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FGTS: expurgos inflacionários. Correção monetária. Diferenças sobre a multa de 40%. Competência da Justiça do Trabalho.

Responsabilidade do empregador pelo pagamento. Prazo prescricional. Julgados do Egrégio Tribunal Superior do Trabalho

FGTS: expurgos inflacionários. Correção monetária. Diferenças sobre a multa de 40%. Competência da Justiça do Trabalho. Responsabilidade do empregador pelo pagamento. Prazo prescricional. Julgados do Egrégio Tribunal Superior do Trabalho

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O artigo aborda os reflexos de julgamento em que tenha sido favorecido o empregado [que não aderiu à LC nº 110/2001], com o reconhecimento do direito à correção monetária plena dos ativos de sua titularidade, sobre cujo valor tenha sido, em data anterior a tal reconhecimento, calculada a multa fundiária a cargo e sob responsabilidade exclusiva do empregador.

            Propõe-se o presente escrito a abordar os reflexos de julgamento prolatado pela Justiça Federal Comum, em demanda proposta pelo empregado [que não tenha aderido aos termos da Lei Complementar nº. 110/2001] em face do órgão gestor do F.G.T.S., a Caixa Econômica Federal, em que se sagrou favorecido com o reconhecimento do direito à correção monetária plena dos ativos de sua titularidade, sobre cujo valor tenha sido, em data anterior a tal reconhecimento, calculada a multa fundiária a cargo e sob responsabilidade exclusiva do empregador.

            A superveniência da declaração de um tal direito implica chamar-se novamente o empregador a recompor o montante outrora desembolsado, sob pena de locupletamento ilícito, pois que os parágrafos 1º e 3º, da Lei Federal nº. 8.036, de 11.05.1990, impõem ao empregador a responsabilidade exclusiva pelo pagamento da verba, tanto a principal como a meramente acessória (correção monetária), daí remanescer íntegra a obrigação, ainda que o empregado tenha conferido expressa quitação das verbas que lhe foram entregues quando da despedida imotivada.


Órgão Jurisdicional competente: a Justiça do Trabalho

            Interessa à presente exposição o disposto no artigo 114, da Constituição Federal, por prescrever competir à Justiça do Trabalho conciliar e julgar os dissídios individuais e coletivos "entre trabalhadores e empregadores", dissídios esses que possuem seu nascedouro necessariamente na "relação de trabalho". Assim, ante as peculiaridades dos limites traçados pelo próprio texto constitucional, caberá sempre à Justiça Especializada a solução dos conflitos entre empregados e empregadores, sobremodo quando se pretende a condenação do empregador à exata recomposição do valor da multa de 40% do saldo da conta vinculada ao F.G.T.S., tendo como base o julgamento proferido em demanda específica, inaugurada pelo empregado, com tramite perante a Justiça Federal Comum.

            Logo, tem-se que o tema diz com aspectos da "relação de trabalho", tal como inserida no texto do mencionado dispositivo da Constituição Federal, relação esta que vigorou exclusivamente entre empregado e empregador, derivada do "pacto laboral" entabulado entre ambos e que posteriormente se viu rompido sem justa causa, por iniciativa deste último.

            Em recente julgamento proferido pela Colenda 2ª Turma do Egrégio Tribunal Superior do Trabalho afirmou-se a competência da Justiça Especializada quando o debate disser respeito a diferenças incidentes sobre a multa de 40% do F.G.T.S. em decorrência dos expurgos inflacionários ditados por planos governamentais. Eis a Ementa do julgado, no que importa ao tema:

            "EXCEÇÃO DE INCOMPETÊNCIA EM RAZÃO DA MATÉRIA. DIFERENÇAS DA MULTA DE 40% SOBRE OS DEPÓSITOS DO FGTS. EXPURGO INFLACIONÁRIO.

            A competência material é desta Justiça Especializada, porque o objeto da ação não é a correção dos depósitos do FGTS, mas diferenças da multa de 40% paga pela Reclamada quando da rescisão arbitrária do contrato de trabalho. Em se tratando da multa sobre os depósitos do FGTS, inegável tratar-se de matéria decorrente da relação empregatícia..". (Recurso de Revista nº. 124-2002-010-03-00, 2ª Turma, j. 20.08.2003, DJ 12.09.2003, Relator Samuel Correa Leite)

            Dessa forma, o empregado que se tenha adiantado em provocar o Órgão Jurisdicional competente, por meio de ação específica, passou a deter um direito [direito adquirido superveniente do trabalhador], cujos efeitos necessariamente repercutirão no valor da multa de 40% do saldo do F.G.T.S., a cargo exclusivo do empregador, vez que a este competia - como aliás ainda compete - a responsabilidade pelo pagamento da multa fundiária ao empregado, considerada a correta oscilação inflacionária (artigo 18, § 1º, da Lei Federal nº. 8.036/1990).

            Não há dúvida, pois, quanto à competência da Justiça do Trabalho para processar e julgar demandas que envolvam o tema.


Legitimidade passiva ad causam: responsabilidade exclusiva do empregador pelas diferenças pleiteadas

            A responsabilidade do empregador decorre da lei, a mesma que lhe atribuiu a obrigação de satisfazer a multa fundiária ao tempo da dispensa sem justa causa.

