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Reflexos das tendências do Direito Civil na responsabilidade civil: apontamentos para uma nova teoria do Direito dos Danos

Reflexos das tendências do Direito Civil na responsabilidade civil: apontamentos para uma nova teoria do Direito dos Danos

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A Responsabilidade Civil olhada por três óticas, três fenômenos pelos quais tem passado o Direito Civil: constitucionalização, personalização e descodificação.

1. Considerações preliminares

O objeto do presente estudo é a Responsabilidade Civil, olhada por três óticas, três fenômenos pelos quais tem passado o Direito Civil. São eles: constitucionalização, personalização e descodificação. Será analisada a maneira pela qual tais fenônemos (pode-se dizer, tendências) incidem na Responsabilidade Civil. O objetivo é, pois, traçar a maneira pela qual tais fenômenos ingressam no Direito dos Danos.

A Responsabilidade Civil é o objeto, a constitucionalização, a personalização e a descodificação são as lentes utilizadas como instrumento para analisar o objeto.

São eventos, faz-se mister alertar, que não existem sozinhos. Vale dizer, ingressam no ordenamento em um contexto harmônico (apesar de algumas resistências). Em outras palavras, a constitucionalização, a personalização e a descodificação são tendências harmônicas, são causa e consequência umas das outras, subsistem e operam em conjunto. Há entre elas similitude estrutural. E, ainda, caminham na mesma direção.

Apesar disso, é necessário distingui-las e (principalmente!) demonstrar como cada uma dela incide na Responsabilidade Civil. Vale dizer, o escopo é evidenciar como as três tendências se traduzem na Responsabilidade Civil. Há uma linha tênue que as divide. Tênue, mas existente. Afirmar que são distintas não significa que não são um conjunto. São fenômenos que atuam somando-se, a caminho de uma nova Responsabilidade Civil.


2. Normativa e axiologia constitucionais no Direito Civil

2.1) O Direito Civil-Constitucional

Sobre a constitucionalização, não é possível afirmar que se trata de um evento novo [01], mas de aceitação e aplicação prática recente no Brasil, tendo, aqui grande impulso com a atual Constituição.

A constitucionalização do Direito Civil significa a irradiação dos efeitos das normas e dos valores constitucionais no Direito Civil [02]. Simboliza "um efeito expansivo das normas constitucionais, cujo conteúdo material e axiológico se irradia, com força normativa, por todo o sistema jurídico" [03]. É a aplicação do Direito Constitucional no Direito Civil, seja na utilização direta das normas (regras e princípios) da Constituição nas relações privadas – eficácia horizontal da Constituição –, seja na hermenêutica da normativa civil.

Normas da Constituição podem ser aplicadas nas relações interprivadas. Ao invés do Código Civil, é possível que se aplique a Carta Maior. Mais que isso, normas do CC devem ser lidas e interpretadas à luz da CR, vale dizer, esta serve de filtro e critério interpretativo daquele. A interação entre eles é intensa, passando o Direito Civil por uma (re)leitura, com as lentes constitucionais.

A Constituição é o Sol em torno do qual gravitam satélites, como o próprio Código Civil. Este poderá ser utilizado sozinho, todavia, desde que esteja de acordo com aquela, que sempre prevalece.

Hoje, é uma tendência [04], antes resistida pela doutrina e, principalmente, pela jurisprudência. Já viveram as searas civil e constitucional em mundos apartados, conforme atesta Barroso [05], todavia, "a fase atual é marcada pela passagem da Constituição para o centro do sistema jurídico, de onde passa a atuar como filtro axiológico pelo qual se deve ler o direito civil" [06].

Ainda segundo Barroso, a constitucionalização do Direito Civil acarreta duas consequências evidentes diante de tal transformação. A primeira simboliza a penetração do "princípio da dignidade da pessoa humana na nova dogmática jurídica", objeto de estudo mais aprofundado no próximo item. "O segundo desenvolvimento doutrinário", diz ele, "é a aplicabilidade dos direitos fundamentais às relações privadas" [07], que, não obstante a importância, não será estudada.

Mas a constitucionalização não cessa nessas implicações.

Além da estrutura de seus institutos fundantes, como a propriedade, a posse, a família, o contrato e a responsabilidade civil, passando pelo filtro do caso concreto, o ordenamento jurídico de caráter civil-constitucional, no Brasil contemporâneo, não se cinge a seguir diretivas constitucionais como se ainda fossem meros conselhos, nem edifica uma nova fattispecie hermenêutica. Faz, isso sim, a construção de uma permanente interrogação que almeja, sempre, saber para que serve e a quem serve o Direito. [08]

A resposta quem dá é a Constituição. Ela é o Sol, o norte, o filtro axiológico, a norma fundamental (e fundante), o centro. É a bússola que indica o caminho a ser percorrido pelo Direito Civil, em todos os seus setores – contratos, obrigações, propriedade, família e responsabilidade civil.

