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Contrato de empreitada

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O contrato de locação de serviços é largamente utilizado na construção civil e execução de obras incorpóreas.

Resumo: Através do presente trabalho serão abordados os principais aspectos do contrato de empreitada, que está regulado pelo Código Civil entre os artigos 610 a 620. Conceituaremos o instituto nos socorrendo da melhor doutrina e ressaltaremos suas principais características. Abordaremos os princípios contratuais aplicados à empreitada, diferenciando-os da contratação entre particulares e entre o Poder Público. Discorreremos sobre as principais espécies da empreitada e suas peculiaridades. Pontuaremos os direitos e obrigações das partes contratantes. Traçaremos as diferenças entre as normas do Código Civil e do Código de Defesa do Consumidor e seu impacto Na responsabilidade civil do empreiteiro. Por último, trataremos das formas de extinção da empreitada.


Introdução

O contrato de empreitada ou locação de serviços é largamente utilizado na construção civil, tanto no âmbito público como no privado, razão pela qual tem grande relevância econômica e jurídica.

O contrato de empreitada pode se prestar também à execução de obras incorpóreas (imateriais), como por exemplo uma criação artística (composição de uma música).

O Código Civil trata do contrato de empreitada entre os artigos 610 a 626. Podemos dizer, portanto, que se trata de um contrato típico.


Conceito do Contrato de Empreitada

Maria Helena Diniz classifica o contrato de empreitada como uma espécie de locação de serviços.

Para a renomada doutrinadora, a empreitada ou locação de obra é o contrato pelo qual um dos contratantes (empreiteiro) se obriga·, sem subordinação, a realizar, pessoalmente ou por meio 'de terceiro, certa obra (p. ex., construção de uma casa, muro, represa ou ponte; composição de uma música) para o outro (dono da obra), com material próprio ou por este fornecido, mediante remuneração determinada ou proporcional ao trabalho executado.[1]

Para Caio Mário da Silva Pereira a empreitada é o contrato em que uma das partes (empreiteiro) se obriga, sem subordinação ou dependência, a realizar certo trabalho para outro (dono da obra), com material próprio ou por este fornecido, mediante remuneração global ou proporcional ao trabalho executado[2]

Podemos concluir, então, que a empreitada, também chamada de locação de serviços é o contrato pelo qual o locador (empreiteiro ou executor) se obriga a fazer pessoalmente ou através de terceiro (subempreiteiro), determinada obra a outrem (contratante; dono da obra ou comitente), mediante retribuição certa ou proporcional, sem que haja entre eles relação de subordinação.


Características do Contrato de Empreitada

A empreitada gera para o empreiteiro a obrigação de entregar a obra, obedecendo a determinados critérios preestabelecidos, por um preço certo ou proporcional. Portanto, a empreitada é uma obrigação de resultado.

Entende-se por obra o resultado a ser obtido através do trabalho do empreiteiro para a produção ou modificação de certas coisas materiais ou imateriais. O trabalho do empreiteiro figura tão somente como prestação mediata ou meio de consecução.[3]

O contrato de empreitada é sinalagmático ou bilateral, comutativo, oneroso, consensual, indivisível e de execução sucessiva ou continuada.

  • Sinalagmático ou bilateral Pois gera para as partes contratantes obrigações recíprocas. A obrigação do empreiteiro é de entregar a obra, conforme as especificações contratadas. Já o comitente ou contratante deve pagar o preço avençado;

  • Comutativo Pois as partes recebem, uma da outra, prestações equivalentes;

  • Oneroso Pois cada um dos contratantes transfere ao outro direitos ou vantagens, mediante uma contraprestação;

  • Consensual Pois aperfeiçoa-se com a congruência das vontades, isto é, pelo consentimento dos contratantes, sem que a lei exija forma solene para sua formalização;

  • Indivisível Uma vez que objetiva a conclusão da obra, que salvo disposição em contrário, não permitirá seu fracionamento;

  • Execução sucessiva ou continuada Pois a conclusão da obra demanda tempo para sua consecução, sendo realizada por uma série de atos concatenados.