            Prescreve o § 1º, do artigo 18, da Lei Federal nº. 8.036/1990, verbis:

            "Na hipótese de despedida pelo empregador sem justa causa, pagará este diretamente ao trabalhador importância igual a 40% (quarenta por cento) do montante de todos os depósitos realizados na conta vinculada durante a vigência do contrato de trabalho, atualizados monetariamente e acrescidos dos respectivos juros." (gn)

            O texto da lei apresenta-se absolutamente claro quanto à figura do responsável pelo pagamento da multa de 40%, cujo fato gerador está estreitamente ligado a ato unilateral do próprio empregador, qual seja, o rompimento do pacto laboral com a despedida sem justa causa do empregado.

            Assim, se o trabalhador - cioso de seus direitos - logra obter em outra demanda, na esfera competente, o reconhecimento judicial, com trânsito em julgado, de que a base de cálculo (o saldo da conta vinculada ao F.G.T.S.) utilizada pelo empregador se mostrava incompleta ao tempo da despedida imotivada, remanesce ao empregador a obrigação de recompor o valor pecuniário da multa de 40% prevista no aludido § 1º, do artigo 18, da Lei Federal nº. 8.036/1990.

            Sobre o tema há inúmeros julgados do Egrégio Tribunal Superior do Trabalho, sendo que num deles, prolatado por sua Colenda 4ª Turma, decidiu-se da seguinte forma:

            "RECURSO DE REVISTA. DIFERENÇA DA MULTA DE 40% SOBRE O FGTS. EXPURGOS INFLACIONÁRIOS. IMPUTAÇÃO DE RESPONSABILIDADE.

            A responsabilidade sobre o depósito da multa fundiária correspondente a quarenta por cento sobre todos os depósitos realizados na conta vinculada do empregado, atualizados e acrescidos de juros é, por imperativo legal - § 1º, do artigo 18, da Lei nº. 8036/90 - do empregador. Ônus que alcança a diferença havida ante os expurgos inflacionários.

            Recurso de revista conhecido e provido." (Recurso de Revista nº. 70-2002-019-03-00, j. 26.02.2003, DJ 14.03.2003, Relatora Juíza Helena Sobral Albuquerque e Mello)

            Outro julgado do Egrégio Tribunal Superior do Trabalho abordou o tema desse modo:

            "...ILEGITIMIDADE PASSIVA ´AD CAUSAM´ DO EMPREGADOR. DIFERENÇAS DA MULTA DE 40% DO FGTS EM RAZÃO DE EXPURGO INFLACIONÁRIO.

            A multa de 40% sobre os depósitos do FGTS representa indenização compensatória, na forma do art. 7º, I, da Constituição Federal de 1988, que trata da proteção da relação de emprego contra despedida arbitrária ou sem justa causa. Assim sendo, é de responsabilidade do empregador. Se a ação tem por objeto diferenças alusivas a esta multa, por certo que deve integrar o pólo passivo da relação processual o empregador, não o órgão gestor dos depósitos sobre os quais incide a multa. Ademais, a clara redação do § 1º do art. 18 da Lei 8.036/90 não deixa dúvidas quanto a caber ao empregador a obrigação do pagamento da multa fundiária, considerado o montante de todos os depósitos realizados na conta vinculada durante a vigência do contrato de trabalho, atualizados monetariamente e acrescidos dos respectivos juros...". (Recurso de Revista nº. 124-2002-010-03-00, 2ª Turma, j. 20.08.2003, DJ 12.09.2003, Relator Juiz Samuel Correa Leite)

            No mesmo sentido:

            "...II.1. ILEGITIMIDADE PASSIVA, DIFERENÇAS DE 40% SOBRE O FGTS. EXPURGOS INFLACIONÁRIOS. RESPONSABILIDADE.

            Pretende a reclamada que seja excluída a sua responsabilidade pelo pagamento de diferenças dos 40% sobre o FGTS, decorrentes dos expurgos inflacionários, direito reconhecido por força de decisão proferida pela Justiça Federal e confirmada pelo Supremo Tribunal Federal.

            Dispõe, entretanto, a Lei nº. 8.036/90:

            Art. 18. Ocorrendo rescisão do contrato de trabalho, por parte do empregador, ficará este obrigado a pagar diretamente ao empregado os valores relativos aos depósitos referentes ao mês de rescisão e ao imediatamente anterior que ainda não houver sido recolhido, sem prejuízo das cominações legais.

            Par. 1º. Na hipótese de despedida pelo empregador sem justa causa, pagará este diretamente ao trabalhador importância igual a 40 (quarenta) por cento) do montante de todos os depósitos realizados na conta vinculada durante a vigência do contrato de trabalho, atualizados monetariamente e acrescidos dos respectivos juros.

            O Decreto nº 90.684/90, que consolidou as normas regulamentares do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS, com alteração introduzida pelo Decreto nº 2.430, por sua vez, estabelece:

            Art. 9º - Ocorrendo despedida sem justa causa, ainda que indireta, com culpa recíproca força maior ou extinção normal do contrato de trabalho a termo, inclusive a do trabalhador temporário, deverá o empregador depositar, na conta vinculada do trabalhador no FGTS, os valores relativos aos depósitos referentes ao mês da rescisão e, ao imediatamente anterior, que ainda não houver sido recolhido, sem prejuízo das cominações legais cabíveis.