2.2) A Constitucionalização da Responsabilidade Civil

Afirmar que a Constituição serve de critério hermenêutico na interpretação e aplicação das normas da Responsabilidade Civil é insuficiente, simplista e excessivamente sucinto. Mais que isso, no âmbito do Direito dos Danos, três valores ficam consubstanciados, pela operação da constitucionalização. Para Paulo Luiz Netto Lôbo, são eles: "a primazia do interesse da vítima, a máxima reparação do dano e a solidariedade social" [09].

Essa imprescindível aproximação ético-ideológica da responsabilidade civil com a Constituição acresce em relevância quando facilmente verificamos que a nova codificação civil foi bastante tímida em inovações no campo do direito obrigacional (...). [10]

A nosso ver, primazia do interesse da vítima e máxima reparação do dano consubstanciam um mesmo resultado, qual seja, a máxima satisfação possível da vítima. Prevalecer seu interesse e reparar ao máximo, em verdade, são projeções da satisfação do lesado – a máxima possível. Satisfazer a vítima pode simbolizar tanto a reparação de um dano sofrido quanto prevenir contra danos futuros. Este é, pois, interesse de qualquer vítima, virtual ou real.

A solidariedade social é corolário do princípio da socialidade, basilar na atual codificação. Há autores que cogitam a função social da Responsabilidade Civil [11], não é equivocado. Todavia, é assentado na doutrina a coletivização da Responsabilidade Civil. Aliás, a socialização dos riscos fez surgir, em países como a Nova Zelândia e a França, seguros públicos, os quais seriam encarregados de ressarcir danos pessoais, alimentados por receitas parafiscais e impostos [12]. Sua primeira manifestação é o seguro de Responsabilidade Civil, o qual garante "melhor a reparação do dano sofrido pelo lesado, ao mesmo tempo que alivia o ônus incidente sobre o responsável" [13], pois cabe a uma coletividade a reparação. Além disso, manifesta-se na seguridade social, que encarrega a toda a coletividade a indenização por um dano corpóreo sofrido – dano de cunho material, ou seja, envolve os danos emergentes e os lucros cessantes [14]. A coletivização também se manifesta na "responsabilidade grupal, ou seja, a responsabilidade de todos os integrantes de um grupo por danos causados por um seu membro não identificado" [15]. Por fim, faz surgir danos transindividuais, ou seja, de caráter coletivo.

Em resumo, a constitucionalização do Direito Civil apresenta dois grandes resultados. O primeiro é a máxima satisfação possível da vítima, que simboliza a primazia do seu interesse a máxima reparação do dano sofrido. O segundo resultado é a coletivização da responsabilidade civil, já delineada. Além, logicamente, da aplicabilidade direta das normas constitucionais e de a Constituição funcionar como critério hermenêutico das normas civis no Direito dos Danos. Nasce a Responsabilidade Constitucional [16].


3. Personalização: ter versus ser

3.1) Personalização, dignidade da pessoa humana e Constituição

A Constituição de 1988 privilegiou a dignidade da pessoa humana. Deve o Direito Civil que operar da mesma maneira [17]. Pessoa, noção de grande importância para este ramo, deve ser encarada em associação necessária com a dignidade [18]. Mais que isso, a pessoa humana virou fim da proteção jurídica [19]. A valorização da pessoa não foi à toa, tendo como marco imprescindível, no direito brasileiro, a atual Constituição, pois nela tal princípio tornou-se fundamento do Estado. Consequentemente, a dignidade da pessoa humana é fundamento e fim do Direito. É para a pessoa humana que existe o Direito.

A dignidade da pessoa humana é princípio estabelecido não apenas na teoria. Exerce funções das mais diversas, todavia,

(...) impõe-se seja ressaltada a função integradora e hermenêutica do princípio da dignidade da pessoa humana, no sentido de que este – por força de sua dimensão objetiva – serve de parâmetro para aplicação, interpretação e integração não apenas dos direitos fundamentais e das demais normas constitucionais, mas de todo o ordenamento jurídico. [20]

Não foram poucas as novidades da atual Constituição. Ressalta-se a dignidade da pessoa humana, tendo em vista sua proximidade cada vez mais evidente na seara civil.

Explica Maria Celina Bodin de Moraes que

o substrato material da dignidade assim entendida pode ser desdobrado em quatro postulados: i) o sujeito moral (ético) reconhece a existência dos outros como sujeitos iguais a ele, ii) merecedores do mesmo respeito à integridade psicofísica de que é titular; iii) é dotado de vontade livre, de autodeterminação; iv) é parte do grupo social, em relação ao qual tem a garantia de não vir a ser marginalizado. São corolários desta elaboração os princípios jurídicos da igualdade, da integridade física e moral – psicofísica –, da liberdade e da solidariedade. [21]

A Constituição de 1988 fornece ao ordenamento brasileiro "uma nova tábua valorativa, consistente na jurídica supremacia dos valores existenciais da pessoa humana sobre os aspectos patrimoniais de sua existência" [22]. Deve prevalecer o "ser" em face do "ter".

Em dizer mais simples, se a Constituição de 1988 insere como centro a dignidade da pessoa humana, e se o Direito Civil deve ser lido à luz da Constituição, a dignidade da pessoa humana é (também) centro e filtro hermenêutico das normas civis [23]. A valorização demasiada do patrimônio na seara civil não é harmônica com a valorização da pessoa humana, exposta na Constituição [24]. É a dignidade da pessoa humana, reitere-se, centro do ordenamento como um todo, que, no Direito Civil, é lida como personalização. O que significam?