Aplicações dos Princípios Gerais dos Contratos

Aplicam-se ao contrato de empreitada os princípios consagrados pela Teoria Geral dos Contratos, quais sejam:

  • Princípio da Autonomia da Vontade, pelo qual prevalece a liberdade de contratação, podendo as partes estipular como melhor lhes convier, os direitos e obrigações decorrentes da avença, nos limites da lei;
  • Princípio do Consensualismo, através do qual prevalece a convergência de vontades visando a consecução de um objetivo comum.  No Direito hodierno vigora o princípio do consentimento, pelo qual o acordo de vontades é suficiente à perfeição do contrato. Em princípio, não se exige forma especial[4];
  • Princípio da Obrigatoriedade da Convenção, nada mais é do que o dever das partes de cumprir o que foi ajustado (pacta sunt servanda). Os contratos existem para serem cumpridos, de forma que a avença faz lei entre as partes;
  • Princípio da Relatividade, através do qual, o contrato e seus efeitos não alcançam terceiros que deles não participaram, vinculando exclusivamente as partes. Ninguém pode se sujeitar a uma convenção da qual não participou;
  • Princípio da Boa-Fé Objetiva. Pelo princípio da boa-fé objetiva as partes têm o dever de se comportar com retidão em todas as fases do contrato, incluindo as tratativas prévias, a formação do contrato e seu cumprimento. A boa-fé objetiva impõe ao contratante um padrão de conduta de agir com correção, ou seja, com probidade, honestidade e lealdade, nos moldes do homem comuns atendidos as peculiaridades dos usos e costumes do lugar.[5]

Além dos princípios gerais acima declinados, na contratação com o Poder Público, aplicam-se também aqueles atinentes à administração pública.

Neste caso, a Lei 8.666/93 determina que os contratos entre particulares e a Administração Pública devem necessariamente serem precedidos de processo licitatório, no qual imperam os seguintes princípios:

  • Princípio da igualdade Assegura aos licitantes igualdade de direitos na participação do certame, a fim de impedir vantagens pessoais;
  • Princípio da legalidade Os licitantes ficam atrelados às normas da licitação, contidas no edital;
  • Princípio da impessoalidade Tem por escopo afastar o subjetivismo nos processos licitatórios, tratando de forma igualitária aqueles que participam da licitação, prevalecendo critérios objetivos e as qualificações dos licitantes, desprezando-se suas condições pessoais;
  • Princípio da Moralidade e Probidade Além de agir conforme a lei e as regras da licitação, os licitantes devem se pautar pela ética e pela moral, eximindo-se de oferecer vantagens indevidas visando a obtenção do contrato;Princípio da Publicidade Todas as informações envolvendo o processo licitatório devem ser públicas e ostensivas, de forma a propiciar aos licitantes todas as informações a cerca da licitação. Não se admite informações privilegiadas a qualquer licitante, a fim de favorecê-lo;
  • Princípio de Isonomia É o princípio pelo qual todos os licitantes devem ser tratados igualmente, sem privilégios;
  • Princípio da Vinculação ao Instrumento Convocatório A administração e os licitantes são obrigados a observar rigorosamente as normas previstas no edital de convocação, o qual deve ser claro e preciso, a fim de evitar dubiedades e interpretações subjetivas;
  • Princípio do Julgamento Objetivo Por este princípio, a forma de escolha das propostas apresentadas no processo de licitação deve se pautar por critérios objetivos, vinculadas às regras do edital, evitando-se subjetivismos na escolha do vencedor e levando-se em consideração a melhor proposta para a administração pública.

Espécies de Contrato de Empreitada e Suas Peculiaridades

A empreitada pode se circunscrever ao fornecimento da mão-de-obra, sendo, neste caso, denominada empreitada de lavor ou pode prever também o fornecimento, pelo empreiteiro, dos materiais, sendo denominada empreitada mista.

A escolha por um ou outro modelo tem reflexos na responsabilidade civil dos contratantes, como adiante explanaremos.

