Este texto foi publicado no Jus no endereço https://jus.com.br/artigos/12190
Para ver outras publicações como esta, acesse https://jus.com.br

Processo legal devido no âmbito disciplinar.

(Des)necessidade de defesa técnica?

Processo legal devido no âmbito disciplinar. (Des)necessidade de defesa técnica?

Publicado em . Elaborado em .

Esta análise não pode prescindir da discussão das Súmulas 343 do STJ e a Vinculante nº 5 do STF, divergentes no que toca à obrigatoriedade de intervenção do advogado na defesa do servidor.

Sumário:Introdução. 1. Regime jurídico administrativo: os princípios da Administração. 1.1 Princípios constitucionais expressos. 1.2. Princípios reconhecidos. 2. Do processo administrativo. 2.1. Noções gerais. 2.2. Questão terminológica: processo ou procedimento?. 3. Processo Administrativo Disciplinar. 4. Das Garantias Fundamentais no Processo Administrativo. 5.1. Noções gerais. 5.2. Do Devido Processo Legal. 5. Intervenção Obrigatória do Advogado. 6. Tratamento Jurisprudencial do Tema. 6.1. O Caráter Obrigatório da Súmula. 7. Considerações Finais. 8. Referências Bibliográficas.


RESUMO

Constitui freqüente preocupação a abordagem das garantias fundamentais dos indivíduos, mormente quando se trata da relação travada com o Poder Público. Neste caso, a regência por normas de Direito Público faz surgir privilégios para o Estado em detrimento do indivíduo, como se verifica, v.g., com a supremacia do interesse público sobre o privado. O caráter cogente do regime jurídico de Direito Público, entretanto, não tem o condão de afastar, plenamente, os direitos e garantias individuais asseguradas pelo Estado Democrático de Direito. Neste contexto, o presente estudo tem por objeto breve análise acerca do processo administrativo disciplinar no âmbito da Administração Pública Brasileira e das garantias deferidas ao servidor processado, principalmente o devido processo legal, e seus consectários lógicos do contraditório e da ampla defesa. Esta análise, por óbvio, não pode prescindir da discussão em derredor das súmulas 343 do Superior Tribunal de Justiça e a vinculante nº 05 do Supremo Tribunal Federal, divergentes entre si no que toca à obrigatoriedade de intervenção do advogado na defesa do servidor processado.

PALAVRAS CHAVE: Processo Administrativo Disciplinar. Garantias Fundamentais. Devido Processo Legal. Participação obrigatória de advogado.


RESUMEN

Constituye frecuente preocupación el abordaje de las garantias fundamentales de los individuos, sobre todo cuando se trata de la relación com El Poder Publico. Em este caso, regirse por normas de Derecho Publico hace surgir privilégios para El Estado em perjuicio del individuo, como se verifica, v.g. con la supremacia del interes publico sobre el privado. El carácter impositivo del régimen jurídico de Derecho Publico, sin embargo no tiene el poder de alejar, plenamente, los derechos y garantias individuales aseguradas por el Estado Democrático de Derecho. En este contexto, el presente estúdio tiene por objetivo um breve análisis respecto al proceso administrativo disciplinário em el âmbito de la Administración Publica Brasilera y de lãs garantias ofrecidas al servidor procesado, principalmente el debido proceso legal, y sus consecuentes lógicos de lo contradictório y de la amplia defensa. Este análisis, obviamente, no puede prescindir de la discusión en torno de las sumulas 343 del Superior Tribunal de Justicia y la vinculante No. 05 del Supremo Tribunal Federal, divergentes entre si respecto a la obligatoriedad de la intervención del abogado em defensa del servidor procesado.

PALAVRAS CHAVE: Procedimiento Administrativo Disciplinario. Garantias Fundamentales. Debido Proceso Legal. Obligatoriedad de la intervención del abogado.


INTRODUÇÃO

Desde que se consolidaram as bases do Estado Democrático de Direito, vêm-se buscando garantir, cada vez mais, e a um maior número de indivíduos, o pleno exercício dos direitos fundamentais [01].

Nesse sentido, afigura-se de grande relevância, a abordagem do processo administrativo, pois se torna inadmissível o exercício da função administrativa sob resquícios de governos ditatoriais e a depender, exclusivamente, do arbítrio do administrador público.

No sistema administrativo brasileiro ainda se notam reminiscências de arbitrariedades, maculando direitos fundamentais e ensejando a busca pelas contendas judiciais, de modo a se permitir o exercício de tais direitos.

A este respeito, é de se reconhecer que a Constituição Federal de 1988, amparada nas bases do Estado Democrático de Direito, trouxe em seu texto a garantia do regular processo, tanto na esfera judicial, como administrativa [02].

Percebe-se, daí, o atual paradigma do processo administrativo, tendente à publicização da função administrativa, mas traduzida como uma garantia constitucional dos administrados perante outrem e, notadamente, em face da Administração Pública. [03]

À guisa de esclarecimento, cumpre registrar a existência de dissenso no que tange à terminologia "processo administrativo". Para uns, cuida-se de procedimento administrativo, relegando-se a expressão "processo" apenas para as lides judiciais. Para outros, cujo entendimento se encontra perfilhado no curso deste trabalho, "processo" é expressão utilizada na totalidade das atividades estatais, como mecanismo de legítimo exercício do poder. [04]

Na sistemática doutrinária atual, sobrevive, em caráter minoritário, a expressão procedimento administrativo [05], em detrimento da terminologia "processo", malgrado ainda se observem reminiscências daquel’outra, v.g. da lei paulista, que opta por utilizar "procedimento administrativo". [06]

Ressalte-se, contudo, que tal incidência permeia a disciplina geral do processo administrativo, impondo-se, por conseguinte, a menção àqueles de aplicação específica na órbita disciplinar [07]. A este respeito, tanto mais se faz imperiosa a observância à "razoável duração do processo", inserta pela EC 45/04, entre as garantias processuais fundamentais, não obstante se lhe deva fazê-lo em consonância com os princípios basilares do Direito Administrativo, notadamente a legalidade e a supremacia do interesse público sobre o privado.

Assim, embora exista regramento normativo genérico acerca do processo administrativo (lei 9784/99), o objeto desta análise estará restrito à seara administrativo-disciplinar, sob amparo da Lei Federal 8112/90, e das legislações estaduais atinentes aos servidores públicos.

Carvalho Filho, após discorrer sobre os princípios da proporcionalidade e da motivação como base do sistema punitivo da Administração Pública, acrescenta-lhes "o princípio do contraditório e da ampla defesa, fundado no art. 5º, LV da CF, que, além de não poder ser postergado, deve incidir toda vez que a Administração aplica sanção a seus servidores" [08]

Cumpre registrar a decisão do TJ-SP:

A aplicação de penas de repreensão a servidores, sem que lhe seja dada oportunidade de defesa, é inadmissível em face do direito constitucional assegurado a todos, previsto no art. 5º, LV da CF (AP. Civ. Nº 008.025/0, 4ª Cam. de Direito Público, Rel. Dês. Aldemar Silva, j. em 11/12/1997).

Como forma de se assegurar a efetividade das garantias do contraditório e da ampla defesa, vinha-se compreendendo a necessidade de patrocínio dos processos administrativos disciplinares por profissional habilitado, entendimento este que chegou a ser sumulado pelo Superior Tribunal de Justiça:

Súmula 343 STJ: é obrigatória a presença de advogado em todas as fases do processo administrativo disciplinar.

Contudo, pouco tempo após a edição da supramencionada súmula, o Supremo Tribunal Federal, órgão de cúpula do Poder Judiciário, utilizou-se do instrumento de uniformização introduzido pela EC 45/2004 – súmula vinculante 05 para estabelecer, em caráter vinculante, que a "falta de defesa técnica por advogado no processo administrativo não ofende a Constituição".

Desse modo, é de se compreender a validade dos processos disciplinares sem a participação dos advogados, relegando a defesa, nestes casos, ao "patrocínio" por servidores defensores dativos, ou ao próprio servidor, quando não lhe acudam recursos necessários à contratação do profissional.

Assim, estará o Poder Judiciário afastado do controle dos atos decisórios, ou ainda se poderão argüir princípios constitucionais ou o livre convencimento do juiz, para se garantir a ampla e devida defesa?


1.REGIME JURÍDICO ADMINISTRATIVO

Amparada pelas bases principiológicas do Estado de Direito, a discussão em derredor da criação do Direito Administrativo permeia a modificação da própria ideologia vigente à época. Ao permitir-se a limitação dos poderes do soberano [09], percebe-se a transmutação do sentido do "governo do Rei" em detrimento do "governo da Lei".

Desse modo, é de se reconhecer que o princípio existencial do Direito Administrativo é, especificamente, a garantia dos direitos dos administrados, outrora cognominados súditos, frente aos demais e também perante a própria Administração Pública.

Acerca da formação do Direito Administrativo, leciona Osvaldo Aranha Bandeira de Mello:

Constitui disciplina própria do Estado Moderno, ou, melhor, do chamado Estado de Direito, porque só então se cogitou de normas delimitadoras da organização do Estado-Poder e da sua ação, estabelecendo balizas às prerrogativas dos governantes, nas suas relações recíprocas e, outrossim, nas relações com os governados. Na verdade, o Direito Administrativo só se plasmou como disciplina autônoma quando se prescreveu processo jurídico para atuação do Estado-poder, através de programas e comportas na realização das suas funções [10].