Segundo Kildare Gonçalves Carvalho, "a dignidade da pessoa humana (...) significa não só um reconhecimento do valor do homem em sua dimensão de liberdade, como também de que o próprio Estado se constrói com base nesse princípio. O termo dignidade designa o respeito que merece qualquer pessoa" [25].

Traduz-se a dignidade da pessoa humana, da linguagem constitucional para o Direito Civil, como personalização. Vale dizer, a personalização do Direito Civil significa o ingresso da dignidade da pessoa humana como noção nuclear, tanto do ponto de vista hermenêutico-axiológico, quanto do ponto de vista normativo. É a especialização por excelência da constitucionalização.

Diferente não é o entendimento de Francisco Amaral, para quem o fenômeno aqui analisado simboliza a "crescente importância da vida e da dignidade da pessoa humana, elevadas à categoria de direitos e de princípio fundamental da Constituição" [26].

São sinônimos da personalização: personificação e repersonificação [27]. O efeito é o mesmo: deslocar o homem para o centro do universo jurídico (no caso, no Direito Civil), em seu sentido existencial, afastando (ao menos do centro) o seu patrimônio. Mais importante que o patrimônio do homem é o próprio homem, entendido como ser humano dotado de direitos e protegido pelo ordenamento. Não se trata do homem como ser livre, independente e autônomo, mas enquanto ser social, dotado de uma dignidade blindada pelo Direito.

É possível ainda descrever a personalização como repersonalização, que significa "repor a pessoa humana como centro do direito civil, passando o patrimônio ao papel de coadjuvante, nem sempre necessário" [28].

Ora, poder-se-ia pensar que o patrimônio, de tão coadjuvante, seria insignificante a ponto de nem merecer proteção. É um raciocínio equivocado. Explica Fachin que "a subjetividade é sempre definida sem deixar de lado o paradigma patrimonial" [29], ou ainda, segundo Amaral, "a personalização do direito não leva (...) à diminuição de importância da esfera patrimonial individual" [30].

O desafio que se coloca aos civilistas é a capacidade de ver as pessoas em toda sua dimensão ontológica e, através dela, seu patrimônio. Impõe-se a materialização dos sujeitos de direitos, que são mais que apenas titulares de bens. A restauração da primazia da pessoa humana, nas relações civis, é a condição primeira de adequação do direito à realidade e aos fundamentos constitucionais. [31]

Como se fosse uma balança, o patrimônio, antes valorizado, passou a ter menor importância, depois a pessoa humana, antes desvalorizada, ganhou maior importância, opera-se um processo inversamente proporcional. "Despatrimonialização significa, portanto, o outro lado da moeda da personalização do Direito Privado" [32].

A Responsabilidade Civil é exemplo claro deste pensamento. Protege-se qualquer dano de caráter extrapatrimonial, sem, todavia, excluir dano de qualquer caráter patrimonial. É a personalidade humana que vai explicitar o que pode ser um dano extrapatrimonial.

Não se pode deixar de ressaltar que a personalização perpassa por todos os setores do Direito Civil: o sujeito proprietário ou possuidor não tem horizonte individualista, mas é pessoa que se realiza do ponto de vista coletivo, além disso, surge a preocupação com a consagração do patrimônio mínimo [33] de cada indivíduo; o contrato é analisado de acordo com princípios solidaristas ou sociais [34]; surgem cada vez mais novas entidades familiares [35]; por fim (a título exemplificativo), emerge a consagração da função social dos institutos jurídicos [36] – propriedade, contrato e família.

Evidentemente, essas evoluções jurídicas não surgem ao acaso, mas passaram por um progresso histórico e possuem um contexto, que é o Estado Social [37], consagrado pela Constituição de 88. A axiologia do texto constitucional é de Estado Social. Um Estado (e, por conseguinte, um Direito) que consagra a pessoa humana inserida em uma dada sociedade. Consagrar a pessoa humana inserida em uma dada sociedade não significa apartar sociedade e indivíduo, mas realizá-lo. É, ainda, personalização.

Se "todo ordenamento jurídico se acha condicionado historicamente e depende das circunstâncias sociais e econômicas, traduzindo, em grande parte, uma ideologia ou uma concepção do mundo" [38], a concepção do mundo atual, ou seja, da realidade brasileira atual, do ponto de vista jurídico, é o Estado Social que ampara o indivíduo social dotado de dignidade.

Por fim, antes de adentrar especificamente na Responsabilidade Civil, é preciso lembrar que a personalização trouxe a (leia-se, deu impulso à) elaboração – antes mera elucubração doutrinária, hoje realidade inclusive positivada – de uma teorização de direitos concernentes à personalidade humana: os direitos da personalidade.

Personalidade significa o "conjunto de caracteres do próprio indivíduo; consiste na parte intrínseca da pessoa humana". Por conseguinte, "a proteção que se dá a esses bens primeiros do indivíduo (tomados em ótica não-patrimonial), são denominados de direitos de personalidade" [39]. Danos extrapatrimoniais são, pois, ferimentos a direitos de personalidade.