Na dicção do artigo 612 do Código Civil, sendo a empreitada de lavor (apenas com o fornecimento da mão-de-obra), todos os riscos da obra correm por conta do contratante (dono da obra), salvo se o empreiteiro tiver agido com culpa no perecimento da coisa. Neste sentido:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER CUMULADA COM PRECEITO COMINATÓRIO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS. CONTRATO DE EMPREITADA DE MÃO-DE-OBRA. RACHADURAS E FISSURAS. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA ORIGEM. PROBLEMAS DE INFILTRAÇÕES PRETÉRITOS. CULPA DO EMPREITEIRO NÃO DEMONSTRADA. RESPONSABILIDADE CIVIL AFASTADA. EXEGESE DO ART. 612 DO CÓDIGO CIVIL. SENTENÇA REFORMADA. RECURSO PROVIDO.Nos contratos de empreitada de mão-de-obra, em que o empreiteiro só contribui com a administração e execução dos trabalhos, ficando o fornecimento de materiais ao encargo do proprietário, a responsabilidade civil por eventuais riscos, desde que não comprovada a culpa do obreiro, corre por conta exclusiva do dono da obra. (TJSC Terceira Câmara de Direito Civil Apelação nº 2009.056792-3 Relator Des. Fernando Carioni Data do julgamento: 15/12/2009). - DESTAQUEI

Porém, se o empreiteiro também fornece o material, além da mão-de-obra, os riscos decorrentes obra, até a data de sua entrega, correm por sua exclusiva responsabilidade, conforme prevê o art. 611 do Código Civil.

Silvio Rodrigues resume didaticamente as aludidas hipóteses:

  1. se a empreitada for unicamente de lavor, o dono da obra sofre o prejuízo pelo seu perecimento e o empreiteiro perde a retribuição;
  2. se a empreitada for de lavor e materiais, os prejuízos são sofridos pelo empreiteiro, exceto em caso de mora do dono da obra, caso em que este responde pelo prejuízo (Código Civil, artigo 611).

AÇÃO MONITÓRIA Embargos rejeitados Devedor dono da obra que celebrou contrato quitado de empreitada global com empreiteira que adquiriu e não pagou pelos materiais instalados na obra Obrigação exclusiva da empreiteira, conforme art. 611 do Código Civil, porque do contrário, se estaria condenando o dono da obra ao pagamento em duplicidade .Sentença modificada Recurso provido. (TJSP 17ª Câmara de Direito Privado Apelação Cível nº 1056213-73.2018.8.26.0100 Relator Des. Paulo Pastore Filho Data do julgamento: 08/11/2019) - DESTAQUEI

É importante destacar que o fornecimento do material não se presume, devendo constar expressamente do contrato.

O contrato de empreitada propriamente dito (empreitada pura) difere-se do denominado contrato sob administração ou empreitada sob administração.

Hely Lopes Meirelles ensina que o contrato de administração é aquele "em que o construtor se encarrega da execução de um projeto, mediante remuneração fixa ou percentual sobre o custo da obra, correndo por conta do proprietário os encargos econômicos do empreendimento".

Na empreitada sob administração incumbe ao proprietário fornecer os materiais e realizar o pagamento pela mão-de-obra. A responsabilidade do empreiteiro cinge-se à direção e à fiscalização da obra. Eventuais acréscimos no orçamento inicial serão suportados pelo contratante. A remuneração do empreiteiro, nesta modalidade, geralmente é calculada e paga sobre um percentual sobre o custo global da obra.

O Código Civil não regulamenta o contrato de construção por administração, aplicando-se, subsidiariamente, as regras sobre a empreitada.

Na empreitada pura, por sua vez, o empreiteiro fornece a mão-de obra, os materiais, dirige e fiscaliza a obra, sendo responsabilizado até a sua entrega. Eventuais oscilações de valores, tais como acréscimos de preços e variações salariais serão suportados exclusivamente pelo empreiteiro, o qual não poderá pleitear nenhum reajuste, exceto se houver alterações no cronograma físico da obra, com o acréscimo de serviços originalmente não previstos.

No tocante ao preço, a empreitada pode ser ajustada a preço fixo ou global ou a preço vinculado a etapas da obra.

Na primeira (preço fixo) o valor da obra é ajustado antecipadamente pelas partes, inadmitindo-se reajustes. O preço engloba toda a obra, razão pela qual é se suma importância que as partes elaborem um memorial descritivo, especificando detalhadamente os serviços a serem realizados e a especificação e qualidade do material a ser utilizado, além de um cronograma de obras, com todas as suas etapas e respectivos prazos.[6]

Oportuno também diferenciar o contrato de elaboração de projeto, pelo qual o empreiteiro se obriga, apenas e tão somente, à execução de uma obra intelectual (elaboração do projeto), sem que haja a obrigação de execução ou fiscalização da obra.


