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Reflexões sobre a decisão do STF a respeito da constitucionalidade do exame de ordem

Reflexões sobre a decisão do STF a respeito da constitucionalidade do exame de ordem

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Com o advento da decisão adotada pelo Supremo Federal no Recurso Extraordinário nº 603583, tem-se que o Exame de Ordem é reconhecidamente constitucional e não fere o art. 5º inciso XIII.

 “A força do direito deve superar o direito da  força.”

Rui Barbosa

“Assim importa salientar que um Direito que não acompanha o evoluir da sociedade perde a sua forma de ser, ou seja, perde a sua função social.”

Leovigildo Novidades Juliasse[1]

Resumo: Um dos temas que causam vigorosos debates no meio jurídico é a discussão sobre a constitucionalidade da exigência do Exame de Ordem como requisito necessário para o exercício da advocacia. De um lado, há a expansão do número de faculdades. Do outro, a lucratividade e ausência de mecanismos eficazes de fiscalização e controle. Os dois se convergem no alto índice de reprovações e na incessante crise no ordenamento jurídico brasileiro causando o repensar da deontologia jurídica. Por vários anos o Supremo Tribunal Federal procurou se esquivar de enfrentar a questão, deixando livre os Tribunais para que pudessem decidir a questão da forma que melhor lhes aprouvessem. Em 26 de outubro de 2011, a Corte Maior concluiu, em sede de Recurso Extraordinário, com unanimidade dos votos, pela constitucionalidade do Exame, ressalvando, contudo, que há pontos que se não forem corrigidos podem culminar na inconstitucionalidade do certame. Todavia, o julgamento do Supremo Tribunal Federal não enfrentou todos os argumentos em desfavor do Exame. A pretensão do trabalho, na realidade, consiste em enfatizar e destacar os pontos críticos que cercam a legalidade do Exame de Ordem como requisito obrigatório e indispensável ao exercício profissional como advogado, convidando, oportunamente, o leitor a um repensar em relação à metodologia atualmente vigente e dos indicativos de possíveis diligências futuras que se pretendem ser adotadas pelo Conselho Federal da OAB e, de modo especial, busca estimular o Bacharel em Direito a não esquecer jamais de lutar pelos seus ideais.

Palavras Chaves: Direito Constitucional. Recurso Extraordinário nº 603583. Exame de Ordem.. Obrigatoriedade.

Sumário: RESUMO. INTRODUÇÃO. I – O EXERCÍCIO DA PROFISSÃO DE ADVOGADO NA CF/88 ANTES E DEPOIS DO ADVENTO DA LEI Nº 8.906/94. a)  Breve retrospectiva do Conselho Federal da OAB.  b)  A atividade prática, o surgimento do exame e a incessante crise do ensino jurídico no Brasil. II – A QUESTÃO JUDICIAL DA OBRIGATORIEDADE DO EXAME DA OAB E OS ARGUMENTOS ANALISADOS PELO STF. a) Das etapas percorridas que culminaram na interposição do Recurso Extaordinário nº 603583.  b) Dos argumentos relevantes apresentados pelo autor – CONTRA O EXAME. c) A posição do Supremo e a análise do caso concreto.  c.1 –   A Manifestação da Procuradoria-Geral da República. c.2 –   Voto do Ministro Relator Marco Aurélio.  c.3 –   Voto do Ministro Luiz Fux. c.4 –   Voto da Ministra Cármen Lúcia. c.5 –   Voto do Ministro Celso de Mello.  c.6 –   Voto do Ministro Gilmar Mendes.  c.7 –   Voto do Ministro Ricardo Lewandowski.  c.8 –   Voto do Ministro Carlos Ayres Brito. d) DOS PONTOS NÃO ENFRENTADOS PELA SUPREMA CORTE. III - OUTROS APONTAMENTOS AINDA NÃO DISCUTIDOS QUE SUSCITAM, NO MÍNIMO, REFLEXÕES. a) Os dados que comprovam a existência de uma reserva de mercado. b) O descabimento da exigência do Exame da Ordem em concursos públicos para cargos da advocacia pública. c)Os critérios de avaliação e fiscalização exercidos pelo MEC que perfazem a exigência de uma nova prova para aferição de grau profissional. CONCLUSÕES. REFERÊNCIAS. 


INTRODUÇÃO

Há mais de uma década vem se travando uma incessante e acirrada discussão em torno da obrigatoriedade ou não da prestação de exame como definidor de capacidade técnico-profissional para atuação do graduado na ciência jurídica, quer dizer, para que exerça a atividade de advogado.

A questão da constitucionalidade do inciso IV do artigo 8º da Lei nº 8.906/94, o qual torna imprescindível submeter o bacharel em Direito à nova avaliação de supervisão do Conselho Federal da OAB para que o mesmo adquira capacidade postulatória, foi questionada em diversos tribunais em vários Estados da federação, inclusive provocando análise interpretativa do texto à luz da Constituição em sede de controle difuso.

Críticas não faltam em relação ao tema, isto porque o curso de direito, até pouco tempo, era o único no país a exigir tal exame pós-colação de grau.

Não se tem a pretensão de esgotar o assunto tampouco alcançar a melhor razão, ao revés, este trabalho tem o singelo desiderato de conhecer, divulgar, debater e refletir sobre os aspectos que envolvem a constitucionalidade do exame de ordem, trilhando sobre o histórico do exercício da profissão bem como sobre a evolução do Conselho Federal antes e após Constituição de 1.988. Tem ainda por objeto realizar um cotejamento em relação aos argumentos daqueles que são favoráveis e contrários ao exame, debruçando-se sobre o entendimento, recentemente, alcançado pelo Supremo Tribunal Federal – STF, na decisão do último dia 26/10/2011.

Destarte, a expectativa final deste trabalho é demonstrar e fomentar o debate sobre qual é o instrumento hábil que certifica a capacitação e qualificação profissional. Conquanto a Suprema Corte tenha alcançado um entendimento, este está longe de se tornar pacífico no universo jurídico em razão dos dispositivos constantes no texto constitucional e na legislação infraconstitucional.


I – O EXERCÍCIO DA PROFISSÃO DE ADVOGADO NA CF/88 ANTES E DEPOIS DO ADVENTO DA LEI Nº 8.906/94.

Visando atualizar os conhecimentos, dividiremos este capítulo em dois subtópicos, a saber:

a)  Breve retrospectiva do Conselho Federal da OAB

Entende-se conveniente, primeiramente, conhecer a biografia do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil cujas raízes encontram-se fincadas no artigo 17 do Decreto nº 19.408, de 18 de novembro de 1930, rubricado pelo ex-Presidente da República Getúlio Vargas[2]. Os cursos jurídicos no país foram implantados logo após a proclamação da independência, nos idos de 1.827, nas cidades de São Paulo/SP e Recife/PE e, à medida que a categoria foi crescendo, houve a necessidade de se buscar, à época, perante o Governo Imperial, uma autorização de criação de uma entidade que os representasse. Assim, por meio do ato oficial de 07 de agosto de 1.843 foi instalado o Instituto dos Advogados Brasileiros – IAB, vindo a ser criada efetivamente a “Ordem dos Advogados” quase um século depois.

A denominação “ORDEM” é, segundo a enciclopédia eletrônica wikipédia[3], corolário do dogma francês,

(...) vinculada à tradição da Idade Média, podendo ser entendida como um conjunto estatutário que determina um modo de vida reconhecido pela religião católica, tal como à Ordo Clericorum ou às ordens de cavalaria. O advogado era então uma espécie de cavaleiro das leis. Apesar de a Revolução Francesa ter extinto todas as corporações profissionais, a tradição manteve-se quanto à denominação da palavra Ordem, inspirando o nome de várias entidades corporativas relativas aos advogados em diversos países, inclusive em Portugal e no Brasil. (Grifou-se).

Tem-se, portanto, que o marco inicial dos Conselhos profissionais adveio da instituição da Ordem dos Advogados do Brasil.

Os Conselhos de Fiscalização de Profissões Regulamentadas são autarquias criadas pelo Estado voltadas a regular e organizar a atividade profissional, diferenciando-se, com isto, das associações, que se revelam uma congregação de pessoas com fins diversos não econômicos, conforme art. 53 do Código Civil[4]. Segundo o sítio eletrônico do Ministério do Trabalho e Emprego existem 63 espécies diferentes de profissões regulamentadas[5].

A OAB é composta por um Conselho Federal, que centraliza as decisões em todo o país. Nos Estados e Distrito Federal existem as Seções da Ordem, por sua vez compostas por diversas Subseções, que congregam vários municípios.

b) A atividade prática, o surgimento do exame e a incessante crise do ensino jurídico no Brasil

A graduação do profissional em Direito reclama, há muito tempo, o usus fori[6], isto é, exige, para sua habilitação, o conhecimento prático não ficando o curso restrito apenas à teoria. Entretanto, desde meados dos anos noventa o ensino jurídico vem passando por uma incansável e tortuosa crítica.

O primeiro estatuto da Ordem dos Advogados (Lei nº 4.215/63) previa como requisito de habilidade técnica[7], tanto de brasileiro como de estrangeiro, a comprovação e aprovação no estágio prático, sendo, o exame, exigido apenas daquele que, durante o período de graduação, obtivesse desempenho insatisfatório, dispensados os professores das instituições superiores e os aprovados em concursos da promotoria e magistratura. Assim vejamos:

Art. 48. Para inscrição no quadro dos advogados é necessário:

I - capacidade civil;

II - diploma de bacharel ou doutor em Direito, formalizado de acordo com a lei (art, 57);

III - certificado de comprovação do exercício e resultado do estágio, ou de habilitação no Exame de Ordem (arts. 18, inciso VIII, letras "a" e "'b" e 53)[8] ;

IV - título de eleitor e quitação do serviço militar, se for brasileiro:

V - não exercer cargo função ou atividades incompatíveis com a advocacia, (arts. 82 a 86) ;

VI - não ter sido condenado por sentença transitada em julgado em processo criminal, salvo por crime que não importe em incapacidade moral;

VII - não ter conduta, incompatível com o exercício da profissão (art. 110, parágrafo único);

Parágrafo único. Satisfazendo os requisitos deste artigo, o estrangeiro será admitido à inscrição nas mesmas condições estabelecidas para os brasileiros no seu país de origem, devendo exibir diploma reavaliado, quando não formado no Brasil.

Art. 53. É obrigatório o Exame de Ordem para admissão no quadro de advogados, aos candidatos que não tenham feito o estágio profissional ou não tenham comprovada satisfatoriamente o seu exercício e resultado (arts. 18, inciso VIII, letras "a" e "b"; 48, inciso III, e 50).

§ 1º O Exame de Ordem consistirá, em provas de habilitação profissional, feitas perante comissão composta, de três advogados inscritos há, mais de cinco anos, nomeados pelo Presidente da Seção na, forma e mediante programa regulado era provimento especial do Conselho Federal (art. 18. inciso VIII, letra b.

§ 2º Serão dispensados do Exame de Ordem os membros da Magistratura e do Ministério Público que tenham exercido as respectivas funções por mais de dois anos, bem como, nas mesmas condições, os professores de Faculdade de Direito oficialmente reconhecidas. (Grifou-se)

A Lei nº 5.842/72 conjuntamente com a Resolução nº 15/73-CFE regulamentaram o Estágio de Prática Forense e Organização Judiciária, de caráter meramente facultativo e, uma vez cursado, dava ao aluno o direito de inscrição na OAB.

Os parâmetros educacionais no Brasil exigem, desde 1972, um conteúdo mínimo[9] da entidade de ensino superior. Entretanto, para alguns especialistas, essa modalidade didática tem causado uma insegurança jurídica quanto a atuação do profissional, pois, em decorrência desta sistemática, raramente estar-se-ia a falar de um profissional especializado. Por outro lado, os estudos demonstraram – e demonstram até os tempos atuais – que “(...) tem sido possível evitar os problemas da admissão em massa de estudantes sem um mínimo de qualificação, o que tem permitido a manutenção mesmo da melhoria da qualidade do ensino em muitas instituições e cursos[10]”. Advém, portanto, conjecturas de uma crise no ensino superior, necessitando de mudanças.

