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"Nada sobre nós, sem nós": a participação como fundamento nas políticas públicas para pessoas com deficiência

"Nada sobre nós, sem nós": a participação como fundamento nas políticas públicas para pessoas com deficiência

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Resumo

Este trabalho relaciona a construção histórica em que se forjou a luta das pessoas com deficiência para se colocarem como agentes políticos no Estado, inclusive pautando, construindo e realizando políticas públicas. Por meio de uma revisão histórico-social, agregamos conteúdos analíticos de cunho sociológico e jurídico para conectar a participação das pessoas com deficiência como princípio fundamental em um Estado, dito democrático e de direito, que deve ter como parâmetros, dentre outros, a garantia da instrumentalização orgânica das instituições como também a institucionalização da diversidade cultural que conforma a sociedade, fazendo do Estado o espelho da sociedade multicultural.

Abstract

This work would relate to historical building that was forged in the struggle of disabled people to place themselves as political agents in the state, including guiding, building and implementing public policies. Through a socio-historical review, aggregate content from a sociological and analytical framework for connecting the participation of disabled people as a fundamental principle in a state called democratic and law, that must have its parameters, among others, ensuring organic instrumentation institutions as well as the institutionalization of cultural diversity that shapes the society, making the state the mirror of the multicultural society.

SUMÁRIO: 1. Introdução 2. A participação como componente principiológico para as políticas das pessoas com deficiência 3. A participação da pessoa com deficiência e a institucionalidade jurídico-constitucional no Estado. 4. Multiculturalidade no Estado, globalização e os desafios à participação das pessoas com deficiência. 5. Considerações finais: da inclusão a participação. 6. Referências bibliográficas.

Palavras chaves

Pessoa com deficiência – Participação – Princípio – Direitos Fundamentais – Multiculturalidade.

Key words

People with disabilities - Participation - Principle - Fundamental Rights - Multiculturalism.


1.INTRODUÇÃO

Nunca foi tão significativo e necessário evidenciar, sobretudo em se tratando de pessoas com deficiência, o elemento participação na construção de políticas públicas. A relevância se dá não somente por conta do conteúdo valorativo e democrático comum na atualidade que pressupõe uma democracia participativa, ampla, irrestrita e nivelada, mas para o segmento das pessoas com deficiência, ainda reforçado pelos argumentos biomédicos que fizeram recrudescer preconceitos pelo paradigma da cultura da normalidade.

A deficiência traduzia a opressão do corpo pelo entendimento de não normalidade pela falta de padrão com a produtividade e adequação às normas sociais (DINIZ, BARBOSA, SANTOS, 2009, p. 65). Nesta perspectiva, obviamente, a pessoa com deficiência era excluída da participação na vida política e pública no Estado pela compreensão da deficiência como limitação intelectual, além do conteúdo moral de inadequação aos modelos ditos normais de funcionamento da espécie humana.

O conteúdo axiológico que traz o tema "Nada sobre nós sem nós", definido em 2004, por ocasião das celebrações do Dia Internacional das Pessoas com Deficiência, remete a essa discussão, não mais biomédica, mas necessariamente de conteúdo político que está contido nas barreiras atitudinais impostas ao segmento das pessoas com deficiência. As privações ou impedimentos, além de não serem desvantagens naturais, como historicamente foram construídas e propagadas, também são imposições de desigualdade e opressão que restringem a participação efetiva pelas barreiras sociais. Então, não somente é incondicional a participação plena por todos os canais institucionais existentes, como também ao invés de se falar políticas para pessoas com deficiência, exige-se a uma nova concepção para ampliar o conteúdo da participação para além de ser parte, também tomar parte, introduzindo nova gramática participativa, avançando para construção de políticas de pessoa com deficiência.

As limitações impostas pelo cotidiano em todos os setores da vida de uma pessoa com deficiência são evidentes e mobilizaram muitas investidas que resultaram em processos vitoriosos para o segmento em termos de políticas para o trabalho, emprego e renda, acessibilidade e mobilidade, saúde, educação, previdência e assistência social. Todavia, os impedimentos e barreiras sociais que reforçam o argumento de opressão são ainda inquietantes para formulação de políticas públicas e sociais (DINIZ, 2007, p. 11). A deficiência é um estado de limitação importante de ordem física, sensorial ou mental e se distingue de incapacidade, que pode ser uma consequência da deficiência (ver, ouvir, locomover), mas não a incapacidade uma limitação absoluta, pois outras atividades são realizáveis.

