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A proteção jurídica do sossego no condomínio edilício

A proteção jurídica do sossego no condomínio edilício

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No presente estudo faremos uma análise da proteção jurídica do sossego da população quando ameaçado pelo mau uso da propriedade.

Sumário: 1 – Introdução; 2 – O Livro de registros; 3 – Os efeitos da poluição sonora; 4 – O condomínio edilício; 5 – Competência; 6 – A função social da propriedade; 7 – O condômino anti-social; 7.1 – Festas; 7.2 – Animais; 7.3 – Reformas; 7.4 – Bares e casas noturnas; 7.5 – Cultos; 7.6 – Áreas de lazer; 7.7 – Condômino nocivo e sua exclusão; 8 – Excesso de sensibilidade; 9 – A legislação reguladora; 10 – As sanções no direito estrangeiro; 11 – Conclusão.

"Por falta de sossego, a nossa civilização vai dar a uma nova barbárie." (Friedrich Nietzsche, in 'Humano, Demasiado Humano').


1 – INTRODUÇÃO:

A palavra sociedade tem sua origem derivada do latim societas, uma "associação amistosa com outros", e societas deriva de socius, que significa companheiro. Estaria, assim, implícito no significado de sociedade que seus membros compartilham interesse ou preocupação mútuas sobre um objetivo comum.

Entretanto, a história nos mostra que os interesses e preocupações giram muito mais em torno de interesses privados que de interesses coletivos. E, quando esses interesses particulares desrespeitam os interesses da coletividade os conflitos são inevitáveis.

Quem nunca teve reclamações a fazer de algum vizinho? Falta de zelo com o prédio, falta de educação, festas, animais de estimação, são vários os motivos. A vida em sociedade impõe uma grande interatividade entre os indivíduos, o que gera um número infindável de conflitos. Afinal, respeitar os direitos do próximo nunca foi uma característica muito apreciada pelos homens.

No presente estudo faremos uma análise da proteção jurídica do sossego da população quando ameaçado pelo mau uso da propriedade.


2 – O LIVRO DE REGISTROS:

O livro de registro de ocorrências é um instrumento de grande importância a serviço dos condôminos incomodados pelos ruídos. Trata-se do espaço destinado em livro próprio, ou em livro do condomínio, para que se registrem as reclamações por escrito dos fatos reclamados. Assim, torna-se possível a aplicação posterior de multa ou outra sanção aos condôminos anti-sociais.

Após o registro formal da reclamação, e antes de qualquer aplicação de penalidade, mostra-se salutar o envio de correspondência pelo síndico ao condômino, constando da mesma advertência pelo mau uso da propriedade, preferencialmente com alguma forma de comprovação do recebimento da correspondência. Na hipótese de permanência da infração à convenção condominial ou ao regimento interno, que perturbe o sossego dos moradores, deve-se aplicar a multa prevista no regimento, através de votação pelos demais condôminos. O percentual da multa, no entanto, não poderá ultrapassar os limites dispostos no Código Civil.


3– OS EFEITOS DA POLUIÇÃO SONORA NO ORGANISMO:

A palavra sossego deriva do latim sessitare, de sedere, que significa sentar. Em outros termos, etimologicamente seria mais uma ação usada para o descanso do que especificamente o descanso em si. Entretanto, conceitualmente os dicionários exemplificam como sinônimos de sossego as palavras descanso, repouso e tranqüilidade. E é baseado nesse entendimento que a doutrina demonstra a importância que o sossego, o descanso e o repouso têm para o bem estar do organismo.

Nos ensinamentos de Paulo Affonso Leme Machado, ao discorrer sobre os efeitos do ruído no organismo:

"estudo publicado pela Organização Mundial de Saúde assinala como efeitos do ruído: perda da audição; interferência com a comunicação; interferência no sono; efeitos clínicos sobre a saúde, efeitos sobre a execução de tarefas e incômodo". (...) pessoas que foram submetidas a controle de eletroencefalogramas, eletrocardiogramas etc. mostraram efeitos nocivos do ruído durante o sono (...) o sono assegura a reparação da fadiga física e da fadiga mental ou nervosa do indivíduo. O sono é composto de várias etapas, cujas durações variam no curso da noite. Primeiramente, há uma preponderância dos estágios de sono lento ou profundo, assegurando-se principalmente a reparação física. Na segunda parte, onde o sono rápido ou paradoxal é maior, assegura-se a reparação nervosa. Nas fases paradoxais, o sono é relativamente leve e pode ser perturbado por ruídos fracos, o que irá impedir ou entravar a reparação do sistema nervoso (...) como efeitos do ruído sobre a saúde em geral registram-se sintomas de grande fadiga, lassidão, fraqueza. O ritmo cardíaco acelera-se e a pressão arterial aumenta. Quanto ao sistema respiratório, pode-se registrar dispnéia e impressão de asfixia. No concernente ao aparelho digestivo, as glândulas encarregadas de fabricar ou de regular os elementos químicos fundamentais para o equilíbrio humano são afetados"1.

