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Análise da proteção internacional, infraconstitucional e constitucional do trabalho do menor na perspectiva da saúde, higiene e segurança no meio ambiente laboral

Análise da proteção internacional, infraconstitucional e constitucional do trabalho do menor na perspectiva da saúde, higiene e segurança no meio ambiente laboral

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Embora a proteção ao trabalho do menor seja uma preocupação antiga, a realidade tem muitas situações em que nossas crianças e adolescentes são objeto de reprovável exploração.

"E Traziam-lhe também crianças, para que ele as tocasse; e os discípulos, vendo isso, repreendiam-nos. Mas Jesus, chamando-as para si, disse: Deixai vir a mim os pequeninos e não os impeçais, porque deles é o Reino de Deus. Em verdade vos digo que qualquer que não receber o Reino de Deus como uma criança não entrará nele" - Bíblia Sagrada, Lucas, capítulo 18, versículos 15 a 17.

1 – Intróito

Neste texto, buscaremos traçar um confronto entre direito e realidade. Inicialmente, o plano é ofertar um breve escorço histórico acerca do combate à exploração do labor infantil, descortinando o robusto instrumental jurídico hoje disponível no sistema. Em seguida, mercê da apresentação de alguns aspectos específicos ligados à temática, realizaremos um confronto com a crueza da realidade, infelizmente ainda marcada por essa chaga.

Nossa intenção, com tal choque de perspectivas, é acentuar ainda mais essa paradoxal circunstância, reafirmando a premente necessidade de não mais adiarmos a concretização dos preceitos normativos que regem esse especialíssimo campo da vida.


2 – A Ampla Rede Jurídica de Combate/Proteção ao Trabalho Infantil: Uma invejável realidade

O trabalho do menor é fenômeno antigo. Basta dizer que já no Código de Hamurabi (1.700 a. C.) podem ser encontradas normas que regem labor infantil. Na Grécia e em Roma os filhos dos escravos também eram propriedade dos senhores, sendo obrigados a trabalhar para o dono ou qualquer pessoa por ele indicada. Por sua vez, na Idade Média, com as corporações de ofício, o menor trabalhava sem qualquer salário ou proteção [01].

Mas foi com o advento da Revolução Industrial (Século XVIII), propiciadora da implantação de um inaceitável quadro de desumana exploração da classe trabalhadora, que o tema da tutela do trabalho infantil começou a ganhar ares inquietantes. De fato, em razão da insensível voracidade do capitalismo, tornou-se comum o trabalho em ambientes extremamente hostis e cujas atividades consumiam longos períodos diários, na maioria das vezes em troca de miseráveis salários. E é exatamente dentro dessa inglória ambiência que se contavam aos montes crianças e adolescentes, força de trabalho menos onerosa e de quase nula resistência à exploração [02].

Estudos apontam que entre 1780 e 1840 houve um vertiginoso aumento da exploração da mão de obra infantil. Afirma-se, por exemplo, que em 1788 mais de 60% dos trabalhadores nas fábricas têxteis da Inglaterra e Escócia eram crianças [03]. De imediato, essa prática gerou terríveis prejuízos ao desenvolvimento físico e psicológico das crianças. Por óbvio, a médio e longo prazo esse triste fenômeno acabou redundou em sérias conseqüências sociais, "em inaceitável afronta a direitos fundamentais de crianças e adolescentes, que precisavam da proteção do Estado contra os abusos do capitalismo" [04].

À época, o respeito à dignidade humana do trabalhador, embora de maneira tímida, já começava a dar seus primeiros sinais, provocando reações contra o abusivo regime de trabalho imposto aos trabalhadores em geral, mais particularmente em face de crianças, cuja fragilidade física/emocional tornava a situação ainda mais delicada.

Não à toa quase que a totalidade da doutrina aponta que o início da legislação tutelar do menor se deu justamente na Inglaterra, com o Ato da Moral e da Saúde ("Moral and Health Act"), de 1802, que reduziu a jornada de trabalho em 12 horas e proibiu o trabalho noturno do menor nas oficinas dos povoados, proteção essa mais tarde estendida às cidades, em 1819, com a Lei "Cotton Mills Act", que limitou a idade mínima para o trabalho em 9 anos [05].

Em 1890, na Conferência de Berlim, já se travavam discussões ligadas à regulamentação do trabalho dos menores, em uma clara sinalização do reconhecimento da necessidade de intervenção estatal nessa área. Em 1924 a Assembleia da Liga das Nações adotou a Declaração de Genebra dos Direitos da Criança, documento que, todavia, não logrou grandes impactos na sociedade de então, "talvez até como decorrência do próprio panorama histórico que já se desenhava e do previsível insucesso da Liga das Nações" [06]. Em 1948, com a Declaração Universal dos Direitos do Homem, reconheceu-se, pela primeira vez, em caráter universal, que a criança deve ser objeto de particular atenção social, pois em seu artigo 25, item II, está preceituado que "a maternidade e a infância têm direito a cuidados e assistência especiais" [07].

Mas foi somente em 1959, em Assembleia Geral da ONU, que se lançou, pela primeira vez, um instrumento jurídico internacional específico, consistente na Declaração Universal dos Direitos da Criança, onde ficou estabelecido que "a criança gozará de proteção especial e disporá de oportunidade e serviços a serem estabelecidos em lei e por outros meios, de modo que possa desenvolver-se física, mental, moral, espiritual e socialmente de forma saudável e normal, assim como em condições de liberdade e dignidade" (grifamos) (princípio II). Pontuou-se, também, que "a criança deve ser protegida contra toda forma de abandono, crueldade e exploração. Não será objeto de nenhum tipo de tráfico. Não se deverá permitir que a criança trabalhe antes de uma idade mínima adequada; em caso algum será permitido que a criança dedique-se, ou a ela se imponha, qualquer ocupação ou emprego que possa prejudicar sua saúde ou sua educação, ou impedir seu desenvolvimento físico, mental ou moral" (grifamos) (princípio IX) [08].

Em 1966, com o Pacto Internacional Sobre Direitos Civis e Políticos, uma vez mais ficou estabelecida a premissa que versa sobre a delicadeza da situação das crianças, pessoas em desenvolvimento e que demandam do Estado e de todos da sociedade um tratamento especial e diferenciado. Nesse sentido, dispôs seu artigo 24, item 1, que "toda criança terá direito, sem discriminação alguma por motivo de cor, sexo, língua, religião, origem nacional ou social, situação econômica ou nascimento, às medidas de proteção que a sua condição de menor requerer por parte de sua família, da sociedade e do Estado" [09].

Ainda em 1966, o Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais foi também taxativo ao asseverar, em seu artigo 10, item 3, que "devem-se adotar medidas especiais de proteção e assistência em prol de todas as crianças e adolescentes", devendo-se "proteger as crianças e adolescentes contra a exploração econômica e social". Pontua, ainda, com precisão, que "o emprego de crianças e adolescentes em trabalhos que lhes sejam nocivos à moral e à saúde ou que lhes faça correr perigo de vida, ou ainda que lhes venham a prejudicar o desenvolvimento normal, será punido por lei" [10].

A essa altura, já havia um verdadeiro turbilhão de pensamentos que serviam como trincheiras no combate à chaga do trabalho infantil. O próximo passo seria ousado: alinhavar uma Convenção Internacional específica em relação ao tema e que incorporasse, em seu bojo, o crescente desejo de se ver erradicado esse vergonhoso fenômeno social. O fluir dessa ideia é bem captado por SOUZA, como segue:

"A necessidade de dar-se força de tratado aos direitos da criança, de forma específica e consolidada, tornou-se cada vez mais premente, tanto que, por ocasião do Ano Internacional da Criança e das comemorações pelos vinte anos da Declaração, em 1979, por iniciativa da delegação da Polônia, a Comissão dos Direitos Humanos das Nações Unidas começou a elaborar um projeto de convenção. A amplitude de participação no tocante à sua elaboração permitiu que o projeto de convenção resultante acabasse por ser o fruto de intenso trabalho internacional, envolvendo as mais diversas disciplinas científicas e, principalmente, compatibilizando sistemas jurídicos e culturais diversos, criando um texto normativo cujos parâmetros são flexíveis, adaptáveis às diferentes realidades dos Estados Partes e, por isso mesmo, sendo referência para as políticas legislativas desses últimos" [11].

Os frutos desse intenso debate foram alvissareiros. Por votação unânime, finalmente a Assembleia Geral das Nações Unidas aprovou, em 1989, a Convenção sobre os Direitos da Criança, outro importantíssimo marco jurídico na história humana de combate ao trabalho infantil. Nesse documento, ficou registrado que os Estados Partes: i) "assegurarão ao máximo a sobrevivência e o desenvolvimento da criança" (artigo 6º, item 2); ii) "reconhecem o direito de toda criança a um nível de vida adequado ao seu desenvolvimento físico, mental, espiritual, moral e social" (artigo 27, item 1); iii) "reconhecem o direito da criança de estar protegida contra a exploração econômica e contra o desempenho de qualquer trabalho que possa ser perigoso ou interferir em sua educação, ou que seja nocivo para sua saúde ou para seu desenvolvimento físico, mental, espiritual, moral ou social" (artigo 32, item 1); iv) "adotarão medidas legislativas, administrativas, sociais e educacionais com vistas a assegurar a aplicação do presente Artigo", tais como: "a) estabelecer uma idade ou idades mínimas para a admissão em empregos; b) estabelecer regulamentação apropriada relativa a horários e condições de emprego; c) estabelecer penalidades ou outras sanções apropriadas a fim de assegurar o cumprimento efetivo do presente Artigo" (artigo 32, item 2).

Em 1997 ocorreu a Conferência sobre Trabalho Infantil, na Noruega, de onde partiu novo fôlego no movimento de erradicação do labor infantil. É que estava causando espécie a inquietante estatística que apontava a ineficácia daquele nobre intento que buscava concretizar na realidade cotidiana as elevadas declarações humanísticas incrustadas nos diversos documentos internacionais até então publicados.