Perfilhando este entendimento, defende Celso Antônio Bandeira de Mello

Portanto, o Direito Administrativo não é um Direito criado para subjugar os interesses ou os direitos dos cidadãos aos do Estado. É, pelo contrário, um Direito que surge exatamente para regular a conduta do Estado e mantê-la afivelada às disposições legais, dentro desse espírito protetor do cidadão contra os descomedimentos dos detentores do Poder estatal [11]

A adoção de regime jurídico pela Administração Pública traz a lume, principalmente, a inserção de prerrogativas especiais em seu favor e sob fundamento da proteção ao interesse público.

No âmbito da doutrina alienígena, destaca-se a concepção da potestade administrativa preponderante no regime jurídico de direito público trazida por Juan Carlos Cassagne:

La prerrogativa se ubica es un plano superior a la relación jurídica singular siendo un poder abstracto general e irrenunciable, cuyo fundamento emana del ordenamiento juridico del Estado. No hay que confundir, entonces, la prerrogativa con El acto de su ejercicio respecto de una relación jurídica determinada o individualizada, porque ella no es un elemento de la relación, como es el derecho subjetivo o el interés legitimo [12]

Nesta esteira de entendimento, conquanto se admita a observância do regime jurídico de direito privado, marcado pela horizontalidade na relação jurídica, a predominância na Administração Pública é do regime jurídico administrativo, emanado das normas de direito público, donde ressaltam, sobremaneira, os princípios da supremacia do interesse público sobre o privado, e da indisponibilidade do interesse público.

Discorrendo acerca das peculiaridades incidentes sobre a atividade administrativa, Renato Alessi entende que a posição de superioridade conferida à Administração Pública, no exercício do poder de império, tem seus efeitos relacionados à satisfação dos interesses públicos. Assim,

"mientras el ejercicio de los poderes conferidos al particular no puede tener eficácia más allá de la esfera jurídica de su titular, o de sus titulares cuando se trate de manifestaciones plurilaterales (dada la situación de igualdad de los particulares entre si, situados en un mismo plano), el ejercicio del poder conferido a la Administración publica, en cambio, dada su supremacia jurídica, puede entenderse a la modificación de la esfera jurídica de sujetos extraños, subordinados, mediante manifestaciones unilaterales de poder, por parte de la Administración" [13]

A este respeito, Osvaldo Aranha Bandeira de Mello expõe a manifestação unilateral de vontade como regra nas relações estatais, inclusive no que concerne aos ajustes bilaterais estabelecidos em razão de acordo de vontades entre o Estado e particulares, pois, também neles, incide o regime jurídico de caráter estatutário. Para ele,

Portanto, a autonomia de vontade só existe na formação do ato jurídico. Porém, os direitos e deveres relativos à situação jurídica dela resultante, sua natureza e extensão, são regulamentados por ato unilateral do Estado, jamais por disposições criadas pelas partes – isto é, através de processos técnicos de imposição autoritária da sua vontade, estabelecendo as normas adequadas e conferindo poderes próprios para atingir seu fim de realização do bem comum [14].

Neste sentido, e consoante se mencionou alhures, enquanto no direito privado as relações jurídicas apresentam características de horizontalidade, amparadas sob o manto da igualdade, no âmbito do direito público, o Estado assume, de regra, uma relação de superioridade frente aos particulares com os quais se envolve, a tal ponto que a aquiescência destes às cláusulas unilateralmente determinadas pelo Poder Público é a única forma de manifestação volitiva numa relação contratual.

A este respeito, Celso Antônio Bandeira de Mello:

O regime jurídico de direito público resulta da caracterização normativa de determinados interesses como pertinentes à sociedade e não aos particulares considerados em sua individuada singularidade.

Juridicamente, essa caracterização consiste, no Direito Administrativo, segundo nosso modo de ver, na atribuição de uma disciplina normativa peculiar que, fundamentalmente, se delineia em função da consagração de 2 princípios:

a)supremacia do interesse público sobre o privado;

b)indisponibilidade, pela Administração, dos interesses públicos [15].

Nesta análise, há que se perquirir sobre a atuação administrativa do Estado, sobretudo no que tange à supremacia do interesse público, sob pena de se consolidarem situações de abuso de poder estatal sob a alegação de se tratar de preponderância do interesse coletivo.

Por isso, tanto maior deve ser a exigência da aferição legal nos atos administrativos, encontrando-se referências da observância da legalidade como requisito de validade da atuação da Administração Pública. [16].

Aliás, como dito alhures, o Direito Administrativo se traduz em importante mecanismo de proteção dos cidadãos contra arbitrariedades do Poder Público.

Interessante é observar a análise de Celso Antônio Bandeira de Mello no que pertine ao interesse público, considerado como "interesse do todo", "função qualificada do interesse das partes", em detrimento d’outra concepção donde exsurge como "realidade independente", desatrelada do aspecto social. Assim, leciona:

Veja-se um indivíduo pode ter, e provavelmente terá, pessoal – e máximo – interesse em não ser desapropriado, mas não pode, individualmente, ter interesse em que não haja instituto da desapropriação, conquanto este, eventualmente, venha a ser utilizado em seu desfavor [17].

Nesta via interpretativa, e consoante já mencionado, o interesse público se constitui em um plexo resultante das vontades individuais dos componentes daquele corpo social, razão pela qual se haverá que distinguir o interesse público do interesse do Estado, posto que este somente será legitimamente considerado se se equiparar àquele interesse resultante da vontade coletiva e para o qual se admite a minoração dos interesses individualizados.

Desse modo, os princípios, como "vetores" a serem seguidos no desenvolver de um ramo jurídico, remontam à norma de orientação dos aplicadores e intérpretes do Direito [18].

1.1. Princípios Constitucionais Expressos:

A este respeito, e considerando a importância do Direito Administrativo na organização sócio-política do país, coube à Constituição Federal, no "caput" do artigo 37, elencar os cinco princípios basilares: legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência, os quais, erigidos ao patamar constitucional, constituem-se em sustentáculos do desenvolvimento e estudo da atividade administrativa estatal.

É de se reconhecer, inicialmente, que o princípio da legalidade assume feição distinta daquela referenciada no inciso 2º do artigo 5º da Constituição Federal. Aqui, o paradigma da legalidade adota concepção estrita, através da qual o comportamento do administrador público deve estar discriminado pela norma, enquanto que, no artigo 5º, a garantia da legalidade permite aos cidadãos atuar livremente, salvo quando existir determinação legal em sentido contrário.

No Estado de Direito, a Administração Pública se encontra atrelada aos regramentos normativos, subsumindo sua atuação à vontade do legislador. A este respeito, calha a transcrição do entendimento de Renato Alessi, presente nas lições de Celso Antônio Bandeira de Mello:

"tal subordinação [do administrador à lei] que concretiza o princípio da necessária legalidade da atividade administrativa, é entendida antes de mais nada em sentido negativo: vale dizer, no sentido de que a atividade administrativa encontra um limite formal insuperável na lei, a qual pode estabelecer proibições a determinadas atividades, tanto no que concerne às finalidades a cumprir quanto no que respeita os meios e às formas a serem seguidas para tal escopo; mas, é entendida, além disso e sobretudo, em sentido positivo: e isto não apenas no sentido de que a lei pode vincular positivamente a atividade administrativa a determinados meios ou formas, mas, ademais, no sentido de que, como melhor se verá na ocasião oportuna, a administração, particularmente no que concerne a atividade de caráter jurídico, pode fazer tão somente o que a lei consente" [19]

Assim, ressalvadas as situações excepcionais da discricionariedade administrativa, tolhida, de todo modo, pelos limites impostos pela lei, o administrador público haverá de se ater à conduta vinculada disposta na norma, como um dos fundamentos de sua atuação enquanto gestor do patrimônio coletivo.

A menção constitucional ao princípio da impessoalidade advém de uma faceta da isonomia constitucional, vedando à Administração Pública o tratamento diferencial aos administrados, quando apresentados em igual situação jurídica. Isto é, o princípio da impessoalidade importa no tratamento equânime aos administrados, afastando-se a concessão de privilégios para uns em detrimento de outros, e do próprio interesse público.

De outra sorte, o princípio da moralidade importa na aplicabilidade dos preceitos éticos para o exercício da função administrativa, valendo-se mencionar que:

Segundo o STF, o princípio da moralidade administrativa revela-se como valor constitucional impregnado de substrato ético e erigido à condição de vetor fundamental que rege as atividades do Poder Público, que representa o verdadeiro pressuposto de legitimação constitucional dos atos emanados do Estado, como resulta da proclamação inscrita no art. 37 caput da Constituição da República. Nesse contexto, o desrespeito ao princípio da moralidade administrativa faz instaurar situações de inconstitucionalidade [20].

Neste raciocínio, prossegue Dirley da Cunha Júnior:

Ainda em consonância com aquela Corte, atividade estatal, qualquer que seja o domínio institucional de sua incidência, está necessariamente subordinada à observância de parâmetros ético-jurídicos que se refletem na consagração constitucional do princípio da moralidade administrativa. Esse postulado fundamental, que rege a atuação do Poder Público, confere substância e dá expressão a uma pauta de valores éticos em que se funda a ordem positiva do Estado. É por essa razão que o princípio constitucional da moralidade administrativa, ao impor limites ao exercício do poder estatal, legitima o controle jurisdicional de todos os atos do Poder Publico que transgridam os valores éticos que devem pautar o comportamento dos órgãos e agentes governamentais [21]

Respeitando-se a valoração ético-jurídica da atividade administrativa, o princípio da publicidade decorre da ampla necessidade de transparência administrativa, tanto mais quando se admite a possibilidade de controle desta atividade pelos demais Poderes do Estado e pelo próprio cidadão. Neste diapasão, exige-se, portanto, que todos os atos administrativos sejam públicos, através dos mecanismos oficiais (Diário Oficial, sítio na Internet), ressalvando-se somente as situações em que tal publicidade importar em prejuízos à Segurança Nacional ou violação dos direitos de personalidade dos indivíduos, hipóteses nas quais se admitirá a sua mitigação.

