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A responsabilidade penal por danos ao meio ambiente

A responsabilidade penal por danos ao meio ambiente

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INTRODUÇÃO

A preocupação no âmbito jurídico penal pelo problema da proteção do meio ambiente, é recente. Foi a partir da década de 70, basicamente, que inúmeros países deixaram a crença no progresso ilimitado da ciência que impulsionou a ideologia positivista no século XIX até os dias atuais, cedendo à preocupação pelas conseqüências trazidas pelo progresso técnico e industrial.

A proteção do meio ambiente constitui um problema fundamental no mundo contemporâneo. A humanidade, orgulhosa de suas conquistas científicas e técnicas, do desenvolvimento da cultura e educação, encontra-se ante a ameaça de sua autodestruição. Surge a necessidade de se tomar medidas enérgicas para proteger a vida e sua qualidade contra aquele que a ameaça, resolvendo o eventual conflito entre desenvolvimento econômico e proteção do meio ambiente.

A nova relação que se estabeleceu entre o homem e a natureza, baseada no mútuo respeito e na mútua dependência, com a predominância do interesse coletivo sobre o individual, induziu a uma nova postura da sociedade para o meio ambiente, que requer um novo enfoque dos problemas existentes e uma adequação da ordem jurídica para as suas soluções, levando em consideração os novos valores emergentes e a responsabilidade comum de sua defesa.

A Constituição Federal de 1988, com a ampla tutela que faz do meio ambiente e a declaração de seus princípios fundamentais no art. 225, após reconhecer o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado como "bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações", frisa, no seu § 1º,II, a necessidade de preservar a integridade do patrimônio genético do país, proteger a fauna e a flora, fazendo ainda uma declaração de domínio no § 4º: "a Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o Pantanal Mato-grossense e a Zona Costeira são patrimônio nacional e sua utilização far-se-á na forma da lei, dentro das condições que assegurem a preservação do meio ambiente, inclusive quanto aos seus recursos naturais".

Para isso, também se espera que o direito penal contribua, como parte integrante da ordem jurídica, e como recurso extremo na proteção dos valores fundamentais da sociedade, através das sanções que lhe são próprias, sendo a violação dos mesmos intolerável, e inevitável de outra forma. Funcionará então o Direito penal como recurso necessário de defesa social, garantidor da coexistência pacífica entre os membros da coletividade, e instrumento de uma política que atenda aos anseios sociais sem descurar os do desenvolvimento econômico e as necessidades básicas da população.

Ressalta-se, então, a necessidade de realizar a compatibilização da Política criminal com as diretrizes da Política ambiental, dotando-se a legislação penal de instrumentos e normas adequadas à proteção dos valores ambientais, refazendo a tipologia, redimensionando as pena e forjando um sistema que, além de apropriado às finalidades visadas, possa atender melhor aos anseios e às exigências da nova ordem social, que pretende a harmonização dos interesses da comunidade com a necessidade de preservar a natureza, no interesse das gerações vindouras.

A maior parte da doutrina que admite a intervenção penal em matéria ambienta, matiza a postura ressaltando o critério de ultima ratio do direito penal. De nada serviria o direito penal se previamente não existe uma programação por parte da Administração pública de todas as atividades que podem supor um perigo para o meio ambiente, programação que deve vir acompanhada de uma tutela sancionadora extrapenal cronologicamente prévia à propriamente penal.

São as normas não penais as que devem assumir o papel primário através da programação de uma política preventiva e de um sistema sancionador no penal, reservando-se a sanção penal para os atentados mais graves ao meio ambiente. Somente assim se evitará o perigo de cair no defeito político criminal de ir até o direito penal criminalizando simbolicamente uma conduta ou um conjunto de condutas sem que tão aparentemente definitiva o tal solução tenha logo eficácia.

O meio ambiente é bem merecedor de tutela penal, já que se trata de um bem jurídico de especial transcendência cuja proteção resulta essencial para a própria existência do ser humano e em geral, da vida, e que se encontra seriamente ameaçado, pelo que sua conservação e manutenção justificam claramente o recurso às mais contundentes medidas de proteção que pode proporcionar o ordenamento jurídico.

Com tais premissas é que o presente trabalho objetiva realizar uma breve análise da nova Lei de proteção ambiental (Lei 9.605/98) que traz que regula tanto as sanções administrativas como as penais derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente.

Os aspectos mais importantes de discussão doutrinária sobre o tema crimes ambientais, relacionam-se à identificação do bem jurídico protegido, a real necessidade de uma intervenção penal nos problemas ecológicos, as novas técnicas legislativas adotadas (lei penal em branco), a autonomia das sanções de ordem administrativa em relação às de índole penal, a possibilidade de se responsabilizar pessoas jurídicas e a aplicação das penas alternativas.

O objetivo desse trabalho será, num primeiro momento, abordar brevemente essas questões, sem a pretensão de solucionar tais problemáticas, mas apenas de incitar o leitor ao indispensável debate. Posteriormente, serão tratados, de maneira mais detida, alguns dos tipos penais trazidos pela nova lei, numa abordagem que levará em consideração a análise doutrinária e jurisprudencial, no intuito de poder identificar o perfil da Lei 9.605/98.

Para a realização desses objetivos, a ciência do Direito Penal deverá ser visualizada sob uma perspectiva metodológica funcional-teleológica. Segundo o sistema teleológico funcional: o Direito Penal deve estar orientado para a função que ele deve cumprir no meio social. Ele deve ser perspectivado, particularmente no que se refere aos seus elementos, a partir da função que lhe incumbe ao direito penal, qual seja, a proteção indispensável de bens jurídicos essenciais.


1. Da necessidade da tutela penal do meio ambiente

1. 1 A intervenção penal em problemas ambientais

O Direito Penal adequado ao Estado Democrático de Direito figura como um Direito Penal de mínima intervenção, em que este só atuará a fim de proteger os bens jurídicos fundamentais da sociedade; esta afirmação justifica-se em virtude da pesada carga punitiva do Direito Penal que sufocaria a convivência social se não fosse limitada a sua intervenção. No fundo desta concepção do controle social penal está a dignidade da pessoa humana, como centro da organização estatal. Há nessa concepção uma concepção mecanicista de sociedade, que coloca o ser humano como fim último da organização social.

Ocorre que, principalmente a partir da década de 80, as relações sociais têm sofrido grandes mudanças, caracterizadas pelo incremento tecnológico, a globalização, as relações econômicas em âmbito internacional, as grandes empresas transnacionais que acabaram por deslocar, até certo ponto, o poder, o qual passa a ter âmbito mundial, não mais regional ou nacional.

Diante de tais transformações, há uma transformação nos fins da sociedade, a qual passa a organizar-se não mais em torno do indivíduo, mas no sentido de atingir os fins do capitalismo mundial, uma sociedade assim organizada ganha um tom organicista, onde o homem não é mais que um subsistema do sistema social e este sim deve ser preservado.

Junto destas transformações sociais cresce a criminalidade, com o surgimento de novas formas de delinqüência. O uso de máquinas nas indústrias, o inchaço da Administração pública, a proliferação de instituições financeiras que ganharam proeminência nas últimas décadas propiciaram um novo tipo de criminalidade, tais como crimes contra o meio ambiente, contra a ordem sócio econômica, contra a ordem tributária, informática, criminalidade organizada e daí por diante.

Diante deste quadro o Direito Penal é chamado a assumir outras funções que não a de proteção de bens jurídicos fundamentais. O capital mundial exigiu do Estado uma tomada de providências, um intervir a fim de combater a criminalidade organizada e este vai buscar no Direito Penal o remédio contra as organizações criminosas que afrontam a nova ordem sócio econômica [1].

Como bem assevera Alberto Silva Franco: "(a)tribui-se legitimação, nos tempos presentes, à atuação do Direito Penal não como tutela de bens jurídicos fundamentais da vida em sociedade, mas como ‘poderosos instrumentos de mudança social e de transformação da sociedade’. Trata-se de ‘um motor que dinamiza a ordem social e promove as mudanças estruturais necessárias’. O Direito penal não deve limitar-se apenas ao papel de mantenedor da ordem social, do status quo que lhe é subjacente, mas deve, direta e imediatamente, imiscuir-se, de modo ativo, nas relações tensionais que explodem na sociedade" [2].

Perde, com isso, espaço o Direito Penal voltado à proteção de bens jurídicos, para ganhar espaço um direito penal de máxima intervenção, destinado a produzir mudanças estruturais necessárias. É o chamado Direito Penal promocional [3].

O penalista espanhol Silva Sanchez, sobre o direito penal promocional, afirma que: "(n)ão creio encontrar-me demasiadamente distante do correto ao afirmar que a tipificação, na forma como foi feita na Espanha, de delitos como o delito fiscal ou do meio ambiente, respondeu, em não pouca medida, à vontade de gerar na coletividade, ou em determinados âmbitos dela, uma ; ética fiscal ou uma ética ecológica até então inexistente. Trata-se portanto, da função promocional do Direito penal, teoricamente criticada, mas bem recebida, na prática, pelo poder. Não obstante, o Estado carece de legitimação para promover através do Direito Penal, reforçando processos educativos já existentes ou iniciando-os" [4].

Concorre também com esta noção de Direito Penal o Direito Penal Simbólico, que não se volta tanto à proteção de bens jurídicos, mas sim em dar respostas tranqüilizadoras à opinião pública, de que o legislador está atento aos seus reclamos.

Hassemer, a propósito, acentua que: "Estamos perante um direito penal simbólico. O direito penal simbólico é identificável através de duas características: por um lado, não serve para a proteção efetiva de bens jurídicos; por outro lado, obedece a propósitos de pura jactância da classe política.(...) Esta suposta forma de garantir a proteção do ambiente, para além de custar pouco dinheiro ao Estado, apresenta ainda a vantagem de servir para acalmar contestações políticas. Com efeito, é assim que a classe política pode proclamar à opinião pública que está atenta aos problemas do mundo moderno e, mais ainda, que até se compromete com a tomada de medidas drásticas para os resolver" [5].

A política criminal, a pretexto de proteger bens jurídicos, mas com fins decididamente preventivos, cria leis de proteção ao meio ambiente, à saúde pública, à ordem sócio econômica etc.., ou seja, bens jurídicos vagos, de difícil visualização, permitindo-se, com isto, qualquer cominação penal, perdendo-se, aos poucos, a incidência do princípio da proporcionalidade.

Algumas das característica deste Controle Social Penal intervencionista são o aumento do rigor sancionatório e a não preocupação em incriminar condutas que ofendem ou expõem a perigo bens jurídicos mas atos de infidelidade ao ordenamento jurídico, daí as penas aos crimes de mera conduta. Criam-se novos tipos penais. Agravam-se, desnecessariamente, as penalidades já existentes. Encurtam-se garantias processuais conquistadas após prolongadas lutas. Volta-se o mecanismo penal controlador contra determinados grupos de delinqüentes.

O objetivo de um Direito Penal Promocional seria o de aquietar a sociedade, em geral, e certos segmentos sociais, em particular. O resultado, no entanto, não é sempre satisfatório. A curto prazo, não provoca nenhuma conseqüência de relevo. A maior contundência do sistema penal implantado não produz o efeito pretendido e não restabelece o sentimento de segurança individual ou coletivo. A médio e longo prazo, o fracasso do mecanismo penal acarreta a perda de sua credibilidade [6].

Tanto a função promocional, como a função simbólica, são criticadas por representar graves distorções que distanciam o Direito Penal de sua verdadeira matiz: autorizam um Direito Penal de máxima intervenção. Na medida em que o mecanismo controlador penal perde sua condição de instrumento a serviço da convivência social e se torna um interventor precoce nos conflitos sociais ou atua, simbolicamente, apenas para efeito de transmitir falsa tranqüilidade à sociedade, sua legitimidade começa a ser posta em dúvida [7].

Tais críticas, que deslegitimam a constituição de um Direito Penal Ambiental, não podem ser totalmente afastadas. Todavia, num Estado Social Democrático de Direito, a tutela penal do ambiente constitui uma exigência irrenunciável de controle do progresso técnico, nascida do reconhecimento da situação de ameaça do ambiente e da conseqüente necessidade de uma melhor proteção das nossas condições de vida.

A proteção do meio ambiente revela-se, atualmente, condição essencial para a sobrevivência da própria espécie humana. A ordem constitucional revela a proteção do meio ambiente como bem jurídico fundamental.

O Direito Penal, no plano de um Estado Democrático de Direito, deve ser direcionado preferencialmente para o combate dos crimes que impedem a realização dos objetivos constitucionais do Estado. Ou seja, no Estado Democrático de Direito – instituído no art. 1º da CF/88 - devem ser combatidos os crimes que fomentam a injustiça social, o que significa afirmar que o direito penal deve ser reforçado naquilo que diz respeito aos crimes que promovem e/ou sustentam as desigualdades sociais". Nessa linha, estão os novos bens jurídicos fundamentais, entre eles, o meio ambiente ecologicamente equilibrado.

Ao legislador "incumbe tentar encontrar o justo equilíbrio entre o progresso económico e social e o direito fundamental à manutenção e restauração de um ambiente são. O que poderá fazer apelando também à técnica e promovendo novos meios ou recursos que permitam o controlo daquelas actividades que podem causar danos ou pôr em perigo aquele interesse fundamental" [8].

1.2 Direito Penal Secundário

Uma vez admitida a tutela penal para os problemas ambientais, o problema que se põe, em seqüência, é o de saber em que termos deve verificar-se uma tal proteção. Ou melhor: deve se saber se ela deve encontrar assento nos Códigos Penais ou em legislação penal extravagante.

É sabido que as tendências são essencialmente duas: ou introduzir as disposições penais no Código Penal, ou reagrupá-las em legislação penal extravagante, numa lei penal autônoma sobre a proteção do ambiente. Essa questão, todavia, não se resume a uma simples questão formal ou de melhor arrumação sistemática. As razões são mais complexas.

Muitos vêem na incriminação dos comportamentos contra o ambiente em legislação penal extravagante um sinal de menor impacto ético-social, ou mesmo um sinal de que elas possam representar um ilícito eticamente indiferente. Na verdade, a distinção entre as incriminações que devem conter-se no Código Penal e as que devem constar antes de legislação penal extravagante vai buscar a sua legitimação última à dupla função – pessoal e comunitária – desempenhada pela personalidade do homem nos quadros do Estado de Direito Material. O que se funda e simultaneamente se traduz numa diferente ordenação jurídico-constitucional dos bens jurídicos, sendo expressão desta diferente ordenação as partes da Constituição em que se consignam os direitos, liberdades e garantias e os direitos sociais e a organização econômica. Tudo a dar fundamento a que se possa dizer que, "como concretização daqueles direitos, liberdades e garantia, surgem os bens jurídicos protegidos pelo CP; e, como concretização dos valores ligados aos direitos sociais e à organização econômica, surgem os protegidos por legislação penal extravagante" [9].