Simon Shwartzan[11], dando continuidade ao discurso acima citado, paulatinamente descreve, em poucas palavras, a expansão do ensino superior como mola propulsora do progresso das nações, inclusive no Brasil. Confira-se:

Isto não significa, naturalmente que o ensino superior no Brasil não tenha problemas, dramatizados pela explosão de matrículas entre 1965 e 1980 – de 150 mil a um milhão e meio de estudantes em quinze anos. Esta expansão acompanhou uma tendência internacional de ampliação progressiva do acesso ao ensino superior, e coincidiu, no Brasil, com um regime militar que sempre desconfiou e muitas vezes agiu contra estudantes, professores e cientistas. Reformular o ensino superior foi um dos compromissos inscritos no discurso inaugural da Presidência da Nova República que Tancredo Neves nunca chegou a ler, mas que foi lido e assumido por seu sucessor, José Sarney. Para este fim o governo instalou, com toda solenidade, uma Comissão Nacional que deveria apontar os caminhos do futuro.  (Grifou-se)

Nessa fase houve expansão indiscriminada do ensino superior, haja vista a finalidade de reverter a insatisfação política da classe média urbana e consequentemente conseguir o seu apoio para o projeto de governo.

Dessa forma, conforme apontado por Galdino[12], surge uma expansão nada criteriosa da educação superior, proliferam instituições privadas sem o devido controle de sua qualidade, principalmente nos cursos de ciências sociais, em razão da baixa necessidade de investimentos.

Em meados da década de noventa, o então Presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, procurando dar continuidade aos trabalhos iniciados pelo governo Sarney, após levantamento de estudos apresentados pelo Ministério da Educação, no qual pontuou que apenas 3% (três por cento) da população brasileira possuíam ensino superior[13], resolveu expandir a universalização liberando concessões a todas as entidades ensino que possuíssem um corpo de docentes mínimo, entre mestres e doutores capazes de graduar novos profissionais, o que impulsionou e proliferou, daquele momento em diante, centenas de novos cursos superiores no Brasil.

Tal situação tem revelado que o ensino superior ainda vive em crise, particularmente porque as disciplinas, em regra, não são padronizadas, dando margem para que cada faculdade ministre ao seu critério o curso superior, salientando-se que, para isto, deve preencher, pura e simplesmente, o requisito mínimo estabelecido pelo Ministério da Educação – MEC.

Diante daquele cenário de crescimento educacional, o Conselho Federal da OAB resolveu, talvez, com receio do ensino jurídico cair em descrédito, além de atualizar seu regulamento de acordo com a previsão da nova Constituição (1988), impor a obrigatoriedade de todos serem submetidos ao exame de proficiência.

O legislador, por meio da Lei nº 8.906/94, estipulou em seu art. 8º, inciso VI a obrigatoriedade de o acadêmico ser submetido a exame para avaliação de seus conhecimentos, a cargo da OAB.

Por sua vez, a Resolução nº 02/1994, da Diretoria do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, estabeleceu exceção à regra:

Art. 7º Estão dispensados do Exame de Ordem:

I - os bacharéis em direito que realizaram o estágio profissional de advocacia (Lei nº 4.215/63) ou o estágio de prática forense e organização judiciária (Lei nº 5.842/72), no prazo de dois anos, com aprovação nos exames finais perante banca examinadora integrada por representante da OAB, até 04 de julho de 1994;

II - os inscritos no quadro de estagiários da OAB, até 04 de julho de 1994, desde que realizem o estágio em dois anos de atividades e o concluam, com aprovação final, até 04 de julho de 1996;

III - os matriculados, comprovadamente, nos cursos de estágio referidos no inciso I, antes de 05 de julho de 1994, desde que requeiram inscrições no Quadro de Estagiários da OAB, e o concluam com aprovação final, juntamente com o curso, até 04 de julho de 1996;

IV - os que preencheram os requisitos do art. 53, § 2º, da Lei nº 4.215/63, e requereram suas inscrições até 04 de julho de 1994; e

V - os que, tendo suas inscrições anteriores canceladas em virtude do exercício, em caráter definitivo, de cargos ou funções incompatíveis com advocacia, requererem novas inscrições, após a desincompatibilização.

Parágrafo único. Os bacharéis em direito que exerceram cargos ou funções incompatíveis com a advocacia, inclusive em carreira jurídica, sem nunca terem obtido inscrição na OAB, se a requererem, serão obrigados a prestar Exame de Ordem.

Nos termos do supracitado artigo, os estudantes de direito matriculados, comprovadamente, nos cursos de estágio de prática forense e organização judiciária, antes de 05 de julho de 1994, desde que requeressem inscrições no Quadro de Estagiários da OAB, e o concluíssem com aprovação final, juntamente com o curso, até 04 de julho de 1996, estavam dispensado do exame.

Há de se salientar que a jurisprudência fixou o entendimento de que a exigência do exame da ordem somente valia para os diplomados após a edição da Lei nº 8.906/94, pois aqueles que se formaram sob a égide da legislação anterior, ainda que não tivessem requerido a inscrição, tinham direito adquirido a esta.

Nesse sentido, trazem-se algumas das várias jurisprudências proferidas pelo Superior Tribunal de Justiça:

A dispensa do Exame de Ordem, nos termos do artigo 84 da Lei n.8.906/94, não exige que a inscrição como estágio no respectivo quadro tenha ocorrido anteriormente à publicação da referida lei.

Com efeito, é necessário apenas que o estagiário tenha efetuado inscrição na OAB e comprove, em até dois anos da promulgação da lei, o exercício e resultado do estágio profissional ou a conclusão, com aproveitamento, do estágio de Prática Forense e Organização Judiciária, realizado junto à respectiva faculdade" (REsp nº 503942/RS, Rel. Min. Franciulli Netto, DJ de 30/6/2004);

O art. 84 do Estatuto da OAB ressalvou a situação do estagiário, inscrito no respectivo quadro, com o objetivo de assegurar a inscrição definitiva aos estagiários que já haviam iniciado o seu estágio jurídico sob a égide da Lei 4.215/63 (Antigo Estatuto da OAB). Logo, impossível estender uma exceção aos não contemplados pela norma de transição" (REsp nº 509360/RS, Rel. Min. Francisco Falcão, DJ de 31/5/2004);

A inscrição na Ordem dos Advogados do Brasil obedece a lei do tempo em que ela se opera, sendo irrelevante o momento da aquisição da condição de bacharel em direito" (REsp nº 478279/PB, Rel. Min. Luiz Fux, DJ de 03/06/2003);         (Grifou-se)

Destarte, os bacharéis que tivessem cursado a disciplina de estágio de prática, pelo período equivalente a dois anos, ou seja, quatro semestres, podiam requerer sua inscrição junto ao Conselho Federal para exercer livremente a sua formação. A exceção acobertou também o estagiário que, já inscrito no respectivo quadro, ficou dispensado do Exame de Ordem conforme consta no Estatuto, art. 84, desde que comprovasse, em até dois anos da promulgação da lei, o exercício e o resultado do estágio profissional ou a conclusão, com aproveitamento, do estágio de Prática Forense e Organização Judiciária, realizado junto à respectiva faculdade, na forma da legislação em vigor.


II – A QUESTÃO JUDICIAL DA OBRIGATORIEDADE DO EXAME DA OAB E OS ARGUMENTOS ANALISADOS PELO STF

a) Das etapas percorridas que culminaram na interposição do Recurso Extaordinário nº 603583

Após ter colado grau, João Antonio Volante, foi impedido de inscrever-se nos quadros da Ordem dos Advogados do Brasil em razão da exigência de, a priori, ter de prestar prova de proficiência perante aquele Conselho Federal.

Irresignado, propôs ação ordinária na Justiça Federal do RS, protocolada sob o nº 2007.71.00.039034-2 (RS), buscando provimento jurisdicional que, declarando a inconstitucionalidade do exame de ordem, determinasse sua inscrição e registro definitivo nos quadros de Advogados da OAB, pois, segundo o autor,

(...) o diploma já é garantia suficiente de que está apto para exercer sua profissão, e que todo aluno proveniente de Instituição de Ensino Superior reconhecida pelo Ministério da Educação tem o direito de exigir sua carteira profissional da sua entidade de classe, independentemente de prévia aprovação em exame.

No mérito, amparado em jurisprudência, aquele juízo não reconheceu a inconstitucionalidade e julgou improcedente o pedido do autor, com os seguintes argumentos:

A legitimidade do Conselho Federal da OAB, por outro lado, é cristalina, visto que a discussão gira em torno do exame de ordem, normatizado pelo Provimento 109/2005 do mencionando Conselho.

Assim, enfrento, desde logo, o mérito, salientando que a questão já é conhecida dos tribunais. Nesse quadro, por medida de economia processual, cito os seguintes precedentes, cujos fundamentos adoto como razões de decidir:

CONSTITUCIONAL. EXAME DE ORDEM EXIGIBILIDADE. REQUISITO FUNDAMENTAL PARA O EXERCÍCIO DA ADVOCACIA. 1. A CF/88 não impede a regulamentação por lei infraconstitucional do exercício de determinada profissões, exigindo certas qualificações para o seu exercício. O Exame de Ordem visa essencialmente a aferir a qualificação técnica dos novos bacharéis. Ausente, pois, a inconstitucionalidade apontada. 2. Não é possível suprimir à apelante que hoje é requisito fundamental para o exercício da advocacia. (TRF4, AC 2007.71.00.041145-0, Quarta Turma, Relatora Marga Inge Barth Tessler, D.E. 05/05/2008).

ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. INSCRIÇÃO NA OAB.  EXAME DE ORDEM. ISENÇÃO. LEI Nº 8906/94. 1. Não é inconstitucional a exigência do exame de ordem prevista no art. 8º da Lei nº 8906/94. Também, não há direito adquirido dos impetrantes a aplicação das normas que vigiam quando do ingresso no Curso de Direito. (MAS n. 1999.04.01.089712-0 UF: RS, DJU data: 26/04/2000)

Ante o exposto, julgo improcedente o pedido inicial.

Condeno a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios que fixo em R$ 500,00 (quinhentos reais), para cada réu, com base no CPC, art. 20, § 4º, verba cuja exigibilidade, todavia, resta suspensa diante da AJG.

Havendo apelação, formalmente em ordem, dê-se seguimento.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Porto Alegre, 26 de agosto de 2008.

Jurandi Borges Pinheiro

Juiz Federal Substituto    (Grifo original)

Em seguida o autor apresentou Apelação Cível, tendo o Tribunal Regional Federal da 4ª Região confirmado os termos da sentença e, por unanimidade, negou o provimento ao recurso por não reconhecer a inconstitucionalidade levantada pela parte interessada, conforme ementa a seguir:

ADMINISTRATIVO. ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL. EXAME DE ORDEM.

Os arts. 8º, § 1º, da Lei nº 8.906/94, assim como os arts. 2ºs dos Provimentos nºs 81/96 e 109/05, do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, são constitucionais. (APELAÇÃO CÍVEL Nº 2007.71.00.039034-2/RS. RELATOR: Juiz Federal Convocado JOÃO BATISTA LAZZARI. Data da Decisão: 23/01/2009.Publicado D.E. em 04/02/2009)

Logo, vê-se que a matéria constitucional foi prequestionada[14] sendo passível a interpretação de Recurso Extraordinário perante o STF. Assim, em 16 de outubro de 2007, a parte interessada interpôs instrumento recursal que doravante será pormenorizadamente analisado.

b)                Dos argumentos relevantes apresentados pelo autor – contra o exame

Inicialmente a petição recursal ressaltou a ausência de isonomia entre o ensino superior jurídico e os demais cursos reconhecidos pelo Ministério da Educação como profissionalizantes, eis que

 (...), da mesma forma que qualquer profissional quando se forma e recebe seu DIPLOMA não está obrigado a prévia aprovação em EXAME semelhante, posto que seu DIPLOMA já é garantia suficiente de que está apto para exercer inclusive, requerer, à sua Entidade de Classe Profissional, a sua respectiva Carteira Profissional tão logo obtenha seu DIPLOMA, independentemente de ter sido ou não aprovado em EXAME semelhante, assim também deve ocorrer, em igualdade de condições, com o Bacharel em Direito, ou seja, este último deve ter o mesmo direito de requerer, à sua entidade de Classe Profissional tão logo obtenha seu DIPLOMA, a sua respectiva Carteira Profissional, independentemente de ter sido ou não aprovado em EXAME DE ORDEM.  (Grifo original)

Adiante, o autor reforçou a tese da violação ao princípio da igualdade, argumentando:

(...) tal exigência só abarca o curso de DIREITO, violando claramente o princípio constitucional da igualdade, pois, por exemplo, o universitário do Curso de Medicina da UFBA (...), após ter cumprido com todos os requisitos do curso, é considerado apto para exercer sua profissão, a medicina. Todavia o mesmo não ocorre com o profissional de DIREITO. Por que se dar este tratamento diferenciado? Por uma razão simples: o Médico cuidará do bem de “MENOR” importância CONSTITUCIONAL, a VIDA (...), enquanto o Advogado cuidará do bem de “MAIOR” importância CONSTITUCIONAL, o patrimônio do ser humano (...).    (com adaptações)

O autor discorre ainda que o papel de “todos” os Conselhos Federais consiste em controlar e acompanhar o bom desempenho na atuação profissional, rechaçando, por meio de sanções disciplinares[15], eventuais impropriedades cometidas durante o exercício, assegurando ao investigado ampla defesa e o contraditório.

