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Alterações da Lei nº 6.766/79 pela Lei nº 14.382/22

Resumo:


  • A Lei nº 14.382/22 trouxe alterações à Lei nº 6.766/79, reduzindo prazos de certidões exigidas para loteadores e atualizando terminologias.

  • Novas disposições permitem substituição de certidões por informações eletrônicas, simplificando processos para companhias abertas e agilizando a tramitação de registros.

  • Alterações visam a proteção dos adquirentes e a adaptação às novas realidades jurídicas e tecnológicas, mantendo a idoneidade e a transparência nos negócios imobiliários.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

A inexistência de ônus e gravames sobre o imóvel ou, ainda, sobre a figura do loteador, é de fundamental importância para proteção dos adquirentes, como demonstra a jurisprudência administrativa.

O presente artigo analisa as principais alterações da Lei nº 6.766/79 com a edição da Lei nº 14.382, de 27 de junho de 2022, decorrente da Conversão da Medida Provisória nº 1.085, de 27 de dezembro de 2022.

As alterações promovidas na Lei nº 4.591/64, Lei de Incorporações Imobiliárias e Condomínio, já foram objeto de análise anterior.

Remete-se o leitor para o referido artigo, em especial diante do § 13 do art. 32 e do art. 68 desta última lei, que fazem remissão aos artigos 2º-A e §§ 4º ao 6º do art. 26 da Lei nº 6.766/79.

QUADRO COMPARATIVO

Redação após a Lei Federal nº 14.382, de 27 de junho de 2022 (conversão em lei da MP nº 1.085/21)

Redação anterior

Alteração da Lei nº 6.766, de 19 de dezembro de 1979

Art. 12. A Lei nº 6.766, de 1979, passa a vigorar com as seguintes alterações:

Art.18. (...)

Sem alteração

IV (...)

Sem alteração

a) dos cartórios de protestos de títulos, em nome do loteador, pelo período de cinco anos;

a) dos cartórios de protestos de títulos, em nome do loteador, pelo período de 10 (dez) anos;

b) de ações cíveis relativas ao loteador, pelo período de dez anos;

b) de ações pessoais relativas ao loteador, pelo período de 10 (dez) anos;

c) da situação jurídica atualizada do imóvel; e

c) de ônus reais relativos ao imóvel;

d) de ações penais contra o loteador, pelo período de dez anos;

d) de ações penais contra o loteador, pelo período de 10 (dez) anos.

A proposta de alteração da Medida Provisória nº 1.085/21 não sofreu alterações no Congresso Nacional.

A inexistência de ônus e gravames sobre o imóvel ou, ainda, sobre a figura do loteador, é de fundamental importância para proteção dos adquirentes, como demonstram decisões da jurisprudência administrativa:

LOTEAMENTO REGISTRO ESPECIAL CERTIDÕES FISCAIS POSITIVAS. PENHORA. TEMPUS REGIT ACTUM. O imóvel acha-se penhorado; existem débitos fiscais municipais e existem protestos tirados contra o proprietário. Não se acham, portanto, atendidos os requisitos do art. 18, da Lei nº 6766/79. Registro não determinado. (CSMSP, Apelação Cível nº 5.969-0, Rel. Des. Sylvio do Amaral, j. 25/07/1986, DJ 08/10/1986).

Registro de imóveis Loteamento urbano Negativa de registro Artigo 18, III, a e c, e §§ 1º e 2º, da lei n° 6.766/1979 Existência de ação penal em curso contra um dos sócios da loteadora que, por si só, obsta o registro Presunção constitucional de não culpabilidade que é insuficiente para afastar o óbice Desqualificação mantida Dúvida procedente Recurso não provido (CSMSP, Apelação Cível nº 3000556-37.2013.8.26.0408, Rel. Des. Hamilton Elliot Akel, j. 28/04/2015)

Na alínea a a certidão dos Tabelionatos de Protesto de Títulos e outros documentos de dívida passa a ser de 5 anos, em vez de 10 anos. Destaque-se que 5 anos é o período usualmente pesquisado para fins de protesto, sendo que a certidão de prazo maior ou de protesto específico demanda rogação específica. O motivo da alteração provavelmente está relacionado com a diminuição dos prazos de prescrição e de usucapião promovidas pelo Código Civil, Lei nº 10.406/02, adaptando a Lei nº 6.766/79 a essa nova realidade.

Na alínea b manteve a redação do dispositivo anterior quanto às ações cíveis pessoais relativas à figura do incorporador.