Por fim, o princípio da eficiência advém da reforma administrativa introduzida pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998, podendo ser traduzido, na esteira do entendimento de Maria Silvia Zanella Di Pietro em dois aspectos:

pode ser considerado em relação ao modo de atuação do agente público, do qual se espera o melhor desempenho possível de suas atribuições, para lograr os melhores resultados; e em relação ao modo de organizar, estruturar, disciplinar a Administração Pública, também com o mesmo objetivo de alcançar os melhores resultados na prestação do serviço público [22]

Em verdade, esta reforma administrativa implementada pelas Emendas Constitucionais 19 e 20 na Carta Brasileira buscou a modificação do paradigma do Estado, que passaria da gestão burocrática para o modelo gerencial da máquina administrativa, utilizando-se de instrumentos típicos do Direito Privado para a melhoria das atividades administrativas, as quais, de forma lamentável, tradicionalmente, vêem-se impregnadas pela lentidão, incompetência e descaso, típicos do exercício da atividade pública.

A eficiência, portanto, tal como o significado do próprio vocábulo, impõe ao servidor público o dever de agir com presteza, atuando de forma a atingir a finalidade intencionada pela lei, o atendimento do interesse público, traduzido como o real interesse da comunidade.

1.2. Princípios reconhecidos:

Conquanto não se possam definir taxativamente todos os princípios que são reconhecidos no âmbito do Direito Administrativo, optou-se, para os fins específicos deste trabalho, por ressaltarem-se somente os princípios da supremacia do interesse público sobre o privado e da indisponibilidade do interesse público, considerados como basilares do regime jurídico de direito público.

Deste modo, pode-se considerar como marco da supremacia do interesse público, o abandono das concepções individualistas do ordenamento jurídico no final do século XIX, quando o Estado passou a significar também o instrumento de consecução da justiça social. Assim é que se considera o referido princípio como aquele através do qual os interesses individuais dos administrados são mitigados em razão da preponderância do interesse público, considerado como o plexo resultante das vontades individualizadas.

Por seu turno, o princípio da indisponibilidade do interesse público advém da finalidade pública determinante da atividade administrativa pois, no exercício da função administrativa, é vedado ao administrador o uso de práticas com intuito pessoal em detrimento da coletividade, sob pena de se caracterizar o desvio da finalidade pública.

A indisponibilidade do interesse público, por conseguinte, se constitui na impossibilidade de disposição ou transação da finalidade coletiva pelo administrador, sendo forçoso reconhecer que o gestor não administra os recursos estatais como próprios, mas se deve entender como instrumento de efetivação dos interesses gerais da sociedade que representa.

Analisado, ainda que superficialmente, o regime jurídico da Administração Pública, passar-se-á agora à abordagem da temática da função administrativa, especificamente no que tange à formalização procedimental de sua atuação.


2. DO PROCESSO ADMINISTRATIVO

Como já se afirmou alhures, a temática do processo administrativo se afigura de extrema relevância diante das concepções do Estado de Direito, amparadas pelo ordenamento jurídico pátrio.

Assim, é de se reconhecer, na esteira do pensamento de José Roberto Pimenta Oliveira, que:

Com a consagração do devido processo legal na Constituição de 1988, e a importantíssima concretização de seus vários desdobramentos em leis disciplinadoras do processo administrativo (destacadamente, pela abrangência, a Lei Federal nº 9784/99), o fenômeno da procedimentalização da atividade administrativa já se pode considerar uma tendência consolidada, com inúmeras conseqüências positivas para o desempenho da função administrativa, dentro dos parâmetros exigidos pela Lei Maior.

A outorga de relevância ao procedimento administrativo é corolário inseparável da consagração do Estado Democrático de Direito, pautado na cidadania e na dignidade da pessoa humana (Parte III, Cap. 3, tópico 3.2.1). Serve o mesmo de instrumento primordial de controle interno e externo da forma como se exerce a função administrativa, bem como de pressuposto inequívoco do bom desempenho desta função, na cura dos interesses públicos que lhe são impostos a implementar. [23]

É de ver-se que o tratamento jurídico dispensado ao processo administrativo assume, com o passar dos anos e diante d’outra concepção do exercício da função administrativa, a feição de garantia indispensável ao cumprimento dos princípios e deveres administrativos, mormente quando importem em interferência no cotidiano dos administrados.

De fato, o procedimento administrativo passa a significar a concretização da vontade administrativa por meio de atos concatenados, circunstância que, per si, já desperta o interesse em seu controle na esfera dos direitos e garantias fundamentais.

Impende ressaltar que, a teor dos artigos 8º e 10 da Declaração Universal dos Direitos Humanos, em 1948, a garantia ao processo foi erigida ao patamar de direito humano universal, nestes termos:

Artigo VIII

Toda pessoa tem direito a receber dos tributos nacionais competentes remédio efetivo para os atos que violem  os direitos fundamentais que lhe sejam reconhecidos pela constituição ou pela lei.   

Artigo X

Toda pessoa tem direito, em plena igualdade, a uma audiência justa e pública por parte de um tribunal independente e imparcial, para decidir de seus direitos e deveres ou do fundamento de qualquer acusação criminal contra ele.   

Assim garantido, surge a primeira problemática em derredor da matéria no âmbito administrativo. Será correto, como referido, utilizar-se indistintamente as expressões processo e procedimento?

2.2. Questão terminológica: processo ou procedimento?

No âmbito da doutrina brasileira, existe grande dissenso em derredor da adequada terminologia a ser aplicável ao exercício da função administrativa. Assim é que, tal como na esfera judicial, busca-se o emprego da expressão "processo administrativo", em evidente alusão ao "processo judicial". Em defesa de tal denominação, os doutrinadores expõem que a terminologia "processo" transcende ao direito processual, estando no campo da Teoria Geral do Direito e podendo ser empregada sempre que se trate de expressão de legítimo exercício de poder, sendo irrelevante tratar-se da esfera judicial, administrativa, legislativa ou política. [24]

De outra sorte, entendem, alguns autores, que a expressão "processo" é reservada estritamente ao deslinde dos casos contenciosos, sendo adequada, para os demais casos, a aplicação da terminologia "procedimento", como modalidade ritual de cada processo.

No tocante ao tratamento legislativo, em que pesem serem recentes os estudos mais aprofundados sobre a temática [25], percebe-se a utilização da terminologia processo administrativo [26], bem como, para outros, o emprego do "procedimento administrativo" [27].

Roberto Dromi, na análise do ordenamento jurídico argentino, utiliza-se da expressão "procedimiento administrativo", para designar o instrumento jurídico que viabiliza a relação entre administrado e Administração. Assim, expõe que:

"específicamente el procedimiento administrativo indica las formalidades y trámites que deben cumprir la Administración (en el ejercicio de la función administrativa) y los administrados (en su gestión de tutela individual com participación colaborativa en el ejercicio de la función administrativa" [28]

A disciplina normativa do ordenamento jurídico argentino contempla uma grande variedade de mecanismos de proteção administrativa, como, por exemplo, os recursos, reclamações e denúncias conforme a atividade administrativa referenciada. De forma exemplificativa, pode-se mencionar a lei nº 19.549, e modificações posteriores. Nessa norma, referencia-se tratar de disposições atinentes ao procedimento aplicável à Administração Pública Nacional direta e indireta, inclusive os organismos autárquicos, excepcionando-se, de outro modo, as organizações militares.

À margem do dissenso apontado, Celso Antônio Bandeira de Mello expõe que o procedimento administrativo ou processo administrativo é uma sucessão itinerária e encadeada de atos administrativos que tendem, todos, a um resultado final e conclusivo [29]. E complementa, afirmando que:

Não há como negar que a nomenclatura mais comum no Direito Administrativo é procedimento, expressão que se consagrou entre nós, reservando-se, no Brasil, o ‘nomen juris’ processo para os casos contenciosos, a serem solutos por um ‘julgamento administrativo’, como ocorre no ‘processo tributário’ ou nos ‘processos disciplinares de servidores públicos’ [30].

Desta forma, a par da discrepância conceitual existente na doutrina e legislação pátrias, adotar-se-á, no presente trabalho, a terminologia "processo administrativo", porquanto, mesmo para aqueles que entendem pela predominância da expressão "procedimento administrativo" – como é o caso do eminente Celso Antônio Bandeira de Mello, reserva-se àquel’outra expressão aos feitos administrativos contenciosos, situação que se afigura in casu, haja vista tratar-se do âmbito administrativo disciplinar.

É certo que a terminologia "processo administrativo" não assumirá idêntica acepção em todos os diversos campos do Direito, nos mais diferentes ordenamentos jurídicos no mundo. No âmbito do Direito Brasileiro, por exemplo, a expressão poderá servir à constituição do crédito tributário, à análise de concessão, ou não, de benefícios e vantagens ou ao procedimento de apuração e imposição de sanções aos servidores públicos. Este último interessa-nos, sobremaneira, e a seu respeito, trataremos com mais vagar.


3. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR

Já na Magna Carta Inglesa, de 1215, vislumbram-se as reminiscências históricas do justo julgamento dos homens. Deveriam eles, ser julgados pelos seus pares e conforme a lei da terra. Costuma-se afirmar aí, a origem da cláusula do devido processo legal, expresso na 14ª emenda à Constituição Americana, mas, antes disso, não se pode olvidar da imprescindibilidade do direito ao processo.