Em excelente estudo, Fernando Pimentel-Souza2 demonstra os efeitos que o ruído pode provocar em uma noite de sono:

"A perturbação pelo ruído é uma das mais críticas, porque o silêncio se faz necessário para o sono ocorrer na melhor qualidade, que garante as mais nobres funções, a pouco tempo desconhecidas. Caso contrário, mesmo dormindo, o organismo começa reagir gradualmente com seu alerta, e o indivíduo tende a acordar. A partir do valor médio de 30 dB(A), aparecem reações perturbadoras das vísceras, no EEG e da estrutura do sono. O ruído aumenta a duração dos estágios superficiais do sono, quase inúteis, enquanto o tempo total e os estágios necessários, MOR e estágios 3 e 4, se reduzem consideravelmente. O despertar costuma ocorrer mais devido aos picos de ruído, de 8 a 19 dB(A) sobre o nível de fundo. Quando o ruído do fundo atinge 65 dB(A), os reflexos protetores do ouvido médio parecem funcionar, anulando em parte função da audição e introduzindo insegurança pela diminuição da vigília auditiva, evidenciada pela maior demora para se pegar no sono. (...) A poluição sonora, consciente ou inconscientemente, piora significativamente a qualidade absoluta do sono, acarretando piores desempenhos físico, mental e psicológico".

Existem ainda estudos que indicam que a partir de certo nível de ruído a saúde dos fetos pode ser prejudicada. Verri, citando Niemtzow (1993), esclarece que "ruídos de 60 db a 80 db produzem estresse no concepto, e acima de 80 db são nocivos à saúde fetal"3.


4 – O CONDOMÍNIO EDILÍCIO:

O condomínio edilício apareceu primeiramente na Roma antiga, como ensina o Professor João Batista Lopes: "(...) alguns autores, apoiando-se em texto de Dionísio, admitem a possibilidade de os plebeus terem construído casas em comum, dividindo-as por andares"4. O festejado Caio Mário da Silva Pereira também discorre acerca do tema, ensinando que "não era, todavia, desconhecida em Roma a superposição habitacional: ao contrário, conhecida e praticada. Não era indiferente ao direito: ao revés, observada e disciplinada"5. Entretanto, a maioria dos autores parece acreditar que o condomínio edilício, como regulamentado atualmente, teve sua origem na França, no século XVIII.

O citado Caio Mário aduz que o acontecimento que precipitou o surgimento dos condomínios edilícios aconteceu "(...) em Rennes, em 1720, quando um grande incêndio destruiu parte da cidade e compelidos os habitantes a construírem casas de mais categoria, submetidas à planificação preordenada, adotaram com espontaneidade a elevação de edifícios de três e quatro andares, usados com autonomia"6.

A matéria era regulada pela Lei 4591/64, mas passou a ter sua disciplina estabelecida nos artigos 1331 a 1358 do Código Civil. O Professor Nelson Rosenvald ensina que:

"o condomínio edilício é um direito real que advém da combinação de outros dois direitos reais: a propriedade individual sobre as unidades autônomas (salas, lojas, apartamentos) e a co-propriedade sobre as partes comuns (terreno, telhado, corredores, fachada). Isto é, há uma verdadeira fusão entre propriedade particular e a propriedade comum, sendo impossível separar juridicamente esse complexo incindível"7.

Esclarecedora ainda a definição de Carlos Roberto Gonçalves, que ensina que:

"caracteriza-se o condomínio edilício pela apresentação de uma propriedade comum ao lado de uma propriedade privativa. Cada condômino é titular, com exclusividade, da unidade autônoma (apartamento, escritório, sala, loja, sobreloja, garagem) e titular de partes ideais das áreas comuns (terreno, estrutura do prédio, telhado, rede geral de distribuição de água, esgoto, gás e eletricidade, calefação e refrigeração centrais, corredores de acesso às unidades autônomas e ao logradouro público"8.

Nota-se, assim, uma grande interação entre as propriedades particulares, demonstrando a necessidade de que os vizinhos não abusem de seu direito sobre suas partes individuais em nome da coletividade do condomínio.


5 – COMPETÊNCIA:

A competência para regulamentar e fiscalizar a poluição sonora, nos termos do artigo 30, I e II da Constituição Federal, é atribuição dos municípios. Assim dispõe o referido artigo:

"Art. 30. Compete aos Municípios:

I - legislar sobre assuntos de interesse local;

II - suplementar a legislação federal e a estadual no que couber".

Assim, cabe aos municípios respeitar e cumprir as normas gerais emanadas pela União e pelo Estado, regulamentando os assuntos de interesse específico. Esse o entendimento defendido pela doutrina. Para Paulo Affonso Leme Machado, "deve o Município pesquisar a existência de normas federais e estaduais sobre poluição sonora, e, se existirem, exigir o cumprimento das mesmas. Pode o Município não só suplementar essas normas, com outras regras mais restritivas, como, no interesse local, inovar no campo normativo da poluição acústica"9.

Também discorrendo acerca do tema, Édis Milaré ensina que "importa ter em mente, ademais, que o controle de ruídos nocivos à saúde pública e ao conforto público, dado o seu caráter quase estritamente local, está mais afeto ao Poder Público municipal. Há casos específicos em que se requer a competência estadual; porém, a partir da legislação federal e da estadual, os Municípios podem, e devem, assumir sua parte no controle de ruídos"10.


6 – A FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE:

O direito de propriedade há muito não é um direito absoluto, devendo se submeter primordialmente ao interesse coletivo, como impõe a Constituição Federal, em seu artigo 5º, XXIII. Rocha (1992, p.71), citado por Oliveira e Theodoro11, discorre sobre o tema, afirmando que "a propriedade não pode atender tão-só ao interesse do indivíduo, egoisticamente considerado, mas também ao interesse comum, da coletividade da qual o titular do domínio faz parte integrante".