Direitos e Obrigações Decorrentes da Lei no Contrato de Empreitada

Como já dissemos em linhas pretéritas, o empreiteiro de uma obra poderá fornecer apenas a mão-de-obra (empreitada de mão de obra ou de lavor) ou, além do trabalho poderá também fornecer os materiais (empreitada mista).[7]

Na empreitada de lavor assume o empreiteiro apenas obrigação de fazer, consistente em executar o serviço conforme as orientações técnicas da obra, cabendo ao proprietário o fornecimento dos materiais. Já na empreitada mista, o empreiteiro também é obrigado a fornecer os materiais, responsabilizando-se por eventuais vícios até a entrega da obra.

Infere-se, portanto, que a responsabilidade do empreiteiro é largamente ampliada na empreitada mista, enquanto na empreitada de lavor os riscos são carreados ao dono da obra, exceto se o prejuízo tiver sido causado pelo primeiro.

Se o contrato ajustou o fornecimento de material pelo empreiteiro, aplica-se o disposto no art. 611 do Código Civil, pelo qual este ficará responsável quanto aos riscos da obra até a sua entrega. A responsabilidade, neste caso, é assim fixada, pois cabe ao empreiteiro a escolha dos materiais. Da mesma forma, se houver um acidente que venha a destruir a obra antes de sua entrega, o empreiteiro suportará o prejuízo, porque ainda não cumpriu o dever de entregá-la pronta.[8]

Entretanto, na empreitada pura, se a coisa perece, antes da entrega e sem culpa do empreiteiro, quem sofre com a perda é o dono da obra, caso não haja culpa do empreiteiro. (art. 612 do CC).

Nesta modalidade, se a coisa perecer sem que haja culpa do empreiteiro e tampouco do dono da obra, repartem-se os prejuízos, exceto se ficar comprovado que a perda resultou de defeito dos materiais e que em tempo reclamara contra a sua quantidade ou qualidade" (art. 613 do CC.).

Desta forma, se o prejuízo foi decorrente da má qualidade do material fornecido pelo comitente, o empreiteiro terá direito à remuneração avençada, proporcional os serviços prestados.

Já, no contrato de empreitada mista, o empreiteiro assume os encargos técnicos da obra e os riscos econômicos, e ainda custeia a construção por preço fixado inicialmente (se ajustado o preço global), que não poderá ser reajustado ainda que o material encareça e haja majoração da folha salarial. A responsabilidade do contratado persiste "até o momento da entrega da obra", salvo se o dono "estiver em mora de receber" (CC artigo 611).

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O contrato de empreitada pode prever que a obra será realizada em fases distintas (empreitada ad mensuram) art. 614. Neste caso, o empreiteiro será remunerado a cada etapa da obra realizada, através das medições dos trabalhos realizados. Uma vez aferidos os serviços prestados, caberá ao empreiteiro o direito de receber por eles. Ou seja, os pagamentos são proporcionais aos serviços efetuados.

Ajustada a empreitada ad mensuram, é de fundamental importância estabelecer previamente um cronograma de obras, bem como a metodologia para aferição dos serviços prestados e sua aprovação.

Daí a importância das medições de constatação, pois "recebida a obra como boa e perfeita, nenhuma reclamação poderá ser posteriormente formulada por quem encomendou, a menos que se tratem de vícios ocultos ou redibitórios, que evidentemente não ficarão cobertos pelo simples ato de recebimento"'.

Decorridos 30 (trinta) dias contados da medição, sem que haja, por parte do contratante (comitente) denúncia sobre vícios ou defeitos, presumem-se verificados os serviços realizados, fazendo o empreiteiro jus ao pagamento daquela etapa.

Concluída a obra, é dever do comitente recebê-la, somente podendo rejeitá-la caso se comprove que o empreiteiro se desviou dos projetos ou das instruções e orientações técnicas para a consecução da obra (art. 615 do CC).

Portanto, finda a obra, se o empreiteiro a realizou de acordo com as orientações e os projetos que lhes foram entregues, e o resultado prometido foi alcançado, não pode o dono se negar a recebê-la e a pagar o preço ajustado.

A recusa sem justo motivo dá ensejo à constituição em mora, possibilitando ao accipiens a consignação judicial da coisa e a cobrança da contraprestação ajustada.