3.2) Personalização da Responsabilidade Civil

É forçoso repensar a Responsabilidade Civil, à luz do personalismo jurídico, aponta, com razão, Dessarego [40].

A máxima satisfação da vítima e a coletivização da Responsabilidade Civil são, como visto, tradução da constitucionalização do Direito Civil no âmbito do Direito dos Danos. Estas são tendências da Responsabilidade Civil, conforme aponta a doutrina. Outra tendência é a ampliação dos danos suscetíveis de reparação [41], resultado, por sua vez, da personalização.

"Em tempos ainda recentes, os danos suscetíveis de reparação eram quase que somente os patrimoniais e individuais. A necessidade sentida pela sociedade de não deixar dano nenhum sem reparação é que mudou as coisas" [42]. Fernando Noronha destaca este dúplice aspecto dos danos, em perspectiva clássica: de caráter patrimonial e individual. Contudo, o surgimento de danos extrapatrimoniais e transindividuais (como os danos ambientais, que recebem cada vez maior importância) afetou bastante a antiga racionalidade.

São os danos extrapatrimoniais que melhor expressam a personalização da Responsabilidade Civil. A aparição do dano à pessoa, explica Iturraspe, é "un avance positivo y remarcable en la vida del Derecho" [43]. O ingresso no tema demanda estudo na teoria dos direitos da personalidade.

Para alguns, adeptos da chamada teoria monista [44], existe uma cláusula geral de personalidade, consubstanciada na dignidade da pessoa humana, que garante a proteção da pessoa. Prega, deste modo, a atipicidade dos direitos da personalidade. Outros, todavia, adotam a teoria pluralista [45], entendendo que existe um rol de direitos da personalidade. Por fim, existe o entendimento – a nosso ver, mais parcimonioso – misto: há um direito geral de personalidade, cuja base é a dignidade da pessoa humana, mas também direitos especiais da personalidade.

Temos, assim, um direito geral da personalidade, que a considera um bem objeto da tutela jurídica geral, e defende a inviolabilidade da pessoa humana, nos seus aspectos físico, moral e intelectual, e temos direitos especiais, correspondentes a esses aspectos parciais da personalidade. [46]

Significa, em resumo, que qualquer direito personalístico é protegido, não importando qual a teoria adotada [47]. Amaral explica que "direitos da personalidade são direitos subjetivos que têm por objeto os bens e valores essenciais da pessoa, no seu aspecto físico, moral e intelectual" [48]. Se os direitos da personalidade correspondem a um tripé, três integridades (física, moral e intelectual), os danos extrapatrimoniais são de três espécies. Explica-se.

A doutrina majoritária fala apenas em dano moral, como gênero. É equivocado: mais adequado é afirmar que gênero é o dano extrapatrimonial, que possui três espécies. A primeira é o dano estético, expressão máxima do dano à integridade física [49]. A segunda é o dano moral, entendido em sentido estrito, como ofensa à moral e à honra do indivíduo [50]. Por fim, há o dano intelectual, que é um ferimento à integridade psíquica ou a direito autoral.

Em outras palavras, os direitos da personalidade dividem-se em três facetas, cada uma delas, havendo ofensa, representam um tipo de dano extrapatrimonial (ou mais, a depender da atividade danosa). São, pois, dois gêneros de dano: dano patrimonial – abrangendo danos emergentes e lucros cessantes (assentados na doutrina) – e dano extrapatrimonial – incluindo dano estético, dano moral e dano intelectual. Mais uma vez, para evitar incorrer em fuga ao tema, não será oportuno verticalizar (ao menos neste texto) estes relevantes temas.

Inquestionável, pois, a ampliação do leque de possibilidades de danos reparáveis. Um marco importante é a Súmula nº 387 do STJ, que possibilita a cumulação dos danos estético e moral. Ambos são danos extrapatrimoniais. Não existe, deste modo, apenas o dano moral.

O surgimento de novos danos extrapatrimoniais é a tradução, por fim, da personalização da Responsabilidade Civil. Protege-se a pessoa de qualquer dano que possa sofrer em sua personalidade.


4. Descodificação: um afastamento da centralidade do Código Civil

4.1) Direito Privado Codificado e Descodificado

Foi o jusracionalismo moderno [51] (séculos XVIII e XIX), através da ideia de sistema, que trouxe ao Direito Privado, a noção de codificação [52], qual seja, a "reunião de normas jurídicas relativas a certo ramo do Direito positivo, de forma metódica e articulada" [53]. Ela nos apresenta virtudes, como a simplificação do Direito, facilitando sua compreensão e aplicação [54]. Todavia, possui também desvantagens, como não possibilitar ao ordenamento acompanhar as mutações sociais, um pretenso (mas impossível) encerramento do Direito e uma restrição do poder do juiz, ao lhe dar parâmetros estritos de subsunção [55].