Uma vez concluído o curso superior, o cidadão é considerado apto para o livre exercício profissional até que advenha prova contrária de sua inexperiência, para isto adverte (em negrito) que as regras do direito posto indicam flagrante desrespeito aos princípios constitucionais:

Se o Bacharel em Direito, ao contrário de todos demais profissionais, não é considerado apto para exercer a sua profissão, a Advocacia, após receber seu DIPLOMA, ao menos, deveria ser considerando presumivelmente apto a exercê-la até prova em contrário, ou seja, até sobrevir sentença condenatória que prove ser ele inapto para exercer a Advocacia, senão estaria cometendo-se [sic] violação expressa e indubitável dos seguintes princípios constitucionais:

1º) Princípio da Presunção da Inocência (art. 5º, inc. LVII, da CF/88): o Bacharel em Direito não será considerado inapto para exercer a advocacia até o trânsito em julgado de sentença condenatória que prove ser ele inapto;

2º) Principio do Devido Processo Legal (art. 5º, inciso LIV, da CF/88): o Bacharel em Direito não será privado da liberdade de exercer sua profissão, a Advocacia, sem o devido processo legal;

3º) Princípio do Contraditório e Ampla Defesa (art. 5º, inc. LV, da CF/88): aos acusados em geral (como, por exemplo, o Bacharel em Direito acusado de ser incompetente e inapto para exercer a Advocacia antes sequer de poder exercê-la para demonstrar se tem ou não fundamento esta acusação), são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.”     (Grifo original)

Enfim, o que o autor pretende demonstrar é que o Bacharel em Direito poderia receber sua carteira, sem necessidade de aprovação em Exame[16], eis que o art. 43 inciso II da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 9.394/96) estabelece que uma das finalidades dos ensino superior é

(...) formar diplomados nas diferentes áreas de conhecimento, aptos para a inserção em setores profissionais e para a participação no desenvolvimento da sociedade brasileira”, talvez, aí esteja a razão de inserir em sua tese de que é “(...) no exercício da Advocacia que sua respectiva Entidade de Classe (...) terá condições de avaliar e provar, mediante o devido processo legal, onde deverá ser assegurado o contraditório e a ampla defesa.

Colhe-se, para tanto, a seguinte informação da petição recursal:

O legislador infraconstitucional disciplinou, dentro dos ideais da Constituição Federal, que os cursos superiores são responsáveis pela declaração da aptidão para inserção no mercado de trabalho. Sendo os diplomas expedidos por tais cursos são prova da formação recebida pelo titular.

(...), o Curso Superior tem por objetivo o estímulo ao pensamento reflexivo, a criação cultural e o espírito científico. Por isso, as instituições (...) são ‘pluridisciplinares de formação dos quadros profissionais de nível superior, de pesquisa, de extensão e de domínio e cultivo do saber do ser humano’ (art. 52). Daí o motivo da autonomia universitária, que inclui a fixação dos ‘currículos dos seus cursos e programas, observadas as diretrizes gerais pertinentes;’ bem como estabelecimento de “planos, programas e projetos de pesquisa cientifica, produção artística e atividades de extensão

O Requerente menciona que essa informação está amparada no art. 209 da CF/88, chegando a afirmar

(...), percebe-se que o exame não é qualificação profissional, e que as instituições de ensino, e não a OAB, são aptas a declarar a aptidão para inserção no mercado profissional. Cabe ao Poder Público, e a mais ninguém, autorizar e avaliar o ensino (...).

Não obstante, entende o autor ainda ser duplamente inconstitucional o exame da OAB por se tratar de regulamento produzido pelo Conselho Federal e não por lei, conforme se percebe da leitura dos parágrafos seguintes, a saber:

(...) o EXAME DE ORDEM da OAB foi criado, na verdade, POR UM PROVIMENTO, editado pelo Conselho Federal (...) Vejam o absurdo: um direito fundamental (art. 5º, XIII, da CF) sendo limitado, não por uma lei, mas por um simples PROVIMENTO (...). Isso ocorre porque a Lei nº 8.906 (Estatuto da Ordem), impõe, como requisito para a inscrição como advogado, A APROVAÇÃO EM EXAME DE ORDEM (art. 8º, IV). Nada mais. Diz, apenas, que O EXAME DE ORDEM SERÁ REGULAMENTADO EM PROVIMENTO DO CONSELHO FEDERAL DA OAB (art. 8º, § 1º).

Portanto, o Exame de Ordem NÃO FOI CRIADO POR LEI do Congresso (...), nem FOI REGULAMENTADO PELO PRESIDENTE DA REPÚBLICA , como deveria ter sido (CF – art. 84, IV, in fine). A norma é inconstitucional, porque a competência de REGULAMENTAR AS LEIS é privativa do Presidente da República.

Verifica-se, desse modo, que o Exame de Ordem é, também, FORMALMENTE INCONSTITUCIONAL, porque foi criado por um órgão que não tinha necessária competência para tanto. SOMENTE A LEI DO CONGRESSO, REGULAMENTADA PELO PRESIDENTE, poderia restringir o DIREITO FUNDAMENTALAO EXERCÍCIO DA PROFISSÃO (CF, art. 5º, XIII).”

Apresentados os pontos de maior relevância contidos no RE, partimos para a interpretação dada à matéria por nossa eminente Suprema Corte.

c)  A posição do Supremo e a análise do caso concreto

Em exame preliminar, o Ministro Relator Marco Aurélio reconheceu a repercussão geral[17]. Em razão dos argumentos apresentados no Recurso, em tese há inobservância dos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana, da igualdade, do livre exercício das profissões, bem como do direito à vida[18]. Impedir que os bacharéis exerçam a profissão de advogado após a conclusão do curso universitário também representaria ofensa aos princípios da presunção de inocência, do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, enfim envolvem não apenas a parte interessada, mas sim uma coletividade de pessoas. Assim, reunidos em sessão solene no Plenário, no dia 26/10/2011, resolveram enfrentar as questões citadas.

c.1 –   A Manifestação da Procuradoria-Geral da República

Em julho/2011, com muita propriedade e com um discurso corajoso o Subprocurador-Geral da República Rodrigo Janot enviou ao STF um parecer sobre o caso. Em apertada síntese, ele considerou inconstitucional o exame por violar o direito ao trabalho e à liberdade de profissão, garantido pela Constituição Federal.

Entende-se relevante destacar alguns excertos da análise percuciente manifestação, por exemplo, a tese de que o Exame de Ordem cria uma restrição ilegal de acesso à profissão de advogado posto que o instrumento hábil de qualificação e capacidade técnica reconhecido no ordenamento jurídico é o Diploma, discorrendo, assim que:

O diploma é, por excelência, o comprovante de habilitação que se exige para o exercício das profissões liberais. O bacharel em Direito, após a conclusão do curso deverá, ao menos em tese, estar preparado para o exercício da advocacia e o título de bacharel atesta tal condição (...)

Com efeito, frisa que Conselho Federal da OAB insiste em impor o Exame de Ordem como necessário a atividade de advogado, apesar de estar se referindo a um profissional liberal e de exerce função essencialmente pública. Logo, seria incabível a aplicação de uma prova tão rigorosa ou exigente de conhecimentos específicos que muitas vezes só é adquirido com a prática e, pior, é considerada uma espécie de concurso público para aferir a qualificação necessária para o desempenho da função.

Destaca que outros atores do sistema de Justiça, como juízes, membros do Ministério Público, defensores e advogados públicos, tem seu conhecimento aferido em concursos públicos para assumir suas funções. Logo, segundo a OAB, o advogado também deve se submeter a um teste que verifique sua qualificação. De acordo com o respeitável Subprocurador-Geral, o argumento não se sustenta:

Não se pode admitir seja o Exame de Ordem instrumento de seleção dos melhores advogados (critério meritório). Se assim considerado, mais flagrante se tornam a indevida restrição à escolha profissional e o caminho para intolerável reserva de mercado (...), não contém a Constituição mandamento explícito ou implícito de que uma profissão liberal, exercida em caráter privado, por mais relevante que seja, esteja sujeita a regime de ingresso por qualquer espécie de concurso público.

 Traduzindo, afasta com isto o método de avaliação utilizado visto que a prova aparentemente não busca acompanhar o conteúdo curricular e exige do candidato conhecimento técnico prático especializado, se esquecendo que o curso de direito forma bacharel com conhecimentos mínimos para atividade e não um profissional especializado, que adquirirá essa capacidade com outros cursos de especialização (pós-graduação, mestrado, doutorado e pós-doutorado). Enfim, a prova se torna um instrumento injusto e inadequado para os seus fins, por essa razão, afirma o Subprocurador-Geral que se deve afastar a exigência de aprovação no Exame de Ordem como requisito indispensável para inscrição como advogado nos quadros da OAB.

Nada obstante, o Procurador-Geral da República, Roberto Gurgel, por ocasião do julgamento, defendeu perante o plenário do STF a constitucionalidade do exame, contrariando o anterior parecer do próprio Ministério Público, sob os seguintes argumentos de que o dispositivo do inciso XIII do art. 5º da Constituição Federal refere-se à norma contida e que o efetivo exercício da profissão dependerá do atendimento às qualificações e exigências legais. “Restrições são possíveis, uma vez que sejam razoáveis”.

Destacou que o princípio da liberdade profissional deve ser interpretado em conjunto com o artigo 22, inciso XVI, da Constituição.

A liberdade profissional não confere um direito subjetivo ao efetivo exercício de determinada profissão podendo a lei exigir qualificações e impor condições para o exercício profissional (...), no caso da advocacia, diante da essencialidade da atividade do advogado para a própria prestação jurisdicional, parece muito consistente a opção do Poder Legislativo no sentido de estabelecer a aprovação do exame de ordem como condição para o exercício profissional.

Assim, o Exame de Ordem não restringe o exercício da profissão.

Enfatizou, o eminente Procurador-Geral da República, que a aplicação de uma prova pode ser considerada uma medida adequada para apurar a qualificação profissional exigida para o exercício de determinada atividade. “O exame de Ordem constitui, portanto, medida claramente adequada para garantir a qualificação do profissional e proteger os direitos de terceiro”.

Assinalando que para Procuradoria-Geral da República a instituição do exame questionado “constituiu inegável avanço no sentido do substancioso aprimoramento, não apenas da advocacia, mas do nosso sistema de Justiça como um todo, imperativo dos tempos em que vivemos, da massificação do ensino jurídico entre outros aspectos”. Para Roberto Gurgel, seria lamentável retirar do cenário jurídico brasileiro “novidade tão imensamente alvissareira que foi o exame de Ordem”.

c.2 –   Voto do Ministro Relator Marco Aurélio

A análise do Ministro Relator trouxe críticas que contribuem para a reflexão particularmente quanto ao surgimento das faculdades que abrem suas portas quase que da noite para o dia sob a ilusão de que “quanto mais melhor”, ressaltando, ademais, a baixa qualidade dos cursos de direito e a alta taxa de reprovação de alunos no exame. Confira-se:

(...), a permissividade com que se abrir os cursos de direito de baixo custo, porquanto restritos ao “cuspi e giz”, decorrente de uma ideologia afiada no adágio “quanto mais, melhor”, merece severas críticas. Vende-se o sonho e entrega-se o pesadelo: após cinco anos de faculdade, o bacharel se vê incapaz de ser aprovado no exame de conhecimentos mínimos da Ordem, condição imposta para que possa exercer a advocacia e, com esta, prover a própria subsistência. A alegria do momento transmuda-se em drama pessoal. A reflexão sobre essa realidade cabe não só ao Supremo, mas também à sociedade brasileira.