            Par. 1º. No caso de despedida sem justa causa, ainda que indireta, o empregador depositará na conta vinculada do trabalhador no FGTS, importância igual a quarenta por cento do montante de todos os depósitos realizados na conta vinculada durante a vigência do contrato de trabalho, atualizados monetariamente e acrescidos dos respectivos juros, não sendo permitida, para este fim a dedução dos saques ocorridos.

            Conforme se observa, os referidos dispositivos evidenciam a responsabilidade do empregador pelo pagamento da multa de 40% sobre os depósitos do FGTS, atualizados monetariamente e acrescidos dos respectivos juros.

            Não se revela, portanto, correta a pretensão de se atribuir à Caixa Econômica Federal, gestora do FGTS, o encargo do pagamento em questão.

            Assim, uma vez reconhecido o direito às diferenças de FGTS, ao empregador, efetivamente, compete a obrigação de pagá-las, nos termos do que reza a Lei nº 8.036/90, que, consoante já mencionado, expressamente afirma ser seu o encargo, quando despede imotivadamente o empregado.

            Eventual ressarcimento, se assim desejar e for o caso, deverá ser objeto de pedido a ser formulado contra o gestor do FGTS...". (Recurso de Revista nº. 80-2002-009-03-00, j. 30.04.2003, DJ 16.05.2003, Relator Ministro Miltou de Moura França)

            Novo julgado do Egrégio Tribunal Superior do Trabalho tece as seguintes considerações:

            "...DIFERENÇAS DE MULTA DE 40% SOBRE OS DEPÓSITOS DO FGTS DECORRENTES DE ERRO DA CEF NO CÔMPUTO DOS SALDOS.

            Com efeito, a melhor exegese extraída do § 1º do artigo 18 da Lei nº 8036/90 é no sentido de que a responsabilidade pelos depósitos da multa de 40% do FGTS - os quais devem ser atualizados e acrescidos de juros - deve ser atribuída, por força de lei, ao empregador. Conquanto a diferença seja decorrente dos expurgos inflacionários, mantém-se a responsabilidade da empregadora à multa, eis que a ela sempre coube a obrigação de saldá-la no momento da despedida imotivada.

            Recurso de revista conhecido e provido." (Recurso de Revista nº. 131-2003-037-03-00, 2ª Turma, j. 23.04.2003, DJ 23.05.2003, Relator Ministro Renato de Lacerda Paiva)

            Ainda em prol da legitimidade passiva ad causam do empregador, há ainda outro julgado do Egrégio Tribunal Superior do Trabalho:

            "FGTS. INDENIZAÇÃO COMPENSATÓRIA DE 40%. CÁLCULO. ‘EXPURGO INFLACIONÁRIO’. CONSIDERAÇÃO DA ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA DO SALDO DA CONTA VINCULADA.

            Uma vez que o Excelso Supremo Tribunal Federal considerou as diferenças resultantes do chamado expurgo inflacionário direito adquirido dos empregados, consectária é a atualização dos saldos pelo Gestor, assim como a complementação da indenização compensatória pelo empregador, ante os claros termos do § 1º do art. 18 da Lei nº 8036/90.

            Recurso de revista a que se dá provimento." (Recurso de Revista nº 605-2002-105-03-00, 2ª Turma, j. 07.05.2003, DJ 30.05.2003, Relator Juiz Samuel Correa Leite)

            Por fim, necessário trazer à colação elucidativo julgado, também do Egrégio Tribunal Superior do Trabalho, cuja Ementa é a seguinte:

            "DIFERENÇA DE MULTA DE 40% - EXPURGOS INFLACIONÁRIOS - RESPONSABILIDADE PELO PAGAMENTO.

            Pela análise das normas dos arts. 9º, § 1º, do Decreto nº 99684, estabelecido pelo Decreto nº 243097, e 18, § 1º, da Lei nº 8036/90, verifica-se que o único que deve responder pela multa fundiária é o empregador, e tendo caráter acessório as diferenças da aludida multa decorrentes dos expurgos inflacionários, deve esse recompor a totalidade dos depósitos, ainda que proveniente de desídia do órgão gestor da garantia. Ressalte-se que o fato de a diferença advir da aplicação dos expurgos inflacionários, reconhecidos pelo STF como direitos adquiridos dos trabalhadores, não afasta a responsabilidade do empregador, uma vez que a reparação pecuniária caberá àquele que tinha obrigação de satisfazer a multa fundiária à época da dispensa sem justa causa. Todavia, eventual direito de reembolso ao empregador quanto às diferenças dos 40% sobre o FGTS em decorrência dos expurgos inflacionários demanda ação de regresso pela via ordinária.

            Recurso conhecido e provido...". (Recurso de Revista nº. 880-2001-009-03-00, 4ª Turma, j. 12.02.2003, DJ 07.03.2003, Relator Ministro Antonio José de Barros Levenhagen) (gn)

            Como pode ser observado, diversos julgados do Egrégio Tribunal Superior do Trabalho consagram a tese da responsabilidade plena do empregador e proclamam, portanto, sua legitimidade passiva ad causam para as demandas que objetivem as diferenças da multa de 40% do saldo das contas vinculadas ao F.G.T.S., por força dos expurgos inflacionários reconhecidos pela Justiça Federal Comum.