Nessa linha, o Ministro Celso de Mello, na ADI 2213, esclarece que "o direito de propriedade não se reveste de caráter absoluto, eis que, sobre ele, pesa grave hipoteca social, a significar que, descumprida a função social que lhe é inerente (CF, art. 5º, XXIII), legitimar-se-á a intervenção estatal na esfera dominial privada, observados, contudo, para esse efeito, os limites, as formas e os procedimentos fixados na própria Constituição da República".

Esses conceitos se aplicam plenamente ao condomínio edilício e às suas unidades autônomas, sendo que o fato de ser proprietário de um apartamento não permite o seu uso ou fruição à margem da lei ou em prejuízo da coletividade.

Assim, a função social da propriedade pode ser conceituada como o limite constitucional ao direito de propriedade imposto em benefício da coletividade.


7 – O CONDÔMINO ANTI-SOCIAL:

Anti-social é aquilo que é contrário à sociedade. O condomínio, por sua natureza, nada mais é que uma espécie de sociedade. Assim, o condômino anti-social é aquele que se comporta contrariamente ao interesse do condomínio. O Código Civil dispôs no parágrafo único do artigo 1337, de maneira inovadora, acerca do tema:

"O condômino ou possuidor que, por seu reiterado comportamento anti-social, gerar incompatibilidade de convivência com os demais condôminos ou possuidores, poderá ser constrangido a pagar multa correspondente ao décuplo do valor atribuído à contribuição para as despesas condominiais, até ulterior deliberação da assembléia".

Podem atentar contra o sossego do condomínio: festas, reformas em apartamentos, animais barulhentos, cultos religiosos, etc.

7.1 – FESTAS:

Um dos grandes motivos de discórdia entre vizinhos é, sem a menor dúvida, a utilização dos salões de festas dos prédios ou mesmo das unidades autônomas dos condôminos, para festas que invariavelmente se prolongam noite adentro e exageram no volume do som. Nessas hipóteses, a doutrina é unânime em conceder aos condôminos incomodados o direito requerido.

"Número do processo: TJMG 2.0000.00.516802-1/000(1)

EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. AÇÃO COMINATÓRIA. SALÃO DE EVENTOS. RUÍDOS EXCESSIVOS. FARTO AMPARO PROBATÓRIO. VEROSSIMILHANÇA. DIREITO DE VIZINHANÇA. RESPEITO AO SOSSEGO.

Havendo amplo respaldo probatório de que os ruídos oriundos da propriedade do agravado vêm causando perturbações ao sossego coletivo deve ser deferida a antecipação de tutela a fim de impedir a realização de eventos com música no local, área residencial, após as 22 horas. Instrução do processo com laudo técnico, boletins de ocorrência e fotografias que demonstram que os eventos são realizados em espaço aberto".

"Número do processo: TJMG 2.0000.00.509411-9/000(1)

APELAÇÃO CÍVEL N. 2.0000.00.509.411-9/000 - MATIAS BARBOSA - 24.11.2005 EMENTA: PROCESSO CIVIL. PROCURAÇÃO. AUSÊNCIA. IRREGULARIDADE SANÁVEL. INTELIGÊNCIA DO ART. 13, DO CPC. AÇÃO ANTECIPATÓRIA DE PROVAS. INAPLICABILIDADE DOS ART. 806 A 807, DO CPC. ASSISTENTE TÉCNICO. INTIMAÇÃO PESSOAL. PRESCINDIBILIDADE. DIREITO DE VIZINHANÇA. MAU USO DA PROPRIEDADE. LIMITAÇÃO - O art. 13 do Código de Processo Civil, em homenagem aos princípios da economia e celeridade processual, assegura a abertura de prazo razoável para o afastamento de vícios presentes na representação dos litigantes, não se podendo aplicar as penalidades previstas no aludido artigo sem antes oportunizar à parte o suprimento da irregularidade. - O objetivo da ação antecipatória é assegurar a prova, com efeito meramente conservativo, para utilização em ação principal, não ficando sujeita à caducidade disposta nos arts. 806 e 808 , e seus incisos, do CPC, sendo certo que o contrário atentaria contra o próprio objetivo do instituto. - O assistente técnico é considerado mero assessor da parte, sendo desnecessária a sua intimação, cabendo à parte diligenciar no sentido de garantir a participação de seus respectivos assistentes nos trabalhos periciais. - A plenitude do domínio a que se refere o art. 1.228 do Código Civil tende a diminuir e ser restringida, na medida em que, na utilização abusiva do seu direito, o proprietário provoca interferências na vizinhança, prejudicando a segurança e a saúde dos vizinhos, como na perturbação do sossego noturno com festas excessivamente ruidosas. - O art. 554 do Código Civil de 1916, atual 1.277, vem para regular as limitações impostas ao direito da propriedade, no interesse social de harmonização dos interesses particulares e de pacificação dos conflitos derivados da proximidade das propriedades imóveis.".