Reforçando, em sua visão, que o exame de proficiência é fator determinante na qualificação do profissional, ressaltou que:

Há de entender-se a aprovação no exame, sem equívocos, um elemento que qualifica alguém para o exercício de determinada profissão. Qualificar-se não é apenas submeter a sessões de ensino de teorias e técnicas de determinado ramo do conhecimento, mas sujeitar-se ao teste relativamente à ciência adquirida. O argumento do recorrente não se sustenta: se o exame “não qualifica”, também não teriam o mesmo efeito as provas aplicadas pelas próprias universidades, as quais são condição essenciais à obtenção do bacharelado. Também elas seriam inconstitucionais? A resposta é desenganadamente negativa. O exame serve perfeitamente ao seu propósito de avaliar se estão presentes as condições mínimas para o exercício escorreito da advocacia, almejando-se sempre oferecer à coletividade profissionais razoavelmente capacitados.

Segundo o ministro, embora o referido comando constitucional impeça o Estado de opor qualquer tipo de embaraço ao direito dos cidadãos de obter habilitação para a prática profissional, quando o exercício de determinada profissão transcende os interesses individuais e implica riscos para a coletividade, “cabe limitar o acesso à profissão em função do interesse coletivo”.

Nesse contexto fez questão de asseverar que:

(...) O constituinte limitou as restrições de liberdade de ofício às exigências de qualificação profissional”, afirmou o ministro Marco Aurélio, ao citar o próprio inciso XIII, artigo 5º, da Carta Magna, que prevê para o livre exercício profissional o respeito às qualificações estabelecidas em lei.

Assim, em síntese, considerou que o dispositivo questionado da lei (Estatuto da Advocacia) não afronta a liberdade de ofício prevista no inciso XIII, artigo 5º, da Constituição Federal, conforme argumentava o bacharel em direito autor do recurso, podendo a OAB regulamentá-lo.

c.3 –   Voto do Ministro Luiz Fux

Este é um voto que requer atenção especial, notadamente, pela riqueza dos detalhes apresentados e por ser, aparentemente, um voto dotado de imparcialidade, onde há argumentos favoráveis e contrários à aplicação do Exame, porém, não é político mas, ao revés, plenamente jurídico.

Em princípio, o jurista fez questão de destacar ter a OAB legitimidade para regular a profissão. Para tanto, buscou apoio no voto do Ministro aposentado Eros Grau que, no julgamento da ADI nº 3026, destacou ter a OAB posição constitucionalmente privilegiada, não sendo ela entidade pertencente à Administração Indireta e, portanto, sequer estaria incluída no rol das “autarquias especiais”, não estando sujeita a controle da Administração e não possuindo similaridade com os demais órgãos de fiscalização profissional. Ao ver do Ministro, trata-se de uma categoria ímpar no elenco das personalidades jurídicas existentes no direito brasileiro. Na sequência, enfrentando o tema da violação do princípio da legalidade, assentou que:

(...) No caso, a Lei nº 8906/94 fixou, como requisito indispensável na OAB – e, portanto, ao exercício da advocacia – a aprovação no Exame da Ordem. Percebe-se, com isso, que a restrição à liberdade fundamental de ofício está presente na lei formal, atendendo-se, portanto, ao limite imanente da reserva da lei.

A delegação legislativa de regulamentação do Exame de Ordem ao Conselho Federal da OAB não fere a reserva de lei, ao menos sob a perspectiva moderna do princípio da legalidade.

Quanto à questão da exigência de prévia aprovação no Exame para inscrição junto a OAB, o Ministro Fux remete-se ao voto do Ministro Thompson Flores e à lição de Sampaio Dória que assentaram que “(...) a exigência de capacidade técnica se revela imperiosa para o exercício da profissão cujo desempenho por indivíduo inepto, desprovido de formação específica para tanto, possa causar prejuízo direto a terceiros”.

Diante disto, destacou em seu voto que:

Destarte, o desempenho da advocacia por indivíduo com formação deficiente poderá causar prejuízo irreparável ou, quando menos, de difícil reparação ao seu constituinte. A representação judicial despreparada pode custar a um indivíduo sua liberdade, o imóvel que reside, a guarda dos filhos; a consultoria jurídica prestada por profissional desprovido da necessária habilitação técnica pode submeter o seu cliente a sanções gravosas, ocasionando prejuízos capazes de fechar empresas. Por essas razões, existe justificativa plausível para prévia verificação da qualificação profissional do bacharel em Direito para que possa exercer a advocacia. Sobreleva, in casu, interesse coletivo relevante na aferição da capacidade técnica do indivíduo que tenciona ingressar no exercício profissional das atividades privativas de advogado.

Complementando, aduziu que o exame exerce um papel preventivo contra os possíveis maus profissionais, outrossim, não seria prudente ao ente representativo da classe controlar seus inscritos apenas durante o exercício da atuação profissional, como discorre a parte autora. Vejamos sua posição:

(...) Trata-se de questão de razoabilidade. Fere o bom senso, data maxima venia, que se reconheça à OAB a existência de autorização constitucional unicamente para controle a posteriori da inépcia profissional, restringindo sua atribuição, nesse ponto, a mera atividade sancionatória. Não se pode admitir que, para que seja deflagrada a fiscalização da capacidade técnica de advogado pela OAB, a atuação desqualificada desse profissional já tenha sido capaz de ocasionar lesão – cuja gravidade pode ser imensurável – ao seu cliente ou a terceiros. Evidentemente, o profissional que, reiteradamente, incide em erros que revelam manifesta inépcia merecerá a sanção da respectiva entidade de classe (observadas, naturalmente, as garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa), mas isso não pode significar a impossibilidade de serem adotadas medidas preventivas. Não é razoável, repita-se, que se espere o arrombamento da fechadura para que só depois se lhe ponha o cadeado; é salutar, ao revés, que se possa estabelecer providência de verificação, a priori da qualificação técnica do profissional, como se faz por intermédio do Exame de Ordem.

Entende o Ministro que boa parte da sociedade que se insurge contra o Exame, na verdade, não é contrário ao Exame em si, mas critica a forma como este está sendo aplicado. Para melhor visualização vejamos, ipsis litteris, as palavras do Ministro:

(...) evidencia-se que a insurgência contra o Exame de Ordem estará a revelar que o problema, se houver, não reside na realização do Exame em si, mas na forma como é elaborado. O problema, destarte, não de um Exame, mas deste Exame, da maneira em que hoje é realizado. Se é assim, não se poderia falar em inconstitucionalidade da lei que o obriga, mas de eventual afronta à própria legislação de regência, desdobrando-se, com isso, do controle de constitucionalidade que compete a esta Corte.

Fazendo alusão ao parecer do Parquet bem como aos argumentos acostados no instrumento recursal, ressaltou, o Ministro, serem insubsistentes os argumentos do autor em relação à reserva de mercado, todavia, não descartou a possibilidade de o tema ser abordado nas vias ordinárias, explicando para tanto, que:

(...) há outras alegações que se afiguram, concessa venia, insubsistentes. Afirma-se que o Exame de Ordem pode consistir numa reserva de mercado , tese presente tanto nas razões recursais como no parecer ministerial. A conclusão que a previsão legal da obrigatoriedade do Exame de Ordem pode consistir numa reserva de mercado, feita in abstrato, não resiste às observações de que: (i) a cada quatro meses, realiza-se novo Exame, aberto a quaisquer bacharéis, ainda que reprovados em edições anteriores, sem nenhuma restrição: (ii) não há limite do número de aprovados para posterior  inscrição na OAB; (iii) há regime própria de isenção de custas para os hipossuficientes. É o que resta a dizer, então, à luz da previsão expressa de que o Exame de Ordem é franqueado também bacharelandos que estejam cursando os últimos períodos do curso de graduação e, assim, podem ingressar logo no mercado de trabalho, reduzindo ao máximo o hiato entre a conclusão do curso superior e o início do exercício profissional (art. 2º, §1º, do Provimento nº 109/05)? É uma previsão inclusiva, incompatível com a alegada reserva de mercado.

Demais disso, ainda que fosse possível alegar o Exame de Ordem produza uma reserva de mercado in concreto, seria necessário que houvesse demonstração fática de sua ocorrência e, nessa instância, um reexame de prova, inviável em sede de recurso extraordinário (Súmula 279 – STF).

Conquanto tenha defendido o exame da ordem, convidou, em seguida, a Corte e a sociedade como um todo à seguinte reflexão:

(...). Entretanto, existe ainda um ponto merecedor de especial atenção. O Recorrente afirma que há incongruência no fato da OAB exercer a fiscalização na realização do de quaisquer concursos jurídicos e que tenha assento Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e no Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), mas que não haja qualquer espécie de controle sobre o Exame de Ordem, que seria aplicado sem a necessária transparência.

(...) Demais disso, a presença da OAB na organização e nas comissões examinadoras de concursos públicos funciona como mecanismo crucial para oxigenação dos certames, na medida em que podem oferecer ângulos de visão diferentes – às vezes, opostos -, com o que contribuirá, dialeticamente, para a seleção de profissionais de visão mais abrangente do Direito para o exercício de carreiras típicas do Estado.

O oposto, no entanto, não ocorre. O art. 3º § 3º, do Provimento nº 109/05, do Conselho Federal da OAB – cuja inconstitucionalidade também foi aguida neste feito – determina que a composição das bancas examinadoras deverá contemplar, no mínimo, três advogados com experiência didática, mas não obriga à participação de integrantes de outras carreiras jurídicas, como Magistratura, o Ministério Público ou mesmo a Defensoria Pública e a Advocacia Pública, que conquanto sejam compostas de advogados também inscritos na OAB,  possuem perspectivas bem próprias da advocacia em si, moldadas pelo exercício de suas atribuições  institucionais. O mesmo se dirá em relação aos docentes universitários. Todas essas categorias poderiam oferecer contribuições relevantes para o aperfeiçoamento do Exame de Ordem e, não é demais assinalar, em vários dos Estados norteamericanos o Bar Exam é organizado pelo Poder Judiciário.

Em seguida discorreu sobre a inviabilidade de se manter a elaboração e organização do exame somente nas mãos de integrantes da OAB porque tal postura pode suscitar questionamentos em relação à observância, pela entidade, de princípios democráticos e republicanos, sendo, portanto, conveniente a presença de particípes externos (Magistratura e o MP, por exemplo), advertindo, ainda que o exame da OAB caminha para a inconstitucionalidade se não forem criadas formas de tornar sua organização mais pluralista. Anotamos:

Cumpre à OAB atender às exigências constitucionais de legitimação democrática da sua atuação, que envolve, entre outros requisitos, a abertura de seus procedimentos à participação de outros seguimentos da sociedade

(...), parece plenamente razoável que outros setores da comunidade jurídica passem a ter assento nas comissões de organização e nas bancas examinadoras do exame de Ordem, o que, aliás, tende a aperfeiçoar o certame, ao proporcionar visão mais pluralista da práxis jurídica, exigindo do bacharel uma perspectiva mais panorâmica do Direito para que assim, profissionais mais qualificados ingressem no exercício da advocacia.

Vislumbro, pois, a existência de uma situação ainda constitucional, mas de constitucionalidade imperfeita (...).

As normas que disciplinam do exame de Ordem, portanto, encontram-se, ao meu sentir, em trânsito para a inconstitucionalidade, mesmo porque a exegese contemporânea do princípio democrático insculpido na Constituição Federal de 1988 é um construto da experiência das últimas décadas, não se podendo exigir da OAB que já houvesse vislumbrado a situação latente de quase-inconstitucionalidade.

(...) Por outro lado, a permanência da falha ocasionará, no futuro, a efetiva inconstitucionalidade da disciplina do exame de Ordem tal como hoje se realiza.