A recusa será lídima, entretanto, nas seguintes hipóteses elencadas por Washington de Barros Monteiro:

  1. se o empreiteiro se afastou do plano ou das instruções ministradas;
  2. se, na falta de plano ou de Instruções específicas, arredou-se das regras da arte ou do costume do lugar, apresentando obra defeituosa e impeditiva de uso regular;
  3. se empregou materiais de segunda ou de má qualidade;
  4. se não entregou a obra no tempo contratado.

O empreiteiro não poderá alegar que seu objetivo foi obter coisa melhor, pois o credor de coisa certa não pode ser obrigado a receber outra, ainda que mais valiosa (Código Civil, artigo 313).

O comitente ao invés de rejeitar o recebimento da obra poderá pleitear do empreiteiro o abatimento do preço, caso se constatem vícios ou irregularidades na execução da obra, conforme permite do artigo 616 do Código Civil.

Caso se estipule que os materiais da obra serão fornecidos pelo comitente, o empreiteiro será obrigado a reparar os danos que der causa, em razão da sua imperícia ou negligência no seu manuseio ou utilização.

O artigo 618 estipula o prazo de 5 (cinco) anos, pelo qual o empreiteiro responderá pela solidez e segurança do trabalho realizado nas obras de grande porte, estendendo-se tal responsabilidade aos materiais utilizados e ao solo.

Trata-se de prazo de garantia, solidez e segurança da obra executada e entregue, que não pode ser convencionado menor, embora admissível maior.

Portanto, não caracterizada a culpa do comitente, por eventuais vícios pós-obra, a responsabilidade civil recai sobre o empreiteiro:

APELAÇÃO CÍVEL. VÍCIO CONSTRUTIVO. PEDIDO CONDENATÓRIO. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. FALHAS NA CONSTRUÇÃO DO IMÓVEL.LAUDO PERICIAL. RESPONSABILIDADE DA CONSTRUTORA. ARTIGO 618 DO CC. AUSÊNCIA DE PROVA DE CULPA EXCLUSIVA DO CONSUMIDOR OU DE TERCEIRO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS. GASTOS PARA REPARO DO IMÓVEL. COBRANÇA DE TÍTULO EXECUTIVO NÃO DATADO. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE OUTRAS PROVAS. SENTENÇA MANTIDA. ART. 252 DO RITJSP. RECURSO NÃO PROVIDO.

1. A perícia realizada em autos de "produção antecipada de provas" é suficiente para o correto equacionamento da demanda, de tal modo que a dispensa de dilação probatória não configura cerceamento de defesa.

2. Não demonstrada a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro, a responsabilidade civil contratual é da construtora por defeitos construtivos de obra (art. 618 do CC).

3. A construtora é parte legítima para responder aos termos da demanda em que se sustenta a existência de vício construtivo em empreendimento imobiliário.

4. Danos materiais consistentes em gastos para realizar reparos em imóvel por conta de trincas, fissuras e afundamento de piso. Higidez do laudo pericial.

5. Pedido reconvencional com base em cheque não datado. Indicação de vencimento do título não comprovada por outros elementos. Improcedência mantida. (TJSP 3ª Câmara de Direito Privado - Apelação Cível nº 1001847-45.2019.8.26.0037 Relatora Des. Maria do Carmo Honório Data do julgamento 21/01/2021)

Dispõe o parágrafo único do artigo 618 que decairá do direito assegurado neste artigo o dono da obra que não propuser a ação contra o empreiteiro, nos cento e oitenta dias seguintes ao aparecimento do vício ou defeito.

Trata-se de prazo decadencial e presta-se ao manejo das ações edilícias, redibitória e estimatória, desde que do defeito tome conhecimento o dono da obra no prazo de cinco anos.

Para a reparação de danos causados ao proprietário, por defeitos de solidez e segurança da obra, o prazo é de dez anos, com base no artigo 205 do Código Civil, e tem natureza prescricional, tendo como termo inicial a data da ofensa, ou a do escoamento do prazo de garantia, no mínimo de cinco anos.