Observando-se a Administração Pública Brasileira, centralizada ou não [31], e especificamente no que pertine aos seus servidores, reconhece-se a incidência de poderes administrativos, donde se destaca – em razão do objeto deste estudo, o poder disciplinar, através do qual se admite, mediante instauração de processo administrativo disciplinar, a imposição de sanções em virtude do cometimento de infração administrativa elencada no estatuto funcional específico.

O exercício do direito de defesa sobrevém da própria natureza do ser humano, enquanto considerado no seio social. Aliás, a sátira do processo kafkaniano causa espanto não só pela dificuldade de intelecção de suas regras e determinações como também, e principalmente, pela inexistência de qualquer forma de defesa pelo acusado.

Por oportuno, registre-se que a regulamentação do processo administrativo dependerá da edição de normas legais específicas de cada um dos entes federativos, em razão da competência legislativa própria, mas se admitindo a aplicação subsidiária da normatização federal.

No que pertine, especificamente, ao processo administrativo disciplinar, é de ver-se que seu tratamento normativo não deflui da generalidade das leis de processo administrativo, mas sim do estatuto especial dos servidores públicos, utilizando-se, subsidiariamente, daquelas normas gerais dantes mencionadas.

Em linhas gerais, os processos disciplinares comportam uma subdivisão em sindicância e processo administrativo disciplinar (PAD), sendo, o primeiro, um procedimento investigativo com intuito de esclarecer supostas irregularidades administrativas imputadas aos servidores públicos, resultando, eventualmente, na instauração de processo administrativo disciplinar contra aquele servidor ao qual se atribui a prática da infração administrativa.

Para Odete Medauar, "em essência, processo administrativo disciplinar é a sucessão ordenada de atos destinados a averiguar a realidade de falta cometida por servidor, a ponderar as circunstâncias que nela concorreram e a aplicar as sanções pertinentes" [32]

Impende registrar que os fatos apurados por meio do PAD podem advir de representação, queixa, denúncia ou mesmo do resultado de sindicância prévia, mas a sua instauração necessariamente se dará com a edição de portaria pela autoridade hierarquicamente superior ao servidor processado.

A portaria que inicia tanto a sindicância quanto o processo administrativo stricto sensu, determina a formação de uma comissão processante, composta por servidores públicos, que prestarão compromisso de trabalhar na busca da verdade dos fatos, sem dolo e sem malícia.

Quanto aos aspectos formais atinentes à instauração do procedimento disciplinar, Odete Medauar explicita:

A portaria inaugural e o mandado de citação, no processo administrativo, devem explicitar os atos ilícitos atribuídos ao acusado. Ninguém pode defender-se eficazmente sem pleno conhecimento das acusações que lhe são imputadas. Apesar de informal, o processo administrativo deve obedecer às regras do devido processo legal [33]

Com o início do procedimento, o acusado é citado para apresentar defesa prévia e é exatamente neste ponto que reside o cerne da questão: tal defesa deverá ser elaborada por profissional do Direito, inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil e devidamente constituído por mandato, ou a apresentação de razões pelo próprio acusado ou terceiros é suficiente para a efetivação da garantia do devido processo legal? Sobre tal indagação, tratar-se-á detidamente no momento oportuno.

Instaurado o processo administrativo e citado o servidor, abre-se-lhe o prazo de cinco dias para oferecimento da defesa prévia, através da qual, de regra, apresenta-se um arrazoado genérico dos fatos na visão do acusado e pugna-se pela realização de provas, especialmente a testemunhal, na oportunidade da audiência de instrução.

Genericamente, as testemunhas são intimadas por meio de mandado encaminhado pela própria Comissão processante ou, quando se tratem também de servidores públicos, são requisitadas diretamente aos seus superiores hierárquicos. Outras provas podem ser realizadas na fase de instrução, a depender da situação que se apura e consoante interesse do acusado ou determinação da Comissão Processante.

Excepcionalmente, o estatuto funcional pode estabelecer regras diversas quanto à formalização do PAD, como se observa, v.g., com a lei baiana 10.845/2007, que trata da Organização do Poder Judiciário Estadual e, por óbvio, também disciplina as regras do regime disciplinar. Neste passo, dispõe-se o prazo de dez dias (e não cinco) para apresentação da defesa prévia no PAD que, também regido por provimentos da Corregedoria de Justiça, serão presididos por um juiz auxiliar da Corregedoria ou o próprio Juiz de Direito da Vara ou Comarca à qual o servidor se encontra vinculado. [34]

Retomando-se a análise das fases do PAD e resguardando-se as excepcionalidades de cada estatuto específico, após a produção probatória, inclusive a audiência das testemunhas, e da oitiva do acusado, em interrogatório, tem-se a apresentação das alegações finais, no prazo de dez dias do encerramento da instrução, oportunidade em que a defesa fará uma sinopse das provas produzidas em confronto com o seu arrazoado inicial, de modo a permitir-lhe a absolvição quanto à infração administrativa que lhe fora imputada, ou a redução da gravidade do ilícito, e minoração da sanção imposta.

Em conclusão, a Comissão Processante elaborará um parecer conclusivo, opinando pela condenação ou absolvição do servidor processado e submeterá sua análise à autoridade hierarquicamente superior, a quem cabe a decisão final do PAD, e sobre a qual ainda cabe a interposição de recurso administrativo.

Saliente-se que, de todo modo, esgotadas as instâncias administrativas, é possível ainda ao servidor público, a proposição de ação judicial tendente à anulação da decisão administrativa, em homenagem ao princípio da inafastabilidade do controle judicial, consignada no artigo 5º, XXXV da Constituição Federal de 1988, cuja análise, pelo objeto deste estudo, não será aprofundada.


4. DAS GARANTIAS DO PROCESSO ADMINISTRATIVO:

Conquanto se encontrem registrados precedentes jurisprudenciais [35], são outros os tempos aqueles em que se admitia a supressão de um direito – como os proventos de aposentadoria, sem a garantia do processo administrativo.

Atualmente, à vista das consolidadas bases do Estado Democrático das quais erigem o contraditório e a ampla defesa, não se há de permitir a imposição ou restrição de direitos sem que seja oportunizado o devido processo legal, sob pena de invalidação pelo Poder Judiciário ou pela própria Administração Pública, com fulcro no princípio da autotutela [36].

Na seara do processo administrativo, Sergio Ferraz e Adilson Abreu Dallari, em obra inteiramente dedicada ao tema, observam, brilhantemente, que:

Somente se pode pensar em efetiva realização do princípio democrático quando e onde se possa o administrado participar da feitura do querer administrativo, ou da sua concretização efetiva. Para tanto, imprescindível é que se assegure ao cidadão o postular junto à Administração, com a mesma sorte de garantias que lhe são deferidas no processo jurisdicional – particularmente as certezas do contraditório, da prova, do recurso e da publicidade [37].

Em última instância, amparando-se na lição dos citados doutrinadores, o processo administrativo se constitui em instrumento seguro de demonstração do "querer administrativo", o qual, num Estado de Direito que se pretende Democrático, somente poderá advir das garantias constitucionais que lhe são asseguradas.

No entendimento de Ferraz e Dallari, aliás, podem ser considerados objetivos fundamentais do processo administrativo:

"disciplinar, conferindo transparência e objetividade, os meios pelos quais a Administração Pública por intermédio de seus agentes, toma decisões; e assegurar o respeito a todos os atributos da cidadania no relacionamento entre a Administração e os administrados, inclusive seus próprios agentes." [38]

A este entendimento, perfilha-se a lição da doutrina espanhola, extraída de Bandeira de Mello:

Tomás-Ramón Fernández, precitado, anota que o procedimento administrativo complementa a garantia da defesa em sede jurisdicional por dois ângulos: de um lado porque – uma vez disciplinada a conduta administrativa desde o 1º ato propulsivo até o ato final – impede que os interesses do administrador sejam considerados ‘ex post facto’, vale dizer, depois de atingidos, pois oferece oportunidades ao interessado de exibir suas razões antes de ser afetado. [39]

Deste modo, restará eternamente afastado o temor do autoritarismo e arbítrio que, por séculos, orientaram o desenvolvimento da função administrativa pelo Estado. Garantias processuais são, portanto, muito mais que instrumentos formais, são meios assecuratórios da efetividade dos direitos humanos consagrados há 60 anos, na Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948, e dos direitos fundamentais insculpidos na Constituição Federal de 1988.

Constata-se, por conseguinte, a preocupação do Constituinte em influir, diretamente, nas relações jurídico-processuais, de modo a assegurar a almejada isonomia material. Assim, Carlos Alberto Álvaro de Oliveira:

Desta sorte, a Constituição passa a influenciar de forma direta a posição jurídico-material dos indivíduos perante os tribunais, garantindo posições jurídicas subjetivas, assumindo natureza de direitos de defesa perante os poderes públicos com dimensão objetivo-institucional, funcionando como princípios jurídico-objetivos para a conformação dos tribunais e do processo judicial. Sublinhe-se a grande riqueza oferecida pelo ordenamento constitucional brasileiro no concernente às máximas processuais, a evidenciar a visão essencialmente comprometida do Constituinte de 1988 com a garantia dos direitos processuais do cidadão e sua preocupação em evitar ou pelo menos minimizar o autoritarismo dentro do processo [40]

Neste sentido, como reflexos do contraditório e da ampla defesa, mencionam-se algumas garantias do acusado no âmbito do processo administrativo extraídas da Lei 9784/99, quais sejam: o direito de ser citado para tomar ciência da acusação que lhe é imputada, fazendo-se acompanhar de cópias de documentos que compõem os autos (art. 3º, II), o direito de requerer a produção de provas e formalidades (art. 38, caput da lei 9784/99 e 156 caput da Lei 8112/90 – Estatuto dos Servidores Públicos Federais), o direito de fiscalizar as provas colhidas pela comissão processante (art. 156 da L. 8112/90), o direito de não produzir prova contra si mesmo, em analogia aos princípios do processo penal, existindo também quem mencione o direito de nomeação de defensor ad hoc, mas sobre este aspecto tratar-se-á oportunamente.