Prazo prescricional: termo inicial de sua contagem

            Já se decidiu que não se mostra juridicamente viável que o prazo prescricional, quando a demanda verse as diferenças ocasionadas pelos expurgos dos planos governamentais, seja contado pura e simplesmente da data do rompimento da relação empregatícia. Isto porque o direito à correção monetária plena dos ativos depositados em conta vinculada ao F.G.T.S. somente foi declarado tempos depois, inclusive pelo Excelso Supremo Tribunal Federal, em demanda entre particulares, isto é, sem efeito erga omnes, o que em si jamais afastou a possibilidade de o próprio empregado ter adotado postura que o levasse a pleitear a condenação judicial do órgão gestor do Fundo ao pagamento daquelas diferenças a seu favor, perante a Justiça Federal Comum.

            A Lei Complementar nº. 110/2001 representou por sua vez verdadeira confissão por parte do Governo Federal quanto ao direito dos trabalhadores em geral à recomposição dos ativos depositados em conta vinculada ao F.G.T.S. Todavia, fez as vezes de uma autêntica proposta pública, já que estabelecera condições inúmeras, conquanto muito pouco atraentes, ao pagamento dos valores devidos, para o que deveriam os interessados expressamente "aquiescer" por meio da assinatura de um determinado "Termo de Acordo", que poderia alcançar até mesmo os que houvessem aforado ações perante a Justiça Federal, desde que delas desistissem.

            Por óbvio que trabalhadores havia cujas demandas já se encontravam adiantadas, muitos deles já com o trânsito em julgado do provimento jurisdicional ou em via de tê-lo dotado desse atributo, e assim optaram por não aderir ao referido "Acordo", por ostensivamente desvantajoso para quem já possuía o reconhecimento judicial do defendido direito, com a iminente possibilidade de vê-lo atendido pelo órgão gestor do Fundo.

            É bem por isso que não se deve estabelecer liame algum entre a entrada em vigor da referida Lei Complementar e o prazo prescricional de dois anos para o empregado - que tenha inaugurado demanda própria perante a Justiça Federal - aforar a Reclamação Trabalhista.

            Então, em decorrência do reconhecimento do aludido direito naquela seara, qual seja, a Justiça Federal Comum, e com o trânsito em julgado, a partir deste evento é que estará franqueado ao ex-empregado aforar Reclamação perante a Justiça do Trabalho, em face de seu ex-empregador, com o objetivo de vê-lo condenado à recomposição da exata expressão pecuniária da multa de 40% sobre o saldo (compulsoriamente retificado ao montante correto pela C.E.F., por força daquela decisão judicial, passada em julgado) da conta vinculada ao F.G.T.S.

            O julgamento proferido pela Justiça Federal Comum, dotado do atributo da coisa julgada, coloca-se, assim, como o pressuposto indispensável ao surgimento da responsabilidade do empregador, sem o que não seria permitido pleitear deste a recomposição de coisa alguma, já que não haveria o prévio reconhecimento do direito (por sinal adquirido - art. 5º, inciso XXXVI, C.F.) à correção monetária plena dos ativos existentes em conta vinculada de titularidade do empregado, e a base de cálculo utilizada para o cômputo da multa permaneceria inalterada.

            Sem a modificação daquela base, por provimento jurisdicional, não há falar em recomposição da multa fundiária.

            Por isso é que se exige tal reconhecimento - prévio - pelo único Órgão Jurisdicional competente, a Justiça Federal Comum, tendo em vista a natureza jurídica do órgão gestor do F.G.T.S., a Caixa Econômica Federal, instituição financeira criada sob a forma de empresa pública.

            Inicia-se o prazo prescricional, como é cediço, somente após o nascimento do direito subjetivo do empregado. Nessa vertente, o Egrégio Tribunal Superior do Trabalho teve a oportunidade de decidir que em razão da superveniência da declaração do direito à perfeita correção dos ativos depositados em conta vinculada ao F.G.T.S., pela Justiça Federal Comum, mostra-se então totalmente lícito postular-se os reflexos dessa correção sobre a multa de 40%, agora em face do ex-empregador, e perante a Justiça Especializada, considerando-se como termo a quo do prazo prescricional o trânsito em julgado do provimento jurisdicional editado por aquela Justiça em face do órgão gestor, no caso a Caixa Econômica Federal.

            Eis um dos elucidativos julgados sobre o assunto em destaque:

            "...PRESCRIÇÃO TOTAL. DIFERENÇAS DA MULTA DE 40% SOBRE OS DEPÓSITOS DO FGTS RESULTANTES DE EXPURGO INFLACIONÁRIO RECONHECIDO PELA JUSTIÇA FEDERAL.