A cultura da normalidade que tanto se sustentou em critérios biomédicos, não teve somente nestes a sustentação da questão fundamental que era estabelecer o modelo de adequação social, mas reforçando a diferenciação pelo estranhamento do outro. Ou seja, o padrão era sempre o homogêneo, de modo que garantisse, com isso, a estabilidade social adequada a determinados interesses. Então, a questão fundamental é de conteúdo político na medida em que havia interesses a serem protegidos, ou privilegiados, necessariamente, utilizando as instituições estatais.

Desse modo, todas as instituições e representações sociais e simbólicas estavam a serviço de tais interesses. Portanto, para defesa desse status quo, a religião, a educação, a ciência de modo geral, e a cultura foram fundamentais para reforçar a desigualdade sobre o tema pessoa com deficiência, não permitindo a politização de tal questão. A diversidade social, a pluralidade de indivíduos, grupos e outros coletivos articulados por quaisquer movimentos (ideológicos, políticos, étnicos, religiosos, culturais) demonstram que multiculturalidade, traz dinamismo e reforça que as diferenças são a base de legitimação e aplicabilidade da igualdade; igualdade esta compreendida em conteúdos formais, materiais e de reconhecimento (aplicação), notadamente na esfera político-institucional e jurídica.

Por óbvio, ordenada enquanto política pública, o Estado é agente crucial na consecução dos programas, projetos e ações que pautam a agenda da pessoa com deficiência. Compreendido na sua essência para contemplar todas as expressões vigentes na sociedade, o Estado, por vezes, não somente impediu a expressão do multicultural, do diverso, como também, como também reforçou estigmas, preconceitos a pretexto de universalizar a ação estatal, na verdade, reprimindo a heterogeneidade de uma sociedade e aniquilando a diversidade cultural com a uniformização da população (QUADROS, 2009, p. 2).

Não à toa, quando remontamos a luta histórica pelos direitos humanos, nas suas várias dimensões, o Estado ocupa lugar, ora como promotor, ora como repressor. Tanto que na referência para assegurar os direitos civis, sobretudo no Estado Liberal, se diz também que são liberdades em relação ao Estado, uma postura não impeditiva deste. Sobre os direitos políticos, seriam as garantias de participação no Estado; liberdades no Estado, exercidas neste e, finalmente, na realização dos direitos econômicos, sociais e culturais, seriam liberdades por meio do Estado, ou seja, realizadas pelo Estado (SANTOS, 2003, p. 115).

Portanto, para que reflita a diversidade social e seja reflexo de todas as expressões, representações e modos de vida, o Estado deve ser a expressão da multiculturalidade, do heterogêneo, da diferença e, nessa perspectiva, deve se estruturar com instituições, órgãos e serviços que garantam esta diversidade. No caso da pessoa com deficiência, a diferença é o elemento de conexão social, pois não se busca um mundo a parte, exclusivo, específico, ao contrário, busca-se compor este mundo em que o todo nada mais é que o conjunto de cada parte, que é sempre inteira. É dizer que a ideologia separatista muito consolidada e firmada na homogeneização por longos períodos torna-se inconcebível. É também compreender que não igualdade quando uma maioria, historicamente estabelecida, impõe suas práticas, valores, história, desconsiderando outros sujeitos, impondo-lhes uma cultura, uma história, que não as sua própria.

Assim, com este artigo procuramos relacionar a construção histórica em que se forjou a luta das pessoas com deficiência para se colocarem como agentes políticos no Estado, inclusive pautando, construindo e realizando políticas públicas. Por meio de uma revisão histórico-social, agregamos conteúdos analíticos de cunho sociológico e jurídico para conectar a participação das pessoas com deficiência como princípio fundamental em um Estado, dito democrático e de direito, que deve ter como parâmetros, dentre outros, a garantia da instrumentalização dessa democracia com as condições objetivas para sua concretização, como a repercussão de toda diversidade existente nas instituições que compõem este Estado.


2. A PARTICIPAÇÃO COMO COMPONENTE PRINCIPIOLÓGICO PARA AS POLÍTICAS DAS PESSOS COM DEFICIÊNCIA.

O contexto de democracia e suas facetas exigem do Estado a capacidade de agregar todas as expressões sociais, e neste sentido, toda a diversidade de interesses e desejos de seus membros. Esta complexidade requer instrumentos, e até mesmo certo grau de institucionalização que permitam atuar na perspectiva de solução de conflitos sociais, ou mesmo no encaminhamento adequado das diversas demandas e plurais interesses.