No âmbito da Organização Internacional do Trabalho (OIT), diversas Convenções foram publicadas no fito de regular o labor infantil, a grande maioria delas preocupada com a limitação da idade mínima para o início do trabalho.

Veja-se que já em 1919, a OIT aprovou a Convenção n. 05 (limitando para 14 anos a idade mínima para o trabalho na indústria) e a Convenção n. 06(vedando o trabalho noturno do menor na indústria). Em 1920 foi aprovada a Convenção n. 07 (limitando para 14 anos a idade mínima para o trabalho marítimo). Em 1921 foram aprovadas a Convenção n. 10 (limitando para 14 anos a idade mínima para o trabalho na agricultura), a Convenção n. 13 (proibição do trabalho que implique o uso de diversas substâncias insalubres), a Convenção n. 15 (limitando para 18 anos a idade mínima para o trabalho na marinha mercante, na condição de foguista e paioleiros) e a Convenção n. 16 (determinou que os menores de 18 anos se sujeitassem a exame médico antes da admissão em empregos a bordo, realizando-se novos exames em periodicidade anual, salvo se trabalhassem em embarcação cuja tripulação fosse constituída de familiares). Em 1932 foi aprovada a Convenção n. 33 (dispôs sobre idade mínima para contratação de menores em trabalhos não industriais). Em 1936 foi lançada a Convenção n. 58 (revisou a Convenção n. 7, fixando em 15 anos a idade mínima para o trabalho marítimo) e em 1937 foram divulgadas as Convenções n. 59 e 60 (que revisaram, respectivamente, as Convenções n. 5 e 33, fixando em 15 anos a idade mínima para o trabalho na indústria e nos serviços não industriais). Em 1946, foram aprovadas as Convenções n. 78 e (dispondo sobre o exame médico de menores em trabalhos não industriais) e 79 (vedando o trabalho noturno do menor em atividades não industriais).

Em 1959 foi editada a Convenção n. 112 (fixando em 15 anos a idade mínima para o trabalho em barcos de pesca). Já em 1965 foi publicada a Convenção n. 123 (fixando em 15 anos a idade mínima para o trabalho do menor em subterrâneos) e em 1967 foi aprovada a Convenção n. 127 (versando sobre o peso máximo a ser transportado pelo menor). Em 1973 foi lançada a Convenção n. 138 (fixando que a idade mínima para o trabalho do menor não deve ser inferior a 15 anos, abrindo exceção para o patamar mínimo de 14 anos, como primeira etapa, para os países suficientemente desenvolvidos, mas desde que, em qualquer caso, não afete o tempo da escolaridade obrigatória) e em 1975 foi editada a Convenção n. 142 (trata de políticas e programas de orientação e formação profissional do menor) [12].

Em 1999, como resultado dos debates travados na já citada Conferência sobre Trabalho Infantil (1997), veio à tona a Convenção 182 da OIT, que cuida da eliminação das dez piores formas de trabalho infantil, documento de grande valia jurídica e cuja adesão representou algo sem precedentes: em apenas cinco anos, mais de 90% dos 182 países vinculados à OIT manifestaram sua aquiescência com essa importantíssima convenção internacional [13], o que demonstra, pelo menos no plano teórico, a ampla aceitabilidade da ideia de erradicação do trabalho infantil no mundo. Não sem razão: à época, estimativas da OIT apontavam que para o ano de 2006 já se prenunciava mais de 200 milhões de crianças, com idades compreendidas entre 5 (cinco) e 17 (dezessete) anos, gastariam suas infâncias em meio a uma espúria relação de trabalho [14].

Esse normativo internacional foi concluído em Genebra, em 17 de junho de 1999, tendo sido incorporado ao ordenamento jurídico brasileiro através do Decreto n. 3.597, de 12 de setembro de 2000, subscrito pelo então Presidente Fernando Henrique Cardoso. Em atenção ao disposto no artigo 5º da Convenção, que exigia a criação ou adoção de mecanismos apropriados para monitorar a aplicação das disposições que dão cumprimento aos nobres objetivos fomentados pela OIT, após consulta dos principais atores sociais jungidos à questão: empregadores e trabalhadores. Surge, daí, a Portaria 952/2003, que cria a Comissão Nacional de Erradicação do Trabalho Infantil – CONAETI [15].

De sua parte, estabelece a Convenção 182 da OIT, em seu artigo 3: "Para efeitos da presente Convenção, a expressão ‘as piores formas de trabalho infantil’ abrange: a) todas as formas de escravidão ou práticas análogas à escravidão, tais como a venda e tráfico de crianças, a servidão por dívidas e a condição de servo, e o trabalho forçado ou obrigatório, inclusive o recrutamento forçado ou obrigatório de crianças para serem utilizadas em conflitos armados; b) a utilização, o recrutamento ou a oferta de crianças para a prostituição, a produção de pornografia ou atuações pornográficas; c) a utilização, recrutamento ou a oferta de crianças para a realização para a realização de atividades ilícitas, em particular a produção e o tráfico de entorpecentes, tais com definidos nos tratados internacionais pertinentes; e, d) o trabalho que, por sua natureza ou pelas condições em que é realizado, é suscetível de prejudicar a saúde, a segurança ou a moral das crianças".

A Convenção 182 da OIT representa o ápice do progressivo reconhecimento das especiais circunstâncias que circundam o mundo da criança e o do adolescente, de modo a impor sua proteção integral (física, psicológica, moral, espiritual e social) [16]. É que, muito além do simples resguardo físico e emocional, as medidas de proteção também almejam salvaguardar dimensões sociaiséticas e culturais, primando-se, basicamente, pelo respeito ao sadio desenvolvimento sócio-moral da criança e do adolescente, com a autorização de atividades que, além de propiciarem instrução adequada, não roubem do menor o direito de brincar e se educar [17].

E esse benfazejo raio de ação protetiva expressa uma doutrina erigida à luz do princípio da dignidade da pessoa humana, substrato jurídico-axiológico do chamado trabalho decente, cujo conceito gira em torno do efetivo resguardo daqueles direitos mínimos do trabalhador necessários à preservação de sua própria dignidade, aí se incluindo, segundo BRITO FILHO, a proibição do trabalho infantil [18].

No plano interno, convém destacar que o Brasil foi o primeiro país da América Latina a editar normas de proteção ao trabalho do menor, o que se deu através do Decreto n. 1.313, de 1891, que tratava do trabalho do menor nas fábricas do Distrito Federal. É possível ainda citar, nesse mesmo campo de proteção do labor infantil, os Decretos n. 1.801, de 1917, e 16.300, de 1923, que cuidavam, respectivamente, do trabalho dos menores na cidade do Rio de Janeiro e da vedação do trabalho de menores de 18 anos por mais de 6 horas em 24 horas [19]. Em 1927 foi aprovado o Código de Menores, através do Decreto n. 17.943-A, proibindo o trabalho dos menores de 12 anos e o trabalho noturno dos menores de 18 anos.

Mas foi com a Constituição Federal de 1988 que a temática do labor infantil ganhou proteção jurídica de alta envergadura, quando ficou assentado que "é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão" (artigo 227, caput).

No que tange ao plano laboral, ficou resguardado à criança e ao adolescente: i) a garantia de direitos previdenciários e trabalhistas (artigo 227, § 3º, inciso II); ii) a garantia do acesso do trabalhador adolescente à escola (artigo 227, § 3º, inciso III); (iii) a proibição de diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil (artigo 7º, inciso XXX); iv) a proibição de trabalho noturno, perigoso ou insalubre a menores de dezesseis anos, salvo na condição de aprendiz, a partir de quatorze anos (artigo 7º, inciso XXXIII). Propugnou-se, ainda, a "redução dos riscos inerentes ao trabalho" (artigo 7º, inciso XXII), cabendo ao Poder Público e à coletividade (trabalhadores, empregadores e a sociedade em geral) defender o ambiente do trabalho ecologicamente equilibrado (artigo 225).

Em 1990 foi publicada a Lei n. 8.069, o famoso Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), firmando que "considera-se criança, para os efeitos desta Lei, a pessoa até doze anos de idade incompletos, e adolescente aquela entre doze e dezoito anos de idade" (artigo 2º). Consagrou-se de vez o princípio da proteção integral, assegurando-se à criança e ao adolescente "todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade" (artigos 1º e 3º), sendo que, no campo laboral, preceituou que "ao adolescente empregado, aprendiz, em regime familiar de trabalho, aluno de escola técnica, assistido em entidade governamental ou não-governamental, é vedado trabalho: I - noturno, realizado entre as vinte e duas horas de um dia e as cinco horas do dia seguinte; II - perigoso, insalubre ou penoso; III - realizado em locais prejudiciais à sua formação e ao seu desenvolvimento físico, psíquico, moral e social; IV - realizado em horários e locais que não permitam a frequência à escola" (artigo 67).

No ano 2000, a Lei n. 10.097 veio à baila para realizar consideráveis ajustes na CLT, adaptando-a aos ditames constitucionais e às diretrizes do ECA, no que diz com a regência do trabalho do menor, quando ficou clarificado, agora no texto celetista, que é considerado como tal – menor –, para os efeitos da Consolidação das Leis do Trabalho, o trabalhador de quatorze até dezoito anos (artigo 402). Ademais, em atenção ao princípio da proteção integral, estabeleceu-se que "o trabalho do menor não poderá ser realizado em locais prejudiciais à sua formação, ao seu desenvolvimento físico, psíquico, moral e social e em horários e em locais que não permitam a frequência à escola" (artigo 403, parágrafo único), ficando vedado o trabalho noturno, bem como em locais e serviços perigosos, insalubres ou prejudiciais à sua moralidade ou aos seus estudos (artigos 404, 405, 406, 407, 408, 424, 425, 427, 428, dentre outros) [20].