            O art. 7º, inciso XXIX, da Constituição Federal estabelece o prazo de dois anos, após a extinção do contrato, para o trabalhador reclamar créditos trabalhistas. A regra geral inerente ao instituto é a de que o prazo prescricional tem início na data da lesão do direito material, ocasião em que surge a possibilidade do exercício de ação para buscar as perdas decorrentes de ato prejudicial. Assim sendo, o prazo prescricional é contado a partir do momento em que o empregado pode ingressar em juízo para postular sua pretensão de direito material ofendida, ou seja, a prescrição inicia-se na ocasião em que o trabalhador tem ciência do ato ilegítimo ou lesivo ao seu direito, a partir de quando poderia formular determinada pretensão em juízo. No caso de diferenças da multa de 40% sobre os depósitos do FGTS, decorrentes essas de expurgo inflacionário, na forma da Lei Complementar nº 110/2001, o marco inicial para a contagem do prazo da prescrição do direito de ação do autor é o trânsito em julgado da decisão perante a Justiça Federal Comum, que reconheceu o direito aos expurgos inflacionários, e a multa em questão incide sobre os valores reconhecidos na decisão proferida na Justiça Federal que assegurou diferenças de correção dos depósitos do Fundo de Garantia, fruto dos expurgos inflacionários.

            Recurso de revista não conhecido." (Recurso de Revista nº. 124-2002-010-03-00, 2ª Turma, j. 20.08.2003, DJ 12.09.2003, Relator Juiz Samuel Correa Leite)

            Outro julgado do Egrégio Tribunal Superior do Trabalho professa o seguinte:

            "AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. PROCEDIMENTO SUMARÍSSIMO. MULTA DE 40% SOBRE CORREÇÃO DO FGTS DECORRENTE DOS EXPURGOS INFLACIONÁRIOS. PRESCRIÇÃO INEXISTENTE.

            O marco para a contagem do prazo da prescrição do direito de ação do autor iniciou-se com o trânsito em julgado da decisão proferida pela Justiça Federal Comum, que reconheceu o direito aos expurgos inflacionários. Não transcorridos dois anos, desde então, até o dia do ajuizamento da reclamação trabalhista, não existe prescrição extintiva do direito de ação. Violação do art. 7º, XXIX da Constituição Federal não configurada.

            Agravo a que se nega provimento." (Agravo de Instrumento em Recurso de Revista nº. 29557-2002-900-11-00, 3ª Turma, j. 16.10.2002, DJ 08.11.2002, Relatora Juíza Eneida Melo)

            Há ainda um outro julgado sobre o tema, também do Egrégio Tribunal Superior do Trabalho, relatado pelo Ministro Milton de Moura França, no qual restou enfrentada a matéria da seguinte maneira:

            "DIFERENÇAS DE 40% DE FGTS - PEDIDO COM BASE EM DECISÃO PROFERIDA PELA JUSTIÇA FEDERAL - PRESCRIÇÃO - TERMO INICIAL.

            Reconhecido o direito à correção monetária, que fora expurgado por planos econômicos, por força de decisão proferida pela Justiça Federal, e, ressalte-se, com o aval até mesmo do Supremo Tribunal Federal, como é público e notório, uma vez que houve ampla divulgação da matéria por todos os meios de comunicação do País, nada mais juridicamente correto de se proclamar que foi a partir do reconhecimento do direito e conseqüente depósito das diferenças em conta do empregado que tem início o prazo prescricional para se reclamar as diferenças de multa de 40% decorrente da injusta rescisão contratual. ‘Data venia’, não se revela juridicamente aceitável se pretender que a prescrição tenha seu início com o término do contrato de trabalho, porque, repita-se, o direito surgiu somente com a decisão da Justiça Federal. Não se vislumbra, pois, a mínima possibilidade de violação do art. 7º, XXIX, da Constituição Federal.

            Recurso de revista não conhecido." (Recurso de Revista nº. 1129-2001-005-24-00, 4ª Turma, j. 05.02.2003, DJ 21.02.2003)

            De todo modo, a ocorrência do trânsito em julgado do provimento jurisdicional obtido na Justiça Federal Comum é condição sine qua non para a definitiva disponibilização pela C.E.F. do crédito em favor do empregado. Assim, por cautela, deverá a Reclamação ser ajuizada até dois anos da data em que se deu o trânsito em julgado da decisão proferida pela Justiça Federal, independentemente do momento em que o órgão gestor venha a cumprir o comando judicial de pagamento.

            Necessário considerar ainda outro aspecto do problema, identificado no julgamento proferido Egrégio Tribunal Superior do Trabalho (Recurso de Revista nº. 00124/2002-010-03-00, relatado pelo Juiz Samuel Correa Leite, j. 20.08.2003, DJ 12.09.2003), in verbis:

            "...O trabalhador não poderia reivindicar essa multa, conseqüência das diferenças dos depósitos, até que a Justiça Federal declarasse o seu direito. Somente a contar daí e que caracterizou-se o Reclamado como devedor dessa verba. Em sendo assim, a prescrição somente poderia ser contada após verificada a condição reconhecimento do direito aos depósitos.

            Não existe, portanto, inércia continuada no tempo, por parte do trabalhador para provocar o Judiciário, situação indispensável à configuração da prescrição. Inversamente, o trabalhador foi diligente, tendo o Sindicado da Categoria ajuizado ação antes de transcorrido o prazo de 2 anos da data do término do contrato de trabalho do Reclamante, buscando o reconhecimento judicial as correções dos depósitos do FGTS. Com a decisão da Justiça Federal, o Reclamante passou a ter conhecimento de que dispunha de um determinado direito (à multa do FGTS), havendo o reclamado dado ensejo, diante da ausência de pagamento espontâneo ao ex-empregado, a sua caracterização como devedor. A partir de então, exigível a quitação pelo ex-empregador e permanecendo ele silente, teve o empregado delineado o nascimento do seu direito de ação, começando a correr a prescrição, não consumada, em face do ajuizamento oportuno da presente reclamação trabalhista...".