7.2 – ANIMAIS:

Mais um ponto de grande discórdia é aquele referente à presença de animais nos apartamentos. É cada vez maior o número de pessoas que possuem animais de estimação nas unidades residenciais, sendo que em grande parte dos condomínios há restrição à presença dos mesmos. Entretanto, a jurisprudência têm entendido que a convenção condominial ou o regimento interno do condomínio não prevalecem sobre o Código Civil, que permite a propriedade de animais de estimação. Outrossim, como salientado alhures, não há direitos absolutos, e esse direito cede espaço ao sossego dos moradores sempre que os animais existentes no condomínio sejam prejudiciais à coletividade, por meio de barulhos incômodos ou por meio do perigo que trazem às pessoas. A jurisprudência é cheia de decisões a respeito:

"Direito de vizinhança. Condomínio. Poluição sonora. Manutenção pelo autor, em seu apartamento, de ave cujo canto é de tonalidade irritante. Caraterização de ruído excessivo anormal e insuportável. Proibição pela convenção do condomínio de animais irritantes. Cominatória procedente. Recurso desprovido" (Ap. 396.348-2, 8ª Câm. do 1º TACSP, j. 21.12.88, rel. Toledo Silva, v.u., JTACSP-RT 117/43)".

"Condomínio - Cão mantido em apartamento. Transtorno, desassossego e apreensão a outros condôminos - Ação cominatória procedente - Recurso improvido. Ainda que a existência de cláusula na convenção de condomínio, ou em regulamento, proibindo a manutenção de animais nas unidades autônomas, por si só, não seja suficiente para impedir o condômino de tê-los consigo, desde que a permanência do animal acarreta transtorno, desassossego e apreensão a outros moradores do edifício, impõe-se a sua retirada (STJ - Decisão 07.04.1992 Processo: REsp. 12.166; ano 91; RJ; 4.a T.)".

"Agravo de Instrumento 1137321003

Comarca: F.D. PAULÍNIA/CAMPINAS

Ementa: AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO DE VIZINHANÇA. COMINATÓRIA. USO ANORMAL DA PROPRIEDADE. Os latidos atingiram níveis de pressão sonora superiores ao permitido em lei, devendo o cachorro ser retirado das dependências da residência do agravante. Decisão mantida. Recurso improvido".

"Número do processo: TJMG 2.0000.00.488929-4/000(1)

AÇÃO COMINATÓRIA - CONDOMÍNIO - CRIAÇÃO DE ANIMAL EM APARTAMENTO - AUSÊNCIA DE PROVA DA PERTURBAÇÃO AO SOSSEGO, SAÚDE E SEGURANÇA DOS DEMAIS CONDÔMINOS - PROIBIÇÃO CONTIDA EM NORMA INTERNA - INAPLICABILIDADE. - O condomínio pode estabelecer regras limitativas do direito de vizinhança, conforme autoriza a Lei 4591/64. - A regra interna do Condomínio que proíbe a criação de animais deve ser interpretada teleologicamente, apenas se aplicando quando restar demonstrado que está ocorrendo perturbação ao sossego, saúde e segurança dos demais moradores. - Inexistindo provas de que tais danos estão ocorrendo, permite-se a criação dos animais, não se justificando a aplicação de qualquer penalidade por esse motivo".

"Número do processo: TJMG 1.0079.05.230150-8/001(1)

APELAÇÃO CIVIL. AÇÃO COMINATÓRIA. CONDOMÍNIO. CRIAÇÃO DE ANIMAL EM APARTAMENTO. VEDAÇÃO. REGULAMENTO INTERNO. INAPLICABILIDADE. AUSÊNCIA DE DANOS AOS MORADORES. 1 - Para que prevaleça a proibição inserida no regulamento do condomínio quanto à manutenção de animais no edifício, há de ser demonstrado o efetivo prejuízo à saúde e à segurança dos demais moradores. 2 - No caso dos autos, os cachorros dos réus são animais de pequeno porte e inofensivos, a saber, poodle e pincher, de forma que sua permanência no interior do apartamento não ocasiona incômodo ou perigo aos condôminos. V.v. Há que se aplicar as limitações contidas em Convenção e Regulamento Interno, diante do incômodo ou perturbação à saúde, sossego e segurança dos demais condôminos".

"Número do processo: TJMG 1.0024.06.118830-6/001(1)

Data da Publicação: 01/03/2008

AÇÃO DECLARATÓRIA - CRIAÇÃO DE ANIMAL EM APARTAMENTO - AUSÊNCIA DE PROVA DA PERTURBAÇÃO AO SOSSEGO, SAÚDE E SEGURANÇA DOS DEMAIS CONDÔMINOS - PROIBIÇÃO CONTIDA EM NORMA INTERNA - INAPLICABILIDADE. Para que prevaleça a proibição inserida no regulamento do condomínio quanto à manutenção de animais no edifício, há de ser demonstrado o efetivo prejuízo à saúde e à segurança dos demais moradores".

7.3 – REFORMAS:

As reformas das unidades autônomas invariavelmente perturbam o sossego dos demais moradores. Em algumas hipóteses voluptuárias, para embelezamento, em outras oportunidades necessárias ou úteis. Mas sempre incômodas aos vizinhos. Entretanto, desde que dentro dos limites do razoável e do tolerável, não adentrando em horários noturnos nem nos finais de semana, deve ser tolerado pelos vizinhos.

"É evidente que qualquer reforma de imóvel para que se realize, produzirá ruídos. Na hipótese, não se verificou o abuso de direito do proprietário do apartamento em reforma, que realizava as obras apenas nos dias de semana e em horários compreendidos entre as 08:00 e 17:00 horas, fato incontroverso. Os ruídos são inevitáveis e para que se estabeleça relações harmoniosas entre vizinhos é necessário que haja reciprocidade e tolerância mútuas. Os transtornos decorrentes da obra (também suportados pela ré) não ultrapassaram os limites do suportável, decorrente da situação normal que envolve relações de vizinhança, em especial, em condomínio de apartamentos. (1ª Câm. do 2º TACSP, 14/12/99)".