A empreitada pode ser contratada a preço fixo ou a preço relativo. No primeiro caso o empreiteiro não terá direito a exigir acréscimo no preço, a não ser se houver modificações no projeto inicial, solicitadas expressamente pelo dono da obra (art. 619 do CC). Neste sentido:

CONTRATO DE EMPREITADA GLOBAL POR PREÇO FIXO. MANTIDA A SENTENÇA. Pedido de revisão do contrato improcedente. Pedido de cobrança parcialmente procedente. Pedidos indenizatórios indeferidos. RECURSO DESPROVIDO. UNÂNIME. (TJRS 17ª Câmara Cível Apelação Cível nº 70056266505 - CNJ: 0351277-21.2013.8.21.7000 Relatora Des. Elaine Harzheim Macedo data do julgamento: 31/10/2013) GRIFEI E DESTAQUEI

Na empreitada a preço relativo é possível convencionar que o valor poderá ser reajustado em caso de oscilações nos valores de insumo, por exemplo.

Maria Helena Diniz entende que é possível evocar-se a rebus sic stantibus no contrato de empreitada, lecionando que:

Em boa política legislativa, a Lei n. 8.078/90 (arts. 6", V, e 51,§§ 1" e 2") permite revisão contratual por onerosidade excessiva, e o Código Civil, no art. 317, prescreve que, "quando, por motivos imprevisíveis sobrevier desproporção manifesta entre o valor da prestação devida e o do momento de sua execução, poderá o juiz corrigi-lo, a pedido da parte, de modo que assegure, quanto possível, o valor real da prestação". E, além disso, diante do disposto no art. 478 do Código Civil, admissível será a resolução desse contrato por onerosidade excessiva, com extrema vantagem para um dos contratantes, em virtude de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, que aumentem o custo do material e dos encargos da obra. Logo, a lei admite a revisão ou a resolução contratual para evitar locupletamento com a jactura alheia.[9]

O Código Civil, em seu art. 620, previu a hipótese de diminuição no preço do material ou da mão-de-obra. Embora de remota aplicação prática, prevê a lei que ocorrendo diminuição no preço do material ou da mão-de-obra superior a um décimo do valor global ajustado, o dono da obra poderá pedir sua revisão, visando o reequilíbrio contratual.

O proprietário da obra não pode efetuar alterações nos projetos sem a anuência dos projetistas (autores dos projetos), mesmo que a execução da obra esteja a cargo de terceiros, exceto se ficar comprovado a inconveniência ou a excessiva onerosidade da execução do projeto como originalmente elaborado (art. 621 do CC).

Como exemplo, podemos mencionar a construção de uma edificação em um solo arenoso, que corra o risco de desabar ou a utilização de determinada técnica construtiva que inviabilize economicamente o empreendimento.

Pretendeu a lei amparar os projetistas, que têm capacitação e autoridade técnica na elaboração dos projetos, evitando intromissões indesejadas que podem colocar em risco a segurança da obra.

A responsabilidade dos projetistas se circunscreve aos danos decorrentes de falhas nos projetos, se estes não forem os responsáveis pela execução da empreitada. Entretanto, se o projetista assumir a execução ou fiscalização da obra assumirá a responsabilidade por quaisquer vícios (art. 622 do CC).

Havendo a configuração de responsabilidade solidária entre o executor, o projetista e o dono da obra, todos responderão pelos danos causados:

AÇÃO DE INDENIZAÇÃO -RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DONO DA OBRA E CONSTRUTOR/ENGENHEIRO - ASSUNÇÃO DE RESPONSABILIDADE TÉCNICA FORMAL PELA OBRA E RESPECTIVOS PROJETOS E EXECUÇÃO - DESABAMENTO PARCIAL DO PRÉDIO - CULPA - DANO MATERIAL E DANO MORAL - INDENIZAÇÃO. QUANTUM. Sem prejuízo da responsabilidade assumida pelo construtor ou engenheiro que assumiu a responsabilidade técnica pelo empreendimento, deve ser responsabilizado também o dono da obra que, embora leigo, assume a construção de prédio por sua conta e risco, executando obra sem o devido acompanhamento técnico, resultando em risco à sua segurança a toda incolumidade pública. É de se reconhecer a responsabilidade do engenheiro, solidariamente ao dono da obra, pelos danos, especialmente se este, sem qualquer investigação prévia das condições técnicas e estruturais do empreendimento, assumiu formalmente toda a responsabilidade técnica perante os órgãos competentes, comprovando-se, através de laudo pericial, a existência de defeito que culminou no desabamento parcial do prédio decorrente de problemas de construção, atingindo ainda imóveis vizinhos, cuja reparação ocorreu às expensas do dono do prédio. Na fixação da reparação por dano moral, incumbe ao julgador, ponderando as condições do ofensor, do ofendido, do bem jurídico lesado e aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade, arbitrar o valor da indenização que se preste à suficiente recomposição dos prejuízos, sem importar enriquecimento sem causa da parte. (TJMG 14ª Câmara Cível Relator Des. Valdez Leite Machado Apelação Cível  0433948-97.2005.8.13.0471 Data do julgamento 09/02/2012) GRIFEI E DESTAQUEI