Duas objeções levantam-se contra a solução de se manter os delitos ambientais disciplinados em lei penal extravagante. A primeira refere-se ao grau de precisão da descrição típica e à delimitação das fronteiras da punibilidade que, diz-se – não fica plenamente assegurada senão no quadro do CP. Este argumento não tem nada por si. Aquele grau de precisão não depende da localização sistemática das respectivas matérias, mas antes do aspecto que se prende com a configuração que se prende com a configuração típica destes crimes.

A segunda objeção tem a ver com a menor eficácia da proteção dos bens jurídicos em causa. No direito extravagante prevalece o ponto de vista dos critérios e parâmetros da ‘técnica’ e, nesta lógica, os inconvenientes do progresso técnico devem ser pura e simplesmente suportados como riscos civilizacionais, sendo a proteção alcançada forçosamente menor do que fosse realizado no quadro do Código Penal, que tem uma vocação natural para a defesa de bens jurídicos tais como a vida ou saúde.

Aqui, todavia, encontra-se um equívoco. Nada justifica que no domínio da legislação penal extravagante nos curvemos perante os valores da ‘técnica’ em detrimento dos da ‘pessoa’. Como decorre do que se vem dizendo, não se consegue descortinar na base da existência deste direito penal extravagante o mínimo indício de ‘falta de consideração’ ético social da matéria em causa.

Assim, a posição mais plausível parece ser a que a proteção dos valores ambientais deve ser feita em legislação penal extravagante, de modo a "dar corpo ao chamado direito penal secundário, de todo o ponto diferente do direito de mera ordenação social: por um lado, aqueles valores contém-se formalmente na parte da Constituição dedicada aos direitos sociais; e, por outro lado, respeitam substancilmente à realização da personalidade comunitária do homem" [10].

Dentro de uma perspectiva funcional-teleológica do direito penal, uma harmonização entre o Direito Penal da Parte Especial do Código Penal e as Leis penais especiais, não seria funcional, de modo algum funcional. O conteúdo dos elementos estruturais dos delitos contidos no Código Penal e na lei penal extravagante é sobremaneira diverso. O Código Penal é norteado para a proteção de garantias individuais. A legislação extravagante sobre o meio ambiente, encontra-se estruturada para garantir bens que são no mínimo coletivos.

Sobre o que norteará, ou melhor, dará a consistência à todo sistema penal, ao admitir-se a existência de um Direito Penal secundário, será o fato de que tanto o Código Penal quanto as Leis Penais especiais estarão ligados à função de proteção de indispensáveis bens jurídicos, sendo esses bens previstos constitucionalmente. É a ordem constitucional, portanto, o ponto garantidor da existência de um direito penal secundário, ao lado do Direito Penal tradicional.

1.3 Autonomia do Direito Administrativo em relação ao Direito Penal: o reenvio e a norma penal em branco.

Não se nega a existência de dificuldades em face da relação de dependência mútua entre o direito penal e o direito administrativo. Se aquele se liga a este, o âmbito de proteção penal deixaria de ser delimitado pelo legislador penal para passar a sê-lo pelo legislador administrativo. O que significa dizer que os pressupostos de aplicação das normas penais se encontrariam nas mãos de órgão administrativo.

De acordo com Hassemer "a acessoriedade administrativa é absolutamente necessária para a configuração de qualquer direito ambiental que se preze. Na parte que diz respeito ao direito penal do ambiente, é forçoso, por muitas voltas que tentemos dar à questão, que acabemos por reconhecer que o juiz penal nunca teria condições para, nos casos concretos, definir o fato lesivo do ambiente, só com base na lei penal. (...) E é pela acessoriedade que o ilícito penal deixa de ser visível. Na prática, a matéria da ilicitude penal passa a ser objeto de negociação direta entre a administração e o potencial infrator. Com isto, o direito penal perde credibilidade para a generalidade dos cidadãos" [11].

Tal crítica parte do pressuposto de que os legisladores penais e administrativos são diferentes. Na verdade, o legislador é um só, com âmbito de competência estabelecido constitucionalmente. Ambos participam de uma tarefa comum e ligados a vínculos que não podem renunciar. O legislador não se encontra num espaço de atuação livre.

A complexidade dos temas ambientais, somada ao dinamismo das inovações tecnológicas em questões tais como a emissão de dejetos, de compostos químicos, o tratamento, manipulação e transporte de substâncias perigosas etc., faz indiscutível que na configuração do delito ambiental, recorra-se tanto à técnica dos chamados delitos de perigo como a do reenvio ou da lei penal em branco. O delito de perigo, por oposição ao de dano ou lesão não requer para a sua consumação que efetivamente se produza menoscabo ao objeto protegido, apenas basta com que seja ocorrido o perigo. Esse perigo pode ser concreto, quando o juiz deve verificar no caso individual, ou abstrato quando é a lei a que o presume.

Assim, a proteção do direito penal ambiental deve realizar-se em função de critérios administrativos. Segundo Anabela Miranda Rodrigues, "do ponto de vista da unidade da ordem jurídica, a técnica das normas penais em branco que reenviam para disposições não penais permite estabelecer a concordância perfeita entre as duas matérias (...). O preenchimento da norma penal dita ‘em branco’ por prescrições administrativas não é senão a conseqüência necessária da própria natureza móvel, alterável e específica do direito do ambiente e, deste modo, uma conditio sine qua non da eficácia – esta também legitimadora – da protecção do ambiente pela via penal" [12].

A ordem jurídico-administrativa é a que se encontra melhor colocada para responder ao objectivo de prevenção no domínio ambiental dizem respeito, desde logo, ao facto de esta ordem ser a que se encontra mais próximo e mais estreitamente ligada aos agentes poluidores mais perigosos.

Ademais, o legislador administrativo, pela facilidade de emitir normas, pela sua proximidade com os processos e os progressos tecnológicos, pela atenção que é obrigado já prestar aos avanços e às mudanças técnicas, possui uma mobilidade e uma plasticidade que não são possíveis nem seriam mesmo convenientes que existissem no legislador penal. Tudo isto vale para lembrar a verdade elementar que o direito administrativo é o campo por excelência do móbil e do alternável, enquanto que o direito penal deve ser tanto quanto possível, o domínio do que permanece e tem tendência para ser imodificável [13].

1.4 Responsabilização de pessoas jurídicas e coletivas

Não é necessário muitos argumentos para afirmar que o meio ambiente se vê mais em perigo por atividades coletivas que por atuações individuais. A questão da intervenção das pessoas invólucras em sociedades ou empresas industriais ou comerciais, nos confronta com o antigo princípio constitucional liberal de que somente as pessoas físicas podem delinqüir e não as sociedade ou pessoas jurídicas.

A dificuldade dogmática tradicional para imputar penalmente a criminalidade das pessoas jurídica reside no conteúdo das noções fundamentais do Direito Penal: ação, culpabilidade, capacidade penal. Na primeira vista, a ação no Direito Penal sempre está ligada ao comportamento humano, e a culpabilidade, ou culpa, parece significar uma reprovação ética ou moral que estaria excluída no caso das pessoas jurídicas, as quais, em exceção, não poderiam ser as destinatárias, ou sujeitos passivos, de penas criminais com sua finalidade preventiva e retributiva. Estas dificuldades são evidentemente muito menos graves quando não se aplicam verdadeiras penas às pessoas jurídicas, mas sim umas sanções meio ou quase penais podem ser flexibilizadas ou alargadas.

Tradicionalmente as pessoas jurídicas carecem de capacidade de ação e de capacidade de culpabilidade. Ademais, as pessoas jurídicas não podem ser sentadas no banco dos réus, nem ser enviada ao cárcere. Mas se pode impor outro tipo de pena ou sanção. Como seria possível atalhar à responsabilidade das pessoas coletivas, respeitando o caráter pessoal da responsabilidade criminal ?

Assinala René Ariel Dotti que: "(c)omo, porém, ‘medir’ a ‘culpabilidade’ da pessoa jurídica quando ela ‘participar’ do fato típico realizado pela pessoa física? Como saber a forma de participação (mandato, comando, conselho e ameaça) ou de cumplicidade (auxílio material)? Quem é quem na estrutura administrativa da sociedade por ações ou da pessoa jurídica de Direito Publico Interno para ser identificado como o prestador do serviço de informações? Quem poderá identificar a forma e o alcance da participação ou do auxílio? Em outras palavras: para quem o Delegado de Polícia (rectius: o escrivão) vai mandar a intimação?" [14]

Apesar das dificuldades, há uma tendência no direito comparado de se acolher a responsabilidade penal da pessoa jurídica. Em nenhuma legislação comparada se vê superadas as objeções tradicionais a responsabilidade penal das pessoas jurídicas relacionadas com os conceitos de ação e culpabilidade naqueles países cujo direito penal se vê condicionado por uma visão espiritualizada ou idealista do princípio da culpabilidade como princípio básico ou princípio de imputação jurídico-penal irrenunciável. A questão não é saber se a pessoa jurídica pode ser sujeito de imputação, mas se é legítimo resolver certos conflitos impondo uma pena as pessoas jurídicas que não têm capacidade de decidir por si mesmas nem se reconhece a elas alternativas de comportamento com respeito às decisões de seus órgão diretivos.

"Los estudios sobre criminalidad de la empresa demuestran que resulta difícil reconducir la lesión a una decisión individual. Más bien suele ser fruto de un processo de acumulación de un management defectuoso o de uma determinada actitud, ética o filosofía empresarial. De hecho las posiciones más recientes que propugnan la responsabilidad de las personas jurídicas insisten en que el fundamento de la ‘culpabilidad de la corporación’ reside precisamente en esta actitud, ética o filosofía empresarial criminógena. Há surgido la necesidad político-criminal de luchar contra un determinado tipo de dirección, actitud, ética o filosofía empresarial que pone en peligro bienes jurídicos de gran relevancia social" [15].

Anabella Miranda Rodrigues diz que: "não nos parece que esteja afastada, com a actual regulação, a possibilidade da consagração da responsabilidade criminal das pessoas coletivas em legislação extravagante, dando corpo ao já referido direito penal secundário" [16].

Bacigalupo Saggese conclui que "todo intento basado en la comparación entre el individuo y la persona jurídica para establecer similitudes se encuentra condenado desde el comienzo al fracaso. No sólo porque el individuo y la persona jurídica presentam dificuldades insuperables, sino fundamentalmente, porque todas las categorías del delito están elaboradas a partir del individuo y de sus capacidades personales". P. 201. La responsabilidad penal de las personas jurídicas, Barcelona, 1997. Apud. Bernardo.p. 32.

La única solución para evitar un inadecuado trato igualitario de estados de cosas esencialmente desiguales parece ser una construción alternativa de la culpabilidad penal. Pero esa propuesta todavía no existe como ya he señalado. No se trata de negar la pisibilidad de su existencia o su imposibilidad ontológica, sino simplemente de constatar que, por ahora, no hay alternativa. Por ello debemos buscar solución a ciertos problemas político-criminales com el instrumental clásico del Derecho Penal [17].

Parece que a solução por um novo conceito de culpabilidade instrumentalmente parece ser algo ainda algo remoto. Para a aplicação imediata e efetiva da responsabilidade da pessoa jurídica. Passar-se-á a comentar sobre o conceito atual de culpabilidade.

Para a ocorrência da culpabilidade, são necessários dois requisitos: a consciência da ilicitude e reprovação da conduta do agente. A culpabilidade é pressuposto fundamental para a aplicação da pena. Num direito penal perspectivado sobre sua função teleológica, deve atender primordialmente à prevenção geral positiva.

É assim o ensinamento de Jorge Figueiredo Dias. Segundo o penalista português, o sistema emergente parece comandado pela profunda convicção de que a construção do conceito de crime há de apresentar-se como teleológica, funcional e racional, possuindo a partir daqui os seus próprios postulados: a) a legitimidade da intervenção penal não pode hoje ser vista como advinda de qualquer ordem transcendente e absoluta de valores, mas unicamente de critérios funcionais de necessidade social. Por isso, a aplicação da pena não mais pode fundar-se em exigência de retribuição ou de expiação da culpa, mas apenas em propósitos preventivos de estabilização contrafática das expectativas comunitárias na validade da norma violada; assinalar à pena uma qualquer função retributiva significaria desligá-la por completo da função do direito penal como ordem de proteção de bens jurídicos. E, a função da culpa não mais residirá em fundamentar a aplicação da pena, mas unicamente em evitar – até por razões ligadas à desejável eficácia da prevenção – que uma tal aplicação possa ter lugar onde não exista culpa ou numa medida superior à suposta por esta. À luz, portanto, de uma concepção do direito penal como ordem de proteção de bens jurídicos – ligada, por sua vez, a uma ordem de legitimação da intervenção penal fundada na necessidade de prevenção das condições indispensáveis de livre realização de cada pessoa na comunidade -, a esta luz, as finalidades da pena só podem ser de natureza exclusivamente preventiva e não retributiva [18].

Dessa forma, pode-se argumentar sobre a culpabilidade da pessoa jurídica, primeiramente, deixando de lado o requisito da consciência da ilicitude, deixando cair o juízo da culpabilidade apenas sobre o critério da reprovação social da conduta da empresa. A pena aplicada à empresa, não terá função retributiva, ou de coação física. Sua função estará ligada apenas à prevenção geral, sendo esta consubstanciada na estabilização contrafática das expectativas comunitárias na validade da norma violada.

1.5 Sistema de Penas

1.5.1 As penas alternativas

O reconhecido fracasso da pena de prisão como modo de solução do conflito, levou a doutrina a propor as chamadas penas alternativas, que no caso do delito ambiental, cometido freqüentemente por conglomerados empresários poderiam ser: clausura provisória ou definitiva, obrigação de reparar danos e prejuízos às vítimas, proibição de operar em Bolsas, cancelamento de registros, suspensão de benefícios tributários ou subsídios, inabilitação para exportar ou importar etc. Somente para os casos mais graves, considera-se necessário seguir mantendo a pena de prisão.

Isso também porque a função da pena, atualmente, deve estar ligada à prevenção geral, conforme acabou-se de salientar anteriormente, sob a lição de Jorge Figueiredo Dias.

1.5.2 A transação penal e a suspensão condicional do processo

A Lei ambiental, em seu art. 27, determina que a transação penal, a ser realizada de acordo com o art. 76 da Lei 9.099/95, depende da prévia composição do dano ambiental, adequando-se desse modo à finalidade preventiva e reparatória que permeia toda a nova normação e apontando para a solução das controvérsias penais e civis no âmbito da Justiça Criminal [19].