7.4 – BARES E CASAS NOTURNAS:

Os barulhos e as algazarras existentes em bares e casas noturnas também são alcançadas pela proteção do sossego. O Tribunal de Justiça de Minas Gerais teve a oportunidade de decidir sobre o tema:

"Número do processo: TJMG 1.0042.05.012012-2/001(1)

AGRAVO - POLUIÇÃO SONORA - BAR - PROVA. O sossego público é um direito natural e sua proteção tem sido preocupação do mundo civilizado. Com efeito, a liberdade de causar barulho (som mecânico e shows em bar) deve cessar quando provada a perturbação à tranqüilidade alheia".

7.5 – CULTOS:

Os cultos são protegidos constitucionalmente, com previsão no artigo 5º, VI:

"VI - é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias".

Entretanto, são várias as reclamações de perturbação do sossego por realização de cultos em residências e em espaços religiosos. Como fazer para conciliar a proteção ao livre exercício dos cultos religiosos e a proteção ao sossego, também prevista constitucionalmente, pelo artigo 182?

Como todo direito, o direito ao livre exercício do culto religioso não é absoluto. O Professor Alexandre de Moraes12 ensina que "a Constituição Federal assegura o livre exercício do culto religioso, enquanto não for contrário à ordem, tranqüilidade e sossego públicos, bem como compatível com os bons costumes". E continua, alegando que "obviamente, assim como as demais liberdades públicas, também a liberdade religiosa não atinge grau absoluto".

Esse o entendimento da jurisprudência:

"Direito de vizinhança. Mau uso da propriedade. Poluição sonora. Constitui violação do direito de vizinhança o mau uso da propriedade advindo do excesso de barulho produzido por manifestações religiosas, no interior de templo, causando perturbações aos moradores de prédios vizinhos, devendo o infrator instalar revestimento acústico para evitar que o som se propague, sob pena de sujeitar-se a indenização (Ap. 00542690-0/00, 6ª Câm. do TAMG, j. 15.10.90, rel. Herculano Rodrigues, RJTAMG 41/257, tb. pub. in DJ 15.10.90)".

7.6 – ÁREAS DE LAZER:

A jurisprudência, ao analisar ruído excessivo emanado de áreas de lazer, como quadras de esporte e playgrounds, assim tem se manifestado:

"Ruídos excessivos oriundos de utilização de quadra de esportes. Anormalidade do uso, que se caracteriza ante a prevalente destinação do imóvel à habitação, a exigir condições mínimas de segurança, saúde e tranquilidade (artigo 554 do Código Civil). Inexistência de prevalente interesse na utilização da quadra por outros condôminos para fins de entretenimento. Sentença que determinou a realização de obras de revestimento acústico, visando reduzir os ruídos. Inocorrência de precedente direito à utilização da quadra, sem aquelas precauções, apenas porque foi aprovada no projeto do obras e divulgada no lançamento do edifício (Ap. 3709/95, 5ª Câm. do TARJ, j. 20.12.95, rel. Luiz Roldão de F. Gomes, v.u.)".

"Direito de vizinhança. Uso nocivo da propriedade. Perturbação do sossego. Excesso de barulho. Caracterização. Aplicação do art. 554 do Código Civil. Tendo sido provado haver barulho na quadra de esportes superior ao permitido, ficou configurado o uso nocivo da propriedade, nos moldes do art. 554 do Código Civil" (Ap. s/rev. 516.579, 6ª Câm. do 2º TACSP, j. 27.5.98, rel. Luiz de Lorenzi, JTACSP-Lex 173/480). Consta da pub. o seguinte julgado no mesmo sentido: Ap. s/rev. 529.243, 1ª Câm. do 2º TACSP, j. 27.10.98, rel. Luiz de Lorenzi, JTACSP-Lex 174/550 – quanto a pequena indústria, ruídos acima dos limites legais".

7.7 – CONDÔMINO NOCIVO E SUA EXCLUSÃO:

Ponto de grande divergência doutrinária, parte da doutrina entende que, por mais que possa causar constrangimentos e brigas no condomínio, os condôminos nocivos devem ser sancionados sempre com multa. Tartuce, após admitir que por ausência de previsão legal, não há consenso acerca da exclusão do condômino anti-social, entende que:

"O Código Civil não traz a possibilidade expressa de expulsão do "condômino anti-social", tese defendida por parte da doutrina e com a qual não concordamos, por violar o princípio de proteção da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, CF/88) e a solidariedade social (art. 3º, I, CF/88). Assim,  para nós,  haveria nesse posicionamento violação a preceito máximo, de ordem pública, sob o prisma "civil-constitucional".  As sanções pecuniárias, antes visualizadas,  existem para ser aplicadas. Mais do que isso seria incompatível com a tendência de valorização da pessoa e da sua dignidade"13.

Para outra parte, caberia a exclusão do condômino anti-social agressivo em prol da segurança e da tranquilidade do condomínio. Nessa linha, Franceschet (2007) citando Venosa (2002) ensina que:

"Verifica-se, portanto, que as multas podem atingir valores elevados. Contudo, haverá situações que nem mesmo essa imposição será suficiente para extirpar o problema da vida condominial. Note que essas punições podem atingir não apenas o condômino, em sentido estrito, como qualquer possuidor da unidade, não importando a que título seja essa posse ou mera detenção. Nota-se que o legislador do novo código chegou muito próximo, mas não ousou admitir expressamente a possibilidade de que o condômino ou assemelhado seja impedido definitivamente ou por certo prazo de utilizar a sua unidade. Não temos dúvida, porém, tendo em vista o sentido social do direito de propriedade que ora se decanta na legislação, que essa solução pode e deve ser tomada pela assembléia geral em casos extremos. É de se perguntar se deve o condomínio suportar em suas dependências a presença de um baderneiro contumaz ou de um traficante de drogas. É evidente que a futura jurisprudência deve atentar para essas circunstâncias. Esse é apenas um dos aspectos, dentre tantas questões que afloram quotidianamente no direito condominial." (Publicado no Valor Econômico de 19/02/2002, p. E2)"14.