            Dessarte, segundo a opinião externada pelo eminente Relator, favoreceria o empregado a circunstância de se ter ajuizado a demanda em face do órgão gestor do Fundo antes de expirado o prazo de dois anos do término da relação empregatícia. Mas, com a devida venia, entendemos que tal não seria necessário, vez que o prazo prescricional do artigo 7º., inciso XXIX, C.F., cinge-se à ação entre empregado e empregador e, na hipótese analisada, a ação de que se cogitou possuía como figurante do pólo passivo o órgão gestor do Fundo. Agora, o biênio - não há dúvida disso - deverá ser necessariamente observado quando da propositura da Reclamação em face do empregador, contado da data em que passada em julgado a sentença obtida na Justiça Federal.


Correção monetária: conceito e aplicação

            Observado que credores de obrigações pecuniárias se viam extremamente prejudicados com os efeitos degenerativos da inflação sobre a moeda em curso, viu-se a sociedade brasileira na contingência de buscar mecanismos que pudessem de alguma maneira enfrentar a perda do poder aquisitivo intrínseco, vale dizer, liberatório, da moeda, com o que inúmeras teorias surgiram na tentativa de debelar o problema.

            Roberto de Oliveira Campos, um dos instituidores da correção monetária, em prefácio à obra de Arnoldo Wald, Mário Henrique Simonsen e Julian Chacel ("A correção monetária", APEC, Rio de Janeiro, 1970) afirma:

            "...o instituto da correção monetária foi inicialmente como uma tentativa de conviver com a inflação, ao invés de debelá-la. (...) É que as condições brasileiras impunham o ´gradualismo´ e a correção monetária foi essencialmente um instrumento para compatibilizar a inflação residual com o objetivo de preservar o estímulo à poupança e evitar distorções na alocação de recursos habitualmente atribuídos à inflação."

            "Embasando o princípio da variação monetária (intitulado ´realismo monetário´), formaram-se no Brasil fortes correntes doutrinárias procurando demonstrar o caráter elementar da correção ou atualização de dívidas de valor: ´Diversas tentativas foram feitas para eliminar a paridade e substituí-la pelas cláusulas de imprevisão, dívidas de valor e escala móvel. (...) Teoria da imprevisão Objetiva eliminar o enriquecimento sem causa, quando uma parte terá de arcar com os prejuízos de modificações substanciais profundas e inevitáveis. (...) Teoria das dívidas de valor, quando não interessa um ´quantum´, mas um ´quid´. Deve-se um valor, uma coisa, um direito, que poderá, no tempo, sofrer variação, sendo, portanto, liquidados, em determinado instante, os bens ou direitos. (...) Teoria da escala móvel ou número-índice, fundada na vontade das partes que desejariam precaver-se contra a inflação, introduzindo uma cláusula de reajustamento" (Edson de Carvalho, "Correção Monetária de Débitos Fiscais", Editora LTN, São Paulo, 1ª edição, 1977, pág. 15). (gn)

            Todas essas teorias procuraram decifrar a essência do mecanismo chamado "correção monetária", em razão de sua cada vez maior ingerência no campo das relações econômicas, jurídicas e sociais.

            Sobre seus efeitos o saudoso mestre Geraldo Ataliba lembrava que "a correção monetária não é aumento de nada. É simples atualização de valor", e ainda: "a correção monetária só mantém o valor avençado" (Gazeta Mercantil, edições de 26 e 28.09.1992, pág. 41).

            Por isso, lícito concluir, já num primeiro momento, que a correção monetária não é sanção, ou seja, não se reveste de feição punitiva, sendo antes mera e justa atualização da moeda, técnica voltada à preservação no tempo do poder liberatório que lhe era intrínseco.

            Arthur Nussbaun explicou as funções da moeda:

            "...a moeda serve, ou deve servir como denominador de valores, valorímetro, ´ponte entre o presente o futuro´, no dizer de Keynes. Neste sentido, é denominada ´moeda de conta´ (money of account), definindo-se como aquela em que se expressam ´as obrigações, os preços e o poder aquisitivo geral´ e opondo-se à moeda efetiva (money itself) ´mediante cuja entrega se cumprem as obrigações monetárias e os contratos em geral" ("Derecho Monetario Nacional e Internacional", Ediciones Arayú, Buenos Aires, pág. 22, nota 63).

            A distinção entre a moeda de pagamento e a moeda da obrigação, esta equiparada à moeda de conta, ou seja, ao indexador, é que a primeira é real e por meio dela se fará o pagamento, enquanto que a segunda serve apenas de medida de valor (indicador) para fixar o quantum de moedas reais necessárias para a liquidação do débito.

            Arnoldo Wald afirma que "efetivamente, a moeda sempre exerceu duas funções básicas, sendo instrumento de câmbio e de pagamento e denominador de valores. Como instrumento de câmbio condiciona a evolução da atividade econômica, facilitando e acelerando as trocas e permitindo a sua substituição por compras e vendas, constituindo um meio de liberação dos débitos e um instrumento de compra indeterminado, geral e imediato."