Consoante o artigo 623 do Código Civil, o proprietário da obra poderá suspendê-la, ou mesmo rescindir unilateralmente o contrato, mesmo após o seu início, desde que pague ao empreiteiro pelos serviços já prestados, além de uma indenização que deverá ser calculada em função daquilo que o empreiteiro teria direito a receber, se houvesse a conclusão da obra.

CIVIL E PROCESSO CIVIL - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR RESIÇÃO UNILATERAL DO CONTRATO DE EMPREITADA - INDENIZAÇÃO DO EMPREITEIRO - POSSIBILIDADE - ART. 623 DO CÓDIGO CIVIL - VALOR DA INDENIZAÇÃO - CRITÉRIO - EQUIDADE DO JUÍZ. Pelo contrato de empreitada o empreiteiro contratado se obriga, sem relação de subordinação ou dependência, à execução de uma obra em favor do contratante - dono da obra. Mesmo após iniciada a construção, a resilição unilateral do contrato de empreitada pelo dono da obra, mediante denúncia, é plenamente possível, posto que prevista no art. 623 do Código Civil, e, principalmente, quando expressamente convencionada entre as partes contratantes, como no caso dos autos, cabendo ao empreiteiro direito ao recebimento das despesas e lucros relativos aos serviços já feitos, mais indenização razoável, calculada em função do que ele teria ganho, se concluída a obra, nos termos do artigo 623 do Código Civil: "Art. 623. Mesmo após iniciada a construção, pode o dono da obra suspendê-la, desde que pague ao empreiteiro as despesas e lucros relativos aos serviços já feitos, mais indenização razoável, calculada em função do que ele teria ganho, se concluída a obra". Quanto ao pagamento das despesas e lucros relativos aos serviços já feitos pela empreiteira, mais indenização razoável, calculada em função do que ela teria ganho, se concluída a obra, na forma do art. 623 do Código Civil, tenho que este segundo valor deve ser fixado pelo juiz por equidade, tendo em vista a falta de critério legal objetivo para a quantificação.  (TJMG -  Apelação Cível  1.0702.15.080926-8/001, Relator(a): Des.(a) Otávio Portes , 16ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 19/02/2020, publicação da súmula em 06/03/2020) GRIFEI E DESTAQUEI

Na hipótese de suspensão da obra sem justa causa, pelo empreiteiro, este responderá por perdas e anos, como determina o art. 624 do Código Civil.

Porém, conforme permite o art. 625, poderá o empreiteiro suspender a obra por culpa do comitente ou por motivo de força maior, ou quando no decorrer da empreitada forem constatadas dificuldades inicialmente não previstas que tornem a execução da obra excessivamente onerosa e o proprietário se opuser ao reajuste do preço em face dos serviços adicionais necessários ao enfrentamento dos fatos supervenientes.

A descoberta de um sítio arqueológico no terreno da edificação, por exemplo, pode ser considerada como força maior.

Como exemplo de fatos imprevisíveis, podemos citar a existência de lençol freático ou de rochas no subsolo, tornando a obra demasiadamente onerosa, desde que o estudo de solo e sondagem preliminares não tenham feito tais constatações.

O proprietário também não poderá exigir a realização de modificações na obra, que sejam desproporcionais ao projeto aprovado, dando ensejo ao empreiteiro que denuncie o contrato.

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Sobre o autor
Rodrigo Otávio Coelho de Souza

Advogado - Especialista em Direito Imobiliário e Contratual Pós Graduado em Processo Civil pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas - PUCC Pós Graduado em Gestão Empresarial pela Fundação Getúlio Vargas - FGV

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SOUZA, Rodrigo Otávio Coelho. Contrato de empreitada. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 27, n. 6894, 17 mai. 2022. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/97825. Acesso em: 22 nov. 2024.

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