A opção brasileira, para o Direito Civil, é, sem dúvida, pela codificação, com suas virtudes e seus defeitos. Todavia, o Direito Privado, ainda na Modernidade, sofreu grande desagregação, surgindo novos ramos, podendo-se citar, dentre outros, o Direito do Trabalho, o Direito Previdenciário, o Direito Agrário e o Direito Imobiliário. São ramos jusprivatistas, que possuem legislação específica, fora do Código Civil [56]. Surge a descodificação.

A descodificação é um fenômeno contemporâneo que consiste na fragmentação do sistema unitário do Código Civil, com a proliferação de leis civis especiais que reduzem o primado do Código e criam uma pluralidade de núcleos legislativos, os chamados microssistemas jurídicos. [57]

Na seara civil, existe o Código Civil, que, graças à constitucionalização, não é o centro (papel exercido pela Constituição), mas é o diploma de aplicação prática mais direta e cotidiana. Mas não o único. No Direito Privado, são inúmeras as leis específicas. A descodificação opera de modo que, além do surgimento de novos ramos, surjam leis específicas e microssistemas legislativos.

Microssistemas são diplomas legais, com objeto específico de proteção, semelhantes às codificações, mas que, ao contrário destas, envolvem mais de um ramo do Direito. O exemplo mais notório é o Código de Defesa do Consumidor – Lei n.º 8.078/90 –, que acopla o Direito Civil (ao tratar de prescrição e decadência, responsabilidade e contratos), o Direito Empresarial (ao abordar a desconsideração da personalidade jurídica e as práticas comerciais), o Direito Penal (ao estabelecer infrações penais), o Direito Administrativo (ao tratar das sanções administrativas), dentre outros, em torno de um mesmo objeto de proteção: o consumidor. Outros exemplos importantes são o Estatuto do Idoso – Lei n.º 10.741/03 – e o Estatuto da Criança e do Adolescente – Lei n.º 8.069/90 –, cujos objetos de proteção são, respectivamente, o idoso e a criança e o adolescente.

É justamente o Código de Defesa do Consumidor que foi o microssistema (portanto, objeto da descodificação) mais importante na Responsabilidade Civil.

4.2) Descodificação e Responsabilidade Civil

De acordo com o art. 186 do Código Civil, que é a cláusula geral de Responsabilidade Civil, nosso sistema adota (assim como o CC/16), em regra, a teoria da culpa [58]: não há responsabilização se não houver culpa do agente. Contudo, o atual Código Civil apresenta um temperamento, vale dizer, a regra geral é a responsabilidade subjetiva (baseada na culpa), todavia, há casos de responsabilidade objetiva, ou seja, de adoção da teoria do risco, de acordo com o parágrafo único do art. 927 [59]. Se o dano decorrer "de uma atividade normalmente geradora de riscos", será "dispensável a culpa, pois o agente será responsável pelo único fato de possuir o controle da fonte geradora" [60] – esta é, pois, a responsabilidade objetiva.

Não obstante a adoção da responsabilidade subjetiva como regra geral, a doutrina [61] aponta como tendência a objetivação da Responsabilidade Civil. Grande impulso nos ofereceu o Código de Defesa do Consumidor, ao adotar exclusivamente a teoria do risco e, portanto, abolir a responsabilidade subjetiva. O CDC exerce grande influência no Direito dos Danos.

O esquema clássico da responsabilidade civil por danos está sujeito ao temperamento do art. 186 do Código Civil, fundado na configuração da culpa em sentido subjetivo. (...) No entanto, uma sociedade civil cada vez mais reivindicante reclamava mecanismos normativos capazes de assegurar o ressarcimento dos danos, se necessário fosse, mediante sacrifício do pressuposto da culpa. A obrigação de indenizar sem culpa surgiu no bojo dessas idéias renovadoras por duas razões: a) a consideração de que certas atividades do homem criam um risco especial para outros homens, e que b) o exercício de determinados direitos deve implicar ressarcimento dos danos causados. Estavam lançadas as sementes da teoria do risco. [62]

Além disso, o mesmo CDC trouxe à tona os danos de caráter coletivo – mais uma obra da descodificação. A coletivização da Responsabilidade Civil, já anunciada quando tratamos da Constitucionalização, é mais um novo desenvolvimento da Descodificação em matéria de danos. Os danos coletivos "são aqueles que atingem bens do interesse da generalidade das pessoas que integram uma comunidade" [63].

A constitucionalização trouxe a preocupação com os danos coletivos, mas foi a descodificação, especificamente o Código de Defesa do Consumidor, que trouxe o regramento e a proteção efetiva dos interesses transindividuais.

A preocupação com os bens coletivos é um dos pontos em que fica mais patente a evolução contemporânea do direito, sobretudo em áreas como as dos direitos da personalidade, do consumidor e do meio ambiente. São bens normalmente ligados aos chamados direitos humanos de quarta geração, voltados para um integral desenvolvimento da pessoa, com reflexos na tutela do meio ambiente, do patrimônio cultural, da infância, da juventude, da terceira idade, do patrimônio genético, etc.; são direitos que ultrapassam a esfera individual, deixando de ser direitos de indivíduos isolados. [64]

Em suma, a descodificação fez surgir microssistemas, podendo-se destacar o Código de Defesa do Consumidor. Por sua vez, este trouxe a responsabilidade objetiva como exclusiva, gerando grande impacto. O CC não aboliu a responsabilidade objetiva como o CDC, mas ampliou as hipóteses de indenização sem culpa, parte graças à forte influência do CDC. A objetivação da Responsabilidade Civil torna-se consequência da descodificação, evidenciada pelo código consumerista. Este, ainda, nos apresenta regramento dos danos coletivos, sendo que o interesse coletivo foi obra da constitucionalização, mas a descodificação foi a autora da sua proteção efetiva.