Na alínea c houve atualização da nomenclatura, de ônus reais para situação jurídica do imóvel. A referida alteração de nomenclatura deu-se também no § 9º do art. 19, da Lei nº 6.015/73:

Art. 19, § 9º A certidão da situação jurídica atualizada do imóvel compreende as informações vigentes de sua descrição, número de contribuinte, proprietário, direitos, ônus e restrições, judiciais e administrativas, incidentes sobre o imóvel e o respectivo titular, além das demais informações necessárias à comprovação da propriedade e à transmissão e à constituição de outros direitos reais. (Incluído pela Lei nº 14.382, de 2022)

O prazo para emissão da certidão de inteiro teor da matrícula é atualmente de 4 horas e da certidão de situação jurídica atualizada, de 1 dia, com possibilidade de a Corregedoria Geral da Justiça autorizar, em casos excepcionais, prazos maiores, nos termos do §§ 10, 11 e 12 do art. 19, da Lei nº 6.015/73.

Na alínea d foi mantido o prazo de 10 anos para a certidão de ações penais em face do loteador.

No âmbito das normativas estaduais, a referida certidão, no caso de pessoas jurídicas, refere-se à figura aos representantes legais, com requisitos adicionais quanto ao tempo e local de sua extração, como demonstram os seguintes itens do Capítulo XX do Tomo II das NSCGJSP:

176. As certidões de ações pessoais e penais, inclusive da Justiça Federal, e as de protestos devem referir-se ao loteador e a todos aqueles que, no período de 10 (dez) anos, tenham sido titulares de direitos reais sobre o imóvel; serão extraídas, outrossim, na comarca da situação do imóvel e, se distintas, naquelas onde domiciliados o loteador e os antecessores abrangidos pelo decênio, exigindo-se que as certidões tenham sido expedidas há menos de 6 (seis) meses.

176.1. Tratando-se de pessoa jurídica, as certidões poderão ser extraídas apenas na Comarca da sede dela, com prazo inferior a seis meses. As certidões dos distribuidores criminais deverão referir-se aos representantes legais da loteadora.

176.2. Tratando-se de pessoa jurídica constituída por outras pessoas jurídicas, as certidões criminais deverão referir-se aos representantes legais destas últimas, não se exigindo outras certidões das sócias ou de seus representantes legais.

Note-se que no âmbito do Estado de São Paulo, a jurisprudência administrativa já havia se pacificado no sentido de que, no caso de pessoa jurídica, as certidões negativas criminais devem referir-se à figura dos representantes legais da empreendedora, nos termos da Apelação Cível n° 38.678-0/6, Rel. Des. Márcio Martins Bonilha, de 31/07/1997:

Evidentemente que, quando o loteamento for de responsabilidade de pessoa jurídica, as certidões negativas criminais, a que alude o artigo 18, III, c, da lei que regula o parcelamento do solo urbano, devem referir-se aos representantes legais da empreendedora. São eles que deverão comprovar idoneidade para o desempenho dessa atividade, que envolve relevantes interesses jurídicos, concernentes ao direito urbanístico e à venda de terreno por oferta pública.

Outrossim, destaque-se que a referida exigência não ofende o princípio constitucional da presunção de inocência, previsto no art. 5º, LVII, da CF/88, uma vez que se trata de medida acautelatória do interesse dos adquirentes, como se vê do seguinte trecho da Apelação Cível nº 3000556-37.2013.8.26.0408, Rel. Des. Hamilton Elliot Akel, j. 28/04/2015:

Importante seja considerada a ratio legis, que, no caso, não leva em conta a culpa desses acusados, mas apenas procura cercar de cuidados o registro do loteamento urbano, com o claro escopo de assegurar o sucesso do empreendimento e de proteger os adquirentes das unidades imobiliárias.

§ 6º Na hipótese de o loteador ser companhia aberta, as certidões referidas na alínea c do inciso III e nas alíneas a, b e d do inciso IV do caput poderão ser substituídas por exibição das informações trimestrais e demonstrações financeiras anuais constantes do sítio eletrônico da Comissão de Valores Mobiliários.

Sem correspondente

Trata-se de dispositivo sem paralelo na legislação anterior e que não foi objeto de alteração durante a tramitação no Congresso Nacional da Medida Provisória nº 1.085/21.

O dispositivo se refere a sociedade anônimas com valores mobiliários de sua emissão admitidos à negociação no mercado de valores mobiliários, nos termos do art. 4º, da Lei nº 6.404/76.

A certidão referida na alínea c do inciso III é a de de ações penais com respeito ao crime contra o patrimônio e contra a Administração Pública. As demais já estão reproduzidas acima.

Por se tratar de companhia sujeita à fiscalização da Comissão de Valor Mobiliários e sujeita, nos termos da Lei nº 6.404/76, a publicação periódica de demonstrações financeiras e divulgação de fatos relevantes, entendeu-se que esses dados são suficientes para a demonstração da idoneidade enquanto loteador.