Dessa forma a OAB deve possibilitar a participar de outros entes nos próximos exames sob pena de eivar o certame de vício de inconstitucionalidade.

c.4 –   Voto da Ministra Cármen Lúcia

A Ministra acompanhou o voto do Ministro Relator e reconheceu a legalidade do Exame da Ordem, frisando, inicialmente, que as faculdades formam bacharéis em direito, não advogados. Destaca, ainda, que o teste aplicado pela OAB atende plenamente à regra constitucional que condiciona a liberdade ao trabalho ao atendimento de qualificações profissionais estabelecidas em lei (inciso XIII do artigo 5º da Constituição).

Segundo ela, o Estatuto da Advocacia foi produzido coerentemente com o que a sociedade, em um Estado democrático, exige da OAB e que os provimentos previstos no Estatuto (parágrafo 1º do artigo 8º da Lei 8.906/94) são necessários para regulamentar os exames aplicados no país. Confira-se: O provimento foi a fórmula encontrada para que a OAB pudesse, o tempo todo, garantir a atualidade da forma de qualificação a ser exigida.

Em síntese, a ilustre Ministra não trouxe acréscimos aos votos dos seus antecessores.

c.5 –   Voto do Ministro Celso de Mello

O decano do STF iniciou seu discurso sendo enfático no sentido de que é lícito ao Estado impor exigências com “requisitos mínimos” de capacidade, estabelecendo o atendimento de certas qualificações profissionais, que sejam condições para o regular exercício de determinado trabalho, ofício ou profissão.

Mencionou, ainda, que as prerrogativas dos advogados traduzem meios essenciais destinados a proteger e amparar os “direitos e garantias” que o direito constitucional reconhece às pessoas. Nas suas palavras,

O advogado assume papel relevantíssimo na aplicação e defesa da ordem jurídica, a ele cabe a missão de deflagrar o controle da legalidade. Todo advogado é um potencial defensor do Direito. E essa nobre missão não pode ser olvidada.

Em sua visão, a legitimidade constitucional do exame da ordem é “plenamente justificada”, principalmente por razões de interesse social. Para o decano,

(...) os direitos e garantias individuais e coletivas poderão resultar frustrados se for permitido que pessoas ‘despojadas de qualificação profissional’ e ‘destituídas de aptidão técnica’ – que são requisitos ‘aferíveis, objetivamente pela prova de suficiência ministrada pela Ordem dos Advogados do Brasil’ – exerçam a advocacia (...)

Assim, acompanhou integralmente o voto do relator.

c.6 –   Voto do Ministro Gilmar Mendes

O constitucionalista foi breve, mas fez questão de enfatizar que a situação de reserva legal qualificada (o exame da OAB) tem sua justificativa na necessidade de controle do exercício da profissão. Entende que tal controle não lesa o princípio da proporcionalidade, porque o exame contém abertura bastante flexível, permitindo aos candidatos participarem de três exames por ano.

Quanto às críticas sobre suposto descompasso entre o exame da OAB e os currículos das faculdades de Direito, Gilmar Mendes disse acreditar que essa questão pode ser ajustada pela própria OAB, em articulação com o Ministério da Educação, se for o caso. No mais, manteve o entendimento do Relator.

c.7 –   Voto do Ministro Ricardo Lewandowski

O jurista esclareceu que neste caso pode-se perfeitamente aplicar a chamada “teoria dos poderes implícitos”, desenvolvida em 1819 na Suprema Corte norte-americana. Essa tese, segundo ele, explica que, quando se conferem a um órgão estatal determinada competências, devem-se-lhe conferir, também, os meios para executá-las.

Em sintonia com essa teoria, portanto, conforme o ministro, o Estatuto da Ordem (Lei 8.906/94), com base no artigo 22, inciso XVI, da Constituição Federal, ao regular o exercício da advocacia, conferiu à OAB os poderes para que o fizesse mediante provimento. Destacou, ainda, que o exame de Ordem possui higidez em sua elaboração seguindo critérios impessoais e objetivos.

Realçou, ainda, que o artigo 44, inciso II, do Estatuto da Ordem é claro, ao atribuir à entidade a incumbência de “promover, com exclusividade, a representação, a defesa, a seleção e a disciplina dos advogados em toda a República Federativa do Brasil”, mantendo os entendimentos anteriores.

c.8 –   Voto do Ministro Carlos Ayres Brito

O atual Presidente do STF em exercício iniciou seu voto destacando que na Constituição Federal há 42 menções à advocacia, à OAB e ao Conselho Federal da OAB, o que, de per si, já marca a importância da advocacia em sua função de intermediária entre o cidadão e o Poder Público.

Fez questão de citar, mais uma vez, o contido no artigo 5º, inciso XIII, que dispõe ser livre o exercício de qualquer trabalho, atendidos as qualificações profissionais que a lei estabelecer. Ressaltou que o dispositivo faz uma mescla de liberdade com preocupação social, que é justamente o que ocorre com o exame contestado no RE, pois, segundo o ministro, ele é “(...) uma salvaguarda social”.

Noutra oportunidade mencionou o artigo 133 da CF, frisando que esse dispositivo estabelece que o advogado é indispensável à administração da Justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei, daí a razão da importância do referido exame.

Os Ministros Dias Toffoli e Cezar Peluso acompanharam integralmente o voto do relator, sem deduzir acréscimos.

d)                Dos pontos não enfrentados pela Suprema Corte

Não obstante tenha o autor deduzido com propriedade o tema, não foi abordada pelos Ministros a questão do tratamento isonômico em relação às demais profissões. Na verdade, o único que tentou falar sobre o tema foi o Ministro Luiz Fux que o fez a partir de uma interpretação do Ministro Eros Grau dada em outro caso (ADIN 3026-DF[19]). Naquela oportunidade, Eros Grau, entendeu ser a advocacia “ (...) uma categoria ímpar no elenco das personalidades jurídicas existentes no direito brasileiro” o que não quer dizer que a carreira jurídica é melhor do que qualquer outra profissão, como destacado no RE impetrado pelo Autor.

Noutras palavras a questão não foi enfrentada quanto ao fato de um advogado ser mais perigoso do que um médico, um engenheiro, um farmacêutico, um enfermeiro, que exerce sua profissão apenas com o diploma.

O teste somente para bacharéis em direito é uma discriminação, pois todos são iguais perante a lei, sendo assim, todos deviam se submeter ao teste independente de qual o curso superior concluído. Ou o Exame de proficiência é legítimo para qualquer profissão derivada de curso superior ou a conclusão do curso superior é suficiente para todas as profissões.

O STF reconheceu a constitucionalidade da Lei nº 8.906/94 (Estatuto da Ordem), mas nenhum dos Ministros se posicionou sobre o critério de qualificação profissional estabelecido pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação em que se garante apto para o exercício profissional o cidadão que possuir diploma emitido por instituição de ensino superior reconhecida pelo MEC.

A Corte Superior enfrentou a questão isoladamente com apoio no art. 5º, inciso XIII, como se este dispositivo pudesse ser interpretado sem se levar em consideração que tal dispositivo é, na verdade, complementado pelos arts. 205 e 209, conforme indicados pelo autor e abaixo transcritos:

Art. 5º (...)

XIII - é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer;

(...)

Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.

(...)

Art. 209. O ensino é livre à iniciativa privada, atendidas as seguintes condições:

I - cumprimento das normas gerais da educação nacional;

II - autorização e avaliação de qualidade pelo Poder Público.”

Diante deste aspecto, convém trazer à baila a irretocável didática do Ministro Eros Grau, a saber:

(...) não se interpreta a Constituição em tiras, aos pedaços. Tenho insistido em que a interpretação do direito é interpretação do direito, não de textos isolados, desprendidos do direito. Não se interpreta textos de direito, isoladamente, mas sim o direito – a Constituição – no seu todo. (Voto proferido na ADI 1.923. Relator(a): Min. ILMAR GALVÃO.  Julgamento: 29/06/2007. Publicação: DJ 01/08/2007 PP-00015).

Assim, vale dizer, é imprescindível uma interpretação sistêmica que leve em consideração valores outros dispostos na Carta Magna e tal, lamentavelmente, não foi levado a cabo na análise deste caso em concreto.


III - OUTROS APONTAMENTOS AINDA NÃO DISCUTIDOS QUE SUSCITAM, NO MÍNIMO, REFLEXÕES

a)                 Os dados que comprovam a existência de uma reserva de mercado

Nas primorosas palavras de Maurício Gieseler de Assis[20] que, recentemente, apresentou dados estatísticos que ratificam a reserva de mercado criado pelo exame de ordem:

As críticas e os elevados percentuais de reprovação geraram uma visão sinistra do que seria o Exame de Ordem. Ao invés de um processo seletivo, um impiedoso sistema de reserva de mercado imposto draconianamente, cujo propósito estaria vinculado a manter um percentual sempre estável de aprovados, independe do preparo dos candidatos.

A análise estatística das edições anteriores da prova afasta quaisquer raciocínios contrários:

Vejamos então os dados dos últimos Exames, considerando o número final de aprovados, exceto o atual Exame, ainda pendente da publicação da lista final de aprovados.

2008.1 — 39.357 inscritos — 11.063 aprovadosPercentual de aprovados em relação ao número de presentes: 28.87%

2008.2 — 39.732 inscritos — 11.668 aprovadosPercentual de aprovados em relação ao número de presentes: 30,22%

2008.3 — 47.521 inscritos — 12.659 aprovadosPercentual de aprovados em relação ao número de presentes: 27,35%

2009.1 — 58.761 inscritos — 11.444 aprovadosPercentual de aprovados em relação ao número de presentes: 19,48%

2009.2 — 70.094 inscritos — 16.507 aprovadosPercentual de aprovados em relação ao número de presentes: 24,45%

2009.3 — 83.524 inscritos — 13.781 aprovadosPercentual de aprovados em relação ao número de presentes: 16,50%

2010.1 — 95.764 inscritos — 13.435 aprovadosPercentual de aprovados em relação ao número de inscritos: 14,03%

2010.2 — 106.041 inscritos — 16.974 aprovadosPercentual de aprovados em relação ao número de inscritos: 16,00%

2010.3 — 106.891 inscritos — 12.534 aprovadosPercentual de aprovados em relação ao número de inscritos: 11,73%

IV Exame Unificado — 121.380 inscritos — 18.234 aprovadosPercentual de aprovados em relação ao número de inscritos: 15,02%

V Exame Unificado — 108.355 inscritos — 26.024 aprovadosPercentual de aprovados em relação ao número de inscritos: 24,01%

Demonstrando estes dados em gráfico tem-se a seguinte ilustração, relacionada ao número de alunos inscritos e aprovados. Na horizontal, encontra-se a relação das provas feitas em 2008, 2009, 2010 e 2011 (unificado). Na vertical, a escala de número de inscrições e aprovados:

Ao comentar o resultado relativo ao IV Exame Unificado (ou 2º/2011), o Presidente da OAB, Ophir Cavalcanti, fez questão de enfatizar que o crescimento da aprovação revela o maior compromisso e empenho das universidades e estudantes. No entanto, segundo ele, os altos índices de reprovação ainda devem permanecer: "É difícil mudar, pois este é o resultado de uma política que depreciou a qualidade do ensino jurídico no Brasil. Colhemos os frutos que foram plantados"[21].

Observa-se que o número de inscritos aumentou, mas o número de aprovados manteve-se quase constante. Logo, é patente que estamos diante de uma reserva de mercado, onde não importa o número de candidatos inscritos, pois haverá sempre um corte quando a linha beirar os 20.000 aprovados.

Se o exame de ordem tem a suposta finalidade de filtrar os bons profissionais, logo o número de advogados que entram no mercado, a cada prova, deveria ser irrelevante. Além disso, a quantidade de aprovados deveria ser diretamente proporcional ao número de inscritos. A OAB afirma que selecionar os advogados aptos é seu real objetivo e que não há reserva de mercado, muito menos lucro. Sendo assim, por que o número absoluto de aprovados se mantém? A prova ficou mais difícil? Se ficou, então estamos diante de um fenômeno raro, uma coincidência numérica espantosa. Será que a qualidade de ensino jurídico piorou tanto assim em 3 anos? A OAB nega, mas os números não mentem. Não se trata de uma simples observação estatística para se afirmar tal coisa. Doutro lado, os anos se passam e a OAB não oferece uma explicação satisfatória. Portanto, de qualquer ângulo que se olhe, o resultado será o mesmo, ou seja, a impressão de que medir a qualificação profissional não é e nunca foi o único objetivo do exame de ordem.