Temos, então, a partir de algumas premissas que compõem as políticas públicas, a inserção da participação ainda pendula ante as outras instituições e ainda se condiciona, ora como instrumento ou procedimento na atuação de um Governo, em alguma arena; nem sempre como uma política do Estado, ora como conceito, mas em uma perspectiva retórica, também pouco institucionalizada no Estado, mantendo-se ainda certa informalidade.

A própria Convenção sobre Direitos das Pessoas com Deficiência dá margem para uma concepção pouco enfática, que retira o preceito obrigatório da participação direta, fazendo crer que se trata de uma sugestão quando o Estado for deliberar sobre políticas para pessoas com deficiência. Diz a convenção que "considerando que as pessoas com deficiência devem ter a oportunidade de participar ativamente das decisões relativas a programas e políticas, inclusive aos que lhes dizem respeito diretamente" (ORGANIZAÇAO DAS NAÇOES UNIDAS - ONU, 2006, Preâmbulo, alínea o).

Ora, dizer que deve ser garantida a participação nas esferas decisórias, inclusive relativas às políticas e programas que se refiram às pessoas com deficiência, ainda mantém o entendimento de que são políticas para as pessoas com deficiência e, no caso, se possível, que estas pessoas também participem. Obviamente, há um equívoco, pois não se trata de uma concessão ou oportunidade, mas a participação dos próprios interessados é o fundamento da participação, ou seja, é o que motiva e legitima a deliberação sobre determinada política para as pessoas com deficiência.

Pelo enfoque principiológico, os conteúdos analítico-críticos do Direito são imprescindíveis, e também cruciais para uma sociedade complexa, sociedade esta de tradição positivista, que em maior medida requer que os direitos sejam expressos e garantidos nos textos constitucionais. Daí o inarredável itinerário jurídico e institucional dos direitos, do seu reconhecimento e de sua reivindicação.

A abordagem proposta envolve participação como princípio e, logo, como componente equivalente-democrático jurídico, político e social, o que exprime o status principiológico da participação e o insere de forma mais direta na esfera de produção e implementação de políticas públicas das pessoas com deficiência, pelas peculiaridades ora apresentadas .

Estes equivalente-democráticos consistem em componentes fundamentais que devem ser considerados desde o nascedouro de uma política pública. Assim, verificando todas as condicionantes que afetam a produção de uma política pública estes componentes são, em grande medida, critérios e variáveis, de início, de forte conteúdo político, o que também evidencia uma arena de disputas em que as relações de poder se evidenciam.

Então, resta à política, tida por Rua como o conjunto de procedimentos formais e informais que expressam relações de poder e que se destinam à resolução de conflitos quanto a bens públicos (RUA, 1997, p. 2), a função de instituição fundamental na consecução de políticas públicas.

Desenvolvendo um conceito preliminar de políticas públicas, a autora entende que decisão política, que é escolha entre várias alternativas adequando preferências conforme escala hierárquica é um componente na compreensão de política pública. Mas, nem toda decisão política se constitui como uma política pública e, assim, vemos que esta envolve a decisão política e outras diversas ações estratégicas alinhadas para implementar aquelas decisões políticas.

Embora não seja tão relevante, convém mencionar que a concepção de política pública aqui adotada diz respeito às atribuições dos órgãos estatais, ou seja, com conteúdo determinante e com agentes legal e legitimamente obrigados na sua consecução, que assegura a dimensão pública das políticas como imperativo, ou seja, como definições revestidas de autoridade soberana no poder público (RUA, 1997, p. 1).

Retomando o conceito de normalidade, a sociedade moderna se organiza utilizando tal conceito como característica inerente aos setores sociais dominantes que montam todo o sistema social, as representações, os símbolos de modo a garantir situação favorável (FOUCAULT, 2001, p. 37). Desse modo, a desqualificação de uma situação humana como "anormalidade" e sua aplicação ideológica ao longo da história têm limitado a vida de indivíduos e reduzido a efetiva realização das potencialidades humanas daqueles que desviam da "normalidade".

Obviamente, mesmo que assegurada a participação, enquanto mecanismo institucional previsto na Constituição ou em leis específicas, seus efeitos práticos se inserem mais em uma ordem programática, até mesmo burocrática, em geral disposta em espaços de pouco poder decisório, que uma referência basilar, isto é, que uma diretriz de exigência obrigatória.