            No Brasil, há longos anos que as funções de moeda de conta e de pagamento foram separadas, instalando-se na economia o que se denominou de "bigamia monetária". Chegaram a funcionar, no auge dessa fase, como moedas de conta mais de vinte instrumentos, entre os quais a O.T.N., a U.P.C., a U.R.P., o I.P.C., a B.T.N. et cetera, enquanto funcionavam como moedas de pagamento, tais os cruzados, os cruzeiros, os cruzados novos.

            Inicialmente, os índices e seus limites de aplicação, que se identificavam com a moeda de conta, foram livremente escolhidos pelas partes. Todavia, na medida em que a política monetária de combate à inflação e de reorganização da economia o exigiu, o Estado passou a definir, por lei, quais as moedas de conta poderiam ou não ser utilizadas nos contratos, fixando critérios e periodicidade.

            A lei proibiu o uso de alguns indexadores e autorizou a utilização de outros, até que acabou por estabelecer um regime legal imperativo para as cláusulas monetárias, definindo, criando e suprimindo não só as unidades da moeda de pagamento, mas também as moedas de conta, ou indexadores, e determinando os limites que considerava adequados para a sua aplicação (ADIn. nº. 493-0/DF, Relator Ministro Moreira Alves).

            Acentuou-se, então, o caráter essencial da correção monetária como mecanismo necessário de manutenção do poder aquisitivo da moeda. Daí que "expurgar" (rectius: subtrair) a correção monetária numa realidade inflacionária significa, precisamente, retirar da moeda o seu poder liberatório original, com isso infligindo profunda lesão ao credor de obrigação pecuniária ainda não solvida.

            Quando abordou o tema, o eminente Ministro Moreira Alves, do Excelso Supremo Tribunal Federal, no julgamento da mencionada Ação Declaratória de Inconstitucionalidade, professou:

            "...Ademais, a verdadeira atualização monetária só se faz com um índice que dela mais se aproxime, e não, evidentemente, com diversos como tivemos, pois a simples multiplicidade mostra que ou todos são falsos pelos métodos e expurgos que se adotam para chegar a eles, ou só um é que se aproxima da realidade e os demais são elementos de manobra. (...) Mascarar a realidade não é fácil."

            Em elucidativo julgado proferido pelo Egrégio Primeiro Tribunal de Alçada Civil do Estado de São Paulo foi destacado o seguinte:

            "...Quem vive no Foro e nos Tribunais deve estar cansado desse fruto exótico brasileiro, a litigiosidade deletéria, sustentada na redução real do objeto econômico do litígio pelo fato da inflação não corrigida, ou mal corrigida, que avilta o prestígio da Justiça e a autoridade do Direito (´Lei e Sentimento Ético´, RJE - Revista de Jurisprudência Escolhida do 1ºTACivSP, vol. 1, p. 12, JTA-Lex, vol 140, p. 15; JB - Jurisprudência Brasileira, vol 170, p. 36; Agravo nº 591.813-8, ementa no DJE de 14.09.1994, p. 90, litigiosidade sempre lucrativa para os devedores que protelam o pagamento em regime inflacionário, beneficiando-se com a inflação não corrigida (em época de congelamento ou desindexação), beneficiando-se pela inflação mal corrigida (em função de índices expurgados, que não refletem a inflação real)..." (Argüição de Inconstitucionalidade nº. 504.884-2/1-Ribeirão Preto).

            Nesse mesmo julgado, em judicioso voto proferido pelo Juiz Sena Rebouças, embora vencido, discorreu-se sobre a posição do Poder Judiciário em situações que tais:

            "...O juiz não pode conhecer tudo, mas a ele não é dado ignorar a realidade dos fatos sociais, nem a dos fatos econômicos. Em sua conhecida ´Metodologia´, Karl Larenz afirma que a lei pressupõe no juiz o conhecimento das formas do comportamento econômico (p. 314). O Judiciário não pode opor-se à consecução das metas políticas e administrativas do governo, tanto que, ressalvado os ´obiter dicta´ que traz como premissa ou ilustração, não julga o mérito dos atos governamentais. Mas aprecia a legalidade do ato administrativo e a constitucionalidade das leis, em razão do caso concreto que se lhe apresenta para julgamento. Isso é precisamente o devido e o esperado dele...".

            Também o Egrégio Superior Tribunal de Justiça, desde o início de suas atividades, firmou entendimento no sentido de que "...essa matéria sobre ser possível ou não a incidência de correção monetária não pode inibir o julgador de, adequando sua interpretação à realidade social ou econômica, entregar a prestação a que fazem jus os jurisdicionados" (Recurso Especial nº 2.755-SE, Relator Ministro Waldemar Zveiter, j. 04.09.1990, DJ 09.10.1990, pág. 10.893).

            Por esses motivos é que se entendeu ser a correção monetária um mecanismo voltado ao equilíbrio do poder liberatório da moeda, sendo por isso justa e necessária medida de preservação das prestações pecuniárias devidas em razão da lei ou do contrato.

            A quitação outorgada pelo empregado não extingue o direito de pleitear do empregador a diferença de correção monetária sobre a multa fundiária: ato jurídico perfeito não configurado

            Necessário partir novamente do que estabelece o artigo 18, da Lei Federal nº. 8.036/1990, em seus parágrafos 1º e 3º, verbis:

            "Art. 18. Ocorrendo rescisão do contrato de trabalho, por parte do empregador, ficará este obrigado a pagar diretamente ao empregado os valores relativos aos depósitos referentes ao mês da rescisão e ao imediatamente anterior que ainda não houver sido recolhido, sem prejuízo das cominações legais.