O art. 28 da nova lei, por sua vez, determina a aplicação do art. 89 da Lei 9.099/95 – ou seja, da suspensão condicional do processo – "aos crimes de menor potencial ofensivo definidos nesta lei", com as modificações dos incs. I a V, que apontam para os mesmos objetivos reparatórios do dano ambiental.

Quanto ao primeiro dispositivo, fica clara a interpretação. Já a interpretação do art. 28 necessita de algumas considerações particulares.

O ilustre Antônio Scarance Fernandes [20], ao tratar do tema, considerou o dispositivo falho, pelo fato de parecer restringir a aplicação da suspensão condicional do processo às infrações penais de menor potencial ofensivo definidas pela Lei 9.099/95 (crimes e contravenções a que se comine pena máxima não superior a um ano). Por isso, descarta a sua interpretação literal, para escolher a finalística, sustentando que o art. 89 da Lei 9.099/95 se aplica integralmente aos crimes ambientais, "pois a intenção do legislador foi apenas a de modificar, com os incisos I a V, as normas sobre os requisitos para a concessão da suspensão ou sobre as condições de seu cumprimento, tendo havido erro na alusão aos crimes de menor potencial ofensivo". E argumenta com os objetivos da lei, que visam a tornar efetiva a reparação do dano ambiental, não se devendo dar ao dispositivo interpretação que diminua o âmbito da Justiça consensual (excluindo da suspensão condicional do processo as infrações penais a que se comina pena mínima de um ano) e que torne ineficaz a norma do art. 89 da Lei 9.099/95, pois no âmbito das infrações penais ambientais de menor potencial ofensivo caberia antes a transação penal, ficando prejudicada a suspensão condicional do processo (aplicação extensiva).

A prof. Ada Pellegrini Grinover, também aludindo ao dispositivo supra mencionado, propõe uma interpretação Essa interpretação respeita mais estritamente ainda os cânones finalísticos e valorativos do Direito, dando maior eficácia não só ao art. 28 da nova lei, como também aos arts. 76 e 89 da Lei n. 9.099/95.

Segundo ela, a Constituição Federal só alude às infrações penais de menor potencial ofensivo" no art. 98, I, deixando a tarefa de conceituá-las ao legislador. Este, na Lei n. 9.099/95, determinou que, para efeitos de Juizados Especiais, infração penal de menor potencial ofensivo é só aquela cuja pena máxima cominada seja igual ou inferior a um ano. Mas nada impede que, para outros efeitos, o legislador fixe critérios diversos para determinar a abrangência das infrações penais de menor potencial ofensivo.

Isso porque a Lei 9.099/95 não definiu de forma exclusiva e única o conceito de menor potencial ofensivo, mas o fez exclusivamente para os efeitos daquela lei, nada impedindo, portanto, o surgimento de outras hipóteses, previstas em leis diversas. Inclusive, como alerta o autor, com critérios outros que não o máximo da pena cominada em abstrato ou a inexistência de procedimento especial [21].

Segundo a lei ambiental, "as disposições do art. 89 da Lei 9.099, de 26 de setembro de 1995, aplicam-se aos crimes de menor potencial ofensivo definidos nesta lei, com as seguintes modificações:..."

"Isto significa que o art. 28 da Lei n. 9.605/98 ampliou o conceito de infrações penais de menor potencial ofensivo, para efeito de caracterização dos crimes nela definidos, estendendo-a aos crimes em que a pena mínima cominada seja igual ou inferior a um ano (na prescrição do art. 89 da Lei n. 9.099/95, a que o art. 28 da nova lei faz referência expressa) [22]".

Dessa forma, as Infrações penais de menor potencial ofensivo, para efeitos da nova lei ambiental, são os crimes, por ela definidos, para os quais esteja cominada, em abstrato, pena mínima não superior a um ano (art. 28 da lei ambiental c/c art. 89 da Lei 9.099/95).

Aplica-se às referidas infrações tanto a suspensão condicional do processo (regulada pelo art. 89 da Lei 9.099/95, com as modificações dos incs. I a V do art. 28 da lei ambiental), como a transação penal, do art. 76 da Lei n. 9.099/95 (com o requisito da reparação do dano ambiental do art. 27 da lei ambiental), nos termos do art. 98, I, da Constituição, que expressmente se refere à transação, "nas hipóteses previstas em lei".


2. O bem jurídico tutelado nos crimes ambientais

2.1 Noções introdutórias sobre bem jurídico penal

A finalidade precípua do Direito Penal hodierno reside na proteção de bens jurídicos reconhecidos como essenciais não apenas ao indivíduo, mas também à toda a coletividade. O penalista português Jorge Figueiredo Dias explica que "num Estado de Direito material deve cabe ao Direito Penal uma função exclusiva de proteção dos bens fundamentais da comunidade, das condições sociais básicas necessárias à livre realização da personalidade de cada homem e cuja violação constitui o crime" Tem ainda uma "visão funcional, que o vê (ao bem jurídico) como unidade de aspectos ônticos e axiológicos através da qual se exprime o interesse, da pessoa ou da comunidade, na manutenção ou integridade de um certo estado, objeto ou bem em si mesmo socialmente relevante e por isso valioso" [23].

Sobre de onde tirar os bens jurídicos, Em um Estado de Direito Democrático, conforme observa Luiz Regis Prado, "a determinação dos valores elementares da comunidade deve estar, em princípio delineada na Constituição", que há de ser, portanto, "o ponto jurídico-político de referência primeiro em tema de injusto penal – reduzido às margens da estrita necessidade – como afirmação do indispensável liame material entre o bem jurídico e os valores constitucionais, amplamente considerados" [24].

Desse modo, descabe a tutela penal se dissociada do pressuposto do bem jurídico, sendo considerada legítima, sob a ótica constitucional, quando socialmente necessária a identificação de bens jurídicos socialmente relevantes é condição exclusiva e imprescindível, dentro de um Estado Social e Democrático de Direito, de legitimação da intervenção do Direito penal. Isso leva à necessária elaboração de uma teoria do bem jurídico-penal, que deverá se fundar em princípios que lhe dêem harmonização a outras regras básicas de construção do sistema penal [25].

A tutela penal não pode se concretizar de forma assistemática, ignorando determinados critérios básicos que devem nortear a intervenção penal em qualquer esfera da vida humana. Faz-se mister balizá-la pelos princípios fundamentais do direito penal.

O princípio da lesividade

Diz respeito à exteriorização da conduta do Agente. Conforme Roxin, só pode ser castigado aquele comportamento que lesione direitos de outra pessoa e que não é simplesmente um comportamento pecaminoso ou imoral [26].

Assim, a legitimação do Direito Penal apenas se dará nos casos em que houver lesão efetiva ao bem jurídico. Assim, ressaltam-se as características da indispensabilidade e essncialidade.

Desse princípio, partem outros, quais sejam, o da dignidade penal do bem jurídico (somente devem ser objeto de tutela penal aqueles bens que são julgados indispensáveis para a convivência harmônica da sociedade e só será tutelada aquela lesão referente a bens jurídicos essenciais), o princípio da necessidade (onde o bem jurídico não carecer de tutela, o direito penal não deve intervir), o princípio da insignificância (só aqueles bens que sofram lesão significativa) e o princípio da carência da tutela penal (o direito penal só deverá intervir quando realmente existir carência dessa tutela penal querendo efetivamente não houver outros tipos de tutela).

O princípio da intervenção mínima.

De acordo com Francisco Muñoz Conde, "é lógico que se espera, de acordo com o princípio da intervenção mínima, que o legislador só utilize o Direito Penal para proteger bens jurídicos verdadeiramente importantes e tipifique aqueles comportamentos verdadeiramente lesivos ou perigosos para esses bens jurídicos. Mas isto é um desideratum que nem sempre é cumprido. Daí a necessidade de Ter sempre presente uma atitude crítica tanto frente aos bens jurídicos protegidos quanto à forma de protegê-los penalmente" [27].

Alberto Silva Franco, ensina que "o controle social penal deve estar predisposto, antes de tudo, à tutela dos bens de máxima importância para o indivíduo e para a comunidade". Assim, "o Direito Penal somente protege os bens jurídicos mais valiosos para a convivência, e o faz, além disso, exclusivamente, em face dos ataques mais intoleráveis de que possam ser objeto (natureza ‘fragmentária’ da intervenção penal) e quando não existam outros meios eficazes, de natureza não penal, para salvaguardá-los (natureza ‘subsidiária’ do Direito Penal). Se parte dessas considerações e do entendimento de que a pena é um mal irreversível, uma ‘amarga necessidade’, força é convir que se deve reduzir ao máximo o apelo ao Direito Penal. Num Estado Democrático de Direito, a intervenção penal não pode ter uma dimensão expansionista: deve ser necessariamente mínima, expressando, apenas e exclusivamente, a idéia de proteção de bens jurídicos vitais para a livre e plena realização da personalidade de cada ser humano e para a organização, conservação e desenvolvimento da comunidade social em que ele está inserido. Como então determinar tais bens? A estreita vinculação entre a ordem jurídica e a ordem social recomenda o exame da própria realidade social para a identificação dos bens jurídicos mais relevantes para o indivíduo e para a convivência societária" [29].

O princípio da fragmentariedade

O caráter fragmentário significa que o Direito penal não deve sancionar todas as condutas lesivas dos bens jurídicos que protege, mas apenas as modalidades de ataques mais perigosos para eles. Assim, como enfatiza Mir Puig (Derecho penal, p. 74. 2ª ed. Barcelona, PPU, 1985), nem todos os ataques a propriedade constituem delito, mas apenas certas modalidades especialmente perigosas, como o apoderamento subreptício, violento ou fraudulento.

O princípio da subsidiariedade

Para proteger os interesses sociais, o Estado deve esgotar os meios menos lesivos que o Direito penal, antes de recorrer a este que, nesse sentido, deve constituir-se numa arma subsidiária, uma ultima ratio. Deverá preferir-se antes de tudo a utilização dos meios desprovidos do caráter de sanção, como uma adequada Política Social. Seguirão, em continuação as sanções não penais. Somente quando nenhum dos meios anteriores for suficiente estará legitimado o recurso à pena ou à medida de segurança.

Aquele diploma traça, de forma inequívoca, os parâmetros a serem obrigatoriamente trilhados pelo legislador ordinário na tipificação de condutas que atentem contra bens jurídicos reconhecidamente essenciais, de acordo com os padrões e valores forjados em um certo momento histórico. Sustenta Bettiol, nesse sentido, que "o bem jurídico está intimamente ligado às concepções ético-políticas dominantes e portanto assume significado diverso e conteúdo diverso com a mudança do tempo e do ambiente. O direito penal, estreitamente jungido a valores de uma determinada época, encontra neles a sua razão de ser, como organismo de tutela" [30].

As diretivas agasalhadas explícita ou implicitamente na Carta Constitucional limitam, pois, a criação do injusto penal, de maneira que "a natureza constitucional do bem jurídico define, em última análise, a possibilidade ou não de sua tutela" Logo, tem-se que "a nenhuma norma infraconstitucional é facultado ignorar esse quadro axiológico e todas devem ser examinadas objetivando tornar possível sua real concreção" [31].

Figueiredo Dias afirma que "(s)e, num Estado de Direito material, toda a atividade estadual se submete à Constituição, então também a ordem dos bens há de constituir uma ordenação axiológica como aquela que preside à Constituição. Entre as duas ordens se verificará pois uma relação, que não é por certo de identidade, ou sequer de recíproca cobertura, mas de analogia substancial, fundada numa essencial correspondência de sentido; a permitir afirmar que a ordem de valores jurídio-constitucional constitui o quadro de referência e, simultaneamente, o critério regulativo do âmbito de uma aceitável e necessária atividade punitiva do Estado" [32].

O Direito Penal adequado ao Estado Democrático de Direito figura como um Direito Penal de mínima intervenção, em que este só atuará a fim de proteger os bens jurídicos fundamentais da sociedade; esta afirmação justifica-se em virtude da pesada carga punitiva do direito penal que sufocaria a convivência social se não fosse limitada a sua intervenção. No fundo desta concepção do controle social penal está a dignidade da pessoa humana, como centro da organização estatal; particularmente eu vejo aí uma concepção mecanicista de sociedade, que coloca o ser humano como fim último da organização social.

Nos delitos chamados não convencionais, que é o caso dos delitos ambientais, prevalece e se reafirma a idéia de que o Direito penal é a última instância de controle social e que cumpre uma função subsidiária e auxiliar, às normas não penais (civis, administrativas, contravencionais) e que são essas, passíveis de uma adequada política de conscientização, as que têm a tarefa de prevenir os danos ecológicos, reservando ao direito penal somente para os atentados mais graves, e quando os outros controles fracassarem.

A intervenção penal em matéria ambiental deve cingir-se, prima facie, a uma função subsidiária da disciplina administrativa. A sanção penal é a ultima ratio do ordenamento jurídico, o que significa que apenas as hipóteses de atentados graves ao bem jurídico devem ser tipificadas.

2.2 O bem jurídico tutelado nos delitos ambientais.

Desde a metade da década de 70 se tem aprofundado o estudo dos chamados bens jurídicos coletivos, colocando-se em relevo uma questão de política criminal que era a ausência de utilização do Direito Penal para a proteção de interesses de grande relevância social, mas que justamente refletem interesses antagônicos a interesses políticos e econômicos importantes e influentes em nossa sociedade (saúde pública, interesse dos trabalhadores), utilizando a expressão interesses difusos.

Todavia, como alerta Berdugo Gomes de la Torre "...la exigencia político-criminal de garantizar estos intereses no puede ni debe reducirse a la utilización del Derecho Penal, sino que debe abarcar la adopción de aquellas medidas más adecuadas para su garantía, lo que presupone la vigencia de principios como lo son los de la última retio, proporcionalidad e igualdad. Ni en sentido contrario, las dificultades que puede presentar el recurso al Derecho Penal frente a los más graves ataques de los mismos debe conducir a la afirmación de que por tanto, no debe en estos casos acudirse ao ordenamiento punitivo" [33].

O ambiente ecologicamente equilibrado é, sem dúvida, um bem jurídico-penal portador de substantividade própria, erigido pelo texto constitucional como direito fundamental da pessoa humana (art. 225, CF). Estampado na Constituição Federal – ponto jurídico-político de referência obrigatória em tema de injusto penal – como valor digno de tutela, a efetiva proteção do ambiente exige a observância das linhas mestras já mencionadas, que figuram como limites infranqueáveis à atividade punitiva do Estado [34].

O bem jurídico ambiente impõe, para seu eficaz resguardo, a intervenção da tutela penal, posto que se reveste, indiscutivelmente, de significativa importância para o regular equilíbrio e sustentação da vida humana sobre a terra. Essa posição de relevo ocupada por tão importante bem jurídico encontra supedâneo no próprio texto constitucional, que reconhece expressamente o direito fundamental de todos ao meio ambiente ecologicamente equilibrado (art. 225).