A partir desta crítica, a inserção da participação como direito fundamental reconhecível juridicamente, e defensável em processo constitucional, pode lhe garantir efetividade de princípio, ou seja, orientação para ação, especialmente, na produção de políticas públicas.


3. A PARTICIPAÇÃO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA E A INSTITUCIONALIDADE JURÍDICO-CONSTITUCIONAL NO ESTADO.

De modo geral, a exploração teórica de princípios jurídicos e constitucionais tem sido objeto primeiro do Direito, sobretudo porque este é tido como instrumento de transformação social concreto, na medida em que é mais afeto às instâncias jurisdicionais, logo, dotado de força legal obrigatória, consubstanciada na produção legislativa a partir da interpretação produzida na prestação jurisdicional. Mas, isso não significa exclusividade, tendo em vista que também é espaço de produção e interpretação de leis, o Legislativo e o Executivo, tendo aquele como função precípua e este como orientação administrativa na implantação de políticas públicas, respectivamente.

Há quem entenda que há uma pedagogia no próprio processo constitucional por ser este um mecanismo de comunicação na medida em que leva a uma atuação direta nos processos legislativos, administrativos e jurisdicionais, garantindo a efetividade dos direitos fundamentais. Então, o processo constitucional constitui um canal de comunicação social que sustenta a democracia (CRUZ, 2004, p. 202).

O fato de haver um elenco de prescrições legais no texto constitucional não somente transmite a segurança jurídica com a institucionalização do registro, como também ilustra o desenvolvimento epistemológico, social e cultural de uma nação. Exemplificando, citamos alguns artigos da Constituição Brasileira de 1988 que declaram e asseguram, amplamente, temáticas relativas à educação, saúde, emprego, acessibilidade, gestão, aposentadoria e outros direitos sociais de cunho individual e coletivo, como o art. 7º, XXXI; art. 23, I e II; art. 24, XIV; art. 37, VIII; art. 40, § 4º, I; art. 201, § 1º; art. 203, IV V; art. 208, III; art. 227, I, § 2º; e art. 244.

Então, há uma relação inescusável destas prescrições constitucionais que refletem exatamente a complexa sociedade forjada em valores éticos e conteúdos morais díspares, logo, em princípios, os quais trazem conteúdos que espelham esta sociedade e induzem formas legítimas de elaboração deste conteúdo. É dizer que a perspectiva da participação enquanto princípio incluso em um sistema jurídico supera a mera inclusão em agendas dadas, mas exige dinâmicas democráticas tão complexas como a própria sociedade a qual se destinam as normas.

A participação como princípio exigível a partir de uma leitura constitucional como direito fundamental em um cenário democrático traz a tona a própria democracia enquanto marco originário que orientam as constituições. Ë dizer, portanto, que a participação se coloca paradigma do direito e da produção e resgate dos direitos ainda não realizados, já que tanto a participação permite a leitura reflexiva da realidadesocial como também é o próprio mecanismo de atuação em tal realidade.

Nesse sentido, dizer que participação é um princípio é também dizer que é um paradigma democrático que tem na Constituição o elemento procedimental para instituir, declarar e assegurar a promoção e proteção dos direitos fundamentais. É dizer que onde não se concretizam os direitos fundamentais, não se tem uma constituição viva, portanto, onde não se verifica a constituição viva não há democracia.

A constituição se conecta ao Estado, tanto na medida em que a constitucionalização do ordenamento jurídico em normas de direitos fundamentais, ou seja, "tal Constituição, tal Estado", logo tais direitos retratando as opções éticas, valorativas e políticas da sociedade, como também "tanto Estado quanto a Constituição" ou "o Estado segundo a Constituição". Reafirmando conteúdos que se expressam no direito positivado, mas com conteúdo moral pautado em princípios, em valores deontológicos que não se restringem ao registro constitucional, mas se extraem em todo processo hermenêutico e em toda argumentação (CANOTILHO, 1992, p. 45).

Assim, decorrência da evolução e da socialização do ser humano, os direitos fundamentais, tidos como direitos positivamente constitucionalizados, se inserem como pressuposto na ordem jurídico-constitucional, logo, se configurando como canais de legitimação desta ordem (HABERMAS, 1997, p. 123).