Outrossim, as duas correntes entendem que pela inexistência de previsão legal, caberá ao juiz, em cada caso concreto, decidir pela exclusão do condômino anti-social. E a jurisprudência majoritária entende que, pela ausência de previsão legal, inexiste a possibilidade de exclusão do condômino anti-social. Criticamos essa linha de decisões, baseado no entendimento de que em inúmeras hipóteses a aplicação de multas não tem o condão de inibir ou impedir o reiterado comportamento anti-social de algumas pessoas. E esse pensamento está bem expressado por Ruggiero (1997), citado por Moraes (2004):

"O suplício imposto aos moradores pelo mau uso, sobretudo quando convivem com vizinhos nocivos, escandalosos, imorais, barulhentos, desrespeitosos e loucos, vai continuar, se esse mau vizinho for rico. Em todos os países que cultivam o respeito ao se humano, sobrepujando-o ao da santíssima propriedade, o morador de conduta nociva é desalojado, seja ele proprietário ou não. O projeto foi sensível ao problema, mas adotou solução elitista: o condômino, ou possuidor, que, por causa do seu reiterado comportamento anti-social, tornar insuportável a moradia dos demais possuidores ou a convivência com eles poderá ser constrangido a pagar multa correspondente ao décuplo de suas contribuições. Então, aquela ‘insuportável convivência’, ditada pelo reiterado comportamento anti-social, passará a ser suportável, com o pagamento do décuplo das contribuições condominiais. Assim, a suportabilidade ou insuportabilidade será uma questão de preço. A multa tornará suportável o que era insuportável"15.


8 – EXCESSO DE SENSIBILIDADE:

O excesso de sensibilidade pode ser conceituado como sendo o sentimento de incômodo exagerado demonstrado por alguém diante de situações que a população média consideraria como de incômodo ínfimo ou irrelevante.

Ao analisar esse tema, Manoel Carlos da Costa Leite informa que "já tem a jurisprudência decidido que ficará a critério do juiz a apreciação de cada caso de perturbação, quer do trabalho, quer do sossego, não se devendo levar em conta o excesso de suscetibilidade do queixoso, mas sim a sensibilidade média dos cidadãos"16. Assim, as reclamações exageradas de condômino sobre determinado ruído não devem prosperar, se provenientes de uma sensibilidade exacerbada, que não seja compartilhada pelos demais condôminos afetos ao mesmo ruído.


9 – A LEGISLAÇÃO REGULADORA:

São várias as normas que regulamentam a proteção do sossego. O Código Civil obriga o morador a não utilizar seu imóvel de maneira prejudicial ao sossego, salubridade e segurança dos demais, sob pena de multa. O parágrafo único do artigo 1337 dispõe que o condômino ou possuidor que, por seu reiterado comportamento anti-social, gerar incompatibilidade de convivência com os demais condôminos ou possuidores, poderá ser constrangido a pagar multa correspondente ao décuplo do valor atribuído à contribuição para as despesas condominiais, até ulterior deliberação da assembléia.

A Lei 9.605/98 prevê no artigo 54 a pena de reclusão de um a quatro anos, e multa para quem causar qualquer tipo de poluição que resulte ou possa resultar em danos à saúde humana. A Lei das Contravenções Penais considera contravenção:

"Art. 42. Perturbar alguém o trabalho ou o sossego alheios:

I – com gritaria ou algazarra;

II – exercendo profissão incômoda ou ruidosa, em desacordo com as prescrições legais;

III – abusando de instrumentos sonoros ou sinais acústicos;

IV – provocando ou não procurando impedir barulho produzido por animal de que tem a guarda:

Pena – prisão simples, de quinze dias a três meses, ou multa, de duzentos mil réis a dois contos de réis".

As leis municipais também cumprem papel importante na proteção do sossego. Como exemplo, a Lei 0071/48 do Município de Belo Horizonte estabelece no artigo 2º, exemplificativamente, os ruídos e sons que podem incomodar:

"Constitui infração da presente lei todo e qualquer som, que, pela duração ou estridência, perturbe o sossêgo público, após as 22 horas, e os excessos, a qualquer tempo, especialmente os provenientes :

a) de motores de explosão desprovidos de abafadores eficientes, bem como de escapamentos abertos;

b) de buzinas, claxons, tímpanos, campainhas ou quaisquer outros aparelhos de alerta, propaganda ou chamada ;

c) de matracas, cornetas e outros instrumentos de convite dos negociantes a ambulantes ;

d) de bandas, tambores, fanfarras e alto-falantes destinados a propaganda e, quando instalados em veículos, não poderão funcionar em qualquer local da cidade depois das 20 horas e antes das 7 horas da manhã.

e) de alto-falantes, rádios, gramofones, radiolas e aparelhos congêneres, seja qual fôr o objetivo do seu emprêgo, mesmo diversão doméstica, desde que se façam ouvir fóra do recinto onde se acham;

f) de morteiros, bombas, rojões, foguetes e fogos ruidosos em geral;

g) de apitos, sereias, máquinas e motores que se escutem fora dos respectivos recintos ;

h) de cães, pássaros e outros animais que incomodem a vizinhança;

i) de anúncios ou pregões em voz estridente.