Por fim, vale destacar a exsurgência, em 2008, do Decreto n. 6.481, que regulamenta os artigos 3º, aliena "d", e 4º, da Convenção 182 da OIT, dispondo em seu artigo 4º que, para fins de aplicação das alíneas "a", "b" e "c" do artigo 3º da referida Convenção, integram as piores formas de trabalho infantil: "I – todas as formas de escravidão ou práticas análogas, tais como venda ou tráfico, cativeiro ou sujeição por dívida, servidão, trabalho forçado ou obrigatório; II – a utilização, demanda, oferta, tráfico ou aliciamento para fins de exploração sexual, comercial, produção de pornografia ou atuações pornográficas; III – a utilização, recrutamento e oferta de adolescente para outras atividades ilícitas, particularmente para a produção e tráfico de drogas; IV – o recrutamento forçado ou compulsório de adolescente para ser utilizado em conflitos armados".


3 – Trabalho Infantil: ainda uma vergonhosa realidade

A crescente evolução das relações sociais e a complexidade dos avanços científicos vêm desencadeando o desenvolvimento de diversos benefícios para a população mundial, seja na órbita da ampliação das comunicações, com o surgimento e a popularização de aparelhos como os smartphones, netbooks, ipods e ipad, dentre outros, que permitem a transmissão de dados e voz de forma on line em praticamente por todo o planeta por via satélite ou por fibra ótica; seja na órbita da saúde, com o aperfeiçoamento de medicamentos que, por exemplo, combatem o envelhecimento precoce e previnem o câncer, como também o estabelecimento de políticas públicas de saúde supranacionais em todo o globo terrestre, como é o caso da vacinação para combater a pandemia provocada pelo vírus H1N1; ou mesmo na área do bem-estar pessoal do indivíduo, com o aprimoramento de roupas que proporcionam um melhor conforto ao usuário, como é o caso das roupas esportivas que utilizam Dri-Fit, que facilita a evaporação do suor, mantendo o corpo seco.

Todavia, o que se vê é que essa dinâmica de crescente desenvolvimento sócio-econômico vem propiciando diminutos reflexos no ambiente de trabalho, mormente nos países com economia em desenvolvimento, como o Brasil, China, Malásia, Tailândia, que, mesmo em meio à produção de sofisticados bens de consumo, continuam mantendo as mesmas práticas exploratórias vergonhosamente constatadas no século XVIII, ou seja, a submissão dos trabalhadores, principalmente mulheres e menores, a excessivas jornadas, baixos salários e ambientes de trabalho inseguros.

Nesse aspecto, verifica-se que é corrente na mídia global a divulgação de que empresas multinacionais fabricantes de produtos de alta tecnologia, como a Apple [21] e Nike [22], utilizam irregularmente trabalho infantil, inclusive em situação análoga à de escravo, em suas fábricas localizadas em países do "Terceiro Mundo", como Taiwan / China, Singapura, Filipinas, Malásia, Tailândia e Brasil, dentre outros.

Olhando especificamente para o cenário do trabalho infantil no Brasil, verifica-se que a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) de 2007 demonstra que, do total de 44,7 milhões de crianças e adolescentes de 5 a 17 anos de idade, 4,8 milhões trabalham regularmente, inclusive 30,5% deste grupo cumprem jornada de, no mínimo, 40 horas semanais [23].

De acordo com os pesquisadores da Fundação das Nações Unidas Para a Infância (UNICEF), Maria de Salete Silva e Pedro Ivo Alcântara, o significado do exorbitante número de trabalhadores infantis no Brasil pode ser percebido "quando se analisa a taxa de escolarização dos adolescentes ocupados e não ocupados. De acordo com o PNDA de 2007, dos adolescentes de 15 a 17 anos que trabalham, apenas 21,8% estão na escola" [24].

Outro dado estatístico importante que merece ser analisado refere-se à ocorrências dos agravos acidentários e das doenças ocupacionais da qual são vítimas crianças e adolescentes no Brasil, elaborado pelo Sistema de Informação Nacional de Agravos de Notificação (SINAN-NET), vinculado ao Ministério da Saúde, que estabelece as seguintes ocorrências:

 

Agravos

2007

2008

Acidente Grave

19.086

26.094

Acidente com Material Biológico

14.748

17.401

Dermatoses Ocupacionais

125

248

Intoxicações Exóginas Relacionadas ao Trabalho

2.018

2.215

LER/DORT

3.117

2.135

Peneuconioses

95

665

PAIR

109

154

Transtorno Mental Relacionado ao Trabalho

114

106

Câncer Ocupacional

4

8

Total

39.416

49.026

Fonte: SINAN-NET – 11.10.2009 [25]

Os dados estatísticos, ainda que reconhecidamente irreais [26], demonstram que as crianças e os adolescentes de nosso país têm sido privadas de seu futuro, de seus sonhos, da oportunidade de poder construir sua história, haja vista que muitos não possuem a possibilidade de simplesmente brincar como crianças e, de maneira lúdica, aprender a produzir o conhecimento.

A submissão da criança ao trabalho de forma prematura tende a ceifar as perspectivas do cidadão, na medida em que as estatísticas do PNAD demonstram que a pessoa que entra no mercado de trabalho antes dos 9 anos tende a perceber na idade adulta remuneração não superior a R$-500,00 [27], como também possui o condão de antecipar o desencadeamento de doenças ocupacionais, especialmente considerando que as crianças e os adolescentes ainda se encontram com o organismo em formação, de modo que a exposição a condições de trabalho insalubres, perigosas, penosas ou sem a observância dos aspectos mínimos de ergonomia, atrelados à utilização de instrumentos de trabalho dimensionados para utilização por adultos, tende a provocar, antecipadamente, a ocorrência de diversas enfermidades laborais.

Contrapondo-se à difícil realidade do trabalho infantil de nosso país, ganha relevo o fato de que a Constituição Federal de 1988 estabeleceu que a República Federativa do Brasil possui como garantia fundamental a dignidade da pessoa humana (art. 1º, inciso III), os valores sociais do trabalho (art. 1º, inciso IV) e a promoção da igualdade de oportunidades (art. 3º, inciso IV), bem como reconhece, dentre os seus "valores supremos", a garantia da segurança e do bem-estar de todos os membros da sociedade (Preâmbulo). Não fosse apenas isso, também já visualizamos, no traçado histórico acima consignado, a invejável rede jurídica de ampla proteção e ferrenho combate, no que respeita ao labor infantil, nos campos nacional e internacional.

Ora, ao se confrontar tais dados/estatísticas acerca do trabalho infantil e esse denso arcabouço jurídico, observa-se que há flagrante contradição entre a realidade fática do ambiente de trabalho e as normas que estabelecem garantias de qualidade de vida e cidadania às crianças e aos adolescentes.

Nesta perspectiva, inicia-se o presente estudo com o objetivo de não apenas analisar as limitações do trabalho infantil no ordenamento pátrio e internacional, como também construir um cenário interpretativo que sirva para viabilizar o desempenho das atividades em meio ambiente de trabalho hígido, seguro e saudável.


4 – A Proteção do Trabalho Infantil em Ambiente Insalubre

A palavra insalubre é definida por Aurélio Buarque de Holanda Ferreira como "não salubre; que origina doença; doentio" [28].

O trabalho insalubre pode ser conceituado como o desempenho de atividades laborais, de natureza física ou mental, em ambiente que efetivamente possibilite a ocorrência de dano à saúde do trabalhador.

Sebastião Geraldo de Oliveira conceitua o labor insalubre como "aquele que afeta ou causa danos à saúde, provocando doenças, ou seja, é o trabalho não salubre, não saudável. Muitas enfermidades estão diretamente relacionadas e outras são agravadas pela profissão do trabalhador ou as condições em que o serviço é prestado, o que possibilita a constatação do nexo entre o trabalho e a doença" [29].

A legislação brasileira considera como "atividades insalubres ou operações insalubres aquelas que, por sua natureza, condições ou métodos de trabalho, exponham os empregados a agentes nocivos à saúde, acima dos limites de tolerância fixada em razão da natureza e da intensidade do agente e do tempo de exposição aos seus efeitos" (art. 189, da CLT).

O conceito fixado pelo texto celetista estabelece dois requisitos básicos para o reconhecimento do labor insalubre: a exposição do trabalhador a agentes nocivos à saúde e a violação dos limites de tolerância.

Os agentes nocivos à saúde também são estabelecidos pela Norma Regulamentadora (NR) n. 15 (Portaria n. 3.214/78, de 8 de junho de 1978), que classifica como agentes físicos [30] (ruídos, ruídos de impacto, calor, radiações ionizantes, pressões hiperbáricas; radiações não-ionizantes; vibrações; frio; umidade), agentes químicos [31] (substâncias químicas e poeiras minerais) e agentes biológicos [32] (microorganismos, vírus e bactérias).

O limite de tolerância para exposição aos agentes insalubre é delimitado pela NR-15, tópico 15.1, que estabelece: "Entende-se por limite de tolerância, para os fins desta Norma, a concentração ou intensidade máxima ou mínima, relacionada com a natureza e o tempo de exposição ao agente, que não causará dano à saúde do trabalhador, durante a sua vida".

A conjugação, portanto, da exposição do trabalhador a agentes nocivos à saúde e a violação dos limites de tolerância proporciona o reconhecimento pela norma jurídica brasileira do labor insalubre.

No caso específico do trabalhador infantil, observa-se que a norma constitucional veda expressamente o trabalho do menor de 18 (dezoito) anos em condições insalubres.

Nesse aspecto, verifica-se que a proibição constitucional do trabalho insalubre por criança e adolescente segue o elo de coerência da Carta Republicana de 1988 que consagra a dignidade humana como núcleo essencial do sistema jurídico brasileiro.

Na esteira desse raciocínio, observa-se que a limitação do trabalho do menor em ambiente insalubre constitui-se como fator de promoção do amadurecimento físico e psicológico do cidadão, coadunando-se, por conseguinte, como o patamar mínimo de existência digna do ser humano.

Nesse contexto de análise da vedação do labor do menor em condições insalubre, verifica-se que a grande maioria das 89 atividades profissionais consideradas como piores formas de trabalho infantil descritas no Decreto Presidencial n. 6.481, de 12 de junho de 2008, que sistematiza a Convenção n. 182 da OIT, são de natureza insalubre, dentre as quais, destaca-se o labor realizado na produção de carvão vegetal e de cerâmica em olarias.