Nesse alinhamento, participação é um direito fundamental que se dispõe em um quadro normativo essencialmente principiológico, com abertura conceitual condizente com a realidade mutável e com dinamismo necessário para atender às pretensões, inclusive de conteúdo moral e valorativo, oriundas da sociedade.

Certamente, mesmo com a constatação de locus principiológico, assegurado no texto constitucional, o desafio da implementação da participação como princípio ainda persiste. Como dito, inserido em uma processualística constitucional ainda se submete a participação aos juízos de aplicação nos casos concretos. Isto é, por ser um princípio, junto a outros princípios, há todo um rito para definir o princípio mais adequado, menos prejudicial e com proporcionalidade mais adequada em caso analisado.

Com certo pragmatismo, atualmente a participação tem se apresentado mais como elemento discursivo moral e ético e menos como norma de conteúdo jurídico-legal. Carece, no nosso entendimento, de maior sustentação nos processo de aplicação. Quase sempre atrelada aos mecanismos participativos, pouco se tem visto sua reivindicação enquanto princípio constitucional em uma ordem democrática dotada de garantias que atribuem conteúdo normativo e juridicidade inerente.

De forte conteúdo axiológico, a participação ainda não sido explorada, em maior medida, seu conteúdo jurídico-normativo, mas somente como componente de alguma outra reivindicação acessória, mas nunca autonomamente.

Com efeito, princípios podem ser considerados como "argumentos voltados para fortalecer e incluir formas de participação cidadã que, embora não se expressem em mecanismos precisos, permitem que se possa exigi-los como garantias constitucionais". (HEVIA, 2006, p. 348).

Acertadamente, Ayres Britto (1992, p. 120) entende que participação popular somente ocorrerá quando for possível identificá-la como manifestação de poder político e não como simples expressão de direito público subjetivo. É dizer que não basta a prescrição em leis estampando que a participação está garantida, mas é preciso um esforço para que tal participação tenha garantias efetivas em influenciar na agenda de um país e tenha qualidade para que seja reconhecida e praticada pela coletividade.

Daí, a participação como princípio requalifica o espaço de decisão antecipando os efeitos jurídicos, políticos e sociais, como também as representações simbólicas que condicionam a sociedade na relação com o Estado. Primeiro, porque alocado como princípio delineia processos e identifica, evidenciando e/ou valorando, outros princípios, além de instruir as regras e procedimentos, o que atua diretamente nos mecanismos legais e instrumentais que preconizam a participação. Segundo, de caráter simbólico e de representação social, porque abre espaço para o entendimento de que a participação não é concessão, nem mesmo algo estático que somente produz efeitos diante de mobilização ou pressão social.

É dizer que, na condição de princípio, mesmo em democracias representativas, a participação é elemento interveniente, tanto na produção legislativa, como nas políticas executivas (públicas). Os efeitos simbólicos se materializam na legitimidade e validade de tais políticas na medida em que são creditadas por toda sociedade, produzindo os efeitos pela garantia da participação que passam a integrar e dinamizar o próprio entendimento da lei.

A idéia de poder, quando reduzida para descrever postura de quem ocupa determinados cargos e exerce determinadas funções, é uma idéia instrumental, ou seja, através desta prerrogativa atribuída a gestor deve realizar os fins públicos. Diferente do dever, posto que esta traduz a natureza funcional deste poder (processo para realizar o interesse público), posto que deve desencadear ações concretas no cotidiano da população. Daí surge um novo paradigma, esperamos, no agir da Administração Pública, o que certamente imporá reflexos na relação com a população, sobretudo quanto à participação na gestão pública.

Portanto, na proposição de uma lei, na aplicação da jurisdição e, especialmente, na implantação de políticas públicas, os princípios não devem sequer serem comparados entre si ou contrapostos tendo em vista que, por si só, o princípio não é o fim buscado ou instrumento para se aplicar uma lei, mas sim a orientação, a condicionante, a premissa na condução de qualquer processo. Ou seja, para além da compreensão instrumental é o princípio uma condicionante pedagógica na função do poder-dever de agir da Administração Pública, e da população, além de transcender na compreensão procedimental.

Evidentemente, o campo de aplicação mais visível da participação é através do Estado, materializando-se através da Administração Pública, mas sujeita a conformações de poder e decisão política que condiciona a participação à mera regra burocrática ou programática, com sujeição discricionária e, portanto afastável, conforme as variáveis sopesadas.