Parágrafo único - Fica terminantemente proibido o uso de businas em frente aos estabelecimentos hospitalares e nas suas imediações.".

Interessante notar que a lei proíbe todo e qualquer som que perturbe o sossego após as 22h, mas proíbe ainda os sons produzidos antes desse horário, se incômodos. Assim, mesmo antes das 22h não é permitido barulho além de uma intensidade aceitável, como muitos pensam. O que deve-se levar em conta é o grau do incômodo e não o horário em que se realiza.

Há, ainda, a NBR 10151/2000 da ABNT, que avalia o nível de ruído em áreas habitadas para o conforto da comunidade. A referida norma define como limite para a área urbana estritamente residencial 50 dB (A) durante o dia e 45 dB (A) durante a noite, e nas áreas mistas predominantemente residenciais sobe para 55 dB (A) durante o dia e 50 dB (A) durante a noite.

Em seu estudo, PIMENTEL-SOUZA17 esclarece quais os níveis de ruído seriam ideais para uma noite agradável de sono:

"já em 1981, Vallet (1982) demonstrou que um índice da qualidade fisiológica para o sono, combinando o tempo total de sono, duração de estágios profundos III, IV e V e tempo passado despertado, só era preservado abaixo de nível médio de 40 dB(A) para ruído de trânsito. Juntando-se ao incômodo e mudanças de estágios por ruído de vôos de aviões este valor caia para 35 dB(A) Vallet (1982), dando origem à primeira recomendação da OMS de que o nível médio (Leq) de ruído para sono de qualidade deveria ser no máximo de 35 dB(A) (WHO, 1980). (...) Pesquisas mais recentes revistas para a OMS chegaram à conclusão que os níveis de ruído nos quartos de dormir deveriam ser ainda 5 dB(A) mais baixos em relação à recomendação anterior, portanto média de 30 dB(A), valor contínuo, e máximo de 45 dB(A) de pico (Bergland & Lindvall, 1995), baseados em trabalhos como de Terzano et al (1990). Estes são valores que deveriam servir de referência para a jurisprudência do código civil, direito de propriedade, das leis de contravenções penais e ambiental no Brasil, para garantir ao cidadão o direito à tranqüilidade no lazer e no trabalho (Muller, 1956; Oliveira, 1995) e para estabelecimento de legislação municipal pertinente e normas expedidas pelo IBAMA, introduzindo conseqüências punitivas intermediárias, como multas crescentes, para garantir recuperação física, mental e psicológica, condições necessárias para potenciar devidamente a capacidade do cidadão para o trabalho moderno."

Alguns ruídos cotidianos foram medidos por Armando Paiva de Lacerda18, que encontrou: Voz segredada - 10 a 20 db ; Murmúrio - 20 a 30 db; Conversação corrente - 50 a 60 db; Barulho de rua - 50 a 70 db; Trânsito intenso - 80 a 90 db.

No Brasil, os condôminos anti-sociais estão propensos apenas a multas, punição irrelevante e sem força educativa, principalmente para os mais abastados. O Professor João Batista Lopes se posiciona favorável a punições mais severas aos condôminos anti-sociais. Ele argumenta que "(...) seria cogitável a inserção de disposições mais rigorosas, a exemplo do que ocorre em outros países, pondo os condôminos a salvo da presença indesejável de indivíduos nocivos à tranquilidade geral"19.

Para Ivan de Hugo Silva, "havendo utilização da unidade para fim diverso do previsto, sendo usada de forma nociva ou perigosa ao sossego, salubridade e a segurança dos demais condôminos, tanto o proprietário quanto o inquilino podem impedir a violação com força no disposto do artigo 554, do código civil. A ação a ser intentada é sumaríssima, com amparo na letra j, do inciso II, do artigo 275, combinado com o artigo 287, do código de processo civil"20.

O CPC não prevê mais a alínea "j" no inciso II do artigo 275, mas o pedido de antecipação de tutela que reza o artigo 287 tem aplicação às hipóteses de uso nocivo da propriedade do condômino, juntamente com o artigo 461, §§ 4º e 5º, que dispõem que o juiz pode impor multa diária em hipótese de descumprimento da tutela antecipada e poderá, de ofício ou a requerimento, determinar as medidas necessárias ao seu cumprimento, tais como a imposição de multa por tempo de atraso, busca e apreensão, remoção de pessoas e coisas, desfazimento de obras e impedimento de atividade nociva, se necessário com requisição de força policial.


10 – AS SANÇÕES NO DIREITO ESTRANGEIRO:

O direito estrangeiro é mais profícuo que o brasileiro no que tange à punição ao condômino anti-social. A legislação argentina permite o sequestro dos apartamentos cujos titulares procedam de forma nociva, por até 20 dias. Entretanto, essa sanção apenas se aplica ao inquilino, e não ao proprietário. No Uruguai, a lei 10751/64 autoriza o despejo dos ocupantes nocivos, mas também apenas dos inquilinos. A legislação suíça permite a exclusão do condômino autor de faltas graves e a venda judicial da sua unidade, no artigo 649 do Código Civil. É essa também a posição da lei alemã, que permite a venda compulsória do apartamento pertencente ao condômino nocivo.