O labor na produção de carvão vegetal, em especial na Região Amazônica e no Nordeste, consiste em uma forma trabalho rudimentar e degradante, haja vista que continua se utilizando da mesma sistemática de operacional do Século XV, quando da descoberta das Américas pelos povos da Europa, de modo que o carvoejamento permanece sendo realizado por meio da prática de atividades manuais de colocação e retirada da madeira em fornos feitos de barro, em formato de iglus, que realizam a queima da madeira 24h por dia.

A queima da madeira nos fornos de carvão produz grande quantidade de fumaça, isto é, "de mistura formada por partículas suspensas no ar, gases e vapores resultantes de combustão incompleta de materiais orgânicos, bem como partículas líquidas provenientes da condensação de vapores de hidrocarbonetos com massa molecular elevada, ou das reações químicas que ocorrem durante a combustão incompleta de materiais orgânicos sólidos" [33].

No carvoejamento os trabalhadores normalmente laboram com roupas inadequadas e sem a utilização de equipamentos de proteção individual, sendo vítimas de diversas enfermidades ocupacionais.

Sobre os efeitos ofensivos da inalação da poeira orgânica pelo organismo, Maurício Torloni e Antônio Vladimir Vieria comentam que "muitos agentes orgânicos, na forma de partículas respiráveis, podem provocar doenças por sensibilização, isto é, levar a uma resposta nociva após subsequente exposição do alérgeno... são sintomas comuns: dermatite, urticária, conjuntivite, inchaço das membranas, espirro, dificuldade de respirar e diminuição excessiva de muco (bronquite) ou a formação de anticorpos que levam a constrição de dutos bronquiais (asma) e, em alguns caos, morte resultante de choque anafilático" [34].

As atividades de carvoejamento normalmente são realizadas por mão-de-obra familiar, envolvendo indevidamente crianças e adolescente que são submetidas ao labor em condições insalubre.

Sônia Hess comenta que nesse sistema de produção familiar do carvão "as crianças desde muito cedo, aos quatro, cinco anos, quando começam a andar com mais desenvoltura, acompanham os pais, especialmente as mães, às carvoarias e ‘brincam’ de ajudar a encher o forno. Em torno de seis a sete anos, algumas delas já conhecem todo o processo, e aos 12, 13 anos assumem todas as tarefas, sem distinção de sexo" [35].

Outra situação de trabalho insalubre, dentre as piores formas de trabalho infantil que merece destaque, é o labor realizado nas áreas de olarias para a produção de cerâmicas.

A produção de cerâmicas em olarias, em especial na Amazônia, é realizado também por mão-de-obra familiar, incluindo-se crianças e adolescentes, as margens dos rios em estruturas em formato de barracão onde é armazenada a matéria prima (barro), o maquinário conhecido como "maromba" e os fornos.

Nas olarias amazônicas, as "marombas" têm vitimado grande quantidade de crianças e adolescentes com acidentes de trabalho que provocam, em geral, a amputação de mãos e braços quando do desempenho da atividade de colocação do barro no equipamento, vez que nessa sistemática a engrenagem que suga o barro, em razão de não possuir uma trava de segurança, pode indevidamente sugar os membros superiores do operador, que normalmente é um trabalhador infantil.

Nesse aspecto, Vicente José Malheiros da Fonseca noticia que "a impressa nacional denunciou que uma garota, menor de 7 anos de idade, foi vítima de um grave acidente de trabalho, numa olaria, na cidade de Abaetetuba, Estado do Pará (Amazônia). A menina teve mutilado os dois braços numa máquina rudimentar de fazer telhas e tijolos, conhecida por ‘maromba’. Por isso, passou a trabalhar, comer e escrever com os pés" [36].

Outro ponto que deve ser observado refere-se à queima dos tijolos e das telhas nos fornos, haja vista que esses locais não apenas são perigosos em razão do risco de queimadura de crianças e adultos que trabalham no local, como também em razão da possibilidade do surgimento de patologias respiratórias nos trabalhadores decorrentes da emissão de gases tóxicos pelo forno.

Nessa apertada síntese descritiva do trabalho em carvoarias e em olarias, verifica-se que as atividades laborais em questão são efetivamente degradantes e insalubres, o que impossibilitam, nos moldes descritos, a prática da atividade laboral de qualquer ser humano, em especial de crianças e adolescentes.

A indisponibilidade dos direitos à saúde, segurança e higiene no trabalho consagrados no texto constitucional, bem como o direito dos trabalhadores a redução dos riscos inerentes ao trabalho também assegurados na Carta Republicana impulsionam o operador do direito a utilização da interpretação teleológica, que possibilite o cumprimento da finalidade do texto constitucional, ou seja, que possibilite a vedação do trabalho insalubre ao menor de 18 anos e, para todo e qualquer obreiro, a eliminação ou neutralização das condições de trabalho insalubre pelo empregador.

Nesse sentido, exige-se dos agentes do direito a busca de medidas preventivas, como o maior rigor da fiscalização dos auditores do trabalho para que se possa exigir que o ambiente laboral observe as condições hígidas, saldáveis e seguras, e que não haja submissão do menor de 18 anos ao trabalho insalubre, sob pena de interdição do empreendimento econômico (art. 161, parágrafo segundo da CLT); como também a fixação de medidas pedagógicas, como a fixação dano moral de ordem individual e coletivo pela submissão do trabalhador a condições insalubres e degradantes que poderiam ser solucionadas com a utilização de tecnologias já existentes que possibilitem a eliminação e/ou redução dos riscos ocupacionais, como também o reconhecimento do salário do trabalhador como base de cálculo do adicional de insalubridade como medida que se coaduna com os ditames do texto constitucional (art. 7º, incisos IV, XXII e XXIII) e pressiona o empregador, em razão da elevação da remuneração do trabalhador e dos respectivos encargos sociais, a buscar os meios necessários para tornar as condições de trabalho salubre.


5 – A Proteção do Trabalho Infantil em Condições Perigosas

A palavra periculosidade, do latim periculosus, é definida por De Plácido e Silva como o "estado ou a qualidade de perigoso, em que se possam apresentar coisas e pessoas... quer significar, assim, a situação que oferece perigos ou o estado de quem pode expor alguém a perigo, ou lhe proporcionar um mal ou um dano" [37].

O trabalho perigoso pode ser conceituado como o desempenho de atividades laborais em que o obreiro é exposto a risco ocupacional que potencialmente pode resultar em mutilação ou perda da vida do trabalhador.

O reconhecimento das atividades perigosas pela legislação brasileira ocorreu pela primeira vez através da Lei n. 2.673, de 15 de agosto de 1955, que no seu art. 2º definiu, limitativamente, como labor perigoso apenas os relacionados ao "transporte de carga e descarga de inflamáveis, do reabastecimento de caminhões-tanque e de postos de serviço, enchimento de latas e tambores, dos serviços de manutenção e operação em que o trabalhador se encontre sempre em contato com inflamáveis, em recintos onde estes são armazenados e manipulados ou em veículos em que são transportados".

José Augusto Rodrigues Pinto e Rodolfo Pamplona Filho comentam que "essa conceituação (Lei n. 2.673/55 - art. 2º) restrita aos inflamáveis e extremamente casuística foi logo interpretada, na doutrina e na jurisprudência, como correspondente a toda situação em que o empregado fosse colocado em contato direto e permanente com substâncias inflamáveis ou explosivas, permitindo considerar-se perigoso, além das operações com combustíveis, o trabalho com outras substâncias explosivas, como a dinamite, o TNT etc" [38].

A Lei n. 2.673/55 foi derrogada pela Lei n. 6.514, de 22 de dezembro de 1977, que reformulou o Capítulo V (DA SEGURANÇA E DA MEDICINA DO TRABALHO) do Título II da CLT, dando nova redação ao art. 193, da CLT, que passou estabelecer como condições de periculosidade "aquelas que, por sua natureza ou método de trabalho, impliquem o contato permanente com inflamáveis ou explosivos em condições de risco acentuado".

O ordenamento jurídico (art. 7º, inciso XXIII, da Constituição Federal; art. 193, da CLT; NR-16, item 16.2) vem legitimando o trabalho em condições perigosas (contato com inflamáveis ou explosivos) através da fixação do adicional de 30% (trinta por cento) incidente sobre o salário, sem os acréscimos resultantes de gratificações, prêmios ou participação nos lucros da empresa.

No caso das condições perigosas estabelecidas pelo art. 193, da CLT, verifica-se que os líquidos inflamáveis, conforme estabelece a NR-20, item 20.2.1, são todos aqueles que possuem ponto de fulgor inferior a 70º C (setenta graus centígrados) e pressão de vapor que não exceda 2,8 kg/cm² absoluta a 37,7º C (trinta e sete graus e sete décimos de graus centígrados).

Os explosivos, consoante estabelece a NR-19, item 19.1.1, são substâncias capazes de rapidamente se transformarem em gases, produzindo calor intenso e pressões elevadas, subdivididos em:

a)Explosivos indicadores: aqueles que são empregados para excitação de cargas explosivas, sensíveis ao atrito, calor e choques. Sob efeito do calor explodem sem se incendiar;

b)Explosivos reforçadores: os que servem como intermediário entre o indicador e a carga explosiva propriamente dita;

c)Explosivos de rupturas: são os chamados altos explosivos, geralmente tóxicos;

d)Pólvoras: que são utilizados para propulsão ou projeção.

A norma jurídica brasileira, através da Lei n. 7.369/85 e do Decreto n. 93.412/86, passou a incluir como labor perigoso as atividades submetidas ao risco de infortúnio acarretado pelo trabalho junto às fontes de eletricidade, enquadrando-se como condições perigosas os trabalhos realizados no sistema elétrico de potência ou de risco equivalente nas empresas de consumo, geração, transmissão ou distribuição de energia elétrica.