No cenário moderno, a participação não precisa mais de justificação de existência, mas de aplicação e reconhecimento na produção normativa, em quaisquer instâncias onde se dê a produção das normas, independente de seu rito ou processo, quer na esfera legislativa, na aplicação enquanto política pública ou na interpretação judiciária. Mais uma vez, Habermas (1997, p. 239) afirma que o ordenamento que conduz a sociedade só é legítimo se garantirem os mecanismos de igual participação na produção do próprio direito, de forma que os destinatários se percebam, simultaneamente, como seus próprios autores.

Mas perdura o contra-argumento da assertiva acima, de que não se vislumbra cenário de participação de todas as pessoas, sobretudo pela escala, nos processos decisórios. Isso tem sido objeto de muitos teóricos da democracia, como também tem sido objeto prático do Estado na busca pela maior participação possível nas agendas governamentais, através dos mecanismos deliberativos. De todo modo, a participação tem figurado sempre como auxílio ou acessório, por exemplo, do princípio da igualdade. É dizer que a forma para se viabilizar a igualdade das pessoas nos processos decisórios se dá através da criação de espaços de participação.


4. MULTICULTURALIDADE NO ESTADO, GLOBALIZAÇÃO E OS DESAFIOS À PARTICIPAÇAO DAS PESSOAS COM DEFICÊNCIA.

Um dos principais componentes da vida em sociedade, senão o ponto de partida é a questão que envolve a cultura, ou a diversidade cultural. No seio do Estado, embora se tenha verificado que o processo histórico em muitos países reconheceu a sociedade diversa e a existência de culturas diferentes, isso traz um novo contexto, que não apenas reconheça a diversidade cultural, mas trate esta diversidade como propulsão no processo para recompor ou fundar o Estado que corresponda à multiculturalidade vista na sociedade.

Como dito, a desconstrução de um Estado neoliberal passa pela ruptura também nas identidades das pessoas que compõem a sociedade. Podemos dizer que há um grau de uniformização que repercute no cotidiano de toda a sociedade e constrói subjetividades. O neoliberalismo tem na globalização a principal ferramenta de construção de subjetividades e, desse modo, há um processo de "pausterização cultural", ou seja, a idéia é que mesmo havendo o reconhecimento de culturas diferentes estas culturas sejam absorvidas a um imperativo inescusável e artificial que dilua a diversidade em um único modelo (supra cultural) uniformizador da sociedade, no caso, com premissas do liberalismo econômico.

Este argumento também condiciona os sujeitos e altera seus processos culturais fazendo crer que o outro é o correto, o avançado e o melhor; argumento este que busca impedir o direito à diferença e ainda impede que se veja que é justamente com o reconhecimento das diferenças que se alcança a unidade.

Há uma falsa premissa de que a unidade se faz com a uniformização, mas unidade é diferente de uniformização. A globalização é mostra de que a padronização (técnica) provocou uma uniformização sem a verdadeira unidade, posto que a cultura não mais se encontra em um lugar, mas em determinado momento (temporal). Enfim, a globalização econômica e material não leva à união pacífica da humanidade como se nos quis fazer acreditar, mas, antes, a uma uniformização perigosa.

A politização das diferenças culturais, e a busca de hegemonia por alguma determinada identidade, por um lado, tem gerado tendências fundamentalistas e radicais, gerando inclusive conflitos armados. Por outro lado, em perspectiva, faz constatar que tal hegemonia e liberalismo econômico mundial já não se sustentam desconsiderando a cultura, religião, enfim a história de cada país.

A tomada de consciência das diferenças culturais pode desencadear também na reivindicação de um diálogo intercultural como base de qualquer nova ordem política. Esta é uma conclusão essencial diante da constatação atual de que as identidades modernas tornam-se mais dissociadas e díspares, o que evidencia que esta modernidade ocidental imposta e a manipulação política do conceito de identidade desconsideram a cultura como diversidade e modos de vida e como conceito intrínseco a Estado.

Sempre houve um propósito de impedir a diversidade e impor a homogeneização, tanto no discurso nacionalista, que dizia não haver nações distintas, ou indígenas, mas somente bolivianos e mesmo no discurso neoliberal, de que a cultura é só folclore e ornamentação para o turismo. Como os modelos de desenvolvimento não são neutros, ao mesmo tempo podem impor determinada perspectiva, inclusive homogeneizante, padronizando e uniformizando as instituições (inclusive estatais) e as identidades culturais, destruindo outras identidades e ameaçando a diversidade cultural.