Flávia Piovesan assinala que "só existirá sadia qualidade de vida se o meio ambiente for ecologicamente equilibrado, não degradado. Vale dizer, sem a proteção ambiental, não há como cogitar do direito à saúde, e, por sua vez, não há como cogitar do direito a uma vida digna" [35].

A determinação exata da noção de meio ambiente como bem jurídico-penal é questão tortuosa, sobretudo em virtude da variedade conceitual que encerra. Faz-se alusão, por ora, a três concepções defendidas pela doutrina que buscam fornecer, com a maior precisão possível, o real significado do bem jurídico ambiente.

Em uma posição de relativo equilíbrio no que respeita à noção do ambiente se encontra uma tendência intermediária, que postula uma elaboração conceitual calcada apenas na vertente naturalista daquele bem jurídico. Ou seja, tal concepção de ambiente coloca de lado "toda a problemática urbanística e territorial, sendo parte dele a natureza, com os elementos água, ar, solo, a fauna e a flora e o conteúdo da relação homem meio. Nesse diapasão, assevera a doutrina que "o bem tutelado é normalmente constituído pela limpeza e pureza da água, do ar e do solo", sendo que a esses componentes foram acrescidos outros, como resultado do desenvolvimento legislativo, passando também a merecer tutela "fatores essenciais ao equilíbrio natural, como aqueles climáticos ou biológicos, afora aqueles alusivos à contenção de ruídos ou à preservação do verde" [36].

Esse entendimento aparenta ser o mais coerente e apropriado na construção conceitual do ambiente como bem jurídico-penal. Uma posição globalista, com lastro em diretrizes genéricas, inclui em seu bojo aspectos que não integram o conceito de ambiente, tais como o espaço urbano fechado (edificações) e aberto (ruas, praças etc.). Se assim não fosse, nada restaria excluído daquele conceito, que acabaria por reunir todo e qualquer setor da vida (natural, artística ou cultural). De outro lado, uma noção assaz restritiva da concepção de ambiente consigna como seus elementos tão-somente alguns aspectos naturais, com ênfase conferida ao meio físico (ar e água), em detrimento do patrimônio florístico, por exemplo.

A proteção dispensada ao bem jurídico ambiente deve ter em conta que este apresenta substantividade própria, ou seja, possui caráter autônomo. É certo que a tutela dos fatores naturais que o compõem – flora, fauna, ar, água, solo – tem por escopo evitar que da alteração prejudicial dos mesmos derivem efeitos adversos ao equilíbrio da vida humana, vegetal e animal. Entretanto, o reconhecimento da validade dessa assertiva não implica a exclusão do "equilíbrio que é o próprio da flora e da fauna, embora sem ter uma incidência direta no desenvolvimento humano, tanto em seu aspecto biológico como social".

A idéia é de que o bem jurídico protegido é fundamentalmente o "meio ambiente", entendido como a manutenção das propriedades do solo, do ar e da água, assim como a fauna e a flora e as condições ambientais de desenvolvimento das espécies, de tal forma que o sistema ecológico se mantenha com seus sistemas subordinados e não sofra alterações prejudiciais. Quer dizer que não é necessário chegar a produzir o dano efetivamente à saúde de uma pessoa ou colocar em perigo sua vida; o âmbito de proteção se antecipa como totalidade ecológica.


3.O meio ambiente como um interesse de caráter difuso

3.1 Os interesses transindividuais

Da reunião de vários fatores inerentes à realidade da sociedade pós-industrial, caracterizada pela produção, comercialização, crédito, comunicação, tecnologia e conflituosidade massificados, emergem situações que, além de serem desconhecidos pela tradição individualística, colocam-se como indispensáveis à vida das pessoas.

Em descompasso com códigos tradicionais, os direitos e os deveres deixam de se apresentar exclusivamente como individuais, de cunho egoístico, passando a assumir um caráter essencialmente coletivo e difuso, onde a socialização e a coletivização têm papel fundamental.

Surgem, portanto, interesses atinentes à toda a coletividade, melhor nomeados de transindividuais, eis que não se encontram acima ou além dos indivíduos. São interesses que não se enquadram na dicotomia tradicional entre o público e o privado, constituindo-se, pois, num terceiro gênero que tem características e conteúdo próprio.

Esses interesses, contrariamente ao direito individualístico, excludente, repressivo e negativo de outros direitos, têm um caráter essencialmente promocional, pois ao Estado não cabe demandar soluções a certas pretensões ou benefícios à pessoas determinadas, mas, sobretudo, compete a ele criar uma consciência de compromisso com atos futuros referentes à proteção da qualidade e continuidade da vida.

A sua violação afeta a todos inexoravelmente, o que, por sua vez, enseja aos seus atores uma co-responsabilidade e a compreensão de uma espécie de destino comum inevitável que os prende aos demais. É por isso que além de serem considerados direitos sociais ao modo de um Estado Democrático de Direito, são direitos de cunho e vínculos políticos, na medida em que requerem uma intervenção ativa de seus atores, uma atividade, e não somente uma negação, um impedimento de violação.

A defesa dos interesses transindividuais, principalmente quando se trata de meio ambiente, de interesses culturais ou de defesa do consumidor e similares, insere-se na luta pela garantia de direitos humanos fundamentais típicos daqueles de terceira geração [37], haja vista que têm, como ponto de apoio, o mesmo compartilhar de destinos, situações e interesses.

A partir da década de 60 começou-se a delinear uma nova categoria de direitos fundamentais direitos de terceira geração. Nesta perspectiva os direitos fundamentais seriam três categorias: os direitos de liberdade, os direitos de prestação (igualdade) e os direitos de solidariedade. Estes últimos direitos pressupõem o dever de colaboração de todos os estados e não apenas o atuar ativo de cada um e transportam uma dimensão coletiva justificadora de outro nome dos direitos em causa: os direitos dos povos.

Eles não se encontram atrelados a uma ordem subordinativa e hierarquizada, de regras e valores, mas sim, validam-se e buscam legitimidade e importância no conflito travado no espaço social entre interesses diversos que se chocam.

Pela conotação política inerente ao conteúdo e objeto desses interesses, sua operacionalização encontra-se estritamente vinculada à questão do acesso à justiça e ao problema da participação democrática no processo jurídico.

Quanto à forma de classificação para albergar as distintas espécies destes direitos, na doutrina encontramos, basicamente duas formas. A primeira entende que tanto os interesses coletivos como os difusos encontram-se alojados na rubrica interesses transindividuais, uma vez que ultrapassam o indivíduo isoladamente considerado. Estes constituiriam gênero, e aqueles as espécies. A segunda corrente sustenta que o gênero são os interesses coletivos que se subdividiria-se em interesses coletivos strictu sensu e interesses difusos propriamente ditos. Em razão de sua maior clareza didática, parece mais apropriada a primeira classificação, que utiliza nomenclatura distinta para cada um dos seus elementos, o que, instrumentalmente, a torna mais precisa.

Solidificou-se o entendimento doutrinário de que o interesse a um meio ambiente ecologicamente equilibrado é um interesse transindividual de caráter difuso. Por isso, passar-se-á a analisar dessa categoria de interesses – os difusos – tentando, dessa forma, evidenciar os traços principais que caracterizam o interesse ao meio ambiente.

3.2 Os interesses difusos

Com o crescimento de importância das questões relacionadas aos interesses difusos faz-se nítida a incompatibilidade destes com a teoria jurídica tradicional acostumada a reconhecer e atrelar a todo direito um titular exclusivo e visualizável, pois eles significam, sobretudo, uma indeterminação subjetiva de sua titularidade.

A síntese ordenadora do interesse difuso, diferentemente do coletivo, não se fará no interior de um grupo determinado, mas como "fruto do debate democrático no interior diluído da sociedade civil como um todo" [38]. Assim, eles distinguem-se sobremaneira dos coletivos por não estarem alicerçados em qualquer vínculo jurídico de base. A reunião de pessoas em torno de um interesse difuso assenta-se em fatos genéricos, acidentais e mutáveis, como habitar a mesma região, consumir os mesmos produtos etc. Contudo, os entes coletivos se fazem necessários para a tutela desses interesses na medida em que representam "mecanismos fundamentais para a praticabilidade, a implementação e a busca de efetivação, de tais interesses" [39].

Péricles Prade diz serem difusos os interesses:

"...titularizados por uma cadeia abstrata de pessoas, ligadas por vínculos fáticos exsurgidos de alguma circunstancial identidade de situação, passíveis de lesões determinadas entre todos os titulares, de forma pouco circunscrita e num quadro de abrangente conflituosidade" [40].

Diz o Código de Defesa do Consumidor (Lei 8078/90) em seu artigo 81,I:

Interesses difusos, assim entendidos, para efeito deste Código, os transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato.

Assim, em razão da inocorrência de um laço de união entre os possíveis ou potenciais titulares, a determinação dos sujeitos resta por demais fluida e dispersa. Na lição de Celso Bastos, há a "descoincidência" do interesse difuso com o interesse de uma determinada pessoa abrangendo, na realidade, "toda uma categoria de indivíduos unificados por possuírem um denomidaor fático qualquer em comum". [41] Ademais, eles apresentam caráter de efemeridade, o que exige uma prestação jurisdicional imediata e eficaz, sob pena de irreparabilidade da lesão.

Não existe qualquer tipo de vínculo jurídico que reuna os sujeitos eventuais ligados aos interesses difusos, havendo apenas uma vinculação fática circunstancial entre os sujeitos afetados;

Esses interesses referem-se a bens indivisíveis, significando que a satisfação do interesse implica sempre a satisfação de toda a coletividade, da mesma forma que sua lesão se concretiza para todos. É por isso que não há que se pensar em fruição exclusiva por algum titular. A fruição é comum, de todos e de ninguém indistintamente

Tem-se assentado, após alguma depuração teórico-conceitual de que têm sido objeto, mormente no seu confronto com os interesses coletivos, que os interesses difusos se manifestam e evidenciam em torno de domínios como:

- o direito à saúde;

- a defesa do ambiente e da qualidade de vida, do direito à preservação da natureza e da paisagem natural (aí se incluindo a proteção contra os ambientes insalubres de trabalho, o ruído excessivo, a emissão de substâncias nocivas, etc);

- O direito a um crescimento e ordenamento harmônico e humanizado do território urbano (onde se pode incluir o direito à proteção da estética urbana) local, regional e nacional;

- O direito à proteção do consumo de bens e da utilização de serviços (aí se incluindo a proteção da produção, conservação, manuseamento, armazenamento, embalagem e venda de produtos, alimentares ou outros, em condições de higiene, à proteção na adesão de cláusulas contratuais de adesão, à proteção contra abusos publicitários, etc);

- o direito à proteção, salvaguarda e valorização do patrimônio cultural, que corresponde a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico;

- a preservação da ordem econômica segundo regras estabelecidas de concorrência, e proibição de práticas de monopólio;

- o direito a uma preservação e circulação rodoviária segura,

- o direito à informação mediática isenta, objetiva e plural, etc.

- o uso da propriedade privada urbana ou rural segundo sua função social;

- a salvaguarda dos direitos humanos fundamentais, principalmente das minorias étnico-sociais.

Em razão dessa indeterminação dos sujeitos e da efemeridade e contingência dos interesses, os interesses difusos se apresentam fundamentalmente diferente dos demais, sejam individuais ou coletivos, o que, por sua vez, implica no que apropriadamente Mauro Cappelletti denominou de conflitualitá massima, eis que, exsurgindo de circunstâncias de fato, conjunturais (consumir produtos, habitar certa região), ensejam o confronto entre interesses de massa, sustentados por sujeitos com interesses antagônicos e são capazes, assim, de promover a discussão e a politização dos entes envolvidos.

Os representantes dos interesses e direitos difusos não são os indivíduos presentes na definição dos interesses individuais egoísticos, uma vez que a satisfação ou lesão de tais interesses implicam na satisfação da coletividade como um todo. Tampouco são os grupos apresentados como titulares exclusivos desses interesses, pois os interesses difusos pertencem não só a eles mas à comunidade como um todo. A discussão acerca da representatividade gira em torno de opções prático-políticas, que acabam por conceder tal atributo àqueles sujeitos mais capacitados para garantir a praticabilidade de tais interesses.


4. Lei dos Crimes ambientais

4.1. Considerações preliminares.

Embora a moderna evolução das idéias ecológicas tenha impulsionado o aparecimento de um complexo de princípios, técnicas e normas destinados a essa finalidade, congregando todos os ramos d ciência do direito para, com seus instrumentos próprios, auxiliar a corrigir ou impedir as distorções ambientais, novos e relevantes contornos dessa intervenção estatal foram delineados nos últimos tempos, trazendo para a órbita da tutela jurídica o direito ao meio ambiente equilibrado e à sadia qualidade de vida como um dos direitos fundamentais da pessoa humana, mas também de toda a coletividade.

Tal se deu no Brasil pela adoção desse princípio, objeto de recomendação da comunidade internacional, que foi impresso na Constituição Federal de 1988, passando assim a nortear toda a legislação ambiental subjacente, e a dar uma nova conotação a todas as leis em vigor, no sentido de favorecer uma interpretação coerente com a orientação político-institucional que então se inaugurava.

Por outro lado, o campo de abrangência da proteção jurídica ambiental alargou-se enormemente pela ampla conceituação dada ao seu objeto, que passou a incluir, ao lado dos recursos naturais, todos os bens que, de natureza material ou imaterial, se referiram à identidade, à ação, à memória da sociedade brasileira, às suas criações científicas e tecnológicas, às suas obras e edificações, enfim, tudo aquilo que se considera essencial para a plena realização da pessoa humana e para a vida na comunidade, e que pode ser chamado de patrimônio cultural da nação.

Há muito que a proteção jurídica do meio ambiente se realizava direcionada para a regulamentação da correta utilização dos recursos naturais, embora fossem parcos os instrumentos disponíveis para a sua defesa. A noção dos interesses difusos, trazida modernamente para a ordem jurídica, e a institucionalização de sua defesa através de instrumentos adequados, bem como as atribuições concedidas ao Ministério Púbico para a proteção do meio ambiente, vieram a intensificar e alargar a tutela até então dispensada aos bens ambientais.

Por outro lado, a discussão dos problemas ecológicos, a todos concernente, a atuação dos organismos internacionais, as atividades das associações civis de defesa do meio ambiente, as pesquisas e estudos científicos, puseram em cheque o substrato filosófico da proteção jurídica ambiental precedente, no sentido de fundamentá-la não apenas em termos econômicos, ou de satisfação às necessidades individuais, mas também em outros valores básicos da condição humana, de tipo cultural e de conotações éticas, que passarão a compor o novo conceito de qualidade de vida, o qual ingressou definitivamente na ordem jurídica através das referências que lhe fez a Constituição brasileira de 1988.