O ordenamento pátrio, através da Portaria n. 518, de 04 de abril de 2003, do Ministério do Trabalho e do Emprego, também assegura o adicional de periculosidade aos trabalhadores expostos a radiações ionizantes ou substâncias radioativas.

O adicional de periculosidade, assim como de insalubridade, objetiva compensar monetariamente o risco da atividade laboral, demonstrando a opção da política legislativa brasileira pela monetarização do risco em detrimento da saúde, higiene e segurança do trabalhador.

No caso específico do trabalhador infantil, seguindo a mesma sistemática do labor insalubre, observa-se que a norma constitucional, com base na promoção do patamar mínimo de existência digna do ser humano, também veda expressamente o trabalho do menor de 18 (dezoito) anos em condições perigosas.

O labor perigoso é indicado em 05 (cinco) hipóteses do Decreto Presidencial n. 6.481, de 12 de junho de 2008, que sistematiza as piores formas de trabalho infantil consagradas pela Convenção n. 182 da OIT, ou seja, enumera o labor com manuseio de inflamáveis e explosivos; o trabalho em fábricas de fogos de artifício; o labor em sistema de geração, transmissão e distribuição de energia elétrica; a atividade na produção de carvão e o labor com exposição a radiações ionizante e não-ionizantes (microondas, ultravioleta ou laser) dentre as piores formas de trabalho infantil em condições perigosas que devem ser banidos do Brasil, merecendo destaque, em razão da grande repercussão social, o trabalho realizado na produção de fogos de artifício.

O labor na produção de fogos de artifício consiste em uma forma trabalho rudimentar, sendo realizado manualmente por mulheres e crianças, sem qualquer equipamento de proteção individual ou coletivo, nas portas de pequenos casebres ("fábricas clandestinas") localizados em cidades e vilarejos do interior dos Estados da Região Nordeste, como a Bahia.

Nessas atividades já foram registradas a ocorrência de várias explosões que vitimaram diversas vidas de trabalhadores, dentre os quais, crianças e adolescentes.

A ocorrência de maior repercussão ocorreu em 11 de dezembro de 1998, no município de Santo Antônio de Jesus, na Bahia, quando uma fábrica clandestina de fogos de artifício explodiu, provocando o óbito de 60 (sessenta) pessoas, na maioria mulheres e crianças [39].

No mesmo município de Santo Antônio de Jesus, em 27 de março de 2007, outra nova explosão em uma fábrica de fogos de artifício ocorreu, resultando na morte de Sólon dos Passos, que teve 90% do seu corpo queimado. Em fevereiro de 2008, Roberto Carlos Barbosa dos Santos, 34 anos e Jefferson Ramos Santana, 14 anos, também morreram em consequência de outra explosão em fábrica ilegal de fogos [40].

Cabe ressaltar que a impunidade dos envolvidos no caso das explosões do município de Santo Antônio de Jesus e ausência de fiscalização do trabalho infantil desencadeou o acionamento do Brasil perante a ausência Comissão Interamericana no caso conhecido como "Explosão de Fábrica Clandestina de Fogos de Artifício" (Caso 12.428), sendo reconhecido pelo Ministro Paulo Vannuchi, da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência de República, em audiência realizada em Washington (EUA), as irregularidades supra mencionadas, porém até a presente data os responsáveis pelas explosões não foram julgados e as famílias das vítimas não receberam qualquer tipo de reparação pecuniária [41].

1.Verifica-se também que o labor infantil em fábricas de fogos de artifício, consoante estudos realizados por Inaiá Maria Moreira de Carvalho [42], vem proporcionando a ocorrência de diversas enfermidades de natureza respiratória e dermatológica em crianças e adolescentes.

Nessas condições de trabalho, verifica-se que, dentre as piores formas de trabalho infantil reconhecidas como atividades perigosas declinadas no Decreto Presidencial n. 6.481/2008 e pela Convenção n. 182 da OIT, o labor realizado na produção de fogos de artifício configuram, nos moldes descritos, trabalho também de cunho degradante que deve ser expressamente vedado para todo e qualquer ser humano, principalmente para crianças e adolescentes.

Como forma de humanizar ambientes de trabalho perigosos, como em áreas de produção de fogos de artifício, deve o gestor da atividade econômica buscar mecanismos que materializem a efetividade da proteção constitucional dos direitos à saúde, segurança e higiene no trabalho, ou seja, deve buscar a adoção de medidas de prevenção da ocorrência do infortúnio laboral que se inicia com a implantação do Serviço Especializado em Engenharia de Segurança e Medicina do Trabalho (SESMET) para sistematizar e colocar em prática um plano preventivo de acidentes de trabalho que perpassa prioritariamente pela antecipação e reconhecimento dos riscos nas fases de produção, armazenamento e transporte dos fogos de artifício; estabelecimento de metas de avaliação e controle; análise dos riscos e da exposição dos trabalhadores; implantação de medidas de controle e avaliação de sua eficácia e o monitoramento da exposição aos riscos.

O SESMT se constitui em órgão interno da empresa composto especificamente por profissionais com formação especializada em segurança e medicina do trabalho, conforme estabelece a NR-4, devendo está integrado e coordenar o plano de ações de programas de prevenção de acidentes ocupacionais, como o Programa de Prevenção de Riscos Ambientais (PPRA), que foi instituído pela NR-9, e o Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO), que é tratado na NR-7.

Não resta dúvida, portanto, que o trabalho em condições perigosas deve permanecer expressamente vedado ao trabalhador infantil, consoante estabelece o texto constitucional (art. 7º, inciso XXXIII), como também, ainda em observância a Carta Magna que consagra "redução dos riscos inerentes ao trabalho" (art. 7º, inciso XXII) como uma das manifestações da dignidade humana na órbita do habitat laboral, deve-se exigir nos gestores das atividades que possibilitam a exposição do trabalhador a condições perigosas preceituadas no art. 193, da CLT, na NR-16, na NR-19, na NR-20, na Lei n. 7.369/85 e na Portaria n. 518/2003, do Ministério do Trabalho e do Emprego, que realizem, com seriedade e responsabilidade, a implantação do SESMET, bem como a sua respectiva sistematização e adoção prática de plano preventivo de acidentes de trabalho, sob pena de interdição e/ou embargo do empreendimento, conforme estabelece o art. 161, parágrafo segundo da CLT.


6 – A Proteção do Trabalho Infantil em Horário Noturno

A palavra "noite", do latim nox, noctis, é definida por De Plácido e Silva como "a designação dada à parte do dia que se escurece pelo afastamento do sol de nosso hemisfério, até seu novo aparecimento no horizonte. Assim, enquanto o dia natural é reconhecido pelo espaço de tempo, em que o sol dá sua claridade a certo hemisfério, a noite é espaço de tempo, compreendido pelo escurecimento, em que se encontra esse mesmo hemisfério, pelo desaparecimento do sol" [43].

Na definição jurídica de trabalho noturno, eventos como o pôr-do-sol ou o anoitecer nem sempre são considerados como fatores preponderantes para delimitação do período noturno, existindo grande variação legislativa na fixação do lapso temporal do labor noturno.

Octavio Bueno Magano comenta que "trabalho noturno é o executado à noite. Não há, porém, unidade de vistas a respeito do período que deva ser considerado noturno. Na França, na Itália, no Luxemburgo, consta-se que esse espaço de tempo é das vinte e duas às cinco horas; na Espanha, das vinte às seis; em Portugal, das vinte às sete; na Argentina, das vinte e uma às seis; no Panamá e na Colômbia das dezoito às seis" [44].

O trabalho noturno, portanto, é o labor realizado no período do dia e/ou da noite fixado como horário noturno pelo ordenamento jurídico do país.

No Brasil, a legislação estabeleceu como trabalho noturno o "executado entre as 22 (vinte e duas) horas de um dia e as 5 (cinco) horas do dia seguinte" (art. 73, § 2º, da CLT).

No caso do trabalhador rural, a legislação brasileira estabeleceu tratamento específico, fixando como trabalho noturno "o executado entre as 21 (vinte e uma) horas de um dia e as 5 (cinco) horas do dia seguinte, na lavoura, e entre as 20 (vinte) horas de um dia e as 4 (quatro) horas do dia seguinte, na atividade pecuária" (art. 7º, caput, da Lei n. 5.889/73).

Analisando os efeitos do trabalho noturno no organismo, verifica-se que a estrutura orgânica do ser humano foi geneticamente formada para desempenhar suas atividades durante o dia e descansar no período da noite, coadunando-se com o ciclo luz / escuridão, que para os seres vivos é um relevante sincronizador externo.

Neste sentido, Ingeborg Sell descreve a interação fisiológica e comportamental do organismo humano com o ciclo luz / escuridão:

"A luz natural é um sincronizador importante para a maioria dos seres vivos. Impressionados pela luminosidade, as células da retina no ser humano disparam através dos nervos óticos uma mensagem elétrica, que alcança o hipotálamo, na base do cérebro. O hipotálamo, além de comandar as glândulas do organismo, possui um pequeno núcleo onde se localiza o relógio biológico, considerado essencial à manutenção dos ritmos.

A glândula pineal, localizada na área dorsal do cérebro e comandada pelo hipotálamo, tem sua função regulada pela luminosidade do dia: alta luminosidade natural (a luz artificial é muito fraca para produzir o mesmo efeito) impede a produção de melatonina; quando chega a noite, a glândula pineal é desbloqueada, começando a liberar esse hormônio que, além de induzir o sono, age como uma espécie de indicador para os outros ritmos biológicos. Para uma boa qualidade de vida do sono é necessário que haja um certo nível de melatonina. O organismo parece compreender que existe um momento antes e um depois da produção dela. Ela regula diversas funções metabólicas e exerce papel fundamental da fisiopatologia dos transtornos da puberdade e das convulsões. Ela também estimula certas células imunológicas que combatem tumores, que por isso, crescem menos à noite do que de dia. Algumas horas após o início da produção de melatonina, a hipófise começa a segregar o hormônio do crescimento, cujo pico no organismo se dá por volta das 3:00 h da madrugada. Esse hormônio é responsável pela renovação das células, processo rítmico que se repete noite após noite. (...)