Com base nesses dados, pede-se licença para estimar o suposto valor arrecadado, sem demonstrá-lo com exatidão, por não se ter acesso ao processo licitatório, a margem real de lucro e a subtração das despesas (aluguel de salas, reprografia e fiscais). Assim temos:

2008.1 — 39.357 inscritos x R$ 200,00 = R$ 7.871.400,00

2008.2 — 39.732 inscritos x R$ 200,00 = R$ 7.946.400,00

2008.3 — 47.521 inscritos x R$ 200,00 = R$ 9.504.200,00

Total em 2008 = R$ 25.322.000,00

2009.1 — 58.761 inscritos x R$ 200,00 = 11.752.200,00

2009.2 — 70.094 inscritos x R$ 200,00 = 14.018.800,00

2009.3 — 83.524 inscritos x R$ 200,00 = 16.704.800,00

Total em 2009 = 42.475.800,00

2010.1 — 95.764 inscritos x R$ 200,00 = R$ 19.152.800,00

2010.2 — 106.041 inscritos x R$ 200,00 = R$ 21.208.200,00

2010.3 — 106.891 inscritos x R$ 200,00 = R$ 21.378.200,00

Total em 2010 = 61.739.200,00

IV Exame Unificado — 121.380 inscritos x R$ 200,00 = R$ 24.276.000

V Exame Unificado — 108.355 inscritos x R$ 200,00 = R$ 21.671.000,00

Parcial em 2011 = R$ 45.947.000,00

Se estes dados forem verossímeis, pode-se concluir que, de 2008 a 2011 (isto incluindo apenas os dois exames), a OAB Federal arrecadou apenas com o exame o montante de R$ 175.484.000,00 (cento e setenta e cinco milhões quatrocentos e oitenta e quatro mil reais). Isto sem falar que o Conselho Federal ainda absorve 20% do valor relativo à anuidade de cada advogado inscrito na seccional ou regional, sublinhando que este valor atualmente (2012) equivale, em média, a R$ 774,00 (setecentos e setenta e quatro) parcelado em onze vezes, e sem falar do estagiário, que paga R$ 85,00 (oitenta e cinco reais) pela inscrição e mais anuidade.

Sem querer fugir do tema, faz-se um adendo para acrescer que a OAB justifica o preço cobrado ao estagiário sob o pretexto de que aquele valor seria para custear as despesas com a confecção gráfica da carteira e boleto bancário. É no mínimo estranho, notadamente, quando realizamos um singela pesquisa no mercado livre (www.mercadolivre.com.br) e, ao colocarmos as expressões “carteirinha pvc” e clicarmos em buscar encontramos uma infinidade de gráficas no Brasil a fora que realizam o determinado serviço, pasmem, com valor de R$ 1,00 (um real) a R$ 8,00 (dezesseis reais), a unidade, dependendo da quantidade em que for solicitado.

Patente, portanto, que não há justificativa plausível pela cobrança do valor. No que refere ao boleto bancário, hoje qualquer impressora pode imprimir o boleto com código de barras.

Retornando ao assunto, uma tarifa única, nacional, de R$ 200,00 (duzentos reais), para a realização do Exame da Ordem inegavelmente é igual ou maior do que o valor de inscrição de concursos para promotor, delegado, procurador e magistrado, em alguns Estados, cuja remuneração, se aprovado, varia entre R$ 12.000,00 a R$ 21.000,00. A situação se agrava ao se saber que, ao ser aprovado na OAB e realizar sua inscrição, assume, o advogado, uma dívida anual de R$ 735,00 a R$ 935,00, dependendo da região. Isto apenas ratifica que se trata de legítima escola de cidadãos que podem pagar para exercer tal profissão, vantagem para classe mais dotada de recursos.

A questão do valor da tarifa de inscrição é tão polêmico, que está sendo alvo de uma Ação Civil Pública - ACP proposta pelo Ministério Público Federal na Justiça Federal da 1ª Região, sob o nº 0015055-77.2011.4.01.3803, com o objetivo de ser declarada a inconstitucionalidade do valor cobrado para a realização dos exames da Ordem dos Advogados do Brasil – OAB, e a política praticada para isenção da referida taxa, lastreada no Decreto nº 6.593, de 02 de outubro de 2008.

 Saliente-se que a naquela referida ACP, o MPF requereu antecipação de tutela, objetivando que o Conselho Federal da OAB se abstenha de cobrar qualquer valor a título de inscrição nos exames de Ordem, e, em não sendo acolhido tal pedido, requereu que o valor cobrado seja o estritamente necessário a cobrir as despesas de realização e aplicação dos certames.

b)                 Os poderes de avaliação e fiscalização exercidos pelo MEC que excluem a exigência de uma nova prova para aferição de qualiicação profissional

A segunda parte do Art. 5º inciso XIII da Constituição Federal dispõe que a função de qualificar para o trabalho compete às instituições de ensino e que a avaliação e a fiscalização do ensino competem ao Estado, e não, evidentemente, à OAB. De acordo com o art. 205 da Constituição Federal, a educação tem como uma de suas finalidades a qualificação para o trabalho. O ensino é livre à iniciativa privada e cabe ao Poder Público a autorização para a abertura e o funcionamento dos cursos e a avaliação de sua qualidade.

Ademais, de acordo com a Lei no 10.861/04 - que instituiu o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior ­ SINAES, o estudante que não prestar o Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (ENADE) não obterá o diploma de conclusão do nível superior, consoante dispõe o Art. 5, § 5º:

O ENADE é componente curricular obrigatório dos cursos de graduação, sendo inscrita no histórico escolar do estudante somente a sua situação regular com relação a essa obrigação, atestada pela sua efetiva participação ou, quando for o caso, dispensa oficial pelo Ministério da Educação, na forma estabelecida em regulamento.

Nestes termos, também há inúmeros posicionamentos da Corte cidadã (STJ) sobre o tema, visto ser alvo constante de impetração de Mandado de Segurança, senão vejamos:

ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. ENADE. OBRIGATORIEDADE.

1. O concluinte do curso superior, quando convocado para prestar o exame nacional de desempenho, não pode deixar de comparecer.

2. Exame que é regulamentado por lei.

3. Ciência da data e do local onde o exame seria realizado comprovada.

4. Obrigatoriedade de prestar o exame para receber a colação de grau. Exigência apoiada na Lei n. 10.861, de 2004, regulamentada pela Portaria MEC 2.051/04 e Portaria n. 603 de 07.03.2006.

5. Inexistência de direito líquido e certo a proteger. Mandado de segurança denegado.(MS 13082 / DF. Relator Ministro JOSÉ DELGADO. Data de julgamento: 28/05/2008)

No dia 26.01.2010, o Superior Tribunal de Justiça manteve a decisão que impede a colação de grau de formandos que não realizarem o Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (ENADE). Uma estudante impetrou mandado de segurança contra ato do Ministro da Educação e o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep). O Presidente do STJ, Ministro Cesar Asfor Rocha, negou o pedido de liminar em mandado de segurança, mesmo tendo sido justificada a ausência por motivos de saúde ou doença. O mérito ainda será julgado no âmbito da 1ª Seção do STJ, especializada em Direito Administrativo e outras matérias de Direito Público, tendo como relatora a Ministra Denise Arruda[22].

Assim, está cabalmente provado que o estudante dos cursos jurídicos é qualificado para o exercício da advocacia e tem essa qualificação certificada, de acordo com a legislação vigente, pelo reitor de cada universidade, através de um diploma. Nenhuma outra instituição tem competência para qualificar os bacharéis ao exercício de suas profissões, nem mesmo a Ordem dos Advogados do Brasil. Por expressa delegação do Estado brasileiro (art. 207 da Constituição Federal de 1.988 e Lei 9.394/96, art. 53, VI), somente os cursos jurídicos detêm a prerrogativa legal de outorgar ao aluno o diploma de Bacharel em Direito, que certifica a sua qualificação para o exercício da advocacia.

O raciocínio para entender a questão é simples: A OAB não tem poderes para invalidar o diploma de bacharel em Direito, mas impede o exercício da advocacia para quem não faz parte de sua Ordem.

Seria interessante que a avaliação do exercício profissional pudesse ocorrer através do exame do ENADE, mas nunca da entidade de fiscalização do exercício profissional.

c)                  O descabimento da exigência do Exame da Ordem para aprovados em concursos públicos para cargos da advocacia pública

Estipular como requisito ao registro junto a OAB a aprovação no Exame de Ordem é fato que vai de encontro a inúmeros princípios constitucionais e traz consigo, nas entrelinhas, a sensação de favoritismo e o privilégio em contribuir para o enriquecimento de entidade de classe representativa.

Por essas razões entende-se ser descabido, desarrazoado, imoral e ilegal a exigir prévio exame de ordem para registro junto a Ordem dos Advogados do Brasil, particularmente, quando se referir aos cargos de Advogado da União, Procurador do Estado, Procurador da Fazenda Nacional e das Procuradorias e Consultorias Jurídicas dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e de suas respectivas entidades de administração indireta e fundacional.

Destaque, que o art. 29 do Estatuto da Ordem prevê determinada liberdade apenas para aqueles que exercem cargo de dirigente de órgãos jurídicos ou o titular de cada pasta: Procurador-Geral, Advogado-Geral, Defensor-Geral.

Independente do cargo, seria de bom alvitre que se o profissional conseguiu êxito na prova preenchendo todos os requisitos do edital para determinado concurso público, não é o fato de ele possuir ou não OAB que vai determinar se é ou não um bom profissional a exercer determinado cargo. Sublinha-se que para estes concursos, em regra, são três etapas a serem superadas: prova objetiva, prova discursiva e prova oral.

Nesse sentido, a Constituição Federal de 1988 prescreve em seu art. 37, inciso II, que o acesso em cargos ou empregos públicos, depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego na forma prevista em lei, sendo isto exigido da Administração Direta e Indireta.

Logo, este argumento demonstra, com clareza, que nos concursos públicos para advocacia pública, o registro de inscrição na Ordem dos Advogados do Brasil, condicionada à aprovação no exame da ordem, não parece harmonizar-se com o texto constitucional, reforçando a ideia de uma reservada de mercado.

Dessa forma, torna despiciendo a utilização da OAB, bastando simplesmente à indicação, nos documentos por estes produzidos, da matrícula e cargo que ocupa na instituição. 


CONCLUSÕES

Com o advento da decisão adotada pelo Supremo Federal, tem-se que o Exame de Ordem é reconhecidamente constitucional e não fere o art. 5º inciso XIII. O Recurso Extraordinário examinado teve repercussão geral reconhecida, com isso a decisão nesse processo será aplicada a todos os demais recursos extraordinários que cheguem ao STF com pedido idêntico, o que não quer dizer o esgotamento do assunto. Com efeito, os juízes de primeiro grau e os tribunais ainda podem decidir diferentemente, pois, em regra, o efeito da decisão no Recurso Extraordinário só vale entre as partes no processo.

Mas não é só. Conforme advertiu o eminente Ministro Luiz Fux, há um processo de inconstitucionalização que pauta o Exame da Ordem, uma vez que vários vícios foram detectados, não na exigência em si do exame, mas, justamente, no modo e forma como este vem se efetivando.

Assim, o exame da OAB deve possibilitar, portanto, participação de outros entes do meio jurídico em sua realização, de modo a proporcionar equidade, imparcialidade e lisura aos atos envolvendo aquele certame, em respeito à democracia, pois, se a OAB participa dos concursos públicos dos membros do Poder Judiciário e do Ministério Público estes também devem participar do Exame de Ordem, de modo a legitimá-lo.

Os dados comprovam que a avaliação imposta pelo Conselho Federal, sem parâmetros adequados cria uma reserva de mercado, diagnosticando um abuso na lucratividade[23] decorrente das receitas arrecadas dos estudantes e bacharéis[24].

Entende-se, bem por isso, que o exame final como fator necessário para aferir a graduação, para ser uma ferramenta “legal” capaz de filtrar os bons dos maus, deve ser isento de qualquer suspeita, o que sugere, também, sua gratuidade.