A lei mexicana admite que o condômino que descumpra reiteradamente suas obrigações seja obrigado a alienar seu apartamento em hasta pública, com preferência da aquisição pelos demais condôminos. A Lei 6071/63 do Chile dispõe no artigo 51 que o condômino pode pleitear em juízo o arresto do apartamento pelo prazo de 15 dias, e assim sucessivamente, enquanto perdurar o comportamento prejudicial à tranquilidade dos demais moradores.

O doutrinador Nascimento Franco informa ainda que, na Europa e nos Estados Unidos, tem-se admitido que a ocupação de um apartamento seja condicionada à aprovação prévia da maioria dos condôminos21.


11 – CONCLUSÃO:

A prática tem demonstrado que as sanções existentes no direito brasileiro não tem surtido os efeitos desejados pela população. Os condôminos reiteradamente anti-sociais não são intimidados pela sanção prevista no Código Civil, usando as unidades autônomas e as unidades comuns ao seu alvedrio. Entendemos que, ao menos quanto aos condôminos não proprietários, deva ser pensada com mais atenção a possibilidade de inclusão de previsão legal de sua exclusão do condomínio, respeitada a ampla defesa e o contraditório. Quanto aos condôminos proprietários, entendemos que, ainda que não possam ser excluídos do condomínio, devem ter alguns de seus direitos de propriedade restringidos, em hipóteses nas quais se perceba que reiteradamente exponham os demais condôminos a risco de vida, integridade física ou saúde. Entender de outra maneira seria privilegiar a mantença da cizânia em detrimento da harmonia da coletividade.


NOTAS BIBLIOGRÁFICAS:

1 - MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. Malheiros Editores. 8. ed. São Paulo: 2000. p. 596-597.

2 - PIMENTEL-SOUZA, Fernando. Efeitos do ruído no homem dormindo e acordado. XIX ESBA, SOBRAC, 2000, Belo Horizonte.

3 - NIEMTZOW, RC. - Loud Noise and Pregancy. Military Medicine,

Association of Military Surgeons of U.S, 1993, vol 158 apud FERRI, Giovana. A gestante exposta ao ruído: efeitos auditivos para o feto. 1999. 35f. Dissertação (Especialização em Audiologia Clínica) – Centro de Especialização em Fonoaudiologia Clínica, Porto Alegre, 1999.

4 – LOPES, João Batista. Condomínio. Editora RT. 5. ed. São Paulo: 1996. p. 21.

5 – PEREIRA, Caio Mário da Silva. Condomínio e Incorporações. Editora Forense. 10. ed. Rio de Janeiro: 1997. p. 60.

6 – PEREIRA. op. cit., p. 62.

7 – ROSENVALD, Nelson. Direitos Reais. Lumen Juris. 3. ed. Rio de Janeiro: 2006. p. 509-510.

8 – GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: Direito das Coisas. vol. V. São Paulo: 2006. p. 370.

9 - MACHADO. op. cit. p. 374.

10 - MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente. Editora RT. 4. ed. São Paulo: 2005. p. 468.

11 - ROCHA, Olavo Acyr de Lima. A desapropriação no direito agrário. São Paulo: Atlas, 1992. p. 72 apud OLIVEIRA, Gustavo Paschoal Teixeira de Castro; THEODORO, Silvia Kellen da Silva. A evolução da função social da propriedade. Encontrado em: <http://www.revistajuridicaunicoc.com.br/midia/arquivos/ArquivoID_16.pdf>. Acesso em: 08 maio. 2008.

12 - MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. Editora Atlas, 19. ed., São Paulo: 2006, p. 42.

13 – TARTUCE, Flávio. Das penalidades no condomínio edilício. Análise das inovações do Código Civil de 2002. Encontrado em <http://www.flaviotartuce.adv.br/secoes/artigos.asp>. Acesso em 08 de maio de 2008.

14 – VENOSA, Silvio de Salvo. Revista Valor Econômico. 19/02/2002. p. E2 apud FRANCESCHET, Júlio. O condomínio edilício sob a perspectiva civil constitucional.Revista Eletrônica da Faculdade Metodista Granbery. n.3. Jul-dez. 2007.

15 - RUGGIERO, Antonio Biasi. Questões imobiliárias. São Paulo: Saraiva, 1997, p. 90 apud SOARES, Deise Mara. Direito de vizinhança e comportamento anti-social . Jus Navigandi, Teresina, ano 9, n. 654, 22 abr. 2005. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/6584>. Acesso em: 12 maio 2008.

16 - LEITE, Manoel Carvalho da Costa. Manual das Contravenções Penais. Editora Saraiva. São Paulo: 1962, p.166.

17 - PIMENTEL-SOUZA. Op. Cit.

18 – LACERDA, Armando Paiva de. O ruído e seus efeitos nocivos sobre o organismo humano. Revista Brasileira de Otorrinolaringologia, v.37, 3.ed., set-dez, 1971.

19 – LOPES. op. cit., p. 159.

20 – SILVA, Ivan de Hugo. Comentários à lei de condomínio em edificações. AIDE, São Paulo. 1987.

21 – FRANCO, J. Nascimento. Condomínio. Editora RT, 3. ed. São Paulo: 2001. p. 199.


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVA, André Pataro Myrrha de Paula e. A proteção jurídica do sossego no condomínio edilício. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2807, 9 mar. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/18647. Acesso em: 6 maio 2024.