Como já se disse alhures, o processo administrativo não ficou à margem desta proteção constitucional, mas, ao revés, restou expressamente abarcado pelas disposições da Constituição, principalmente ao se garantir aos acusados, em processo judicial ou administrativo, o contraditório e a ampla defesa, consectários lógicos do devido processo legal, cuja análise se seguirá com mais vagar.

4. 2. Do Princípio do Devido Processo Legal:

Do que se disse até o momento, não se explicitou o "por quê" da escolha da expressão "processo legal devido" em detrimento da vasta aplicabilidade da terminologia do devido processo legal.

Nestes termos, é de se reconhecer que o processo – mormente o administrativo, deve estar vinculado às prescrições legais, e, in casu, pela influência da legalidade estrita, mas tal não se verificará devido, se não se lhe acudirem as garantias constitucionais da razoável duração do processo, dos consectários da ampla defesa e do contraditório, com vistas a atingir a finalidade última da Administração Pública: o atendimento dos interesses públicos, sem olvidar da proteção aos direitos individuais.

Neste sentido, Ferraz e Dallari:

"Sempre há de estar [o processo administrativo], contudo, o antecedente jus-filosófico inafastável: ‘processo legal devido’ – assim escandida a expressão:

Processo – seqüência de atos concatenados e encadeados em que todos os "interessados" (aí incluída a Administração – parte) tenham forças idênticas;

Legal – a anatomia e a fisiologia, ou seja o aparato e o procedimento, hão de estar previamente estabelecidos em lei, inteiramente reverentes à axiologia constitucional pertinente;

Devido – o processo legal há de ser eficiente, proporcional, transparente e isonômico no equacionamento da deflagração e do favorecimento das instâncias de dirimência. " [41]

Assim também, Carlos Alberto Álvaro de Oliveira:

O princípio [do devido processo legal] não se esgota em assegurar a regularidade do procedimento, abrangendo também a possibilidade de ambas as partes sustentarem suas razões e apresentarem suas provas, e assim, influírem por meio do contraditório na formação do convencimento do juiz. Por tais razões, o aspecto mais essencial do devido processo legal é o de assegurar o contraditório e a ampla defesa. [42]

Sob ângulos distintos poderá ser entendida a cláusula do ‘due processo of law’: genérico, que se biparte em material e processual. O devido processo legal no sentido genérico tutela os direitos à vida, à liberdade, à propriedade, devendo-se entender neste sentido a previsão do art. 5º, LIV da Constituição. No sentido material ou substancial (substantive due process), a cláusula versa a respeito dos direitos materiais e à sua proteção por meio de processo judicial ou administrativo. No sentido processual (procedural due process), tem o sentido de atribuir-se aos litigantes diversas garantias dentro da relação jurídico-processual [43]

Deste modo, concluindo-se pela incidência das garantias constitucionais no âmbito do processo disciplinar, deflui-se deste raciocínio, a importância da efetividade da ampla defesa do acusado. Se assim o é, somente com a participação efetiva de profissional habilitado, o Advogado, é que se poderá garantir defesa ampla ao servidor processado, resguardando-se, com isso, o processo legal devido. Aliás, nesta esteira de entendimento, está Odete Medauar:

"No processo disciplinar, exige-se a defesa técnica. Por isso, o indiciado deve constituir advogado para assisti-lo no processo; se não o fizer, a Administração é obrigada a indicar advogado dativo sob pena de anulação do processo.

Integram a garantia do contraditório, em especial: o advogado e o indiciado têm o direito de acompanhar o processo; têm direito a vista e cópia dos autos; o advogado deve ser cientificado de todos os atos da instrução, com certa antecedência (em geral, mínimo de 48 horas). Integram a ampla defesa, nessa fase, em especial: o indiciado, arrolar e reinquirir testemunhas, solicitar e produzir provas e contraprovas, formular quesitos na prova pericial". [44]

A inserção dos incisos LIV e LV no artigo 5º da Constituição Federal, especificamente no Título "Dos Direitos e Garantias Fundamentais", importa na demonstração de limitação da atuação estatal já que toda intervenção na liberdade e propriedade individuais deverá ser precedida do devido processo legal, com os consectários lógicos do contraditório e da ampla defesa.

LIV – ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal

LV – aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.

Malgrado se perceba a assimilação de "processo" ao âmbito judicial, é de ver-se a Constituição Federal, ao referir-se às garantias do devido processo legal, não restringe a terminologia ao processo judicial. Ao revés, garante expressamente a extensão ao âmbito administrativo.

A maioria da doutrina administrativa inclina-se para adoção da terminologia "processo administrativo" decorrente da generalidade da Ciência Processual, sem olvidar da aplicação de princípios e regras atinentes especificamente ao ramo do Direito Administrativo.

Neste diapasão, é de se recordar que não nos cabe uma análise aprofundada da generalidade do processo administrativo, mas sim o tratamento específico pertinente ao âmbito disciplinar e as garantias processuais que lhe são inerentes. [45]

Assentada a concepção processualista do "iter" administrativo, traz-se à baila a dúvida em derredor da imparcialidade no julgamento uma vez que a Administração Pública assumirá sempre dois papéis: o de interessada e também aquele de responsável pela instrução e julgamento. Para se evitar a quebra da imparcialidade é que se tem exigida a inclusão dos princípios constitucionais também no âmbito do processo administrativo, v.g. a cláusula genérica do "devido processo legal" que, muito além de constitucional, é base para o desenvolvimento de toda e qualquer atividade estatal no ordenamento jurídico constitucional.


5. DA INTERVENÇÃO OBRIGATÓRIA DO ADVOGADO

Corroborando tudo quanto se estudou até o presente momento, resta evidenciada que a garantia do devido processo legal se estende aos processos administrativos disciplinares, sobretudo pela dicção de dispositivo constitucional expresso (art. 5º LIV CF). Contudo, o que não se vislumbra adequadamente delineada é a obrigatoriedade da participação de advogado na seara disciplinar para que tal garantia seja efetivamente assegurada.

Com efeito, a Constituição Federal de 1988 [46] ressaltou a participação do advogado como função essencial à Administração da Justiça [47], e esta não se encontra adstrita exclusivamente às vias do Poder Judiciário [48]. Pela exegese da norma constitucional, compreende-se, portanto, a auto-executoriedade do seu comando, prescindindo de maiores regulamentações legais.

A imprescindibilidade da participação do advogado, contudo, não é prerrogativa iniciada com a Carta de 1988. Ao revés, já na Bíblia se percebem indícios da necessidade de patrocínio na defesa dos interesses dos homens, sendo em Jesus Cristo que se vê a figura do advogado entre Deus e os homens. Assim também, na Grécia Antiga e em Roma, a figura do jurista era dotada de uma série de privilégios, havendo registros de que em Athenas, nomeavam-se dez defensores por ano para o patrocínio das causas nas quais os envolvidos não possuíam recursos para arcar com tal despesa.

Com Ulpiano, a necessidade da intervenção do causídico fixou-se na jurisprudência romana e, a partir daí, influenciando os ordenamentos jurídicos de origem romana, podendo-se trazer, exemplificativamente, a expressão: Ait praetor: Sin non habebunt advocatum, ego dabo".

Ora, observe-se que a advocacia não se mostra somente como uma profissão regulamentada, mas um múnus público, ou uma função essencial à Administração da Justiça, como consignado na Carta Magna, exercendo papel fundamental na edificação do Estado Democrático de Direito, há tanto tempo buscado e ainda em fase de implantação.

Neste passo, é que se retorna ao ponto crucial deste trabalho. Tratando-se de um processo administrativo tendente à imposição de sanção disciplinar ao servidor público, será admissível a condenação do acusado sem que lhe seja assegurado o direito de patrocínio de defensor habilitado, conhecedor das disposições normativas?

Não se pode, jamais, olvidar do tecnicismo e formalismo das normas jurídicas e, em razão disso, da grande dificuldade de sua intelecção pelos leigos. Bastará, portanto, as alegações apresentadas pelo próprio acusado, ou o patrocínio de um servidor como defensor dativo para se cumprir a imposição constitucional do processo legal devido? [49]


6. TRATAMENTO JURISPRUDENCIAL DO TEMA

O cerne da questão apresentada neste trabalho se concentra na disparidade existente entre os entendimentos jurisprudenciais encontrados nos Tribunais Superiores Brasileiros, de modo a se questionar acerca da invalidação, ou não, do processo administrativo disciplinar, quando verificada a ausência de intervenção de advogado na defesa do servidor acusado.

Neste passo, é de se ressaltar que, malgrado não possua efetividade legislativa, a inserção das súmulas vinculantes no ordenamento jurídico pátrio reforçou a ideologia da observância obrigatória dos entendimentos sumulares dos Tribunais Superiores, mormente porque, consoante determinado pelo próprio Supremo Tribunal Federal, as súmulas vinculantes tem caráter impeditivo de recursos. Vale dizer, não se admitirá a interposição de recursos quando manifestamente contrários ao entendimento esposado nas súmulas vinculantes.