Contudo, a diversidade cultural representa uma força decisiva para o desenvolvimento, pois somente uma análise especializada do ambiente cultural pode assegurar o êxito de um projeto de desenvolvimento econômico. É dizer, que a história do pensamento reflete o sistema de valores de uma cultura que influi sobre o conjunto da sociedade, o que torna indispensável repensar a relação no universo múltiplo das culturas.

Nesse contexto, é imprescindível conectar e atualizar o tema da diversidade cultural com os desafios postos a toda sociedade, especialmente, para introduzir de vez a multiculturalidade com componente fundamental para uma universalização heterogênea, ou seja, que introduza em todas as esferas sociais, inclusive o Estado, em todas as instituições orgânicas e simbólicas.

O direito dos indivíduos a uma identidade cultural diferenciada representa um conteúdo fundamental para construção de novas bases universais para consolidação de direitos, a partir do reconhecimento da igualdade que tem como fundamento as diferenças e a diversidade.

É preciso ter em mente os problemas trazidos pela globalização ao fixar alto grau de concentração dos meios de produção e de difusão, o que ameaça esse direito à diferença cultural, traz consigo outro elemento que exige mudanças ou desconstruções da monoculturalidade.

Portanto, nos desafios para superações propostas pelo multiculturalismo, necessariamente há a dimensão cultural nas transformações a serem operadas. Um ponto de partida essencial diz respeito à ruptura com o chamado universalismo que impede a evidência multicultural e as relações interculturais, as quais conservam a diversidade cultural e, desse modo, avançam na universalidade dos direitos na medida em que as lutas pela igualdade passam pelo reconhecimento da diferença. Universalismo combina com diversidade, heterogeneidade e não combina com uniformização.

Desse modo, a participação como componente histórico-social que representasse não só o fato de ser parte de um todo e, ao mesmo tempo, tomar parte nos processos de construção e reconstrução permanente do todo não foi algo natural no Brasil.

Mais precisamente a partir de 1980, quando houve certa mobilização para o Ano Internacional das Pessoas com Deficiência, que teve como lema "Igualdade e Plena Participação", é que se iniciou um processo de visibilidade da temática na esfera governamental, como também a própria compreensão das pessoas com deficiência de seu lugar como sujeito de direitos. A Constituição de 1988, como dito, sobretudo pelo processo de preparação da constituinte, mobilizou o tema nos municípios e Estados, o que resultou na formalização de alguns direitos constitucionais. A partir de então, a concretização disso em ações, projetos e programas que conformem políticas públicas exigiu, e exige a constante mobilização.

Outro fomento importante que repercute na ação do Estado em se tratando de pessoas com deficiência se dá com os avanços na ordem internacional.

A Organização das Nações Unidas (ONU), em 1982, instituiu o "Programa de Ação Mundial para as Pessoas com Deficiência (PAMPD)", acompanhando a mobilização em torno das celebrações do ano internacional dedicado às pessoas com deficiência, o que pautou os países-membros na convergência para políticas públicas adequadas ao segmento.

Esse percurso institucional e político resultou no que Dworkin (2001) entende que deva ser o desenho institucional de um Estado democrático de direito em que os segmentos sociais recebam igual tratamento e sejam tratados como iguais. Ou seja, que determinado grupo populacional com demandas específicas tenham asseguradas as condições para o devido encaminhamento, de modo que a igualdade seja um princípio universal e o igual tratamento seja o reconhecimento das diferenças como componente multicultural.

Na prática, avaliando o Brasil, em especial sua organização administrativa, a Convenção sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, ratificados [01] contribuiu para o desenvolvimento da temática, notadamente com a Secretaria Nacional de Promoção dos Direitos das Pessoas com Deficiência, órgão da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República e que responde pelas políticas públicas para tal segmento. Dentre outras pautas, estão o Programa Nacional de Acessibilidade e o Programa de Promoção e Defesa dos Direitos das Pessoas com Deficiência, que compõem os referenciais do Executivo para consecução das políticas públicas para este segmento social.

Com isso, se vê avanços na conformação do desenho institucional e político do Estado que, desse modo, passa a transmitir segurança social na realização das políticas para as pessoas com deficiência, em grande medida, pelo desenho institucional de seus órgãos orgânico-administrativos.