Assim como há hormônios que induzem o sono, há também hormônios que preparam o organismo para a vigília: o cortisol e a corticotrofina ocorrem em níveis mais baixos nas horas iniciais do sono e mais altos nas fases finais, preparando o organismo para a vigília. O cortisol aumenta a resistência ao estresse físico" [45].

O relógio biológico também fixa regularmente os horários de ingestão do alimento, preparando o sistema digestivo para receber os nutrientes, sendo importante a manutenção dos horários de refeição, pois o consumo de alimento fora do horário estabelecido pelo relógio biológico pode ocasionar o aparecimento de desordens gastrointestinais como azia, má digestão, gastrite e úlceras.

O labor noturno, portanto, apesar de impulsionado pelas necessidades de ordem social [46], econômica [47] e tecnológica [48], vem causando graves prejuízos à saúde dos trabalhadores, com o aumento da incidência de diversas enfermidades (distúrbios do sono, doenças gastrointestinais, alterações cardiovasculares, câncer, dentre outras), além de comprometer os relacionamentos familiares e sociais do obreiro.

Nessa sistemática, verifica-se que o próprio INSS, na lista das doenças ocupacionais fixadas pelo Decreto n. 3.048/99, Anexo II, Lista B, reconhece como patologias ocupacionais o "Transtorno do Ciclo Vigília-Sono Devido a Fatores Não Orgânico (F51.2)" que possui como agentes etiológicos a "má adaptação à organização do horário de trabalho (trabalho em turnos ou trabalho noturno)" e "circunstância relativa às condições de trabalho".

O problema de relacionamento sócio-familiar do trabalhador é uma outra conseqüência do trabalho noturno, haja vista que a inversão temporal do seu relógio biológico dificulta a participação do obreiro nas atividades culturais, familiares e de lazer.

Em meio às conseqüências nocivas do trabalho noturno, observa-se que a legislação brasileira, de forma tímida, estabeleceu alguns benefícios ao trabalhador com o objetivo de tentar minimizar os seus efeitos danosos.

O art. 73, caput, da CLT, fixou como devido ao trabalhador noturno o adicional de 20% (vinte por cento) sobre a hora diurna como forma de compensar o desconforto físico e mental sofrido pelo obreiro, bem como equiparou a hora de trabalho noturno a 52 (cinqüenta e dois) minutos e 30 (trinta) segundos.

No caso do trabalhador rural, o legislador brasileiro estabeleceu o adicional noturno no percentual de 25% (vinte e cinco por cento) sobre a hora diurna, conforme consta no art. 7º, parágrafo único, da Lei n. 5.889/73, porém não fixou qualquer redução na hora noturna.

Com relação especificamente ao labor do menor, constata-se que a norma constitucional expressamente proíbe o trabalho noturno dos "menores de 18 (anos) e de qualquer trabalho a menores de 16 (dezesseis) anos, salvo na condição de aprendiz, a partir de 14 anos" (art. 7º, inciso XXXIII), restrição esta que já era estabelecida pelo art. 404, da CLT.

O trabalho noturno é indicado em 03 (três) hipóteses do Decreto Presidencial n. 6.481, de 12 de junho de 2008, que sistematiza as piores formas de trabalho infantil consagradas pela Convenção n. 182 da OIT, ou seja, enumera o labor na cata de iscas de pesca em horário noturno; o cuidado e vigilância de crianças, idosos e doentes em horário noturno e o labor doméstico em horário noturno entre as piores formas de trabalho infantil que devem ser extirpadas do Brasil.

Em razão das afetações do trabalho noturno, seja no âmbito da saúde ou das relações sócio-familiares, não resta dúvida que deve prevalecer a vedação constitucional que impede o trabalho infantil em horário noturno, como também se deve superar a timidez do ordenamento jurídico brasileiro que atribui como benefício ao trabalhador noturno apenas o adicional noturno de 20% (vinte por cento) sobre a hora diurna para o trabalhador celetista e de 25% (vinte e cinco por cento) sobre a hora diurna para o trabalhador rural.

Nesta perspectiva, verifica-se que a efetiva compensação pelo desconforto físico, mental e sócio-familiar sofrido pelos trabalhadores que desempenham suas atividades em horário noturno deve perpassar pela adoção das seguintes medidas: alteração do art. 73, caput, da CLT, para que a jornada de trabalho noturna seja de no máximo 06 (seis) horas, com a concessão obrigatória do intervalo de 01 (uma) hora computado como duração do trabalho, estabelecendo o adicional noturno no percentual de 50% (cinquenta por cento) da hora diurna; alteração do art. 136, da CLT, para que seja estabelecido que os trabalhadores do horário noturno, após o período aquisitivo das férias, escolham a época para concessão das férias, desde que não comprometa o funcionamento da empresa; adoção de dispositivo legal que imponha às empresas a realização de exames médicos e psicológicos a cada 03 (três) meses, e o fornecimento regular de alimentação aos trabalhadores do horário noturno.


7 – Considerações Finais

Aquele que mantém seu senso crítico acionado não deixou de perceber, em meio à trama de "Quem Quer Ser Um Milionário?" [49], um vergonhoso exemplo de exploração de trabalho infantil. Nessa famosa película, um aliciador arregimenta diversas crianças debaixo do falso intuito fraternal de resgatá-las da violência das ruas. Todavia, seu verdadeiro objetivo é garimpar talentos mirins para apresentações musicais a céu aberto, com propósitos de mendicância.

A armadilha envolvia uma sórdida medida: aqueles cujos dotes artísticos se destacavam dos demais tinham seus olhos queimados, para que, na qualidade de deficientes visuais, causassem maior comoção à plateia e, com isso, alcançassem maior rentabilidade para seu aliciador. Com esse macabro expediente, mais que da visão física, a criança também era espoliada de seus sonhos, de seu futuro. É que a cegueira, naquele caso, não apenas fechava a possibilidade de ver luz, mas também estancava a oportunidade de ser luz, de se tornar alguém, de viver a máxima potencialidade de sua dignidade humana.

Debaixo desse enfoque, a pergunta "Quem quer ser um milionário?" acaba ganhando um novo contorno significativo. E, na esteira do que sucede na tela do cinema, a vida, por aqui, entre cegos e milionários, também se pauta na cadência do mesmo ritmo: uns ganham; outros perdem...

Não é fácil reconhecer, mas o fato é que essa exitosa produção cinematográfica tão somente reproduz uma prática exploratória que, em pleno século XXI, ainda preenche o cotidiano de inúmeras crianças. Talvez na grande maioria dos casos não se chegue ao disparate de literalmente cegar os menores. Mas o fato, indiscutível, é que ao despender boa parte da infância no labor, milhões de crianças ao redor do mundo – tal como ocorre com aquelas retratadas no filme – também são abruptamente privadas de seu futuro, de seus sonhos, da oportunidade de poder construir sua história.

No transcorrer deste estudo, deixamos registrado que a proteção ao trabalho do menor é uma preocupação que já há algum tempo nos incomoda. Mas, infelizmente, a realidade, como vimos, é prenhe de situações em que nossas crianças e adolescentes são objeto de reprovável exploração, circunstância de deletérios efeitos, para eles próprios e para todos, hoje e amanhã.

De todo modo, também consignamos, neste texto, a esperançosa existência de um vigoroso arsenal jurídico, nacional e internacional, cujo grande desiderato é viabilizar a construção de uma sociedade diferente, onde a erradicação do trabalho infantil seja, enfim, uma realidade efetivamente palpável, concreta, e cuja responsabilidade constitui, a um só tempo, dever de todos e de cada um. Eis, pois, hoje, o nosso grande desafio: aproximar a teoria da prática.

Como leciona, com precisão, SOUTO MAIOR, "não há como possam os homens do direito continuar buscando fórmulas nos meandros da legislação para permitir que a exploração do trabalho infantil sirva aos restritos propósitos de acumulação de riqueza de alguns. O direito possui todas as ferramentas para negar isso. Basta que sejam aplicadas" [50].

Utopia? Quem sabe. Lembremos de Mario Quintana: "Se as coisas são inatingíveis... ora! Não é motivo para não querê-las... Que tristes os caminhos se não fora a mágica presença das estrelas!".

Então, resolutos, continuemos nossa marcha...


