020). Tal fato demonstra que em relação às pessoas atingidas pelo coronavírus, o direito à saúde foi limitado ao ponto de impedir que algumas tivessem a oportunidade de receber o tratamento médico-hospitalar que necessitavam, levando várias dessas pessoas a óbito em razão da ineficiência do Estado em garantir o atendimento médico necessário e constitucionalmente assegurado.

Seguindo o raciocínio, é compreensível que deve ser analisada a possibilidade de o Estado concretizar os direitos constitucionais frente às suas limitações de natureza econômica e orçamentária. Por outro lado, também deve ser preservado o Mínimo Existencial, sendo indispensável para a vida o acesso ao tratamento necessário para a saúde.

Diante disso, no contexto da pandemia, o Brasil vivenciou um agravamento da crise de saúde pública já existente no país, no qual se pôde ver de fato a contraposição entre Mínimo Existencial e Reserva do Possível na garantia do direito à saúde.

De um lado, pessoas infectadas pelo coronavírus precisavam de atendimento médico, internação e medicamentos. De outro, o Estado não tinha estrutura hospitalar para atender a demanda crescente. Como resultado, muitas mortes ocorreram em filas de espera, sem sequer, ter o acesso ao atendimento médico necessário.

Com base nisso, a discussão sobre a prevalência da Reserva do Possível em detrimento do Mínimo Existencial durante o ápice da pandemia é de grande relevância. Isso porque o Estado não possuía estrutura médico-hospitalar para atender a demanda de infectados, em razão disso, muitas vidas foram perdidas sem sequer ter acesso ao atendimento médico.

Tendo em vista os dados aqui demonstrados, entende-se que muitas vítimas do coronavírus de fato tiveram seu direito à saúde limitado ou até mesmo negado em alguns casos. Quando essa limitação/negação chega ao ponto de gerar mortes, é evidente que não existe razoabilidade.

Como dito, o direito à saúde é basilar para a manutenção da vida. Em razão disso, para os tribunais superiores, sequer deveria haver alguma limitação em seu exercício, conforme amplamente demonstrado no decorrer do presente trabalho. Ocorre que com a grande demanda por leitos hospitalares e atendimento médico, o Estado não suportou, o que levou a limitação ou até mesmo a negação do acesso ao tratamento adequado.

Com a superlotação do sistema de saúde, as pessoas precisaram entrar em filas para que pudessem receber o atendimento que necessitavam. Ocorre que muitas morriam enquanto aguardavam o atendimento. O que leva a conclusão de que, mais uma vez, a Reserva do Possível e a limitação do Estado prevalecerem sobre o direito à saúde que faz parte do Mínimo Existencial, o que jamais deveria ocorrer no nosso Estado democrático de direito, sobretudo considerando que o Estado brasileiro se obrigou em sua Carta Magna e em tratados internacionais a garantir o amplo acesso ao direito à saúde a todos os brasileiros e residentes no país.

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Sobre a autora
Eduarda Milhomem Viana

Advogada, pós-graduanda em direitos e garantias fundamentais e em tribunal do júri e execução penal.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

VIANA, Eduarda Milhomem. Princípio da reserva do possível e o direito à saúde diante da pandemia do novo coronavírus. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 28, n. 7155, 2 fev. 2023. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/97643. Acesso em: 21 nov. 2024.

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