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A inconstitucionalidade da PEC da maioridade

A inconstitucionalidade da PEC da maioridade

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A nova deliberação na mesma sessão legislativa viola o texto constitucional eivando a matéria de inconstitucionalidade formal.

Consoante amplamente divulgado nos noticiários brasileiros, após a não aprovação, na Câmara dos Deputados, no último dia 30/06, de uma proposta de emenda à Constituição que autorizava a redução da maioridade penal no que concerne a prática de crimes considerados mais graves, a Mesa da aludida Casa, por meio do seu Presidente, colocou em deliberação ontem (01/07) nova proposta, com teor similar ao texto anteriormente rejeitado, embora com algumas alterações. Ocorre, no entanto, que a ordem constitucional brasileira não admite tal espécie de manobra.

Com efeito, dada a natureza condicionada e limitada do Poder Reformador, o próprio legislador constituinte estabeleceu limites e condições sob os quais é possível a alteração da nossa Constituição, caracterizada, dentre outras coisas, pela sua rigidez – que impõe um processo legislativo mais solene e dificultoso para modificação do seu texto do que o previsto para alteração de leis infraconstitucionais –, e pelo seu caráter supremo.

Nesta senda, ao lado dos limites circunstanciais, materiais e temporais ao Poder de Reforma, existem também limites formais que além de dar o tom da rigidez constitucional, resguarda o texto supremo de mudanças repentinas, impensadas ou precipitadas.

Sendo assim, devem ser respeitadas as condições fixadas pela Constituição para iniciativa do processo de emenda (art. 60, I, II, III), o quórum qualificado (art. 60, § 2º), bem como os seus limites materiais, mormente as cláusulas pétreas previstas no art. 60, § 4º da Lei Maior.

Nesta ordem de ideias, prevê o § 5º do artigo 60:

§ 5º A matéria constante de proposta de emenda rejeitada ou havida por prejudicada não pode ser objeto de nova proposta na mesma sessão legislativa.

O texto constitucional é bastante claro. A MATÉRIA constante de proposta de emenda que tenha sido rejeitada, ou considerada prejudicada, NÃO pode ser objeto de nova proposta na mesma sessão legislativa. Vale lembrar que, nos termos do artigo 57 da Constituição, a sessão legislativa consiste no período anual em que os parlamentares se reúnem em Brasília, não se confundindo com legislatura (período de 4 anos em que o Congresso mantem uma mesma composição), nem com as meras sessões, que são as reuniões diárias dos órgãos legislativos.

Observe-se, outrossim, que o texto constitucional impede não apenas que a mesma PEC seja deliberada no mesmo ano em que foi rejeitada, mas veda que a própria MATÉRIA nela constante seja apreciada novamente pelas casas legislativas durante a mesma sessão legislativa, uma vez que já foram rejeitadas. Ou seja, a matéria em si não pode ser posta em discussão novamente, ainda que existam mudanças pontuais no texto não aprovado anteriormente.

Em se tratando de alteração do texto constitucional todo cuidado é pouco, sendo fundamental proteger a Lei maior de mudanças decorrentes de arroubos circunstanciais ou pela formação de uma maioria ocasional dispostos a modificar a ordem constitucional vigente. Tal vedação protege, inclusive, o Parlamentar de se submeter a reiterados constrangimentos, tendo que votar repetidas vezes no mesmo sentido, até que uma determinada parcela mude de opinião e altere o resultado anterior.

Sendo assim, se já existiam calorosas discussões acerca da inconstitucionalidade material desta matéria, por violação de cláusula pétrea, endossa agora a tese da inconstitucionalidade o vício formal que atinge a “PEC da maioridade”, posto que, ainda que aprovada no próximo turno e no Senado Federal, não estará imune à apreciação do Supremo quanto a sua patente inconstitucionalidade.

A guisa de conclusão, vale salientar que esposamos do entendimento de que, no caso em tela, na mesma linha do que ocorre com a proposta de emenda violadora de cláusula pétrea, é possível que qualquer parlamentar impetre Mandado de Segurança perante o STF visando não ser compelido a participar das deliberações acerca de tal projeto. Com efeito, soa evidente o direito subjetivo dos congressistas a não serem constrangidos a participar de processo legislativo que seja contrário ao que estabelece a Constituição, tal como ocorre no caso em espécie.



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