A nova relação que se estabeleceu entre o homem e a natureza, baseada no mútuo respeito e na mútua dependência, com a predominância do interesse coletivo sobre o individual, induziu a uma nova postura da sociedade para com o meio ambiente, que requer um novo enfoque dos problemas existentes e uma adequação da ordem jurídica para as suas soluções, levando em consideração os novos valores emergentes e a responsabilidade comum de sua defesa.

Para isso também se espera que o direito penal contribua, como parte integrante da ordem jurídica, e como recurso extremo na proteção dos valores fundamentais da sociedade, através das sanções que lhe são próprias, sendo a violação dos mesmos intolerável, e inevitável de outra forma. Funcionará então o direito penal como recurso necessário de defesa social, garantidor da coexistência pacífica entre os membros da coletividade, e instrumento de uma política que atende aos anseios sociais sem descurar os do desenvolvimento econômico e as necessidades básicas da população.

A execução dessa tarefa encontra algumas dificuldades no âmbito do direito penal. Por isso se faz necessário a realização da compatibilização da política criminal com as diretrizes de política ambiental, dotando-se a legislação penal de instrumentos e normas adequadas à proteção dos valores ambientais, refazendo a tipologia, redimensionando as penas e forjando um sistema que, além de apropriado às finalidades visadas, possa atender melhor aos anseios e às exigências da nova ordem social, que pretende a harmonização dos interesses da comunidade com a necessidade de preservar a natureza, no interesse das gerações vindouras.

4.2. A Lei dos crimes contra o meio ambiente (Lei 9.605/98). Generalidades sobre os tipos penais ambientais.

4.2.1. Bem jurídico tutelado

A idéia fundamental é do meio ambiente ecologicamente equilibrado, entendido como a manutenção das propriedades do solo, do ar e da água, assim como a fauna a flora e as condições ambientais de desenvolvimento dessas espécies de tal forma que o sistema ecológico se mantenha com seus sistemas subordinados e não sofra alterações prejudiciais.

4.2.2. Conduta

Em geral, os artigos da lei 9605/98 que trazem tipos penais, apresentam múltiplas condutas (condutas mistas ou de conteúdo variado), configurando, assim, a modalidade de tipo alternativo, ou seja, o agente pode praticar qualquer das condutas ou mais de uma que a pena será única, crime único.

Em relação ao bem jurídico mediato, os crimes previstos pela lei ambiental são formais, bastando a efetivação da conduta, não se exigindo a ocorrência do resultado naturalístico, que é a lesão ou exposição a perigo do bem jurídico "meio ambiente ecologicamente equilibrado". Contudo, em relação ao bem jurídico imediato, os crimes poderão ser formais ou materiais, de dano ou de perigo.

A maior parte dos crimes se configura por meio de ação, mas também aparecem formas omissivas.

4.2.3 Sujeito Ativo

Qualquer pessoa, física ou jurídica, poderá ser sujeito ativo do delito ambiental, inclusive as pessoas coletivas. Há, portanto, na lei penal ambiental a imputação de condutas delituosas a pessoas jurídicas.

4.2.4 Sujeito Passivo

A coletividade, de maneira difusa. A agressão ao bem jurídico meio ambiente afeta a todos de maneira indeterminada. Em algumas figuras delituosas da lei, aparece, como sujeito passivo imediato, o particular, proprietário do objeto material.

4.2.5 Objetos materiais

Fauna (Espécies da fauna silvestre, nativos ou em rota migratória);

Flora (Florestas consideradas de preservação permanente, mesmo que em formação, unidades de conservação, e demais formas de vegetação);

Qualidade do ar, água e solo em relação à saúde humana;

Patrimônio histórico e cultural e o Ordenamento urbano.

4.2.6 Elemento normativo

Em inúmeros dispositivos, o aplicador deverá recorrer a outros diplomas legais para complementar o tipo penal, já que inúmeros são os tipos penais em branco. Assim, muitos serão os tipos penais que trarão elementos normativos relacionados ora à ilicitude, ora, de índole jurídica.

4.2.7 Elemento Pessoal

A maior parte dos delitos ambientais admitem crimes somente na forma dolosa, sendo poucas as figuras culposas.

4.2.8 Ação Penal

Por motivos de política criminal, que norteia a maioria das leis penais extravagantes, a ação penal dos tipos delituosos ambientais será pública incondicionada. Ou seja, caberá somente ao Ministério Público a sua proposição.

4.3. Análise dogmática e jurisprudencial dos tipos penais em espécie.

4.3.1 Crimes Contra a Fauna

Na Seção I do Capítulo V, o legislador reservou nove artigos para os crimes contra a fauna, tipificando condutas delituosas praticadas contra espécies da fauna silvestre. Somente os arts. 29, 30, 31, 32, 33, 34 e 35 tipificam as condutas delituosas. O art. 29 se refere à caça, e os arts. 34 e 35 à pesca. As penas dos arts. 29, 31 e 32 não ultrapassam um ano de detenção. Aplicável, in casu, o instituto da transação penal, previsto no art. 76 da Lei n. 9099/95. Os arts. 30, 33, 34 e 35 têm penas mínimas de um ano. Aplica-se, nesses caso, o instituto da suspensão do processo, previsto no art. 89 da Lei 9099/95. O art. 36 é norma explicativa, e o art. 37 trata de causa de isenção de pena.

Fauna é o conjunto de animais próprios de um país ou região que vivem em determinada época. Protegem-se as espécies da fauna silvestre ou aquática, doméstica ou domesticadas, nativas, exóticas ou em rota migratória. É a própria lei, no § 3o do art. 29 que determina quais são as espécies da fauna silvestre protegidas, quais sejam, "todos aqueles pertencentes às espécies nativas, migratórias e quaisquer outras, aquáticas ou terrestres, que tenham todo ou parte de seu ciclo de vida ocorrendo dentro dos limites do território brasileiro, ou águas jurisdicionais brasileiras".

Assim, passar-se-á à análise particular de alguns dos delitos contra a fauna, sempre tentando elucidar as abordagens e comentários com casos jurisprudenciais.

4.3.1.1 Art. 29, caput.

Dispositivo: "Art. 29. Matar, perseguir, caçar, apanhar, utilizar espécimes da fauna silvestre, nativos ou em rota migratória, sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente, ou em descordo com a obtida:

Pena – detenção de seis meses a um ano, e multa."

4.3.1.1.1 Casos jurisprudenciais.

a) FAUNA – apanha – pequena quantidade de pássaros apreendidos – princípio da insignificância.

Pequena quantidade de pássaros apreendidos. Insignificância. Em virtude de pequena quantidade de pássaros apreendidos (um casal de bonitos, um tico-tico-rei, cinco azulões e um papagaio), não havendo comprometimento ao meio ambiente, aplica-se o princípio da insignificância para absolver os acusados (TRF – 4ª Reg., 2ª T., Acrim 93.04.29517-3-SC, rel. Juiz Jardim de Camargo, DJU, 5.06.1996).

b) FAUNA – Caça – Crime de dano – Inocorrência de tentativa.

O crime, previsto na Lei n. 5.197/67, é de dano, dado que o tipo do injusto está configurado na ação de caçar ou perseguir. Inocorrência, no caso, de tentativa, pois se configura em havendo início dos atos executórios e, quando iniciada a execução (de caçar ou de perseguir), e não vontade de fazê-lo (TRF – 2ª Reg., 2ª T., Acrim 94.02.08526-2-RJ, rel. Juiz convocado Rogério V. de Carvalho, DJU, 8.06.1995.

c) PENAL – Crime contra a fauna silvestre nacional – materialidade e autoria delitiva comprovadas – Sentença de condenação mantida.

1. Comprovada a materialidade do delito pelo auto de exibição e apreensão e laudo do Instituto de Criminalística do Estado de São Paulo, que atestam o abate do animal, cuja carne foi apreendida. 2. As circunstâncias em que os réus foram surpreendidos, bem como o fato de, em poder deles, serem encontrados os instrumentos utilizados para o abate, e à ausência de qualquer prova no sentido de que fora o animal vítima de atropelamento, conclui-se que a capivara abatida foi produto de caça, proibida nos termos da Lei 5.197/67. 3. Condenação mantida. Recurso improvido.

(TRF – 3ª Reg. ApCrim 94.03.081966-9 – TRF 3ª R – 5ª T. – j. 15.06.1998 – rela Juíza Ramza Tartuce).

d) FAUNA – Caça de animal silvestre – Erro de proibição configurado.

O art. 10, d e j, da Lei n. 5.197/67, com as alterações feitas pelos arts. 27, § 1º, da Lei n. 7.653/88. Não basta a prática de um fato típico para infligir pena. É imprescindível, sempre, que fique demonstrada a culpabilidade. Além da imputabilidade do sujeito e a exigibilidade de conduta diversa, há que se exigir a potencial consciência da ilicitude do fato cuja ausência exclui a culpabilidade, isentando de pena quando inevitável, ao teor do art. 21, § único do CP. Na hipótese, os elementos indiciadores da vontade do réu de violar a norma penal mostram-se precários e o legislador não previu o delito em sua forma culposa, razão pela qual deve ser confirmada a sentença absolvitória (TRF – 2ª Reg., 1ª T., Acrim 93.02.14174-8-RJ, rel. Des. Fed. Frederico Gueiros, DJU, 10.05.1994)

4.3.1.1.2 Comentários

a) Elementos descritivos objetivos: Os elementos descritivos objetivos são aqueles encontrados no tipo, que se pode apreender seu conteúdo sem necessidade de qualquer valoração por parte do juízo. São, portanto, o bem jurídico penalmente protegido; a ação que lesiona ou o verbo que expressa a conduta que venha a lesionar o bem jurídico; o resultado naturalístico; o nexo causal; os sujeitos do delito e o objeto material do delito. Passar-se-á, então, à análise desses elementos no tipo penal ora em estudo.

Bem jurídico tutelado. É a preservação do patrimônio natural, especialmente da fauna silvestre e aquática ameaçada ou não de extinção. Trata-se de um crime de dano, já que para a sua configuração exige a lesão ao bem jurídico penalmente tutelado.

Núcleo do tipo: São cinco os verbos núcleos do tipo em análise, quais sejam, matar, perseguir, caçar, apanhar, utilizar. Cuida-se de crime de múltipla ação (várias condutas); não importa se o agente praticou uma única ou várias condutas ao mesmo tempo descritas no tipo penal: responderá por um só delito. É um crime comissivo, já que exige uma ação por parte do agente.

Resultado: Aqui, trata-se de um crime material, pois o efeito lesivo concretiza-se somente com a exteriorização das ações destacadas no tipo -–matar, perseguir, caçar, apanhar ou utilizar. Consuma-se o delito com a prática de qualquer das ações incriminadas.

Sujeito ativo. Qualquer pessoa (física ou jurídica) que não possua a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente para o exercício da caça, da pesca ou da comercialização dos animais silvestres e das respectivas peles e couros, ou se a possuir, utilizá-las em descordo com a lei.

Sujeito passivo. A comunidade, de maneira difusa.

Objeto material. São todos os animais da fauna silvestre pertencentes às espécimes nativas, migratórias e quaisquer outras aquáticas ou terrestres, que tenham todo ou parte de seu ciclo de vida ocorrendo dentro dos limites do território brasileiro, ou águas jurisdicionais brasileiras.

b) Elemento normativo. Os elementos normativos são aqueles que exigem, para a sua compreensão, um determinado juízo de valoração. Podem ser por referência à ilicitude, de natureza cultural, de índole jurídica ou de índole estimativa.

No caso do dispositivo em análise, exige-se a permissão, licença ou autorização da autoridade competente para que a pessoa possa praticar as condutas descritas no caput e nos incisos I e III deste artigo. O órgão competente deverá regulamentar as normas administrativas concernentes à expedição da permissão, licença ou autorização para o exercício da caça, pesca ou comercialização dos animais silvestres e das respectivas peles e couros. Por isso, elemento normativo aqui está relacionado à ilicitude.

c) Elemento pessoal. O elemento pessoal é responsável pela ligação do fato a um determinado agente. Essa ligação poderá se dar a título de dolo ou culpa strito senso. No caso, a ligação se dará a título de dolo genérico.

O § 4º e 5º do artigo em análise, dispõe sobre as causas de diminuição e aumento da pena, sendo que será aumentada de metade, se o crime for praticado contra espécie rara ou considerada ameaçada de extinção, ainda que somente no local da infração; em período proibido à caça; durante a noite; com abuso de licença; em unidade de conservação; com emprego de métodos ou instrumentos capazes de provocar destruição em massa. Será aumentada até o triplo, se o crime decorre do exercício de caça profissional.

O art. 29, caput, por exigir uma atividade do aplicador para a complementação do tipo penal, consiste num tipo de conteúdo aberto.

Em seu § 6º fica determinado que as disposições deste artigo não se aplicarão aos atos de pesca.

Pela descrição típica do art. 29 são inúmeras as condutas que poderiam configurar o delito em questão. Todavia, a análise da tipicidade não pode estar atrelada somente à tipicidade legal. Dentro de um Estado Social Democrático de Direito, a tipicidade deve também relacionar-se à elementos materiais. Melhor dizendo, inúmeras condutas, apesar de se enquadrarem na descrição típica, de fato não ocasionam lesividade ao bem jurídico penalmente tutelado nos delitos ambientais. Por isso, deve o aplicador, para excluir tais condutas da incriminação legal, levar em conta a tipicidade material do delito.

Para que a tipicidade material seja configurada, a proteção do bem jurídico lesionado deve ser essencial (carência da tutela penal), a lesão deve ser significativa ao ponto de provocar uma danosidade social e o bem jurídico lesionado deve ser essencial (dignidade penal dos delitos). Quando não se configura a tipicidade material, diz-se que a conduta será atípica.

Assim foi o entendimento do caso jurisprudencial a) acima transcrito, no qual, pela insignificância da conduta em lesionar o bem jurídico penalmente tutelado, julgou-se improcedente a condenação. Já no caso c), parece que o órgão julgador penal desconsiderou o verificação da tipicidade material. Não parece ser de grande relevância para a proteção do bem jurídico ambiental a conduta de abater um animal, sobretudo, sendo este um animal não ameaçado de extinção. Não parece, no caso, caber os rigores do Direito Penal; apenas seria possível, dentro da concepção funcional-teleológica dos fins do direito penal adotada no presente trabalho, sanções de natureza administrativa.

O caso b) foi mister em elucidar que o delito do art. 29, caput, é um delito de dano e que, por isso, requer, para a sua consumação a lesão efetiva ao bem jurídico penalmente tutelado. Sem essa lesão – o resultado naturalístico – não há que se incriminar a conduta do agente.

4.3.1.2 § 2º do art. 29.