Passemos, por conseguinte, à análise dos precedentes jurisprudenciais e das súmulas que ensejaram a discussão:

Genericamente, pode-se afirmar que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) vem delineando uma postura mais garantista quanto aos direitos do cidadão, sendo consectário lógico a extensão deste entendimento para as vias do processo administrativo.

De fato, antes mesmo que se editasse a súmula 343, no ano de 2008, o STJ já havia consolidado seu entendimento no sentido de se assegurar ao acusado, no âmbito administrativo, o patrocínio da causa por um advogado, com vistas a não se minorar ou suprimir quaisquer das facetas do devido processo legal e ocasionar, conseqüentemente, a anulação do feito administrativo pelo Poder Judiciário.

Assim é que, condensando tal entendimento, editou-se a súmula 343, in verbis:

Súmula 343 STJ: é obrigatória a presença de advogado em todas as fases do processo administrativo disciplinar.

Deste modo, nesta específica modalidade de processo administrativo, se o acusado não constituísse advogado, deveria ser-lhe nomeado um defensor dativo, legalmente habilitado, sob pena de invalidação.

Fernão Borba Franco, em tese de doutoramento específica sobre o processo administrativo, compreende haver cuidado excessivo nesse entendimento,

"uma vez que, como todo ato administrativo, também a imposição da sanção administrativa está submetida a controle judicial e, como a aplicação dessa pena está submetida a controle judicial e, como a aplicação dessa pena está submetida ao parâmetro constitucional da proporcionalidade, esse controle é suficientemente amplo para dispensar a necessária intervenção de advogado. Finalmente, para reforçar a aparência de excesso, deve ser considerado que a aplicação de penalidade administrativa, embora grave, é bem menos danosa que a imposição de pena criminal, que serve como parâmetro de comparação" [50].

A interpretação procedida pelo mencionado autor parece ter sido a adotada pela Corte Suprema do País, o STF.

De fato, pouco tempo após a edição da supramencionada súmula, o Supremo Tribunal Federal, órgão de cúpula do Poder Judiciário, utilizou-se do instrumento de uniformização introduzido pela EC 45/2004 – súmula vinculante 05 para estabelecer, em caráter vinculante, que a "falta de defesa técnica por advogado no processo administrativo não ofende a Constituição".

É de se reconhecer que a súmula vinculante não proíbe a participação do advogado nos feitos administrativo-disciplinares, mas lhe faculta a intervenção, de modo que a sua ausência não poderá importar em nulidade do feito, tal como vinha sendo entendido pelo STJ.

Neste sentido, argumenta-se pela possibilidade de acesso ao Poder Judiciário, caso decorram danos ao acusado, diante do princípio da inafastabilidade do controle judicial (art. 5º, XXXV da Constituição Federal) e também, não menos importante, pela ponderação de que a defesa técnica do acusado em processo administrativo disciplinar ocorrerá às suas expensas, inexistindo viabilidade de assistência pela Defensoria Pública ou de qualquer outra forma de patrocínio gratuito ao servidor.

Assim também, expõe Borba Franco que:

"De qualquer modo, o contraditório, e a possibilidade de defesa do réu, seja técnica ou não, é uma opção que deve a ele ser facultada, e não uma obrigação. Assim sendo, correta a lei federal ao estatuir a possibilidade de representação por advogado, mas não a sua obrigatoriedade. Entretanto, as considerações acima são úteis porque demonstram que o modo pelo qual se chega ao ato administrativo é de extrema importância, tendo, inclusive, eventualmente reflexos no plano do direito material." [51]

Interessante é observar que o entendimento esposado por Borba Franco se assenta na facultatividade do contraditório e defesa do réu, concepção que não se coaduna com a ideologia da Constituição Federal de 1988, uma vez que somente com o contraditório e a ampla defesa se vislumbra a observância do processo legal devido.

Registre-se que, como já dito alhures, a Constituição Federal não restringiu a cláusula do due processo of Law ao âmbito do processo judicial, mas, ao revés, reconheceu-lhe aplicação expressa na seara administrativa, razão pela qual há que se divergir absolutamente da concepção de facultatividade da defesa no processo administrativo disciplinar.

Contudo, em que pese a interpretação conforme à Constituição no sentido da imprescindibilidade da defesa no PAD, o Supremo Tribunal Federal compreendeu que o exercício do direito à defesa não exige a intervenção de advogado, ou melhor, da defesa técnica, circunstância que, salvo melhor juízo, poderá importar em prejuízos ao servidor processado quando lhe sejam desconhecidas as expressões e a técnica das regras jurídicas.

6.1. O caráter obrigatório da súmula vinculante

A expressão "súmula" advém de summula, significando a menor parte de summa (ou soma). Neste sentido, a summa equivale à jurisprudência, assim compreendida como o conjunto de decisões emanadas dos Tribunais.

Deste modo, a inserção da expressão "súmula vinculante" no ordenamento jurídico brasileiro [52] passou a significar a sintetização, em caráter diminuto, da jurisprudência dominante na Corte Suprema (o STF) intencionando a uniformização jurisprudencial nos juízes e Tribunais de todo o País.

A aprovação da súmula vinculante, composta por enunciado curto e direto, impassível de interpretação extensiva, depende da aprovação de dois terços dos membros do STF (oito dos dez ministros).

O parágrafo terceiro do artigo 103-A da Constituição Federal de 1988 disciplina que, em caso de descumprimento da súmula vinculante, impõe-se a provocação por reclamação ao STF, que anulará o ato administrativo ou cassará a decisão judicial e, além disso, determinará que outra seja proferida com ou sem a aplicação da súmula conforme o caso.

Nesse diapasão, surge a problemática acerca do livre convencimento do magistrado frente à imposição de observância dos enunciados dispostos nas súmulas vinculantes.

No que tange especificamente à súmula vinculante nº 05, não se poderia compreender pela supressão ou minoração dos direitos fundamentais provenientes do devido processo legal? Poderia o magistrado, em ação mandamental de reintegração no cargo proposta pelo servidor entender prejuízo para a defesa do acusado pelo desconhecimento técnico das normas legais?

Desde a inserção das súmulas vinculantes, grande discussão doutrinária vem sendo levantada quanto à inconstitucionalidade de sua edição, uma vez que limitam a compreensão do magistrado na interpretação da lei ao caso concreto, violando, deste modo, o princípio constitucional do livre convencimento motivado.

De fato, se o diminuto enunciado prolatado pela Corte Suprema tem a capacidade de vincular as decisões proferidas pelos juízes e tribunais de todo o País, a compreensão dos conflitos de interesse submetidos ao crivo do Poder Judiciário se adstringem à mera aplicabilidade das súmulas vinculantes pertinentes à matéria aventada.

No que pertine à súmula vinculante nº 05, haja vista tratar-se da validade do processo disciplinar sem a participação do profissional habilitado, é de se indagar se o magistrado poderá nulificar a decisão administrativa que condene o acusado, quando se vislumbre um prejuízo para a defesa.

Neste passo, retomam-se as concepções de Peter Haberle quanto à sistemática da interpretação constitucional, absolutamente aplicável ao nosso objeto de estudo. Em seu entender, Haberle considera que a hermenêutica não está restrita aos órgãos oficiais, mas provém da interpretação de todos os componentes do corpo social, dentro do que se compreende como sistemática aberta.

Com efeito, a interpretação constitucional é uma atividade que pertine a todos os indivíduos, organizados em grupos sociais ou individualmente considerados, de modo que se lhe possa imputar uma participação mais efetiva na construção da sociedade aberta. Esta é a concepção de Haberle, cuja percepção se faz no trecho a seguir transcrito:

"Os participantes do processo de interpretação constitucional em sentido amplo e os intérpretes da Constituição desenvolvem, autonomamente, direito constitucional material. Vê-se, pois, que o processo constitucional formal não é a única via de acesso ao processo de interpretação constitucional". [53]

Para ele, os intérpretes da Constituição não se restringem aos órgãos jurídicos ou "corporações", responsáveis pela interpretação formal, mas há que se ampliar para todo aquele que vivencia a norma, pois acaba por interpretá-la, ou pelo menos, co-interpretá-la. Neste sentido, afirma:

"Todo aquele que vive no contexto regulado por uma norma e que vive com este contexto é, indireta ou, até mesmo diretamente, um intérprete dessa norma. O destinatário da norma é participante ativo, muito mais ativo do que se pode supor tradicionalmente, do processo hermenêutico. Como não são apenas os intérpretes jurídicos da Constituição que vivem a norma, não detém eles o monopólio da interpretação da Constituição" [54]

Impende registrar que o entendimento perpetrado por Häberle permeia a década de setenta do século passado, haja vista que a edição inaugural de seu texto sobre hermenêutica constitucional se deu em 1975. Desse modo, é forçoso reconhecer que, tendo a evolução do constitucionalismo chegado à democracia da interpretação constitucional, através da qual todos os elementos do corpo social figuram como interpretes, houvéssemos regredido à hermenêutica fechada e há muito ultrapassada da interpretação vinculada aos órgãos jurídicos; in casu, determinada pela compreensão dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, quando da edição das súmulas vinculantes.

Entretanto, considerando o princípio constitucional do livre convencimento motivado do julgador e também, no caso em estudo, a obrigatoriedade da observância do processo legal devido, haverá que se reconhecer a inconstitucionalidade da súmula vinculante nº 05, por haver preterido um direito fundamental, ao pretenso fundamento da salvaguarda da segurança jurídica. Ora, não poderá haver segurança jurídica num País [55] em que nem mesmo os direitos fundamentais são resguardados e, ainda mais, violentados pela própria Instituição que os deveria proteger.