Ademais, o tema ora em apreço não pode ser considerado como uma página virada, até porque a Suprema Corte não enfrentou todas as questões que envolvem o assunto tampouco se aprofundou em todos os aspectos constitucionais, prova disso é que existe em andamento a ADI nº 3613, questionado, em sede de controle abstrato, a constitucionalidade do art. 8º inciso IV da Lei nº 8906/94, que exige o exame de ordem, e esta ação não foi julgada concomitantemente com o RE nº 603583, que criou precedente em favor da OAB. Esta situação aponta para a possibilidade de alteração do entendimento do STF sobre o tema, com base em outros fundamentos, já que o desfecho do exame, pelo STF, no controle concentrado é amplo não havendo limites aos fundamentos deduzidos na petição inicial, inclusive oportuniza acesso mais fácil ao amicus curie.

Inclui ao rol da inconstitucionalidade uma gigantesca árvore de Projetos de Leis alguns já votados e outros por votar, que tramitam na Câmara dos Deputados contra o Exame de Ordem, o próximo da vez é o PL 2154/2011 defendido pelo Deputado Federal Eduardo Cunha. Ganha destaque o Relatório e o Parecer Substitutivo da Comissão de Constituição e Justiça sobre o PL 5.504/2005 o qual pugna pela extinção sumária do Exame da OAB (de autoria do Deputado Pastor Marco Feliciano), fato que deve toda a sociedade acompanhar e reivindicar pela sua aprovação como exercício de sua cidadania plenamente reconhecida em um estado democrático de direito.

Outro aspecto conexo com o tema da constitucionalidade da exigência do Exame de Ordem, e não abordado pelo STF, está na definição da natureza jurídica da OAB, que não pode ser considerada um super Conselho, com natureza, ora pública, ora privada. A OAB, como os demais Conselhos de Fiscalização do exercício da profissão, rendem respeito aos princípios que norteiam a Administração Pública, insculpidos no art. 37 e seguintes da Constituição Federal, já que são consideradas “autarquias especiais”.

Nessa perspectiva, a OAB deve prestar contas ao TCU não só das anuidades, que tem natureza tributária e por isso são obrigatórias. Mas de outras arrecadações como é a vultosa receita relativa às taxas de inscrição do Exame de Ordem. A destinação de tais recursos, evidentemente, não pode ser afetada à construção de clubes e sedes sociais da entidade, mas direcionadas ao fim da instituição, que é a melhoria da qualificação profissional.

A ausência de transparência (publicidade) quanto à destinação real dos recursos é um dos “calcanhares de Aquiles” em desfavor do Exame e do próprio Conselho Federal configura estado flagrante desrespeito à Lei nº 12.527, de 18 de novembro de 2011 (Lei de Acesso à Informação), isso, sem falar que é o único Conselho que não realiza concursos públicos para seus quadros (administrativos, técnicos e jurídicos) e obriga, por outro lado, filiação para se estagiar.

Os Exames antigos eram compostos, em regra, de questões objetivas, consulta à doutrina e jurisprudência.  Hodiernamente, são duas fases sendo que a segunda permite apenas o auxílio da lei seca e, no critério de correção, se vê excesso de falhas provocando a tutela jurisdicional para resolver a celeuma.

Na verdade o papel da Ordem dos Advogados do Brasil não pode mais ser interpretado com velhas classificações[25] ou sob o pretexto de servir como um filtro. Entende-se que os Centros Universitários não devem se submeter a regras criadas pelos Conselhos de Classe, uma vez que o texto constitucional (inciso XXIV do art. 22) traz a educação nacional como matéria de competência privativa à União ou “concorrente com os Estados e Distrito Federal” conforme inciso IX do art. 24. Noutro lado, o inciso XX do art. 5º cumulado com o art. 7º inciso V da Carta Magna desobriga qualquer pessoa a filiar-se salvo voluntariamente. Ademais, estes vêm criando novas regras exclusivas de concursos de grande complexidade (magistratura, procurador, promotor), impedindo, com isto, o exercício profissional (art. 5º inciso XIII) do recém-formado, constituindo flagrante abuso de poder (art. 3º, alíneas “f” e “j” da Lei nº 4898/65), desqualificando, com isto, sobremaneira, a autonomia didático-cientifica dos cursos superiores (art. 207 – CF/88). Como se vê, tudo, no arrepio da lei (inciso II, art. 5º - CF).

Contribui com a reflexão o comentário exarado pelo atual Presidente do Conselho Federal, Ophir Cavalcante, que entrevista à rádio CBN, realizada no dia 21/12/2010, declarou que está em estudo proposta de aplicar a prova de tempos em tempos, ou seja, que o candidato refaça o exame a cada 5 ou 6 anos, sob a justificativa de aprimorar a qualidade dos profissionais que estão no mercado e equilibrar o nível com os Magistrados e Promotores. Seria isso uma verdade ou visa-se ampliar a lucratividade? Não se pode esquecer que essas carreiras, a quem se busca espelhar, possuem um número restrito de vagas e exigem um profundo saber do candidato, a avaliação consiste em três ou quatro fases, incluindo estudo de vida pregressa e psicológica, o rigor é tamanho que raramente as vagas são preenchidas em sua totalidade. Já o Exame de Ordem, pelo o que se sabe, não existe reserva de mercado e a avaliação, em tese, se diz ser de conhecimentos mínimos. Malgrado cria-se uma comparação desproporcional ao ponto de levantar, no contexto prático, outras indagações: Seria o Exame apto a avaliar o conhecimento técnico do recém-formado ou está a exigir conhecimentos práticos que só são absorvidos daqueles profissionais que militam na atividade com dez anos de carreira?[26]

Sob este viés, seria de bom alvitre orientar a aplicação da prova também aos antigos advogados, inclusive aos membros titulares do Conselho, para ver se estão aptos a exigir tamanha qualidade.

Nessa mesma entrevista o Presidente da OAB ao ser questionado sobre o valor da tarifa cobrada de R$ 200,00 (duzentos reais) chegou a desmerecer e fazer pouco caso dos certificados emitidos pelas Instituições Privadas reconhecidas pelo MEC, como se eles não tivessem nenhuma utilidade. Veja a entrevista disponível no site daquele Conselho[27]:

Carlos Alberto Sardenberg - Para concluir, sobre o Exame de Ordem: R$ 200 é o valor cobrado dos alunos que vão fazer o Exame de Ordem. O pessoal diz que é caro...

Ophir Cavalcante - Você acha? É caro pagar R$ 1.200,00 em mensalidade por uma faculdade privada para sair com um diploma de Direito que, muitas vezes, não vale nada? Um concurso para juiz ou membros do ministério Público é de R$ 150,00 a R$ 170,00, isso feito só nas capitais. A Ordem realiza o seu Exame em mais de 150 municípios do Brasil. É uma estrutura gigantesca, isso sem um centavo de incentivo do poder público. Desde à empresa contratada, até toda a estrutura de apoio é por conta daquilo que se cobra para realizar o exame de Ordem. Infelizmente, não temos condições ou recursos para suportar ou subsidiar isso, que não é, efetivamente, um dever da Ordem para aqueles que ainda vão ingressar nos seus quadros.

Como se vê a pergunta é capciosa e coloca a OAB numa situação delicada. Todavia, o entrevistado tenta justificar o injustificável. Dos dados inseridos neste singelo trabalho e do lucro presumido uma pergunta não quer calar: será que assiste razão aos argumentos de que o Conselho Federal não dispõe de recursos?

A OAB precisa ser parceiro dos bacharéis de direito ao invés de algoz; ela quer ser a dona do mundo, com poderes acima de suas prerrogativas constitucionais. Quer participar de tudo, opinando e intervindo diretamente até nas investigações criminais (papel do Parquet, notadamente, nos casos de grande comoção popular). A avaliação dos cursos universitários é papel constitucional do MEC. O Conselho Federal deve se limitar a cumprir a sua missão institucional, valendo pela ética e prerrogativas de seus inscritos; tem de parar querer levar vantagem em tudo e, aliás, dar transparências dos recursos arrecadados bem como de onde estão sendo investidos, prestando contas pois, arrecada uma grande quantia da parcela da sociedade podendo este recurso ser considerado como público, logo, cabível, também a previsão do art. 70 da CF.

Se a prova aplicada pela OAB é constitucional, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional deveria ser julgada inconstitucional. Sob este viés, desnecessário seria o curso superior, basta ser aprovado no Exame (proficiência) para exercer qualquer carreira profissional. Assim, estamos próximos do fim da graduação superior ou ela está em plena mutação. Termina-se as faculdades e abrem-se os cursinhos preparatórios de profissionalização, particularmente o ensino à distância (que vem em ritmo acelerado de expansão) posto que, nos dizeres do Conselho Federal, os profissionais que ministram aulas presenciais são inábeis para o ofício[28].

Do contexto, se o imbróglio envolvendo a formalização do Exame não for adequadamente adaptado às grades e currículos acadêmicos está longe de ser um instrumento seguro e eficaz ao seu propósito. Outrossim, incumbe às esferas do poder público definir qual é o instrumento hábil de capacitação técnica profissional: diploma ou avaliação de proficiência. Essas imprecisas indefinições ferem de morte a segurança jurídica e indicam, seja de longo ou de curto prazo, a inconstitucionalidade do certame. Abstrai a possibilidade de interpor mandado de segurança para proteger direito líquido e certo[29].

De qualquer forma, apenas o Legislativo detém o poder de dizer o que é, ou não, legal[30].

Como verdade tem-se que o objeto do tema proposto cabe uma profunda reflexão e discussão, principalmente a partir de construções e conceitos que envolvem, lato sensu, o assunto. Logo, a discussão está longe de ser superada e caminha para uma inadiável alteração.

Por fim e diante desse conjunto de ideias postas e com amparo mais uma vez no Recurso Extraordinário interposto, convém refletir se estaria correto o pensamento de nosso saudoso patrono, Rui Barbosa, quando diz:   “(...) demonstrada a aptidão profissional, mediante a expedição do título, que, segundo a lei, certifica a existência dessa aptidão, começa constitucionalmente o domínio da liberdade profissional[31]


REFERÊNCIAS

Constituição Federal da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro de 1988.

Código Civil (Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002).

CORBUCCI, Paulo. O ensino superior na décade de 90. Disponível em: http://www.ipea.gov.br/sites/000/2/publicacoes/bpsociais/bps_02/ensiao2_ensino.pdf

Dicionário jurídico Piragibe, 9ª ed., 2007. Lumen Júris.

Enciclopédia eletrônica Wikipédia. Disponível em: www.wikipedia.org.br

GALDINO, Flávio Antônio Esteves. A ordem dos Advogados do Brasil na Reforma do Ensino Jurídico. Ensino Jurídico OAB 170 anos de cursos jurídicos no Brasil, Brasília: Conselho Federal da OAB, 1997. p.155 -186

JULIASSE, Leovigildo Novidades. Mudanças sociais e a evolução do Direito. Disponível em: http://leoiuris.blogspot.com.br/2007/09/mudanas-sociais-e-evoluo-do-direito.html Publicado: Terça-feira, Setembro 11, 2007

ASSIS, Maurício Gieseler de. Revista Consultor Jurídico, 26 de março de 2012. Título: “O Exame de Ordem começa a encontrar seu caminho”. Disponível em: www.conjur.br/2012-mar-26/exame-ordem-comeca-enconcontrar-bom-caminho.

Resolução CNE/CES nº 2/2007 do Ministério da Educação – MEC. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/2007/rces002_07.pdf. Acesso em: 05/05/2012.

Portal Aprendiz: Brasil alcançará atual índice chileno de jovens no ensino superior apenas em 2022. Publicado em: 24/02/10. Disponível em: http://aprendiz.uol.com.br/content/drislepoci.mmp

SCHWARTZAN, Simon Brasil: Oportunidade e Crise no Ensino Superior. Título original “Brazil: opportunity and Crisis in Higher Education”, Higher Education 17, 1, 1988. Disponível em: http://www.schwartzman.org.br/simon/pdf/oportun.pdf


Notas

[1] JULIASSE, Leovigildo Novidades. É Advogado, formado em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade Católica de Moçambique. Disponível em: http://leoiuris.blogspot.com.br/2007/09/mudanas-sociais-e-evoluo-do-direito.html

[2] Art. 17 – Fica criada a Ordem dos Advogados Brasileiros, órgão de disciplina e seleção da classe dos advogados, que se regerá pelos estatutos que forem votados pelo Instituto da Ordem dos Advogados Brasileiros, com a colaboração dos Institutos dos Estados, e aprovados pelo Governo (Decreto nº 19.408/30).