Em outras palavras, em sede de Responsabilidade Civil, a descodificação traduz-se como tendências de objetivação da responsabilidade e o surgimento dos danos coletivos, desenvolvimentos explicitados pelo Código de Defesa do Consumidor.


5. Considerações finais

O escopo deste artigo era demonstrar como três tendências gerais do Direito Civil – a constitucionalização, a personalização e a descodificação – traduzem-se no âmbito da Responsabilidade Civil. O Direito dos Danos possui suas próprias tendências, todavia, estas são resultado do efeito expansivo das tendências gerais.

Em resumo, deste modo, a Responsabilidade Civil acompanha as tendências gerais do Direito Civil, recebendo-as e transformando-as em tendências específicas, estudadas a fundo no presente texto.

A constitucionalização, na seara da responsabilidade, traduz-se em dois desenvolvimentos: a máxima satisfação possível da vítima – que esboça a primazia do interesse desta e a máxima reparação do dano – e a coletivização da Responsabilidade Civil – resultado do princípio constitucional da solidariedade social. Alguns autores citam, sem equívoco, uma função social da Responsabilidade Civil. Surge, por conseguinte, a Responsabilidade Constitucional.

Por sua vez, a personalização do Direito dos Danos gera novas espécies de danos extrapatrimoniais (não mais restritos aos danos morais) e os danos transindividuais – vale dizer, amplia-se o rol de danos reparáveis. Danos extrapatrimoniais são os que ofendem a personalidade do indivíduo, em seu aspecto físico, moral ou intelectual (estas são as facetas dos direitos da personalidade). O gênero dano extrapatrimonial dá espaço a três espécies: dano estético (ferimento à integridade física), dano moral (ferimento à moral individual) e dano intelectual (ferimento à integridade intelectual, englobando a integridade psíquica e danos a direitos autorais). Além disso, mais uma vez, os danos coletivos surgem, agora como resultado da personalização.

Por fim, a descodificação da Responsabilidade Civil, principalmente através do Código de Defesa do Consumidor, apresenta-se como a objetivação da responsabilidade, assim como no regramento dos danos coletivos (os quais, com a personalização e a constitucionalização eram apenas cogitação, elaboração doutrinária e preocupação teórica, recebendo normatização e garantia prática efetiva com a descodificação).

As crescentes alterações sociais, bastante evidentes no Direito de Família e tímidas no Direito Contratual, apresentam-se, na Responsabilidade Civil, como demanda também existente. Não pode o legislador estabelecer uma matéria de indenizações fixas, com regras imutáveis, permanentes e desatualizadas. Ao revés, a reparação civil é dinâmica, a legislação apresenta novidades, faz-se mister, pois, adaptar o Direito à nova realidade. Esta é a tarefa dos juristas. Sem pretensão de esgotamento, o objetivo aqui foi colaborar na reflexão e na sistematização do que há de mais recente no âmbito da Responsabilidade Civil, de modo a clarificar as obscuras – pois recentes – necessidades jurídicas neste setor. Espera-se que a contribuição seja efetiva.


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Notas

  1. Teve como marco inicial a Alemanha da metade do séc. XX (BARROSO, Luís Roberto. Neoconstitucionalismo e constitucionalização do direito).
  2. É o conceito, aqui adaptado, de Virgílio Afonso da Silva. Para ele, a constitucionalização do direito significa a "irradiação dos efeitos das normas (ou valores) constitucionais aos outros ramos do direito" (SILVA, V. A. da. A constitucionalização do direito, p. 18).
  3. BARROSO, L. R. Op. cit., p. 12.
  4. "O reconhecimento da incidência dos valores e princípios constitucionais no direito civil reflete não apenas uma tendência metodológica, mas a preocupação com a construção de uma ordem jurídica mais sensível aos problemas e desafios da sociedade contemporânea" (MATTIETTO, Leonardo. O Direito Civil Constitucional e a Nova Teoria dos Contratos, p. 163-164).
  5. BARROSO, op. cit., p. 25.
  6. Idem, p. 25-26.
  7. Idem, p. 26-27.
  8. FACHIN, Luiz Edson. Contemporaneidade, novos direitos e o direito civil-constitucional no Brasil, p. 231, grifos originais.
  9. LÔBO, Paulo Luiz Netto. Teoria geral das obrigações, p. 14.
  10. BARROSO, Lucas de Abreu. Novas fronteiras da obrigação de indenizar e da determinação da Responsabilidade Civil, p. 362.
  11. Nesse sentido: BARROSO, L. de A., op. cit..
  12. NALIN, Paulo. Responsabilidade civil: descumprimento do contrato e dano extrapatrimonial, p. 50.
  13. NORONHA, Fernando. Direito das obrigações, p. 543.
  14. "Com a seguridade social alcança-se um estágio em que se pode falar em eliminação da responsabilidade civil" (NORONHA, F., op. cit., p. 544, grifos originais). Contudo, este posicionamento de Noronha nos parece equivocado, tendo em vista que ignoraria os danos extrapatrimoniais. A seguridade social tem por escopo abarcar, apenas e tão-somente, lesões patrimoniais. Deste modo, não se configuraria o fim da Responsabilidade Civil.
  15. NORONHA, F. Op. cit., p. 544, grifos originais.
  16. Também defendida por BORGES, Roxana Cardoso Brasileiro. Direitos de personalidade e dignidade: da responsabilidade civil para a responsabilidade constitucional.
  17. TEPEDINO, Maria Celina B. M. A caminho de um direito civil constitucional, p. 28.
  18. Significa que "a dignidade do homem se apoia na normativa constitucional, jamais podendo ser ele esquecido, seja nas relações singulares, seja naquelas de massa" (CASTRO, Carlos Alberto Farracha; NALIN, Paulo. Economia, mercado e dignidade do sujeito, p. 118).