"§ 2º No caso de guarda doméstica de espécie silvestre não considerada ameaçada de extinção, pode o juiz, considerando as circunstâncias, deixar de aplicar a pena".

4.3.1.2.1 Casos jurisprudenciais

a) FAUNA – MANTER AVES SILVESTRES EM CATIVEIRO – ATIPICIDADE.

Leis ns. 5.197/67 e 7.653/88. É atípico o fato de manter aves silvestres em cativeiro, se não há prova de que tenham sido caçadas ou utilizadas ilicitamente. Sentença absolutória mantida. Não é fito típico o mantenimento de aves silvestres em cativeiro, para lazer, bem cuidadas, sem que se prove tenham sido caçadas ou que venham a ser utilizadas ilicitamente (TRF – 3ª Reg., 1ª T., Acrim 91.03.43765-5, rela. Juíza Ramza Tartuce, DJU, 22.03.1994.)

b) CRIME CONTRA A FAUNA – Descaracterização – Agente que mantém em cativeiro aves não ameaçadas de extinção – Ausência de potencialidade lesiva – Hipótese, ademais, em que não demonstrada a destinação comercial – Inteligência da Lei 5.197/67.

O bem protegido pela lei de crimes contra a fauna é o animal silvestre, fora do cativeiro, tendo em vista a preservação das espécies nativas. Assim, não pratica crime previsto na Lei 5.197/67, por não apresentar potencialidade lesiva, o agente que mantém em cativeiro aves não ameaçadas de extinção, mormente quando não demonstrada a destinação comercial. (TRF – 4ª Reg. Ap. 96.04.15529-6/PR – 2ª T. j. 11.12.1997 – rela. Juíza Tania Escobar – DJU 11.02.1998.

c) PROCESSO PENAL. Recurso em sentido estrito. Rejeição da denúncia. Crime contra a fauna. Manutenção em cativeiro de espécime pertencente à fauna silvestre nacional para simples deleite. Ausência de finalidade de comércio: indiferente penal. Infração administrativa. Art. 9º da Lei 5.197/67. Recurso improvido. (TRF – 3ª Reg. Rcrim. 96.03.038304-4/SP - 1ª T. j. 21.07.1998 – rel. Juiz Theotônio Costa).

4.3.1.2.2 Comentários:

No caso, aplica-se o disposto no § 2º do art. 29, que trata da guarda doméstica de espécie silvestre não considerada ameaçada de extinção. O juiz poderá deixar de aplicar a pena, pela insignificância da conduta em lesar o bem jurídico fauna.

Assim, o § 2º do art. 2º trata de uma excludente da ilicitude penal.

Os casos jurisprudenciais acima transcritos bem elucidam a ocorrência dessa excludente.

4.3.1.3 Art. 32.

"Praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos:

Pena – detenção, de três meses a um ano, e multa".

4.3.1.3.1 Casos jurisprudenciais

a) MEIO AMBIENTE. Crueldade a animais. "Farra do boi". Alegação de que se trata de manifestação cultural. Inadmissibilidade. Aplicação do art. 225, § 1º, VII, da CF.

A obrigação de o Estado garantir a todos o pleno exercício de direitos culturais, incentivando a valorização e a difusão das manifestações, não prescinde da observância da norma do art. 225, § 1º, VII, da CF, que veda prática que acabe por submeter os animais à crueldade, como é o caso da conhecida "farra do boi". (RE 153.531-8/SC – 2ª T. – STF – j. 03.06.1997 – redator p/ acórdão Min. Marco Aurélio – DJU 13.03.1998).

4.3.1.3.2 Comentários.

a) Elementos descritivos objetivos :

Bem jurídico tutelado. É a preservação do patrimônio natural, especialmente os da fauna silvestre, ameaçada ou não de extinção contra abusos e maus tratos. É um crime de dano.

Núcleo do tipo: praticar, ferir e mutilar. A conduta punível é a de praticar ato de abuso, maus tratos, ferir ou mutilar. Cuida-se de crime de múltipla ação. É um tipo comissivo.

Resultado: Trata-se de um crime material.

Sujeito ativo. Qualquer pessoa

Sujeito passivo. A comunidade, de maneira difusa.

Objeto material. São as espécies da fauna silvestre, domésticas e domesticadas, nativas ou exóticas.

d) Elemento pessoal. Admite-se apenas a modalidade dolosa, sendo o dolo de forma genérica.

4.3.1.4. Art. 34, II

"Pescar em período no qual a pesca seja proibida ou em lugares interditados por órgão competente:

Pena – detenção de um ano a três anos ou multa, ou ambas as penas cumulativamente."

Parágrafo único. Incorre nas mesmas penas quem:

(...)

II – pesca quantidades superiores às permitidas, ou mediante a utilização de aparelhos, petrechos, técnicas e métodos não permitidos;"

4.3.1.4.1 Casos jurisprudenciais.

a) FAUNA – Pesca predatória – Inocorrência de dano ao meio ambiente – Infração administrativa.

A prática de pesca com a utilização de rede de malhas não permitida administrativamente não configura crime previsto no art. 15 da Lei n. 6938/81, e sim, em caso de reincidência, contravenção. Ademais, a pesca penalizada não trouxe dano ao meio ambiente, não havendo provas de que se poderia criar uma situação de perigo ao ecossistema (TJ- MS - 1ª T., Acrim 46.262-6, rel. Des. Rui Garcia Dias, j. 11.06.1996).

b) CRIME CONTRA O MEIO AMBIENTE. Pesca predatória – Descaracterização – Pesca mediante o uso de redes – Inutilização de substância explosiva ou tóxica – Hipótese de mera infração administrativa – Interpretação dos arts. 15, caput, da Lei 6.938/81, e 34 e 35 da Lei 9.605/98.

Somente se considera pesca predatória aquela feita com a utilização de substância explosiva ou tóxica, assim, por não representar dano ao meio ambiente ou situação de perigo ao ecossistema, a pesca mediante o uso de redes não constitui crime, seja o tipificado no art. 15, caput, da Lei 6.938/81, sejam os tipificados nos arts. 34 e 35 da Lei 9.605/98, tratando-se, assim, de mera infração administrativa. (TJMS – SER 62.218-8 – 2ª T. – j. 02.12.1998 – rel. Des. Carlos Stephanini.).

4.3.1.4.2 Comentários.

a) Elementos descritivos objetivos :

Bem jurídico tutelado. É a preservação do patrimônio natural, especialmente os da fauna aquática (cetáceos, peixes, crustáceos), nos períodos considerados proibidos em lugares interditados. Trata-se de um crime de perigo concreto, pois conduzem a uma potencialidade de lesão ao bem jurídico fauna, realizável ou não, em concreto, sendo que esse perigo deve ser constatado processualmente.

Núcleo do tipo: pescar. A conduta punível é a de pescar nos períodos considerados proibidos ou em lugares interditados. Cuida-se de crime de uma única ação. É um tipo comissivo.

Resultado: Trata-se de um crime formal.

Sujeito ativo. Qualquer pessoa

Sujeito passivo. A comunidade, de maneira difusa.

Objeto material. São as espécies da fauna aquática em época de reprodução.

b) Elementos descritivos circunstanciais de meio: São os instrumentos propriamente dito para a realização do delito, quais sejam, aparelhos, petrechos, técnicas e métodos não permitidos.

c) Elemento normativo. Exige-se que a pesca não seja realizada em quantidade superior à permitida. Trata-se, portanto, de um elemento normativo com referência à ilicitude. O aplicador também deverá verificar se o instrumento utilizado é método de pesca não permitido. Também, aqui trata-se de um elemento normativo com referência à ilicitude.

d) Elemento pessoal. Admite-se apenas a modalidade dolosa, sendo o dolo de forma genérica.

No caso a) o julgador referiu-se à não ocorrência do dano para a considerar atípica a conduta. Quando ele se refere a ocorrência do dano, não quer dizer que seja um crime de dano. É um crime de perigo. Mas, como é de perigo concreto, a realização do tipo exige constatação, caso a caso, de perigo real, paupável, mensurável de lesão ou exposição a perigo do bem jurídico penalmente tutelado. Pela ementa do julgado, percebe-se que fica descaracterizado o delito pela não ocorrência de potencial perigo para o bem jurídico protegido. Acertou, assim o julgador.

Já no caso b) também acertou o julgador, pois, para a ocorrência do delito, o aplicador da norma penal deve analisar o elemento normativo com referência à ilicitude do material ou instrumento utilizado. Trata-se de uma norma penal em branco que deverá ser complementada pelo dispositivo legal ou ato administrativo que dispõe sobre quais os métodos e instrumentos são proibidos.

4.3.2. Crimes contra a flora.

Aos crimes contra a flora (Seção II do Capítulo V) o legislador reservou quinze artigos, tipificando condutas delituosas praticadas contra as unidades de conservação, abrangendo aí as reservas biológicas, reservas ecológicas, estações ecológicas, parques nacionais, estaduais e municipais, florestas nacionais, estaduais e municipais, áreas de proteção ambiental, áreas de relevante interesse ecológico e reservas extrativistas ou outras a serem criadas pelo Poder Público (art. 40, § 1º, da Lei ). Somente os arts. 38, 39, 40, 41, 42, 44, 45, 46, 48, 49, 50, 51 e 52 tipificam as condutas delituosas.

As penas dos arts. 44, 46, 48, 49, 50, 51 e 52 não ultrapassam um ano de detenção. Aplicável, nessas hipóteses, o instituto da transaçãopenal, previsto no art. 76 da Lei 9.099/95. Os arts. 38, 39, 40, 42 e 45 têm penas mínimas de um ano. Aplica-se, nesses casos, o instituto da suspensão penal, previsto no art. 89 da Lei 9.099/95.

Por flora entende-se o conjunto das plantas de uma região, de um país ou de um continente. Denomina-se diversidade biológica ou biodiversidade "a variabilidade de organismos vivos de todas as origens e os complexos ecológicos de que fazem parte: compreendendo ainda a diversidade dentro de espécies, entre espécies e ecossistema" [42].

Há que se ressaltar, ainda, que todas as infrações penais previstas na Lei n. 4.771, de 15 de setembro de 1965, alteradas pelas Leis n. 7.803/89 e 7.875/89, foram revogadas, exceto as alíneas e, j, l e m do art. 26 da mencionada lei.

4.3.2.1 Art. 38

"Destruir ou danificar floresta considerada de preservação permanente, mesmo que em formação, ou utilizá-la com infringência das normas de proteção:

Pena – detenção, de um a três anos, ou multa, ou ambas as penas cumulativamente.

Parágrafo único. Se o crime for culposo, a pena será reduzida à metade."

4.3.2.1.1 Casos jurisprudenciais.

a) FLORA – Derrubada de árvores e outras formas de vegetação da mata atlântica – Caracterização.

A derrubada de árvores e outras formas de vegetação em área de preservação permanente, como, por exemplo, as da mata atlântica, localizadas em topo de morro, por presunção legal absoluta, configura o ilícito contravencional previsto no art. 26, a, da Lei n. 4.771/65 (TaCrim - 4ª Câm., Acrim 774.793/7 – SP, j. 22-2-1994 – RJDTACrimSP, 21:105).

b) FLORA – Desmatamento em área de preservação ambiental – Erro de proibição – Absolvição.

Inexistência de querer realizar a conduta punível, tratando-se de pessoas extremamente modestas, de pouca escolaridade. Habitualidade em realizar pequena derrubada para plantio, vez que sobreviviam deste. Inteligência do art. 20, § 1º, 1ª parte do CP (TRF - 8ª Câm., Acrim 949.431/5, rel. Juiz Bento Mascarenhas, j. 6.06.1995).

4.3.2.1.2 Comentários

a) Elementos descritivos objetivos :

Bem jurídico tutelado. É a preservação do patrimônio natural, especialmente da flora. É crime material.

Núcleo do tipo: São três os verbos núcleos do tipo em análise, quais sejam, destruir, danificar ou utilizar. Cuida-se de crime de múltipla ação (várias condutas); não importa se o agente praticou uma única ou várias condutas ao mesmo tempo descritas no tipo penal: responderá por um só delito. É um crime comissivo, exigindo uma ação por parte do agente.

Resultado: Aqui, trata-se de um crime de dano, pois o efeito lesivo concretiza-se com a exteriorização das ações destacadas no tipo. Consuma-se o delito com a prática de qualquer das ações incriminadas.

Sujeito ativo. Qualquer pessoa (física ou jurídica).

Sujeito passivo. A comunidade, de maneira difusa.

Objeto material. É a floresta considerada de preservação permanente, mesmo se em formação.

b) Elemento normativo.

Exige-se a autorização para eventual destruição da floresta para fins de utilidade pública. É, portanto, um elemento normativo com referência à ilicitude.

Há também o elemento normativo de índole jurídica, quando trata "considerada de preservação permanente.

c) Elemento pessoal. Dolo genérico. Aqui admite-se o crime na modalidade culposa.

4.3.2.2 Art. 42

"Fabricar, vender, transportar ou soltar balões que possam provocar incêndios nas florestas e demais formas de vegetação, em áreas urbanas ou qualquer tipo de assentamento humano:

Pena – detenção de um a três anos ou multa, ou ambas as penas cumulativamente."

4.3.2.2.1Casos jurisprudenciais.

a) FLORA – Agentes que transportam balão que tem o potencial de provocar incêndios em florestas – Caracterização.

O simples transporte de balão de grande porte, apto a causar incêndio em florestas e outras formas de vegetação, caracteriza a contravenção florestal do art. 26, f, da Lei n. 4.771/65 (TaCrim – 15ª Câm., Acrim 856.619/7 – SP, RJDTACrimSP, 23:106).

4.3.2.2.2 Comentários.

a) Elementos descritivos objetivos :

Bem jurídico tutelado. É a preservação do patrimônio natural, especialmente da flora. É crime de perigo abstrato, ou melhor, os balões devem ter real potencialidade de expor a perigo ou lesionar o bem jurídico tutelado.

Núcleo do tipo: São quatro os verbos núcleos do tipo em análise, quais sejam, fabricar, vender, transportar ou soltar balões. Cuida-se de crime de múltipla ação (várias condutas); não importa se o agente praticou uma única ou várias condutas ao mesmo tempo descritas no tipo penal: responderá por um só delito.

Resultado: Aqui, trata-se de um crime formal.

Sujeito ativo. Qualquer pessoa (física ou jurídica)

Sujeito passivo. A comunidade, de maneira difusa.

Objeto material. São as florestas e as demais formas de vegetação..

b) Elemento circunstancial de meio: balões, que consubstancia-se no instrumento propriamente dito para a realização do delito.

c) Elemento normativo. Encontra-se nesse dispositivo um elemento normativo de índole estimativa, qual seja, "possa provocar incêndio", já que o juízo deverá realizar um juízo de valoração para verificar a potencialidade da conduta do agente em expor a perigo ou lesionar o bem jurídico flora.

d) Elemento pessoal. Dolo genérico.