Nada há de legítimo em um processo no qual o acusado não teve direito de defesa, e não há defesa devida quando ao acusado não são assegurados os mecanismos capazes de proporcionar a efetividade do que alega. Assim, o acusado fica relegado à própria sorte: se tem recursos, paga pelo patrocínio do feito; se não os têm, restam-lhe apenas os próprios conhecimentos e a esperança de um Poder Judiciário capaz de reconhecer a absoluta violação das garantias asseguradas pelo Estado Democrático de Direito.


7. CONSIDERAÇÕES FINAIS:

Diante da vastidão do tema proposto, não se tem a pretensão de esgotar-lhe todos os questionamentos ou digressões da legislação e doutrina nacional e estrangeira, mas somente semear pontos de reflexão em derredor da temática apresentada. Nestes termos, pode-se afirmar que:

a)Para além do projeto político de um Estado de Direito, busca-se a ratificação de um Estado Democrático de Direito, capaz de garantir ao cidadão, mecanismos de proteção contra as intemperanças da Administração Pública, no exercício da potestade administrativa.

b)Assegurar-se o regime democrático é, antes de tudo, garantir-se a supremacia da Constituição e das leis dela provenientes, impondo-se a todos, inclusive ao próprio Poder Público, a absoluta observância de seus dispositivos, decorrentes do exercício da soberania popular.

c)A oposição do administrado ao cumprimento de um ato ilegal emanado do Poder Público constitui, em última análise, o exercício da própria cidadania.

d)A ideologia da garantia ao processo como direito do acusado, mormente quanto ao âmbito disciplinar da Administração Pública, no qual o Estado figura, simultaneamente, como parte interessada e Estado-Juiz. Com efeito, no processo administrativo disciplinar, o Estado possui interesse na comprovação da infração administrativa e imposição de penalidades ao servidor faltoso, enquanto que, no âmbito judicial, o Estado, estrutura judicante, deve manter-se acima dos interesses litigiosos, a fim de dirimir os conflitos que lhe são postos.

e)À vista da evidente discrepância na seara administrativo-disciplinar, deve a Administração assegurar isenção na condução do processo, com as garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa. Aliás, é de ver-se que o processo legal somente será devido com a efetivação das garantias processuais do acusado.

f)Assim é que, editada a portaria de instauração do processo administrativo disciplinar, deverá a Administração Pública, assegurar ao servidor processado as garantias necessárias à ampla defesa, donde, por certo, exsurge a participação do advogado, responsável pela defesa técnica.

g)Com a devida vênia ao entendimento sumulado pela Suprema Corte Brasileira [56], é de se reconhecer que a ausência do profissional habilitado na instrução do feito disciplinar poderá importar na supressão de garantias ao processado, a ponto de chegar-se à invalidação do feito por violação ao processo legal devido.

h)As limitações interpretativas provenientes da edição de súmulas vinculantes, notadamente a de número cinco, só enfraquecem a concepção democrática do Estado, pois afasta da processo interpretativo os demais elementos do corpo social, os cidadãos e também os magistrados, agentes públicos incumbidos da salvaguarda da Constituição Federal.

i)O combate às infrações administrativas pela Administração Pública deve estar permeada por valores morais e de justiça, uma vez que a tutela da segurança jurídica não se pode sobrepor à proteção do próprio indivíduo, sob pena de perder toda e qualquer credibilidade enquanto Estado Democrático de Direito. As garantias processuais do acusado são, antes de mais nada, garantias de um processo justo, assegurando, em última análise, também a justiça na decisão.


8. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

, Renato. Instituciones de Derecho Administrativo", trad. 3ª ed. italiana por Buenaventura Pellisé Prats, tomo I. Borsch: Barcelona, 1970.

ÁVILA, Humberto. Teoria dos Princípios – da definição à aplicação dos princípios jurídicos. 8ª ed. São Paulo: Malheiros, 2008.

BACELLAR FILHO, Romeu Felipe. Princípios constitucionais do processo administrativo disciplinar. São Paulo: Max Limonad, 1998.

BARROSO, Luís Roberto. Temas de Direito Constitucional. 2ª ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2002.

BIELSA, Rafael. La función publica – Caracteres jurídicos y políticos. La moralidad administrativa. Buenos Aires: Roque Depalma Editor, 1960.

CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e teoria da Constituição. Coimbra: Almedina, 1998

CARVALHO, Kildare Gonçalves. Direito Constitucional. 13ª ed. atual. e ampl. Belo Horizonte: Del Rey, 2007.

CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 16ª ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2006.

CASSAGNE, Juan Carlos. Derecho Administrativo. Vol. 2, 8ª ed. Buenos Aires: Abeledo-Perrot, 2006

CINTRA, Antônio Carlos de Araújo, GRINOVER, Ada Pellegrini, DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria geral do processo. São Paulo: Malheiros, 19ª ed., 2003

COMPARATO, Fábio Konder, in "Afirmação Histórica dos Direitos Humanos", 3ª Ed. rev e ampl. São Paulo: Saraiva, 2003

DI PIETRO, Maria Sílvia Zanella. Direito Administrativo. 21ª ed. São Paulo: Atlas, 2008.

DROMI, Roberto. Derecho Administrativo, 8ª ed. Buenos Aires: Ciudad Argentina, 2002, p. 1016

FERRAZ, Sérgio; DALLARI, Adilson Abreu. Processo Administrativo. 2ª ed., São Paulo: Malheiros, 2007.

FRANCO, Fernão Borba. Processo Administrativo. São Paulo: Atlas, 2008.

FONTES, Ana Lúcia Berbert de Castro. Garantia do devido processo legal – Princípio constitucional da administração pública. Revista da Procuradoria-Geral do Estado da Bahia. 14, jul-dez. 1990

GARCÍA DE ENTERRÍA, Eduardo; FERNANDEZ, Tomas-Ramon. "Curso de Derecho Administrativo", Madrid: Civitas-Revista de Occidente, 1999

GORDILLO, Agustín. Tratado de Derecho Administrativo, 6ª edición. Fundación de Derecho Administrativo. Buenos Aires, 2002.

HÄBERLE, Peter. Hermenêutica Constitucional: A sociedade aberta dos interpretes da Constituição: contribuição para a interpretação pluralista e ‘procedimental da Constituição. Trad. Gilmar Ferreira Mendes. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris, 2002

JUNIOR, Dirley da Cunha Curso de Direito Constitucional. Salvador: Editora Podivm, 2008

MARTINS NETO, João dos Passos. Direitos Fundamentais: conceito, função e tipos. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003.

MALJAR, Daniel. El Derecho Administrativo Sancionador. Buenos Aires: Ad Hoc, 2004

MEDAUAR, Odete. Direito Administrativo Moderno, 10ª Ed. rev. atual, e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro, 24ª ed. São Paulo: Malheiros, 1999.

MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo, 17ª ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2004.

. "Legalidade, Motivo e Motivação do Ato Administrativo", in RDP-90, abr-jun/1989

MELLO, Oswaldo Aranha Bandeira de. Princípios Gerais de Direito Administrativo, 3ª Ed., vol. I. Introdução. Malheiros: São Paulo, 2007

MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Curso de Direito Administrativo. 14ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005.

OLIVEIRA, Carlos Alberto Álvaro de. Do formalismo no processo civil. 2ª ed. rev. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2003

OLIVEIRA, José Roberto Pimenta. Os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade no Direito Administrativo Brasileiro. Coleção Temas de Direito Administrativo, vol.16. São Paulo: Malheiros, 2006

PEREZ LUÑO, Antonio Enrique. Derechos humanos, estado de derecho y constitución. 6ª ed. Madrid: Tecnos, 1999.

PONDÉ, Lafayette. Considerações sobre o processo administrativo. RDA130, p.1-11, out. - dez 1977.

SARMENTO, Daniel (org) Interesses públicos versus interesses privados: Desconstruindo o Princípio da Supremacia do Interesse Público. 2ª tiragem. Rio de Janeiro: Lúmen Júris Editora, 2007.

SILVA NETO, Manoel Jorge. Curso de Direito Constitucional. 2ª Ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2006


9. ANEXOS

Precedentes jurisprudenciais do Supremo Tribunal Federal quanto à edição da súmula vinculante nº 05.

Julgados do Superior Tribunal de Justiça.


Notas

  1. Sobre esta terminologia, convém trazer a nota distintiva extraída do livro "A eficácia dos direitos fundamentais"" de Ingo Wolfgang Sarlet: "a distinção é de que o termo ‘direitos fundamentais’ se aplica para aqueles direitos do ser humano reconhecidos e positivados na esfera do direitos constitucional positivo de determinado Estado, ao passo que a expressão ‘direitos humanos’ guardaria relação com os documentos de direito internacional, por referir-se àquelas posições jurídicas que se reconhecem ao ser humano como tal, independentemente de sua vinculação com determinada ordem constitucional, e que, portanto, aspiram à validade universal, para todos os povos e tempos, de tal sorte que revelam um inequívoco caráter supranacional (internacional)" Assim também, Fábio Konder Comparato, in "Afirmação Histórica dos Direitos Humanos", 3ª Ed. rev e ampl. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 224: "a doutrina jurídica contemporânea, de resto, como tem sido reiteradamente assinalado nesta obra, distingue os direitos humanos dos direitos fundamentais, na medida em que estes últimos são justamente os direitos humanos consagrados pelo Estado como regras constitucionais escritas"
  2. Art. 5º ...
  3. LV – aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes"