  19. FROTA, Rommel Barroso. O parágrafo único do art. 12 do Código Civil á luz da atual concepção dos direitos da personalidade, p. 153.
  20. "Operou-se, pois, em relação do Direito dogmático tradicional, uma inversão do alvo de preocupações, fazendo com que o Direito tenha como fim último a proteção da pessoa humana como instrumento para seu pleno desenvolvimento" (FACHIN, L. E. Questões do Direito Civil brasileiro contemporâneo, p. 6).
  21. Pode-se afirmar, deste modo, que "o projeto social global (...) gradualmente começa a mudar para nos dias atuais consagrar a dignidade da pessoa humana no seu centro" (KATAOKA, Eduardo Takemi. Declínio do individualismo e propriedade, p. 459).

  22. SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e "novos" direitos na Constituição Federal de 1988: algumas aproximações, p. 181.
  23. MORAES, Maria Celina Bodin de. Danos à pessoa humana: uma leitura civil-constitucional dos danos morais, p. 85.
  24. CORTIANO JUNIOR, Eroulths. Para além das coisas (breve ensaio sobre o direito, a pessoa e o patrimônio mínimo), p. 155.
  25. Ocorreu um "salto de qualidade, pois a dignidade da pessoa humana passou a ser o valor supremo" (COCURUTTO, Ailton. Os princípios da dignidade da pessoa humana e da inclusão social, p. 51).
  26. "(...) volta-se o ordenamento não mais para o ‘indivíduo’, abstratamente considerado, mas para a tutela da pessoa humana nas concretas e diferenciadas relações jurídicas em que se insere, como forma de assegurar os princípios constitucionais da solidariedade social (art. 3º, III) e da igualdade substancial (art. 3º, IV)" (TEPEDINO, Gustavo; BARBOZA, Heloisa Helena; MORAES, Maria Celina Bodin de. Código Civil interpretado conforme a Constituição da República, p. 3).
  27. CARVALHO, Kildare Gonçalves. Direito Constitucional, p. 672.
  28. AMARAL, Francisco. Direito civil: introdução, p. 154.
  29. Alguns entendem que esta operação é um retorno, deste modo, o homem já foi centro do ordenamento, deixando de o ser por um tempo, hoje retornando.
  30. LÔBO, Paulo Luiz Netto. Teoria geral das obrigações, p. 7.
  31. FACHIN, Luiz Edson. Direito civil e dignidade da pessoa humana: um diálogo constitucional contemporâneo, p. 106.
  32. AMARAL, F. Op. cit, p. 155.
  33. LÔBO, Paulo Luiz Netto. Constitucionalização do Direito Civil.
  34. SARMENTO, Daniel. Direitos fundamentais e relações privadas, p. 91.
  35. Patrimônio mínimo é aquele "mensurado consoante parâmetros elementares de uma vida digna e do qual não pode ser expropriada ou desapossada" (FACHIN, L. E. Estatuto jurídico do patrimônio mínimo, p. 1). Evidencia-se aqui a preocupação com a existência humana com dignidade. Diz Fachin que a repersonalização e a despatrimonialização são tendências que vão de encontro com a proteção de um patrimônio mínimo (p. 10-11).
  36. Ver, nesse sentido: LÔBO, Paulo. Os novos princípios contratuais. In: MATOS, Ana Carla Harmatiuk (Org.). A Construção dos novos direitos.
  37. Ver, nesse sentido: MATOS, Ana Carla Harmatiuk. "Novas" entidades familiares. In: Idem, ibidem.
  38. Ver, nesse sentido: RUZYK, Carlos Eduardo Pianovski. Liberdade(s) e função: contribuição crítica para uma nova fundamentação da dimensão funcional do Direito Civil brasileiro.
  39. "Estado social significa intervencionismo, patronagem, paternalismo" (BONAVIDES, Paulo. Do Estado Liberal ao Estado Social, p. 203).
  40. LOBO, Paulo Luiz Neto. Do contrato no Estado social: crise e transformações, p. 20.
  41. SZANIAWSKI, Elimar. Direitos de personalidade e sua tutela, p. 70.
  42. DESSAREGO, Carlos Fernández. Hacia una nueva sistematización del daño a la persona, p. 10.
  43. Nesse sentido: HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. Tendências atuais da responsabilidade civil: marcos teóricos do século XIX; BARROSO, L. de A.. Op. cit..
  44. NORONHA, F. Op. cit., p. 541.
  45. ITURRASPE, Jorge Mosset. El daño fundado en la dimension del hombre en su concreta realidad, p. 39.
  46. Nesse sentido: PERLINGIERI, Pietro. Perfis do direito civil: introdução ao direito civil constitucional.; SZANIAWSKI, E. Op. cit..
  47. Nesse sentido: BITTAR, Carlos Alberto. Os direitos da personalidade.
  48. AMARAL, F. Op. cit., p. 251, grifos originais.