Há uma discussão doutrinária a respeito de se o tipo é formal ou de mera conduta. O crime formal, já foi delineado suas características. Já o crime de mera conduta são aqueles em que a ação ou a omissão bastam para constituir o elemento material da figura típica penal. A razão de punir tais condutas é de ordem preventiva: "a inidoneidade dessa conduta basta para torná-la objeto de reprovação, por parte do legislador, em face da presunção de dano ou de perigo, sendo indiferente que chegue, ou não, a produzir qualquer resultado" [43].

A conduta de soltar balões, por si, é uma conduta reprovável, pela presunção de dano ou perigo ao bem jurídico. Todavia, faz-se necessário que o balão seja potencialmente capaz de criar essa presunção. Assim, melhor é entendimento de que o crime em tela é formal, de perigo concreto, devendo-se averiguar, caso a caso, a potencial danosidade da conduta.

4.3.2.3 Art. 48

"Impedir ou dificultar a regeneração natural de florestas e demais formas de vegetação:

Pena – detenção, de seis meses a um ano, e multa."

4.3.2.3.1 Casos jurisprudenciais.

a) FLORA – Impedir ou dificultar a regeneração natural de florestas e demais formas de vegetação – Norma penal em branco – Erro de tipo caracterizado – Absolvição decretada.

O agente que acredita que a restrição às práticas agrícolas se limita a uma distância de 30 metros das margens da represa, quando a lei considera como imune de corte a vegetação situada a menos de 100 metros dos reservatórios, incide em erro relativo ao aspecto da norma complementar da lei penal em branco, a qual faz parte do tipo, assim caracterizado fica o erro de tipo e consequentemente excluído o dolo (TaCrim – SP – 7ª Câm., Acrim 1.043.053-2-SP, j. 27-2-1997, RJ, 243:115).

4.3.2.3.2 Comentários.

a) Elementos descritivos objetivos :

Bem jurídico tutelado. É a preservação do patrimônio natural, especialmente da flora. Trata-se de um crime de dano.

Núcleo do tipo: Impedir ou dificultar.. Cuida-se de crime de múltipla ação.

Resultado: Aqui, trata-se de um crime material, pois o efeito lesivo concretiza-se com a exteriorização das ações destacadas no tipo. Consuma-se o delito com a prática de qualquer das ações incriminadas.

Sujeito ativo. Qualquer pessoa (física ou jurídica).

Sujeito passivo. A comunidade, de maneira difusa.

Objeto material. É regeneração natural de florestas e demais formas de vegetação.

b) Elemento subjetivo. Impedir ou dificultar, pressupõe determinadas finalidade do agente.

c) Elemento pessoal. Dolo genérico.

4.3.3 Poluição e outros crimes ambientais

Aos crimes da Seção III do Capítulo V, o legislador reservou oito artigos, em que são descritas as condutas delituosas praticadas contra aqueles que causem poluição, entre outros crimes ambientais. Os arts. 54, 55, 56, 60 e 61 tipificam as condutas delituosas. As penas dos arts. 54, § 1º, 55, 56, § 3º, e 60 não ultrapassam um ano de detenção. Aplicável, pois, o instituto da transação penal, previsto no art. 76 da Lei n. 9.099/95. Os arts. 54, caput e § 2º, 56 caput e 61 têm penas mínimas de um ano. Aplica-se, assim, o instituto da suspensão do processo, previsto no art. 89 da Lei 9.099/95. O art. 58 arrola as causas de aumento de pena aplicáveis aos crimes em questão.

Essa lei revogou o art. 15 da Lei n. 6.938/81, alterada pela Lei 7.804/89, que dispunha sobre a política nacional do meio ambiente. Contudo, as contravenções penais previstas nos arts. 38 e 42 não foram revogados pela nova lei.

4.3.3.1 Art. 54, III

III - Causar poluição hídrica que torne necessária a interrupção do abastecimento público de água de uma comunidade;

4.3.3.1.1Casos jurisprudenciais.

a) POLUIÇÃO – Poluição de água potável – Configuração – Ausência de prova da potabilidade e utilização da água pela população local.

Falta elemento objetivo integrante do tipo. Para a configuração do crime do art. 271 do CP, necessária se faz a prova da potabilidade da água e sua utilização, antes de poluída ou corrompida. Sem provas da existência dos elementos objetivos integrantes do tipo, impõe-se decisão absolutória. (TRF – 3ª Reg., 2ª T., Acrim 94.03.73128-1-SP, rela. Juíza Sylvia Steiner, DJU, 13.12.1995).

b) CRIME CONTRA O MEIO AMBIENTE – Poluição do Rio Parnaíba – Violação ao art. 15 da Lei 6.938/81, com a redação dada pela Lei 7.804/89.

Comete o crime previsto no art. 15 da Lei 6938, de 31.08.1981, alterado pela Lei 7804, de 18.07.1989, o proprietário de curtume que lança no rio matérias orgânicas putrefactas, matérias não biodegradáveis, substâncias tóxicas, poluindo-o, criando, assim, uma situação de perigo para a vida humana, animal e vegetal (TRF – 1ª Reg., 3ª T., Ap. 95.01.11586-0-PI, j. 25-3-1996, rel. Juiz Tourinho Neto, DJU, 18 abr. 1996, RT, 729:651).

4.3.3.1.2 Comentários.

a) Elementos descritivos objetivos :

Bem jurídico tutelado. É a preservação do patrimônio natural e a qualidade de vida do ser humano, da fauna, da flora, do solo, do ar e das águas. Aqui, trata-se de um crime de dano, pois o efeito lesivo concretiza-se com a exteriorização da ação destacada no tipo.

Núcleo do tipo: causar poluição hídrica.

Resultado: Consuma-se o delito com a prática da ação incriminada. É crime material, portanto.

Sujeito ativo. Qualquer pessoa (física ou jurídica).

Sujeito passivo. A comunidade, de maneira difusa.

Objeto material. É a saúde humana e as águas.

c) Elemento normativo. De índole estimativa, pois deve tornar necessária a interrupção do abastecimento público de água de uma comunidade.

d) Elemento pessoal. Dolo genérico.

4.3.3.2 Art. 56, § 2º

"Produzir, processar, embalar, importar, exportar, comercializar, fornecer, transportar, armazenar, guardar, ter em depósito ou usar produto ou substância tóxica, perigosa ou nociva à saúde humana ou ao meio ambiente, em desacordo com as exigências estabelecidas em leis ou nos seus regulamentos:

(...)

§ 2º Se o produto ou a substância for nuclear ou radioativa, a pena é aumentada de um sexto a um terço."

4.3.3.2.1 Casos jurisprudenciais

a) POLUIÇÃO – Abandono de substância radioativa – Césio – 137 – Negligência da clínica – Crime caracterizado.

É responsabilizado penalmente, a título de crime culposo, o profissional (médico e físico hospitalar) que, atuando no ramo da medicina nuclear, e ciente dos riscos dos equipamentos operados nessa atividade (clínica de radioterapia) resolve deixar equipamento radiológico em prédio abandonado, sem comunicação aos órgãos competentes, com isso ensejando a sua manipulação por pessoas do povo (comerciantes de ferro-velho) e sua contaminação por material radioativo (Césio-137), causando-lhes graves danos – mortes e lesões coporais (TRF – 1ª Reg., 3 T., Acrim 93.01.03115-9-GO, rel. Juiz Olindo Menezes).

4.3.3.2.2 Comentários.

a) Elementos descritivos objetivos :

Bem jurídico tutelado. É a preservação do patrimônio natural. É um crime de dano.

Núcleo do tipo: São doze os verbos núcleos do tipo em análise, quais sejam, produzir, processar, embalar, importar, exportar, comercializar, fornecer, transportar, armazenar, guardar, ter em depósito e usar. Cuida-se de crime de múltipla ação (várias condutas); não importa se o agente praticou uma única ou várias condutas ao mesmo tempo descritas no tipo penal: responderá por um só delito. É crime comissivo.

Resultado: Aqui, trata-se de um crime material.

Sujeito ativo. Qualquer pessoa (física ou jurídica).

Sujeito passivo. A comunidade, de maneira difusa.

Objeto material. É a saúde humana e o meio ambiente. Inclui-se também aqui o meio ambiente do trabalho, de modo a proteger todos os funcionários que trabalham em contato com substâncias tóxicas.

b). Elemento normativo. Com referência à ilicitude: "em desacordo com as exigências estabelecidas em leis e nos seus regulamentos".

Também traz elemento normativo de índole jurídica, ao dizer: "perigosa ou nociva à saúde humana ou ao meio ambiente".

c) Elemento pessoal. Dolo genérico. Também admite-se aqui a modalidade culposa.

4.3.4. Crimes contra o ordenamento urbano e o patrimônio cultural.

Na seção IV do Capítulo V, o legislador reservou quatro artigos para os crimes contra o ordenamento urbano (arts. 64 e 65) e o patrimônio cultural (arts. 62 e 63), tipificando condutas delituosas praticadas contra bem público. Todos os artigos tipificam condutas delituosas (arts. 62, 63, 64 e 65). As penas dos arts. 64 e 65 não ultrapassam um ano de detenção, aplicando-se o instituto da transaçãopenal, previsto no art. 76 da Lei 9.099/95. Já os arts. 62 e 63 têm penas mínimas de um ano de reclusão, aplicando-se o instituto da suspensão do processo, previsto no art. 89 da Lei 9.099/95.

4.3.4.1 Art. 62

"Destruir, inutilizar ou deteriorar:

I – bem especialmente protegido por lei, ato administrativo ou decisão judicial;

II – arquivo, registro, museu, biblioteca, pinacoteca, instalação científica ou similar protegido por lei, ato administrativo ou decisão judicial:

Pena – reclusão, de um a três anos, e multa.

Parágrafo único. Se o crime for culposo, a pena é de seis meses a um ano de detenção, sem prejuízo da multa."

4.3.4.1.1 Casos jurisprudenciais

a) Patrimônio Cultura – Crime de dano – Perícia indispensável – Não caracterizado o crime de dano.

Patrimônio da União. Sítio arqueológico. Art. 20, X, e Lei n. 3.924/61. Inexistência de prova das pinturas rupestres e de seu valor histórico ou arqueológico. Provimento da apelação. Conquanto os sítios arqueológicos constituam patrimônio da União Federal, conforme art. 20, X, da CF, e sua destruição configure o delito do art. 163 do CP, indispensável a comprovação de seu valor histórico e arqueológico. Não comprovada por perícia técnica, extremamente falha, a existência de pinturas rupestres, e ainda o seu valor arqueológico, pelo que sua destruição não caracteriza o crime de dano contra o patrimônio da União Federal (TRF – 1ª Reg., 3ª T., Acrim 94.01.03974-7-MG, rel. Juiz Osmar Tognolo, DJU, 10.08.1995).

b) Patrimônio cultural – Crime de dano – Ausência de dolo – Impunível a conduta culposa – Absolvição decretada.

Lei n. 3.924/61. Crime contra o patrimônio nacional. Art. 163, do CP, ausência de dolo. Impunível a conduta culposa. Absolvição pelo inc. VI, do art. 386, do CPP. Incabível o reconhecimento de dolo eventual quando o agente desconhecia o bem jurídico protegido, condição que afasta a realização do tipo penal denunciado. O delito de dano exige a consciência e a vontade de destruir, restando impunível a conduta culposa. A prova judicializada não contém elementos para demonstrar que o acusado conhecia a existência de sítio arqueológico no local das obras sob sua responsabilidade. A inexistência de marcos visuais conforta as alegações do réu. Solução absolutória que se impõe ( TRF – 4ª Reg., 1ª S., Acrim 95.04.17622-4-RS, rela. Juíza Tania Escobar, DJU, 5.06.1996).

c) Crime contra o patrimônio histórico – Tombamento provisório e definitivo – Efeitos penais.

Tendo sido previamente notificados, o proprietário, o Prefeito e a autoridade policial, pelo CONDEPHAAT, do seu interesse em preservar o imóvel, e, estando estes cientes da existência de um processo para o seu tombamento, a derrubada do prédio, a alteração de local já tombado, representa crime, pelo menos em tese.

A inexistência de dolo, a responsabilidade do infrator (ou de terceiros), o exame de eventuais justificativas da culpa ou da presença de dirimentes, tudo isso demanda um aprofundado exame do mérito, impossível de ser apreciado nos estreitos âmbitos do habeas corpus.

Se para todos os efeitos, o tombamento provisório é equiparado ao definitivo, parece que também o será para efeitos penais. O contrário, aliás, seria incentivar, muitas vezes, o proprietário de coisa durante o processo de tombamento a danificá-la parcialmente, tirando, por exemplo, seu valor histórico, sem grave dado para o valor material a fim de furtá-lo ao tombamento. (JTACrimSP, 91:162).

4.3.4.1.2 Comentários.

a). Elementos descritivos objetivos :

Bem jurídico tutelado. É a preservação do patrimônio cultural. Trata-se de um crime de dano, pois o efeito lesivo concretiza-se com a exteriorização das ações destacadas no tipo – destruir, inutilizar ou deteriorar.

Núcleo do tipo: Destruir, inutilizar ou deteriorar. Cuida-se de crime de múltipla ação (várias condutas); não importa se o agente praticou uma única ou várias condutas ao mesmo tempo descritas no tipo penal: responderá por um só delito.

Resultado: É delito instantâneo, que se consuma com a prática de qualquer das ações incriminadas. É crime material.

Sujeito ativo. Qualquer pessoa (física ou jurídica).

Sujeito passivo. A comunidade, de maneira difusa.

Objeto material. Pelo inciso I, é qualquer bem que tenha proteção por seu valor cultural através de lei específica, ato administrativo, onde estão incluídos o tombamento provisório e definitivo, além de outras formas de acautelamento, ou decisão judicial. Pelo inciso II, é arquivos, o registro, o museu, a biblioteca, a pinacoteca, a instalação científica ou similares, desde que seja protegido por lei, por ato administrativo, ou decisão judicial.

b) Elemento normativo. De índole jurídica: bem especialmente protegido por lei, ato administrativo ou decisão judicial.

c) Elemento pessoal. O crime do art. 62 e incisos é punido a título de dolo. Admite-se também a forma culposa, pelo parágrafo único do art. 62, quando a destruição, inutilização ou deterioração do bem resultar de negligência, imprudência ou imperícia do agente.