  4. Cumpre registrar a consagração da garantia ao processo como direito humano fundamental no texto da Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948 (arts. 8º e 10), valendo ressalvar que se trata, efetivamente, do devido processo legal
  5. Neste sentido, Antônio Carlos de Araújo Cintra, Ada Pelegrini Grinover e Cândido Rangel Dinamarco: "Processo é conceito que transcende ao direito processual. Sendo instrumento para o legítimo exercício do poder, ele está presente em todas as atividades estatais (processo administrativo, legislativo) e mesmo não estatais (processos disciplinares de partidos políticos ou associações, processos das sociedades mercantis para aumento de capital, etc.)in " Teoria Do Processo", P. 275 E 276
  6. v.g. Carlos Ari Sundfeld, "A importância do procedimento administrativo", RDP, 84/64-74
  7. Interessante é observar que a lei paulista nº 10.177/98 dispõe em sua ementa a regulação do "processo administrativo no âmbito da Administração Pública Estadual", enquanto que a redação do artigo 1º faz uso da outra terminologia, in verbis: Art. 1º - Esta Lei regula os atos e procedimentos administrativos da Administração Publica centralizada e descentralizada do Estado de São Paulo, que não tenham disciplina legal específica. (grifos aditados)
  8. Na esfera disciplinar, impõe-se a observância dos princípios do devido processo legal, e seus consectários da ampla defesa e do contraditório, além da busca da verdade material e oficialidade.
  9. CARVALHO FILHO, José dos Santos. "Manual de Direito Administrativo", 19ª Ed., Lúmen Júris: Rio de Janeiro, 2008.
  10. Até então, vigiam as máximas clássicas: quod principi placuit leges habet vigorem (o que agrada o príncipe tem vigor de lei); ou ainda, the king can do no wrong (o rei não pode errar)
  11. BANDEIRA DE MELLO, Osvaldo A. "Princípios Gerais de Direito Administrativo", 3ª Ed., vol. I. Introdução. Malheiros: São Paulo, 2007, p. 76-77
  12. BANDEIRA DE MELLO, CELSO A. "Curso de Direito Administrativo", 22ª ed. Malheiros: São Paulo, 2007, p. 46.
  13. CASSAGNE, Juan Carlos. Derecho Administrativo. Vol. 2, 8ª ed. Buenos Aires: Abeledo-Perrot, 2006, p. 19
  14. ALESSI, Renato. Instituciones de Derecho Administrativo", trad. 3ª ed. italiana por Buenaventura Pellisé Prats, tomo I. Borsch: Barcelona, 1970, p. 246
  15. BANDEIRA DE MELLO, Osvaldo A. "Princípios Gerais de Direito Administrativo", 3ª Ed., vol. I. Introdução. Malheiros: São Paulo, 2007, p. 40
  16. Ob. Cit, p. 52
  17. Neste sentido, observe-se a doutrina de Renato Alessi: "...una exigencia de legalidad (o conformismo com el Derecho) para lãs manifestaciones negociales privadas, exigencia de legalidad que viene a ser un requisito de validez de la actividad administrativa que constituye manifestación del poder jurídico de la Administración, de forma que toda la materia relativa a la validez del acto y de la reacción contra el mismo debe ajustarse a estes rigurosos princípios y reglas" (Ob. Cit, p. 246-247)
  18. Ob. Cit., p. 57
  19. Segundo Humberto Ávila, os princípios são normas imediatamente finalísticas, primariamente prospectivas e com a pretensão de complementaridade e de parcialidade, para cuja aplicação se demanda uma avaliação da correlação entre o estado de coisas a ser promovido e os efeitos decorrentes da conduta havida como necessária à sua promoção. (Teoria dos Princípios, p. 78-79)
  20. ALESSI, Renato. "Sistema Istituzionale del Diritto Amministrativo Italiano", apud MELLO, Celso Antonio Bandeira de. "Legalidade, Motivo e Motivação do Ato Administrativo", in RDP-90, abr-jun/1989
  21. JUNIOR, Dirley da Cunha Curso de Direito Constitucional. Salvador: Editora Podivm, 2008, p. 853
  22. JUNIOR, Dirley da Cunha Curso de Direito Constitucional. Salvador: Editora Podivm, 2008, p. . 854
  23. DI PIETRO, Maria Silvia Zanella. Direito Administrativo. 21ª Ed. São Paulo: Atlas, 2008, p. 79.
  24. OLIVEIRA, José Roberto Pimenta. "Os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade no Direito Administrativo Brasileiro". Coleção Temas de Direito Administrativo, vol. 16. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 377
  25. A este respeito, veja-se CINTRA, Antônio Carlos de Araújo, GRINOVER, Ada Pellegrini, DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria geral do processo. São Paulo: Malheiros, 19ª ed., 2003,
  26. Somente no ano de 1999 é que se tem a edição da Lei 9784 concernente ao processo administrativo em nível federal.
  27. Na lei federal 9784/99, a ementa regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal; a lei paulista 10.177/98: "regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública estadual"
  28. Lei Complementar 33/96 do Estado de Sergipe: "Institui Código de Organização e Procedimento da Administração do Estado de Sergipe"
  29. DROMI, Roberto. Derecho Administrativo, Buenos Aires: Ciudad Argentina, 2002, p. 1016
  30. Ob. Cit., p. 466
  31. Ob. Cit., p. 467
  32. A teor da Constituição Federal de 1988 e do Dec. Lei 200/67, que trata da organização administrativa federal, a Administração Pública Brasileira pode ser dividida em Administração Direta ou Centralizada, donde se compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, seus órgãos e agentes, enquanto que a Administração Indireta ou Descentralizada abarca as autarquias, fundações, empresas públicas e sociedades de economia mista.
  33. Ob. Cit, p. 306
  34. STJ, RDA 188/136, RMS 1074, Rel. Min. Peçanha Martins.
  35. Neste sentido, atente-se ao provimento 06/92 da Corregedoria Geral de Justiça do Estado da Bahia.
  36. STJ ROMS 5211-SP, Rel. Min. Fernando Gonçalves, DJU 12/08/97; STF RE 185285-1-AL, Rel. Min. Sydney Sanches, DJU 19/09/97; TRF 4ª Região, MAS 2000.7104.007427-RS, Rel. Dês. Fed. Francisco Donizete Gomes, DJU 31/07/2002)
  37. Sumulas 346 e 473 do STF
  38. Ferraz, Sérgio e Dallari, Adilson Abreu, "Processo Administrativo", 2ª ed., 2ª tiragem, Malheiros Editores: São Paulo, 2007, p. 21-22.
  39. Ob. Cit., p. 63
  40. Ob. Cit., p. 476
  41. "Do formalismo no processo civil", 2º Ed. rev. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 83-84
  42. Ob. Cit., p. 67-68
  43. Ob. Cit., p. 85-86
  44. SILVA NETO, Manoel Jorge. Curso de Direito Constitucional. 2ª Ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2006, p. 590
  45. Ob. Cit. p. 309
  46. "O Estado não se compreende sem o poder é, além de político, jurídico porque quando o Estado age distanciando-se da lei, estará ao mesmo tempo distanciando-se da lei" (Antônio Carlos de Araújo Cintra. "Motivação e Controle do Ato Administrativo", p. 20).
  47. Artigo 133 CF: o advogado é indispensável à administração da Justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da Lei.
  48. Existem algumas exceções à indispensabilidade do advogado, como as reclamações trabalhistas, alguns recursos eleitorais interpostos por delegados de partido e também as causas dos Juizados Especiais Cíveis, arbitradas em até vinte salários mínimos. Para Randolpho Gomes, in "O Advogado e a Constituição Federal", apud Kildare Gonçalves, "Direito Constitucional", somente constituiria exceção à obrigatoriedade da presença do advogado nos feitos judiciais, a impetração de habeas corpus, dado o princípio maior da liberdade..
  49. Conforme Carlos Alberto Álvaro de Oliveira, in "Do formalismo no processo civil", 2º Ed. rev. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2003: o valor justiça, espelhando a finalidade jurídica do processo, encontra-se intimamente relacionado com a atuação concreta do direito material, entendido este, em sentido amplo, como todas as situações subjetivas de vantagem conferidas pela ordem jurídica aos sujeitos do direito (p. 66)
  50. Apenas a título exemplificativo, registre-se que no processo administrativo disciplinar instaurado contra servidores do Poder Judiciário do Estado da Bahia, a intervenção do advogado para elaboração da defesa técnica é indispensável, pois contida em dispositivo legal específico (Lei 10.845/2007). Assim é que, no Poder Judiciário da Bahia, não são relevantes as considerações expendidas neste trabalho, posto que a súmula nº 05, conquanto vinculante, não poderá contrariar norma legal expressa.
  51. FRANCO, Fernão Borba. Processo Administrativo. São Paulo: Atlas, 2008., p. 99-100
  52. Ob. Cit. P. 101
  53. A partir do art. 103-A da Constituição Federal de 1988, introduzido pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004.
  54. HÄBERLE, Peter. Hermenêutica Constitucional: A sociedade aberta dos interpretes da Constituição: contribuição para a interpretação pluralista e ‘procedimental da Constituição. Trad. Gilmar Ferreira Mendes. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris, 2002, p. 42
  55. Ob. Cit., p. 15
  56. Acerca deste aspecto, observem-se, em anexo, os fundamentos de proteção à segurança jurídica emanados dos precedentes jurisprudenciais que serviram à consolidação do entendimento prolatado por meio da súmula vinculante nº 05 do STF
  57. Súmula vinculante 05:"falta de defesa técnica por advogado no processo administrativo não ofende a Constituição".

Autor


Informações sobre o texto

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

DANTAS, Bartira Pereira. Processo legal devido no âmbito disciplinar. (Des)necessidade de defesa técnica?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2020, 11 jan. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/12190. Acesso em: 29 mar. 2024.