5. CONSIDERAÇOES FINAIS: DA INCLUSÃO A PARTICIPAÇÃO.

Ainda na perspectiva reducionista de homegeneização da sociedade como forma de negação da diversidade cultural, e também a pretexto de um mito democrático da participação das pessoas com deficiência nos rumos do Estado, a ideologia da integração fez crer que a igualdade formal preservava todas as diferenças e que este era o limite na atuação do Estado. Mantido este cenário, certamente, não haveria testemunhas do estágio atual de organização social acerca das políticas públicas para pessoas com deficiência.

Evidentemente, é crucial que haja garantias institucionais em todos os poderes (Legislativo, Executivo e Judiciário) a fim de dar segurança jurídica, política e institucional para que se tenha um processo de inclusão e não somente de integração.

A integração pressupõe apenas a admissão por parte das pessoas sem deficiência que existem as pessoas com deficiência e a estes é permitido que busquem por is mesmo a integração, a adaptação à esta normalidade social. Assim, se vê como resultante a igualdade formal.

Ao revés, a inclusão avança na compreensão da igualdade, tanto formal e material, mas destacadamente, no reconhecimento, na expressão, na explicitação das diferenças enquanto conteúdo multicultural. É dizer que incluir é integrar com garantia, isto é, incluir é não excluir e isso implica em uma ação positiva de criar as condições para uma integração qualificada.

A compreensão da participação antecipa a luta por questões e políticas mais específicas como emprego, educação, assistência, previdência, acessibilidade, mas é um componente inerente aos processos de produção legislativa, de políticas executivas, e como parâmetros principiológicos que repercutem no Judiciário de modo a conformar toda uma compreensão intelectual. Por isso, a exploração da participação como um princípio, ou seja, um parâmetro interpretativo e aplicativo nas instituições estatais contribuem para conformação de uma nova gramática democrática e para o processo epistemológico que redefine os paradigmas adequando-os a realidade.

No caso das pessoas com deficiência, saindo da invisibilidade, passando pela negação e pela descaracterização, ainda pelo mito da integração sem inclusão, alcançar espaço político nas instâncias de um Poder que sempre oprimiu o diferente é, antes de tudo, inaugurar práticas, sempre negadas ou reprimidas.

Assim, medidas declaratórias de direitos, assecuratórias de garantias e definidoras de reconhecimento, tanto na ordem interna como na ordem internacional, somente reforçam o argumento da multiculturalidade que contempla a compreensão do diferente como elemento da igualdade no Estado. Ao contrário do que significa idêntico (de origem no idem), que remete ao mesmo, igual não é o antônimo de diferente. Logo, a diferença é conteúdo da igualdade, pois pressupõe um processo que decorre da construção comparativa de igualdade pela diversidade dos envolvidos, ou seja, só se pode pleitear igualdade quem não é idêntico, quem traz o diverso para as arenas políticas de ação democrática.

A participação, portanto, além do instrumento viabilizador dos processos democráticos que se reproduzem nas instituições administrativas, políticas e judiciárias, também é mecanismo ou dispositivo que compõe cada etapa do processo de socialização e inclusão das pessoas. Assim, não se cria espaços para garantir a participação; a participação é que resultou na criação de espaços e assim a participação é um componente e não um produto.

Para as pessoas com deficiência, os processos participativos representam não somente desdobramentos de lutas e conquistas sociais empreendidas, sobretudo, pelos movimentos sociais, mas significa a própria construção identitária de suas representações, seus modos de vida, sua composição enquanto agentes sociais. A participação das pessoas com deficiência compõe a própria expressão da diversidade cultural vista na sociedade, mas agrega um fator distinto que, no caso, a participação deste segmento remonta a expressão do corpo, e não sua opressão, como também evidencia as barreiras de ordem política antes criadas e, agora evidenciadas e combatidas com a conquista da participação plena.


6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.

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Notas

01 A Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência foi ratificada pelo Brasil em março de 2007, em Nova Iorque, na sede da ONU e ganhou status de Emenda Constitucional pela aprovação no Congresso Nacional do Decreto Legislativo N.º 186 de julho de 2008 e pelo Decreto do Poder Executivo N.º 6.949 de agosto de 2009, como exige o procedimento constitucional do § 3º do art. 5º CF/1988.


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SANTOS, Braulio de Magalhães. "Nada sobre nós, sem nós": a participação como fundamento nas políticas públicas para pessoas com deficiência. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2838, 9 abr. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/18867. Acesso em: 20 abr. 2024.