8 – Referências

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Notas

  1. VIANNA, Segadas. Instituições de Direito do Trabalho. Arnaldo Süssekind... [Et al.]. 21ª Edição. Vol. 2, São Paulo : LTr, 2003, p. 996.
  2. "Entre os trabalhadores europeus do século XIX havia muitas crianças. Para os patrões era vantajoso empregar crianças: elas costumavam ser mais submissas do que os adultos, recebiam salários ainda mais baixos e podiam movimentar-se por espaços estreitos. As crianças arrastavam-se por baixo do tear para recolher os restos de lã que caíam da máquina. Os retalhos eram catados e retornavam às máquinas de fiar para que não houvesse desperdício de matéria-prima.  As crianças que faziam isso corriam o risco de serem esmagadas pelas máquinas. Muitas vezes as crianças ficavam cansadas, sonolentas, e não conseguiam manter a velocidade exigida pelas máquinas. Quando isso ocorria, em geral apanhavam para trabalharem mais depressa ou tinham a cabeça mergulhada em água fria para ficarem acordadas. Em meados do séc. XIX, o avanço da maquinaria nas fábricas inglesas tornou desnecessário o emprego da força muscular para a produção, permitindo o uso de mão-de-obra feminina e infantil" (grifos no original). Disponível em: http://sol.sapo.pt/blogs/olindagil/archive/2010/02/10/O-Trabalho-Infantil-no-s_E900_culo-XIX.aspx. Acesso: 09.04.2010.
  3. Disponível em: http://translate.google.com.br/translate?hl=pt-BR&langpair=en%7Cpt&u=http://www.buzzle.com/articles/history-of-child-labor.html. Acesso: 09.04.2010.
  4. GARCIA, Gustavo Filipe Barbosa. Curso de Direito do Trabalho. 4ª Edição. São Paulo : Método, 2010, p. 991.
  5. BARROS, Alice Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho. São Paulo : LTr, 2005, p. 517.
  6. SOUZA, Sergio Augusto Pereira. A declaração dos direitos da criança e a convenção sobre os direitos da criança. Direitos humanos a proteger em um mundo em guerra. Jus Navigandi, Teresina, ano 6, n. 53, jan. 2002. Disponível em: http://jus.com.br/artigos/2568. Acesso: 12.04.2010.
  7. FRANCO FILHO, Georgenor de Sousa (organizador). Tratados Internacionais. São Paulo : LTr, 1999, p. 411.
  8. Disponível em: http://www2.camara.gov.br/comissoes/cdhm/instrumentos/declaracaodireitoscrianaca.html. Acesso: 12.04.2010.
  9. FRANCO FILHO, Georgenor de Sousa (organizador). Tratados Internacionais. São Paulo : LTr, 1999, p. 411.
  10. FRANCO FILHO, Georgenor de Sousa (organizador). Tratados Internacionais. São Paulo : LTr, 1999, p. 411.
  11. SOUZA, Sergio Augusto Pereira. A declaração dos direitos da criança e a convenção sobre os direitos da criança. Direitos humanos a proteger em um mundo em guerra. Jus Navigandi, Teresina, ano 6, n. 53, jan. 2002. Disponível em: http://jus.com.br/artigos/2568. Acesso: 12.04.2010.
  12. Esse histórico foi extraído do cotejo das seguintes obras: SÜSSEKIND, Arnaldo. Direito Internacional do Trabalho. 3ª Edição. São Paulo : LTr, 2000; BARROS, Alice Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho. São Paulo : LTr, 2005; GARCIA, Gustavo Filipe Barbosa. Curso de Direito do Trabalho. 4ª Edição. São Paulo : Método, 2010. Destaca Alice Monteiro de Barros que "as principais Convenções da OIT sobre a temática, ratificadas pelo Brasil, são as de n. 05, 06, 16, 58, 138, 142 e 182. Além dessas normas internacionais, há várias recomendações da OIT sobre o trabalho do menor..." (BARROS, Alice Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho. São Paulo : LTr, 2005, p. 520).
  13. Fonte: "El Convenio núm. 182: la eliminación de las peores formas de trabajo infantil". Ginebra : Organización International del Trabajo – OIT, 2009, p. 2-3.
  14. Fonte: "Trabajo – La Revista de la OIT". Ginebra : Organización International del Trabajo – OIT, número 61, dez/2007, p. 5.
  15. Sobre esses entes cuja criação se destinou especificamente para o cumprimento do elevado intuito social incrustado na Convenção 182 da OIT, vale conferir: VIDOTTI, Tárcio José. Exploração de Crianças e Adolescentes em Condições Análogas à de Escravo. In Trabalho Escravo Contemporâneo: O Desafio de Superar a Negação. VELLOSO, Gabriel; FAVA, Marcos (coordenadores). São Paulo : LTr, 2006, p. 139-150.
  16. Sobre o princípio da proteção integral, confira-se: GARCIA, Gustavo Filipe Barbosa. Curso de Direito do Trabalho. 4ª Edição. São Paulo : Método, 2010, p. 997. Sobre os diversos fatores sempre ventilados para justificar essa ampla rede de proteção normativa de tutela da pessoa do menor, destacam com extrema lucidez MARANHÃO e CARVALHO, in verbis: "Motivos de ordem biológica, moral, social e econômica encontram-se na base da regulamentação legal do trabalho do menor. A necessidade de trabalhar não deve, evidentemente, prejudicar o normal desenvolvimento do organismo do menor. A formação moral e escolar impõe que, até determinada idade, não se afaste o menor da escola e do lar. Tais razões não interessam apenas ao menor, como indivíduo, ou a seus pais, mas à sociedade, à nação, para que aqueles que a venham a integrar, no futuro, não tenham seu desenvolvimento físico e espiritual lesado pelo trabalho prematuro ou em condições adversas. Finalmente, o trabalho prematuro do menor, além de seu pequeno rendimento em termos de produção, pode, ainda assim, traduzir-se em concorrência ao do trabalhador adulto, gerando desemprego" (MARANHÃO, Délio; CARVALHO, Luiz Inácio Barbosa. Direito do Trabalho. 17ª Edição. Rio de Janeiro : Editora da Fundação Getulio Vargas, 1998, p. 163). Sobre o tema, não há como olvidar da perspicaz crítica formulada por Ives Gandra da Silva Martins Filho, verbis: "A OIT, quando se empenha na erradicação do trabalho infantil, não o faz exclusivamente por motivos humanitários. Visa, muitas vezes, como objetivo mais concreto e menos ideal, combater a concorrência desleal que se dá no mercado internacional, no qual a exploração da mão-de-obra infantil, abundante e barata, permite a países subdesenvolvidos concorrerem com países que têm a seu favor o avanço tecnológico" (MARTINS FILHO, Ives Gandra da Silva. Manual de Direito e Processo do Trabalho. 18ª Edição. São Paulo : Saraiva, 2009, p. 173-174). Segundo a precisa lição de Alice Monteiro de Barros, as medidas de proteção ao menor, no campo laboral, buscam se afinar, em síntese, com os seguintes parâmetros: proibir o trabalho da criança, restringir o trabalho do jovem e equiparar o trabalho do maior de 18 anos ao do adulto (Curso de Direito do Trabalho. São Paulo : LTr, 2005, p. 516).
  17. "Trabalho versus escola parece ser dilema proposto, inevitavelmente, nesse debate. Os padrões internacionais vigorantes indicam que o trabalho precoce consolida e reproduz a miséria, inviabilizando que a criança e o adolescente suplantem suas deficiências estruturais através do estudo" (destaques no original). Fonte: DELGADO, Mauricio Godinho.Curso de Direito do Trabalho. 3ª Edição. São Paulo : LTr, 2004, p. 784.
  18. BRITO FILHO, José Cláudio Monteiro de. Trabalho com redução à condição análoga à de escravo: análise a partir do trabalho decente e de seu fundamento, a dignidade da pessoa humana. In Trabalho Escravo Contemporâneo: O Desafio de Superar a Negação. VELLOSO, Gabriel; FAVA, Marcos (coordenadores). São Paulo : LTr, 2006, p. 126-128. Sobre o tema do trabalho decente, vale conferir ainda: BRITO FILHO, José Cláudio Monteiro de. Trabalho decente: análise jurídica da exploração do trabalho: trabalho forçado e outras formas de trabalho indigno. São Paulo : LTr, 2004; GARCIA, Gustavo Filipe Barbosa. Direitos fundamentais e relação de emprego: trabalho, constituição e processo. São Paulo : Método, 2008.
  19. BARROS, Alice Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho. São Paulo : LTr, 2005, p. 518.
  20. Sobre o tema do limite de idade do menor, com referência a uma ampla rede de proteção forjada à luz do princípio da proteção integral, vale conferir as seguintes orientações elaboradas pela Coordenadoria Nacional de Combate à Exploração do Trabalho de Crianças e Adolescentes (COORDINFANCIA), do Ministério Público do Trabalho (MPT): "ORIENTAÇÃO N. 01. Autorizações Judiciais para o Trabalho antes da idade mínima. Invalidade por vício de inconstitucionalidade. Inaplicabilidade dos arts. 405 e 406 da CLT. Inaplicabilidade do art. 149 da CLT como autorização para o trabalho de crianças e adolescentes. I - Salvo na hipótese do art.8°, item I da Convenção n. 138 da OIT, as autorizações para o trabalho antes da idade mínima carecem de respaldo constitucional e legal. A regra constitucional insculpida no art. 7º, inciso XXIII, que dispõe sobre a idade mínima para o trabalho é peremptória, exigindo aplicação imediata. II – As disposições contidas nos arts. 405 e 406 da CLT não mais subsistem na Ordem Jurídica, uma vez que não foram recepcionadas pela Ordem Constitucional de 1988, a qual elevou à dignidade de princípio constitucional os postulados da proteção integral e prioridade absoluta (art. 227), proibindo qualquer trabalho para menores de 16 anos, salvo na condição de aprendiz, a partir dos 14. III – A autorização a que se refere o art. 149, inciso II, do Estatuto da Criança e do Adolescente, não envolve trabalho, mas a simples participação de criança e de adolescente em espetáculo público e seu ensaio e em certame de beleza. (Orientação elaborada e aprovada com base em estudo da Coordinfância.) ORIENTAÇÃO N. 02. Trabalho Infantil Artístico. Proibição Geral para menores de 16 anos. Excepcionalidades. Condições Especiais. I. O trabalho artístico, nele compreendido toda e qualquer manifestação artística apreendida economicamente por outrem, é proibido para menores de 16 anos, salvo na condição de aprendiz, a partir dos 14 anos, nos termos do art. 7°, XXXIII da Constituição Federal. II. Admite-se, no entanto, a possibilidade de exercício de trabalho artístico, para menores de 16 anos, na hipótese do art. 8°, item I da Convenção n. 138 da OIT, desde que presentes os seguintes requisitos: A) Excepcionalidade; B) Situações Individuais e Específicas; C) Ato de Autoridade Competente (autoridade judiciária do trabalho); D) Existência de uma licença ou alvará individual; E) O labor deve envolver manifestação artística; F) A licença ou alvará deverá definir em que atividades poderá haver labor, e quais as condições especiais de trabalho. III. Em razão dos princípios da proteção integral e prioridade absoluta, são condições especiais de trabalho a constar em qualquer alvará judicial que autorize o exercício de trabalho artístico para menores 16 anos, sob pena de invalidade: A) Imprescindibilidade de Contratação, de modo que aquela específica obra artística não possa, objetivamente, ser representada por maior de 16 anos; B) Prévia autorização de seus representantes legais e concessão de alvará judicial, para cada novo trabalho realizado; C) Impossibilidade de trabalho em caso de prejuízos ao desenvolvimento biopsicosocial da criança e do adolescente, devidamente aferido em laudo médico-psicológico; D) Matrícula, freqüência e bom aproveitamento escolares, além de reforço escolar, em caso de mau desempenho; E) Compatibilidade entre o horário escolar e atividade de trabalho, resguardos dos direitos de repouso, lazer e alimentação, dentre outros; F) Assistência médica, odontológica e psicológica; G) Proibição de labor a menores de 18 anos em locais e serviços perigosos, noturnos, insalubres, penosos, prejudiciais à moralidade e em lugares e horários que inviabilizem ou dificultem a frequência à escola; H)Depósito, em caderneta de poupança, de percentual mínimo incidente sobre a remuneração devida; I) Jornada e carga horária semanal máximas de trabalho, intervalos de descanso e alimentação; J) Acompanhamento do responsável legal do artista, ou quem o represente, durante a prestação do serviço; L) Garantia dos direitos trabalhistas e previdenciários quando presentes, na relação de trabalho, os requisitos do arts. 2° e 3° da Consolidação das Leis do Trabalho. (Orientação elaborada e aprovada com base em estudo da Coordinfância)". Fonte: http://www.pgt.mpt.gov.br/portaltransparencia/download.php?tabela=PDF&IDDOCUMENTO=641 Acesso: 29.04.2010.
  21. Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/folha/informatica/ult124u701196.shtml - Acesso: 06.04.2010.
  22. Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/folha/mundo/ult94u9550.shtml - Acesso: 06.04.2010.
  23. SILVA, Maria de Salete e ALCÂNTARA, Pedro Ivo. O Direito de Aprender: Potencializar Avanços e Reduzir Desigualdades. Brasília: UNICEF, 2009, p. 20. Disponível em: http://www.unicef.org/brazil/pt/siab_capitulos.pdf - Acesso: 06.04.2010.
  24. SILVA, Maria de Salete e ALCÂNTARA, Pedro Ivo. O Direito de Aprender: Potencializar Avanços e Reduzir Desigualdades. Brasília: UNICEF, 2009, p. 20. Disponível em: http://www.unicef.org/brazil/pt/siab_capitulos.pdf - Acesso: 06.04.2010.
  25. Disponível em: http://www.oitbrasil.org.br/topic/ipec/pub/boas_praticas_setor_saude_144.pdf - Acesso: 06.04.2010.
  26. Cabe destacar que as estatísticas apresentadas pelo SINAN-NET tendem a não refletir a quantidade real dos infortúnios laborais e das patologias do trabalho sofridos por crianças e adolescentes no país, haja vista que os dados estatísticos em questão apenas demonstram as patologias e os acidentes do trabalho regularmente comunicados aos órgãos governamentais (Ministério da Saúde ou Ministério da Previdência Social), de modo que não se inclui o infortúnio laboral ou enfermidade ocupacional sofridos por trabalhadores infantis que são tratados na rede hospitar pública ou privada como enfermidade não relacionada as condições de trabalho.
  27. Disponível em: http://www.pnud.org.br/gerapdf.php?id01=3034 - Acesso: 06.04.2010.
  28. FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Minidicionário da Língua Portuguesa. 2ª ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1988, p. 362.
  29. OLIVEIRA, Sebastião Geraldo de. Proteção Jurídica à Saúde do Trabalhador. 3ª ed. São Paulo: LTr, 2001, p. 172.
  30. NR-15, Anexos 1, 2, 3, 5, 6, 7, 8, 9 e 10.
  31. NR-15, Anexos 11, 12 e 13.
  32. NR-15, Anexo 14.
  33. TORLONI, Maurício, e VIEIRA, Antônio Vladimir. Manual de Proteção Respiratória. São Paulo: ABHO, 2003, p. 149/150.
  34. Op. cit., p. 153/154.
  35. HESS, Sônia. Riscos à Saúde do Trabalhador, na Produção do Carvão Vegetal em Carvoarias no Brasil. Disponível em: http://www.riosvivos.org.br/arquivos/1357514940.pdf - Acesso: 13.04.2010.
  36. MALHEIROS, Vicente José Malheiros da. O Trabalho do Menor no Direito Brasileiro. Disponível em: http://bdjur.stj.gov.br/xmlui/bitstream/handle/2011/18854/O_Trabalho_do_Menor_no_Direito_Brasileiro.pdf?sequence=2 - Acesso: 13.04.2010.
  37. SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico. 15a ed. Rio de Janeiro: Forense, 1998, p. 602.
  38. Op. cit., p. 52/53.
  39. Disponível em: http://www.direitos.org.br/index.php?option=com_content&task=view&id=3445&Itemid=1 - Acesso: 19.04.2010.
  40. Disponível em: http://global.org.br/programas/onze-anos-apos-64-mortes-em-explosao-de-fabrica-de-fogos-ilegal-nada-mudou-em-santo-antonio-de-jesus/ - Acesso: 19.04.2010.
  41. Disponível em: http://global.org.br/programas/onze-anos-apos-64-mortes-em-explosao-de-fabrica-de-fogos-ilegal-nada-mudou-em-santo-antonio-de-jesus/ - Acesso: 19.04.2010.
  42. CARVALHO, Inaiá Maria Moreira de. O trabalho infantil no Brasil contemporâneo. Caderno CRH vol.21 no.54 Salvador Sept./Dec. 2008.Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0103-49792008000300010&script=sci_arttext&tlng=es#back11 - Acesso: 19.04.2010.
  43. Op. cit., p. 555.
  44. MAGANO, Octavio Bueno. Manual de Direito do Trabalho. Volume IV – Direito Tutelar do Trabalho. 2ª ed. São Paulo: LTr, 1992, p. 44.
  45. SELL, Ingeborg. Trabalhador em Turnos e Noturno. Medicina Básica do Trabalho. Volume VI. Organizado por Sebastião Ivone Vieira. Curitiba: Gênesis, 1999, p. 79/80.
  46. A complexidade das relações sociais vem impulsionando o trabalho noturno através da organização de serviços essenciais (serviços hospitalares, segurança, transporte, dentre outros) e da expansão das atividades comerciais.
  47. A busca pela recuperação imediata dos investimentos financeiros impõe que máquinas e equipamentos Industriais sejam utilizados 24 (vinte e quatro) horas por dia como forma de alcançar maior rendimento e lucratividade.
  48. Certas indústrias químicas ou metalúrgicas utilizam tecnologias que exigem que o processo indústrial ocorra de forma ininterrupta.
  49. Título original: "Slumdog Millionaire" (2008). Película britânica, dirigida por Danny Boyle e escrita por Simon Beaufoy. Ganhadora do Oscar de melhor filme no ano de 2009.
  50. SOUTO MAIOR, Jorge Luiz. Curso de Direito do Trabalho. Volume II. São Paulo : LTr, 2008, p. 353.