4.3.5 Crimes contra a administração ambiental

Na seção V do Capítulo V, o legislador reservou quatro artigos para os crimes contra a administração ambiental, tipificando condutas delituosas praticadas por funcionário público e por particular. Todos os quatro artigos tipificam crimes e estipulam sanções penais. As penas dos arts 66, 67, 68 e 69 têm penas mínimas de um ano de reclusão e detenção. Portanto, nesta Seção, aplica-se somente o instituto da suspensão do processo, previsto no art. 89 da Lei n. 9.099/95, com exceção do parágrafo único do art. 67 e do parágrafo único do art. 68 da Lei ambiental, cujas penas são de três meses a um ano, sem prejuízo da multa, se o crime for de natureza culposa. Nesses casos, aplica-se o instituto da transação penal, previsto no art. 76 da Lei n. 9.099/95.

Os dois primeiros artigos cuidam de crimes praticados por funcionário público, e os dois últimos, por particulares contra a administração pública ambiental. O legislador resolveu punir mais severamente o funcionário público do que o particular, agravando a pena daquele.

Antes do advento desta lei, o funcionário público e o particular respondiam pelas infrações penais previstas no Código Penal, cujos delitos encontram correspondência nos arts. 328 e s. do Código Penal (tratam dos crimes praticados por particular contra a administração em geral) e nos arts. 312 e s. do mosmo Codex (cuidam dos crimes praticados por funcionário público contra a dministração em geral). Com a criação da nova Lei ambiental, aplica-se o Código Penal subsidiariamente.

4.3.5.1 Art. 68.

"Deixar, aquele que tiver o dever legal ou contratual de fazê-lo, de cumprir obrigação de relevante interesse ambiental.

Pena – detenção, de um a três anos, e multa."

4.3.5.1.1Casos jurisprudenciais

a) CRIME ECOLÓGICO.

Resulta caracterizado o crime ecológico definido no art. 15 da Lei 6938/81, com a redação emprestada pela Lei 7804/89, o fato de depositar lixo doméstico na cidade a céu aberto, em local declarado por lei local área especial de preservação manancial. O crime ecológico é crime de perigo, funcionando o dano efetivo, representado pela lesão corporal grave ou pelo dano irresistível à flora ou ao meio ambiente, como causa de especial aumento de pena.

O recolhimento diário do lixo da cidade em local proibido, alimentando o mesmo agente poluidor, caracteriza um crime permanente e não concurso material de delitos ou a continuidade delitiva.

Extinto o valor referencial da multa, prevista no art. 15 da Lei 6.938/81, a pena pecuniária deve ser estabelecida com apoio na regra geral prevista no art. 49 do CP.

(TJRS – PC 694.122.680 – 4ª Cam. Crim. – j. 26.11.1996 – rel Des. Vladmir Giacomuzzi).

b) CRIME ECOLÓGICO.

Merece censura penal, de acordo com o prescrito no art. 15 da Lei n. 6.938/81, o administrador municipal que, recalcitrante às determinações dos órgãos competentes deorientação e fiscalização do meio ambiente se recusa a fazer cessar a atividade poluidora executada pelo setor da limpeza e consistente em depositar o lixo sólido da cidade em local não-licenciado e de preservação permanente.(TJRS – 4ª Câm. ProcCrim. 693153827. Revista de Jurisprudência do TJRGS 193/456)

c) PREFEITO. Poluição causada por depósito de lixo.

Não resultando demonstrado que o chorume contaminou significativamente o lençol freático ou outro manancial d’ água superficial, não se configura o delito tipificado no art. 15 da Lei 6938/81, o que só ocorre quando a poluição é em níveis tais, a ponto de poder causar danos à saúde humana, provocar a mortandade de animais ou a destruição significativa da flora, conforme os termos da nova lei ambiental, que buscou esclarecer aspectos controvertidos do diploma antigo. Ação improcedente, com a absolvição dos acusados. (Revista de jurisprudência do TJRGS 193/878).

4.3.5.1.2 Comentários.

a). Elementos descritivos objetivos :

Bem jurídico tutelado. É a administração ambiental.

Núcleo do tipo: Deixar de cumprir. Conduta, portanto, comissiva por omissão.

Resultado: Aqui, trata-se de mera conduta.

Sujeito ativo. Qualquer pessoa que tiver o dever legal ou contratual de cumprir a obrigação. Pode ser funcionário público ou particular.

Sujeito passivo. A comunidade, de maneira difusa.

Objeto material. Não há.

Consumação: Consuma-se o delito com a omissão, quando o agente tinha a obrigação de agir por dever legal ou contratual.

b) Elemento normativo. Com referência à ilicitude: de cumprir obrigação de relevante interesse ambiental.

c) Elemento pessoal. Dolo genérico. Também se admite a forma culposa.

Nos casos jurisprudenciais supra citados, o dever legal dos prefeitos municipais de cumprir obrigação de relevante interesse ambiental está relacionado à necessidade de impedir que o lixo das cidades sejam depositados em lugares impróprios.


Conclusões

1. O bem jurídico penalmente tutelado, considerando-se os delitos ambientais, consubstancia-se no equilíbrio ecológico, relacionando-o à vida e à saúde pública.

2. A acentuação do caráter de ultima ratio da norma penal, reservando o direito penal àquelas condutas mais graves, deixa à atuação primária em matéria de controle, autorização e limites à administração, com as suas respectivas sanções. Somente quando as sanções administrativas e civis forem insuficiente para a proteção do bem jurídico meio ambiente, é que deverá atuar o Direito Penal. As técnicas da lei penal em branco e do reenvio não significam delegação da determinação da matéria proibida à autoridade administrativa ou a autoridades de competência inferior. O Direito penal necessita de tais técnicas, já que ele não seria capaz, sozinho, de abranger todos os elementos do delito.

3. O Direito penal deverá utilizar-se das técnicas de reenvio e da norma penal em branco, pelo próprio caráter do conteúdo dos tipos penais ambientais. Que são volúveis. Os chamados crimes de perigo abstrato são rechaçados, dando-se preferência aos delitos de perigo concreto, em que o risco deve ser provado em cada caso concreto.

4. A responsabilidade penal da pessoa jurídica pode ser admitida no ordenamento brasileiro, apesar de inúmeros problemas relacionados à matéria, pricnipalmente no que cabe à culpabilidade da pessoa jurídica.

5. Sempre será prioritária a utilização das chamadas penas alternativas ou substitutivas da pena de prisão, com a imposição de condutas reparatórias ambientais ou de vítimas, sem prejuízo das sanções administrativas ou civis.


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Notas

1. Winfried Hassemer, assevera que: "Problemas ambientais, drogas, criminalidade organizada, economia, tributação, informática, comércio exterior e controle sobre armas bélicas, sobre estas áreas concentra-se hoje a atenção pública; sobre elas aponta-se uma ‘necessidade de providências’; nela realiza-se a complexidade das sociedades modernas e desenvolvidas; delas preferencialmente surgem na luz do dia os problemas de controle desta sociedade. São áreas modernas e delas se encarrega o atual direito penal. Nesta áreas, espera-se a intervenção imediata do Direito Penal, não apenas depois que se tenha verificado a inadequação de outros meios de controle não penais. O venerável princípio da subsidiariedade ou da ultima ratio do Direito Penal visto como sola ratio ou prima ratio na solução social de conflitos: a resposta penal surge para as pessoas responsáveis por estas ;áreas cada vez mais freqüentemente como a primeira, senão a única saída para controlar os problemas" (HASSEMER, Winfried. História das idéias penais na Alemanha do pós-guerra. RBCCriminais, vol. 6, p. 63).

2. SILVA FRANCO, Alberto. Do princípio da mínima intervenção penal ao princípio da máxima intervenção penal. Justiça e democracia, 1996, p. 170.

3. Alberto Silva Franco, sobre o Direito promocional, assevera que por meio dessas infiltrações é posto em xeque o caráter instrumental e garantístico da intervenção penal para atribuir-se ao controle social penal ou uma função puramente promocional ou uma função meramente simbólica. "Essa tomada de posição acarreta uma inflação de figuras criminosas para efeito de evidenciar uma atitude acautelatória do legislador diante das mudanças que se processam, com espantosa velocidade, em nível de convivencialidade social. Esta indvida e antecipada intervenção penal mostra-se de absoluta ineficácia, o que, a final, se traduz numa desmoralização do próprio controle social penal". Op. cit. p. 171.

4. Apud. SILVA FRANCO, Alberto. Op. cit. p. 172.

5. HASSEMER, Op. cit. p. 33.

6. SILVA FRANCO, op. cit. p. 172.

7. SILVA FRANCO, Alberto op. cit. p. 174.

8. MIRANDA RODRIGUES, Anabela. Direito penal do meio ambiente – uma aproximação ao novo Direito Portugês. Revista de Direito ambiental, n. 2, p. 15.

9. MIRANDA RODRIGUES, Anabella. Op. cit. p. 18.

10. MIRANDA RODRIGUES, Anabella. Op. cit. p. 18.

11. Op. cit. p. 32.

12. Op. cit. p. 21.

13. MIRANDA RODRIGUES, Anabela. Op. cit. p. 25.

14. ARIEL DOTTI, René. As bases constitucionais do direito penal democrático. Reforma penal brasileira. 1988,p. 193.

15. FEIJÓO SÁNCHEZ, Bernardo J. Cuestiones basicas sobre la responsabilidad penal de las personas jurídicas, de otras personas morales y de agrupaciones y asociaciones de personas.Bernardo J. Feijóo Sánchez. Revista Brasileira de Ciências Criminais. n. 27, 1999, p. 22

16. Os crimes contra o ambiente no Código Penal Português revisto. Revista de Direito Ambiental., v. 1, 1995, p. 29.

17. FEIJÓO SÁNCHEZ, Bernardo J. Op. cit. p. 32.

18. FIGUEIREDE DIAS, Jorge. Sobre o Estado actual da doutrina do crime. 1ª parte. Revista Brasileira de Ciências Criminais. Número especial de lançamento. pp. 23-52.

19. PROCESSO PENAL. Crime contra a fauna. Lei 5.197/67, art. 1º, da Lei 9605/98, art. 29. Rejeição da denúncia. Princípio da insignificância. Antecedentes do infrator. Juizado especial criminal. Transação. Lei 9099/95, art. 76. Ementa: 1. Não deve o juiz, a pretexto de esclarecer os antecedentes do denunciado, deixar que significativo lapso de tempo passe, possibilitando eventualmente a prescrição, pois o acessório (pesquisa na vida pretérita) não pode sustar o principal ( desenvolvimento regular da ação penal). 2. Nos crimes contra a fauna o juiz deve propiciar ao infrator a possibilidade de transação (Lei 9.099/95, art. 76) e não rejeitar a denúncia atribuindo ao fato insignificância, sem qualquer análise das conseqüências da ação delituosa sobre o ecossistema e a cadeia alimentar. ( ApCrim 1998.04.01.080341-8?RS – 1ª T. TRF 4ª R – j. 06.04.1999 – rel. Juiz Vladmir Freitas).

PENAL. Ambiental. Lei 5197/67, art. 1º, Lei 9605/98. Transação. Lei 9.099/95, art. 76. Ementa: Pela Lei 9605/98 o crime do art. 1º da Lei 5.197/67 passou a ter como pena máxima 1 ano de detenção (Lei 6.905/98, art. 29, III) e, portanto, admite transação (Lei 9.099/95, art. 76). Como a lei penal retroage a favor do réu, converte-se o julgamento em diligência, sem exame da sentença condenatória baseada na lei revogada (Lei 5.197/67, art. 3º ), a fim de que seja tentada a transação.

ApCrim 1999.04.01.003393-9/RS – 1ª T. – TRF 4ª R. – j. 16.03.1999 – rel Juiz Vladmir Freitas.

20. A nova lei ambiental e a Justiça consensual. Boletim IBCCrim n. 65, ed. especial, 1998, p. 4.

21. Cfr. SILVA JÚNIOR, Edison Miguel da. Crimes de trânsito da competência dos juizados especiais criminais. Revista Síntese, 1998, p. 8.

22. PELLEGRINI GRINOVER, Ada. Infrações ambientais de menor potencial ofensivo. Boletim IBCCrim, n. 68, 1998, p. 3.

23. Direito penal e Estado de direito material. Revista de Direito Penal. n. 31, 1982, p. 43.

24. Bem jurídico penal e constituição. 2. ed., 1997, p. 75.

25. Cfr. RIBEIRO LOPES, Mauricio Antonio. Teoria constitucional do Direito Penal. 2000, p. 313.

26. Apud. RIBIERO LOPES, Mauricio Antonio. Op. cit. p. 315.

27. Teoria geral do delito. 1988, p. 51.

28. Op. cit. p. 167.

29. BETTIOL, Giuseppe. Direito Penal. 1977, p. 229-230.

30. PRADO, Luiz Regis. Direito Penal ambiental (problemas fundamentais. 1992, p. 58.

31. Os novos rumos da política criminal. Revista da Ordem dos Advogados, 1983.

32. Apud.. GARCIA, Jorge Amilcar L. El Delito Ecológico: Un nuevo paradigma simbolico del ius puniendi. Revista de Ciencias Penales. n. 3, 1997.

33. REGIS PRADO, Luiz. Bem jurídico penal e Constituição. 1997, p. 65.

34. O Direito ao Meio Ambiente e a Constituição de 1988: Diagnóstico e Perspectivas. Cadernos de Direito Constitucional e Ciência Política n. 4, 1993, p. 84.

35. COSTA JR., Paulo José da. Direito penal ecológico. 1996. p. 61.

36. Canotilho acentua que "Por vezes, estes direitos são chamados direitos de quarta geração. A primeira seria a dos direitos de liberdade, os direitos das revoluções francesas e americanas; a segunda seria a dos direitos democráticos de participação política; a terceira seria a dos direitos sociais e dos trabalhadores; a quarta a dos direitos dos povos. A discussão internacional em torno do problema da autodeterminação, da nova ordem econômica internacional, da participação no patrimônio comum, da nova ordem de informação, acabou por gerar a idéia de direitos de terceira (ou quarta geração): direito à autodeterminação, direito ao patrimônio comum da humanidade, direito a um ambiente saudável e sustentável, direito à comunicação, direito à paz e direito ao desenvolvimento." (GOMES CANOTILHO, J. J. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 1999, p. 362).

37. BOLZAN DE MORAIS, José Luís. Do direito social aos interesses transindividuais. 1996, p.134.

38. BOLZAN DE MORAIS, op. cit. p. 136.

39. BOLZAN DE MORAIS, op. cit. p. 140.

40. A tutela dos interesses difusos no direito constitucional brasileiro. Vox Legis, v. 152.

41. Convenção sobre Diversidade Biológica, art. 2, in Entendendo o meio ambiente, v. 2.

42. PEDRO PIMENTEL, Manoel. Crimes de mera conduta. 1968. p. 92.


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVA, Rodrigo Alves da. A responsabilidade penal por danos ao meio ambiente. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 8, n. 61, 1 jan. 2003. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/3630. Acesso em: 24 abr. 2024.