  49. Bastante pertinente é a explicação de Roxana Borges para a utilização da teoria que aqui chamamos de mista: "Conceber o princípio da dignidade da pessoa humana ou os direitos de personalidade com significados rígidos, fechados ou a-históricos impede a efetiva concretização da ampla proteção da pessoa" (BORGES, R. C. B. Op. cit., p. 563). O que importa é a proteção da pessoa – o que coincide com a já aludida máxima satisfação da vítima.
  50. Idem, p. 247.
  51. Dano estético é um ferimento ao bem jurídico integridade física. Nas palavras de Teresa Ancona Lopez, autoridade no tema, é uma "lesão à beleza física, ou seja, à harmonia das formas externas de alguém (imagem)" (LOPEZ, Teresa Ancona. Dano estético: responsabilidade civil, p. 45).
  52. Note-se, aqui, que o entendimento é de dano moral em sentido estrito. Engloba, apenas e tão-somente, dano à honra e à moral individual.
  53. No qual convergem diversos ideais, como o Iluminismo, o individualismo e o formalismo. As razões histórico-filosóficas não serão aqui abordadas, não obstante sua importância ímpar.
  54. No Brasil, tem-se como marco do impulso de codificação a primeira Constituição (a Constituição imperial, de 1824), a qual previa a feitura de dois códigos: civil e criminal.
  55. GUIMARÃES, Deocleciano Torrieri. Dicionário técnico jurídico, p. 171.
  56. AMARAL, F. Racionalidade e sistema no direito civil brasileiro, p. 49.
  57. Amaral, F. A descodificação do direito civil brasileiro, p. 638.
  58. Recorde-se a especificidade do Direito Empresarial: antes do atual Código Civil (de 2002), o Código Comercial, de 1850, regia tal matéria, com menor amplitude. Apesar de ser um ramo diferente, o Direito Empresarial tem o Código Civil como importante diploma legal. Contudo, não é possível afirmar, nesse aspecto, que o Código Civil de 2002, ao tomar para si o regimento do Direito Empresarial, codificou toda a matéria, em uma tentativa de recodificação do Direito Privado: existem normas concernentes às empresas além do CC, tais como a Lei de Recuperação e Falências (Lei n.º 11.101/05) e a Lei da Duplicata (Lei n.º 5.474/68).
  59. Em suma, afirmar que o CC, ao retomar a temática empresarial, demonstra uma tentativa de recodificação, mostra-se equivocado. Ao revés, o Direito Empresarial é exemplo de descodificação.

  60. AMARAL, F. A descodificação do direito civil brasileiro, p. 646. Em outro artigo, o mesmo autor define a descodificação como "a desagregação do sistema unitário do Direito Civil tradicional, que se fragmenta em microssistemas, cada um com individualidade e especificidade, autonomia e interpretação própria" (Racionalidade e sistema no direito civil brasileiro, p. 54-55).
  61. Não obstante entendimento em contrário, como o de Paulo Nader (Curso de direito civil: responsabilidade civil).
  62. Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.
  63. Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.

    Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.

    art. 186 é a cláusula geral de Responsabilidade Civil, ao anunciar os elementos do dever de indenizar, dever este estabelecido pelo art. 927. O parágrafo único do art. 927 é um anexo à regra da indenização, um caso excepcional – tanto o é que se apresenta na parte especial do Código Civil, em um parágrafo do artigo inaugural do título IX.

    Inequívoca, pois, a adoção, no Código Civil, da responsabilidade subjetiva como regra geral e da objetiva como exceção.

  64. NADER, P. Idem, p. 104.
  65. HIRONAKA, G. Op. cit., p. 228.
  66. GRINOVER et al. Código brasileiro de defesa do consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto, p. 187, grifos originais.
  67. NORONHA, F. Op. cit., p. 572. Destaque-se, ainda, que os danos coletivos não são apenas patrimoniais, havendo, hoje, o desenvolvimento de uma teoria em prol dos "danos morais coletivos".
  68. Idem, p. 572-573.

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MANASSÉS, Diogo Rodrigues. Reflexos das tendências do Direito Civil na responsabilidade civil: apontamentos para uma nova teoria do Direito dos Danos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 3036, 24 out. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/20266. Acesso em: 20 abr. 2024.