Autores

  • Ney Maranhão

    Professor Adjunto do Curso de Direito da Universidade Federal do Pará (Graduação e Pós-graduação). Doutor em Direito do Trabalho e da Seguridade Social pela Universidade de São Paulo - Largo São Francisco, com estágio de Doutorado-Sanduíche junto à Universidade de Massachusetts (Boston/EUA). Especialista em Direito Material e Processual do Trabalho pela Universidade de Roma/La Sapienza (Itália). Mestre em Direitos Humanos pela Universidade Federal do Pará. Ex-bolsista CAPES. Professor convidado do IPOG, do Centro Universitário do Estado do Pará (CESUPA) e da Universidade da Amazônia (UNAMA) (Pós-graduação). Professor convidado das Escolas Judiciais dos Tribunais Regionais do Trabalho da 2ª (SP), 4ª (RS), 7ª (CE), 8ª (PA/AP), 10ª (DF/TO), 11ª (AM/RR), 12ª (SC), 14ª (RO/AC), 15ª (Campinas/SP), 18ª (GO), 19ª (AL), 21ª (RN), 22ª (PI), 23ª (MT) e 24 ª (MS) Regiões. Membro do Instituto Goiano de Direito do Trabalho (IGT) e do Instituto de Pesquisas e Estudos Avançados da Magistratura e do Ministério Público do Trabalho (IPEATRA). Membro fundador do Conselho de Jovens Juristas/Instituto Silvio Meira (Titular da Cadeira de nº 11). Membro do Conselho Editorial da Revista de Direito do Trabalho – RDT (São Paulo, Editora Revista dos Tribunais). Ex-Membro da Comissão Nacional de Efetividade da Execução Trabalhista (TST/CSJT). Membro do Comitê Gestor Nacional do Programa Trabalho Seguro (TST/CSJT). Juiz Titular da 2ª Vara do Trabalho de Macapá/AP (TRT da 8ª Região/PA-AP). Autor de diversos artigos em periódicos especializados. Autor, coautor e coordenador de diversas obras jurídicas. Subscritor de capítulos de livros publicados no Brasil, Espanha e Itália. Palestrante em eventos jurídicos. Tem experiência nas seguintes áreas: Teoria Geral do Direito do Trabalho, Direito Individual do Trabalho, Direito Coletivo do Trabalho, Direito Processual do Trabalho, Direito Ambiental do Trabalho e Direito Internacional do Trabalho. Facebook: Ney Maranhão / Ney Maranhão II. Email: [email protected]

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  • Francisco Milton Araújo Júnior

    Juiz do Trabalho - Titular da 5ª Vara do Trabalho de Macapá/Ap. Mestre em Direito do Trabalho pela Universidade Federal do Pará - UFPa. Especialista em Higiene Ocupacional pela Universidade de São Paulo – USP. Professor das disciplinas de Direito do Trabalho e Processo do Trabalho na Faculdade SEAMA/AP e colaborador da Escola Judicial do TRT da 8ª Região — EJUD8

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MARANHÃO, Ney; ARAÚJO JÚNIOR, Francisco Milton. Análise da proteção internacional, infraconstitucional e constitucional do trabalho do menor na perspectiva da saúde, higiene e segurança no meio ambiente laboral. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2979, 28 ago. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/19871. Acesso em: 19 abr. 2024.