Destaque-se que não é incomum a existência de ações cíveis e protestos em face de grandes corporações, como ocorre com as companhias abertas, pelo que a apresentação dos referidos documentos era, em muitos casos, volumosa, mas de pouca utilidade.

Ademais, destaque-se que sociedades anônimas, em especial nas abertas, os papéis do Conselho de Administração, da Diretoria e do Conselho Fiscal estão bem delineados, não havendo pessoalidade, em regra, na gestão da companhia.

Dessa forma, as certidões de ações penais tinham pouca relevância prática, conforme visto, se tiradas em nome dos representantes legais, uma vez que são, via de regra, administradores profissionais, desvinculados do quadro societário da companhia. De qualquer forma, a divulgação de fato relevante está sujeita às regras da Comissão de Valores Mobiliários, inclusive para proteção dos investidores e assegurar a simetria de informações ao mercado.

§ 7º Quando demonstrar de modo suficiente o estado do processo e a repercussão econômica do litígio, a certidão esclarecedora de ação cível ou penal poderá ser substituída por impressão do andamento do processo digital.

Sem correspondente

A redação do dispositivo na Medida Provisória n 1.085/21 não foi objeto de alteração pelo Congresso Nacional.

A certidão de ações cíveis ou penais poderá ser substituída pela impressão do andamento do processo que tramita em formato eletrônico. Nesse caso, a tramitação deverá demonstrar, de forma suficiente, o estado e a repercussão econômica

Trata-se de dispositivo também previsto na Lei nº 4.591/64, Lei de Incorporações Imobiliárias e Condomínio:

Art. 32, § 14. Quando demonstrar de modo suficiente o estado do processo e a repercussão econômica do litígio, a certidão esclarecedora de ação cível ou penal poderá ser substituída por impressão do andamento do processo digital.

Não obstante, destaque-se que a previsão era tradicional nas normativas estaduais, como demonstra os itens 177 e 178 do Capítulo XX do Tomo II das NSCGJSP:

177. Sempre que das certidões pessoais e reais constar a distribuição de ações cíveis, deve ser exigida certidão complementar, esclarecedora de seu desfecho ou estado atual, salvo quando se tratar de ação que, pela sua própria natureza, desde logo aferida da certidão do distribuidor, não tem qualquer repercussão econômica, ou, de outra parte, relação com o imóvel objeto do loteamento.

178. A certidão esclarecedora poderá ser substituída por cópias autenticadas das partes mais importantes do processo ou por print do andamento da ação, quando o tribunal correspondente fornecer esta informação por meio eletrônico, devendo sua autenticidade ser confirmada pelo oficial ou seu proposto autorizado.

Trata-se de medida para simplificar a obtenção de informações de processos judiciais, considerando a tramitação eletrônica em diversos tribunais.

Art. 19. O oficial do registro de imóveis, examinada a documentação e encontrada em ordem, deverá encaminhar comunicação à Prefeitura e fará publicar, em resumo e com pequeno desenho de localização da área, edital do pedido de registro em três dias consecutivos, podendo este ser impugnado no prazo de quinze dias corridos, contado da data da última publicação.

Art. 19. Examinada a documentação e encontrada em ordem, o Oficial do Registro de Imóveis encaminhará comunicação à Prefeitura e fará publicar, em resumo e com pequeno desenho de localização da área, edital do pedido de registro em 3 (três) dias consecutivos, podendo este ser impugnado no prazo de 15 (quinze) dias contados da data da última publicação.

O dispositivo não sofreu alteração na redação original da Medida Provisória nº 1.085/21.

Além do aprimoramento da redação anterior, foi inserido que a contagem do prazo para impugnação o pedido de registro será de 15 dias corridos, e não dias úteis.

Trata-se de exceção expressa à contagem do prazo em dias úteis trazida pelo art. 9º, § 3º, da Lei nº 6.015/73, com redação dada pela Lei nº 14.382/22, em referência aos critérios previstos no art. 219, do CPC/15:

Art. 9º, § 3º A contagem dos prazos nos registros públicos observará os critérios estabelecidos na legislação processual civil. (Incluído pela Lei nº 14.382, de 2022)

Art. 219. Na contagem de prazo em dias, estabelecido por lei ou pelo juiz, computar-se-ão somente os dias úteis. Parágrafo único. O disposto neste artigo aplica-se somente aos prazos processuais.

Essa forma de contagem de prazo visa conferir celeridade ao andamento do registro do loteamento.


Bibliografia:

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Sobre o autor
Carlos Eduardo Almeida Martins de Andrade

Mestre em Direito pela Universidade de Sevilha.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ANDRADE, Carlos Eduardo Almeida Martins. Alterações da Lei nº 6.766/79 pela Lei nº 14.382/22. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 27, n. 6969, 31 jul. 2022. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/99218. Acesso em: 25 dez. 2024.

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