[3] Conselho Federal da Ordem – História. Disponível em: http://pt.wikipedia.org/wiki/Ordem_dos_Advogados_do_Brasil

[4] Art. 53. Constituem-se as associações pela união de pessoas que se organizem para fins não econômicos.

[5] Classificação Brasileira de Ocupações. Listagem das profissões regulamentadas e normas regulamentadoras. Disponível em: http://www.mtecbo.gov.br/cbosite/pages/regulamentacao.jsf;jsessionid=C554C9EC3AA58E9D9047C6DEE1D01C96.lbroutev121p05

[6] Segundo o dicionário jurídico este verbete possui o seguinte significado: “Praxe forense, regras de estilo, costumes do foro”. Piragibe, 9ª ed., 2007. Lumen Juris, p. 1251.

[7] Atente-se que não estamos a falar de investidura, pois essa é uma modalidade restrita aos cargos efetivos de servidores públicos que ocorre com a posse conforme art. 7º da 8.112/90.

[8] Art. 18. Compete ao Conselho Federal: VIII - regular e disciplinar, em provimentos especiais:    a) o programa e processo de comprovação do exercício e resultado do estágio da advocacia (art. 48, inciso III);    b) o programa e a realização do Exame de Ordem (art. 52);

[9] A Resolução CNE/CES nº 2/2007 dispõe sobre a carga horária mínima e procedimentos relativos à integralização e duração dos cursos de graduação, bacharelados na modalidade presencial, estabelecendo que para o curso o direito é exigido a carga mínima de 3.700 horas. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/2007/rces002_07.pdf. Acesso em: 05/05/2012.

[10] Brasil: Oportunidade e Crise no Ensino Superior. Simon Schwartzan. Título original “Brazil: opportunity and Crisis in Higher Education”, Higher Education 17, 1, 1988. Disponível em: http://www.schwartzman.org.br/simon/pdf/oportun.pdf

[11] Sociólogo brasileiro. Membro Titular da Academia Brasileira de Ciências Foi presidente do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) entre 1994 e 1998. Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Simon_Schwartzman

[12] GALDINO, Flávio Antônio Esteves. A ordem dos Advogados do Brasil na Reforma do Ensino Jurídico. Ensino Jurídico OAB 170 anos de cursos jurídicos no Brasil, Brasília: Conselho Federal da OAB, 1997. p.155 -186

[13] Numa população de 180 milhões de brasileiros pode-se concluir que “De acordo com o Censo escolar do MEC, havia, em 1996, cerca de 5,3 milhões de alunos, na faixa etária de 18 a 24 anos, matriculados em outros níveis de ensino que não o superior ”. Texto: O ensino superior na décade de 90. Paulo Corbucci. Disponível em: http://www.ipea.gov.br/sites/000/2/publicacoes/bpsociais/bps_02/ensiao2_ensino.pdf

[14] O fundamento legal do Recurso Extraordinário se encontra na Constituição Federal. O art. 102, III, a, b, c e d estabelece as hipóteses de cabimento do recurso. Ele é julgado pelo STF, que possui duas turmas com cinco ministros cada e tem a missão de uniformizar questões constitucionais, resguardar a hegemonia e a autoridade da Constituição. Uma das características do Recurso Extraordinário é a necessidade do préquestionamento, que consiste na hipótese de que a questão constitucional tenha sido apreciada pelo acórdão atacado.

[15] Discorre, noutra oportunidade, que: “Ressalta-se, ainda, que a própria lei que dispõe sobre o Estatuto da OAB (8.906/94) prevê quais são sanções disciplinares para o Advogado, ou seja, já existem mecanismos legais, inclusive, excluir o Advogado inapto (...), respeitando, é claro o devido processo legal (...)”

[16] Inclusive destaca em sua argumentação, “O fato é que a expedição do da Carteira Profissional é ato vinculado: se o universitário cumpre com suas obrigações estudantis, integraliza os créditos curriculares exigidos, comparece a solenidade de colação de grau e recebe  o Certificado e, posteriormente, o Diploma, tem a ré a OBRIGAÇÃO de fornecer-lhe a Carteira Profissional”,  conforme fls. 06

[17] Com o advento da repercussão geral da questão constitucional (§ 3º do art. 102 da CF, introduzido pela EC 45/2004), abre-se nova perspectiva para o recurso extraordinário, a partir da reafirmação do papel do Supremo Tribunal Federal como Corte Constitucional e da compreensão ampliada dos escopos político e social do processo (para além da tutela do interesse privado). A repercussão geral surge como novo requisito de admissibilidade do recurso extraordinário, que impõe repensar as demais regras de cabimento desse recurso. Em particular, defende-se que a instituição da repercussão geral representa o fim do prequestionamento.

[18] Segundo o autor: “O Exame de Ordem atenta, finalmente, contra o princípio constitucional do direito à vida, porque esse direito não se refere, apenas, à possibilidade de continuar vivo, mas também à necessidade de prover a própria subsistência, através do exercício de sua profissão, para a qual o bacharel se qualificou, durante cinco anos, em um curso superior, autorizado, fiscalizado e avaliado pelo Estado. Assim, o Exame de Ordem, ao atentar contra a liberdade de exercício profissional, atenta, também, contra o próprio direito à vida, do bacharel em Direito”.

[19] STF – Supremo Tribunal Federal -, na ADIN - Ação Direta de Inconstitucionalidade - nº 3.026/DF, decidiu que é uma exceção, configurando como entidade "ímpar", "sui generis", sendo um serviço público independente, sem enquadramento nas categorias existentes em nosso ordenamento, muito menos integrante da Administração Indireta ou Descentralizada. Na decisão do Ministro Eros Grau, verifica-se que a OAB, sob a visão do STF é uma entidade independente, cuja função é institucional de natureza constitucional. Em virtude de tal classificação, a OAB não se compara às demais autarquias profissionais, possuindo suas próprias regras.

[20] ASSIS, Maurício Gieseler de. Advogado, pós graduando em Direito do Trabalho e editor do blog Exame de Ordem. Revista Consultor Jurídico, 26 de março de 2012. Título: “O Exame de Ordem começa a encontrar seu caminho”. Disponível em: www.conjur.br/2012-mar-26/exame-ordem-comeca-enconcontrar-bom-caminho.

[21] CAVALCANTI, Ophir. In “OAB divulga lista final dos aprovados no Exame de Ordem”. Disponível em: http://www.tribunauniao.com.br/?p=vernoticia&id=20999&OAB%20divulga%20lista%20final%20dos%20aprovados%20no%20Exame%20de%20Ordem

[22] Fonte STJ. MS 14963 REGISTRO: 2010/0008137-7

[23] Resta clarividente que o Exame não tem o propósito de avaliar, ao revés, vem a criar uma reserva de mercado notadamente ao se impor uma tarifa de R$ 200 (duzentos reais) que multiplicada pelo número de candidatos se transforma em centenas de milhões, estes que são anualmente triplicados, porém, desconhece a sua destinação e aplicação.

[24] O Exame de Ordem, não por acaso, foi ampliado, para permitir que estudantes já do 8º (oitavo) semestre (ou último ano) possam realizá-lo e, aprovados, tenham direito à inscrição tão logo obtenham o diploma.

[25] Sem esquecer que no passado prestou relevantes serviços quando da redemocratização do nosso país. O que não quer dizer que tal fator servirá como uma chave mestre capaz de abrir eternamente todas as portas.

[26] Se para ingressar no mercado de trabalho a faculdade é o pontapé inicial não seria plausível muito menos aceitável querer cobrar do bacharel em Direito conhecimento tão profundo ou atual que só são aprendidos na prática, tais como decisões jurisprudências proferidas pelos tribunais superiores. No máximo, seria razoável abordar o contido na legislação, evitando pegadinhas ou casos hipotéticos que causem confusão. Lembre-se, que idéia é avaliar o conhecimento absorvido na faculdade (positivismo) e não trilhar pelo critério subjetivista (interpretação) que se revela exorbitante e discrepante, por inviabilizar o livre exercício da profissão.

[27] Disponível em: http://www.oab.org.br/noticia/21150/ophir-classifica-o-exame-de-ordem-como-instrumento-de-defesa-da-sociedade

[28] OAB lançou em novembro/2011 o Selo de Qualidade que segundo o atual Presidente “... a lista das faculdades de Direito que apresentam índices satisfatórios de qualidade do ensino ... diante da inércia governamental e da falta de compromisso do Ministério da Educação com o ensino superior, a entidade se julgou no dever de indicar quais são as instituições que apresentam índices de ensino em Direito mais satisfatórios no país". Todavia, esquece que os profissionais que atuam no ensino superior são: Delegados, Promotores, Juízes, Procuradores Federais, Advogados entre outros, todos, do ramo jurídico. Destarte, é difícil entender que o problema esteja nas instituições de ensino.

[29] A Constituição protege a liberdade de trabalhar e o exercício de profissão. Malgrado a LDBE impõe como instrumento de identificação da qualificação o diploma (art. 43, inciso II).

[30] Como uma pedra que lhe empurra para o fundo há o discurso do Presidente da OAB, na posse do Ministro Carlos Ayres Brito no STF, proclamando: “O Congresso tornou-se um pântano”. Para melhor visualização da oratória, vejamos o trecho em que se ataca o parlamento:

“(...)

Antes que sejam ligados os holofotes, precisamos refletir – e refletir seriamente – sobre dado inegável: na origem de todos os grandes escândalos está o modelo de financiamento privado das campanhas políticas, que permite o “caixa dois”, ou, em outras palavras, a relação promíscua entre o interesse privado e a coisa pública. É sempre assim.

E o resultado é que a cada eleição, se de um lado tomam posse os eleitos, nas sombras, outro poder se instala, apropriando-se dos negócios públicos e dando as cartas no jogo. E manda tanto que quando cai arrasta, junto a si, numa grande cascata, bicheiros, contraventores, falsificadores, arapongas, policiais, governadores, parlamentares, servidores, empresários, projetos, obras e, também, a própria credibilidade nas instituições. Este, sim, nos parece o verdadeiro apocalipse.

O Congresso Nacional, o Parlamento em todos os níveis, tornou-se, para usar uma expressão de Monteiro Lobato, um pântano, onde muito se discute, mas nada é feito de concreto para melhorar o ambiente, que continua sendo um pântano. Com honrosas exceções, é claro, o Parlamento tem servidor de balcão de negócio para muitos políticos, contribuindo para desgastar ainda mais a imagem das instituições” (...).

[31] Comentários, Homero Pires, v. 6, p. 40


Abstract: One of the issues that cause vigorous debate in the legal environment is a discussion on the constitutionality of the requirement for examination of Order as a necessary requirement for the practice of law. On the one hand there is the expansion of the number of colleges. On the other, profitability and lack of effective supervision and control. The two converge in the high rate of failures and the incessant crisis in the Brazilian legal system causing a rethinking of legal ethics. For several years the Supreme Court sought to evade facing the issue, leaving the courts so they could decide the issue in a manner best aprouvessem them. On October 26, 2011, the Higher Court concluded, in place of extraordinary appeal with unanimous vote, the constitutionality of the Examination, stressing, however, that there are points which if not corrected can lead to the unconstitutionality of the event. However, the judgment of the Supreme Court has not faced all the arguments to the detriment of the exam. The pretense of work, in fact, is to emphasize and highlight the critical issues surrounding the legality of the Examination Order as a mandatory requirement and essential to professional practice as a lawyer, invited in due course the reader to rethink about the methodology currently in effect and indicative of possible future steps that are intended to be adopted by the Federal Council of OAB and, in particular, aims at stimulating the Bachelor of Righ not never forget to fight for their ideals.


Autor

  • Clinston Antonio Fernandes Caixeta

    Bacharel em Direito. Possui 16 anos de experiência no serviço público federal, atuou em diversos setores (Licitações, Contratos, Convênios, Corregedoria), tanto na Administração Direta (Ministério do Trabalho, Ministério da Saúde, Ministério Público do Trabalho e Secretaria de Desenvolvimento Social do GDF), como na Administração Indireta (Funasa, Dnit).

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CAIXETA, Clinston Antonio Fernandes. Reflexões sobre a decisão do STF a respeito da constitucionalidade do exame de ordem. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3331, 14 ago. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/22410. Acesso em: 24 abr. 2024.