            Par. 1º. Na hipótese de despedida pelo empregador sem justa causa, pagará este diretamente ao trabalhador importância igual a 40 (quarenta) por cento do montante de todos os depósitos realizados na conta vinculada durante a vigência do contrato de trabalho, atualizados monetariamente e acrescidos dos respectivos juros.

            ................................

            Par. 3º. As importâncias de que trata este artigo deverão constar do recibo de quitação de rescisão do contrato de trabalho, observado o disposto no art. 477 da CLT, e eximirão o empregador exclusivamente quanto aos valores discriminados. (gn)

            Não há como repelir a pretensão formulada em Juízo por empregado que tenha conferido quitação, ainda que geral, quando do recebimento das verbas rescisórias, por não representar tal circunstância a figura do ato jurídico perfeito, tal como previsto no artigo 5º., inciso XXXVI, da Constituição Federal.

            Explica-se.

            O Egrégio Tribunal Superior do Trabalho, por sua Colenda 2ª Turma, ao julgar o Recurso de Revista nº 3053-2000-030-15-00, j. 18.06.2003, DJ 15.08.2003, Relator Juiz Marcio Eurico Vitral Amaro, analisou o tema do seguinte modo:

            "...FGTS. INCIDÊNCIA DOS EXPURGOS INFLACIONÁRIOS DECORRENTES DOS CHAMADOS PLANOS VERÃO E COLLOR - RECONHECIMENTO PELO STF. MULTA DE 40%.

            Não se constata violação ao ato jurídico perfeito decisão que determina a aplicação do índice de 68,9% - decorrente da reposição dos planos em comento, já reconhecida pelo STF sobre a multa de 40% do FGTS...".

            Ademais, o Direito não se contenta com a satisfação incompleta das obrigações, exigindo o seu total exaurimento, no sentido técnico de perfeito adimplemento da obrigação. Sim, porque, fosse o empregado que tivesse recebido importância superior à que teria direito não haveria quitação (com a amplitude que a ela se pudesse atribuir) firme o suficiente para afastar a incidência (ao tempo de sua vigência) do artigo 964, do Código Civil de 1916, segundo o qual "Todo aquele que recebeu o que não lhe era devido fica obrigado a restituir", ou do artigo 876, do atual Código Civil brasileiro.

            Não se pode esquecer de que não se adquirem direitos contra expressa disposição legal. Existindo lei a expressamente determinar a incidência de correção monetária sobre o valor da multa fundiária, o pagamento de determinado montante - sem a referida correção ou com apenas parte dela - não eximirá o empregador da respectiva complementação, até que venha a satisfazer integralmente a obrigação que sobre ele pesa.

            Legem habemus sobre o tema, a predispor com a mais absoluta clareza que as importâncias que constarem do recibo de quitação de rescisão do contrato de trabalho eximirão o empregador exclusivamente quanto aos valores nele discriminados (parágrafo 3º, do artigo 18, da Lei nº. 8.036/1990).

            Ora, o dispositivo não pode ser interpretado isoladamente, senão com o auxílio do contido no parágrafo 1º (do mesmo artigo 18), cujo teor determina o pagamento, pelo empregador, de importância correspondente a quarenta por cento do montante de todos os depósitos (considerada a atualização monetária e os juros respectivos) realizados na conta vinculada do trabalhador durante toda a vigência do contrato de trabalho.

            Se o empregado obtém provimento jurisdicional que resulta na elevação do saldo da conta vinculada em razão da aplicação de indicadores que mais adequadamente refletiram a oscilação inflacionária ao tempo em que realizado o pagamento pelo empregador, remanesce a obrigação deste, que não está desonerado (em vista da deficiente correção monetária inicialmente aplicada) da obrigação de complementar o valor desembolsado a título de multa fundiária.

            Nessa vertente, o que se defende é que eventual recibo de quitação não está a impedir o empregado de aforar Reclamação Trabalhista com o objetivo de pleitear a complementação, visto que o liame obrigacional ainda não se dissolveu por completo diante do imperfeito cumprimento da prestação a cargo do empregador.

            E assim se dá pois existe razoável distância entre o pagamento (e sua prova) e a certeza de que esteja o empregador desonerado por completo da obrigação Colocam-se entre ambos esses fatos as disposições contidas nos parágrafos 1º e 3º, do artigo 18, da Lei Federal nº. 8.036, de 11.05.1990.

            Isto porque naturalmente não se encontrará quitado aquilo que o empregado não recebeu, consoante preciso ensinamento do consagrado jurista Sergio Pinto Martins:

            "..a quitação envolve apenas as parcelas e os valores pagos e não os títulos. Se não houve o pagamento integral, o empregado poderá reclamar eventuais diferenças ou até mesmo verbas que não foram pagas e que, portanto, não foram quitadas" ("Direito do Trabalho", Editora Malheiros, São Paulo, 4ª edição, 1997, pág. 553).

            De observar ainda o teor do Enunciado nº. 330/TST, que estabelece, no que concerne à presente exposição: "...a quitação não abrange parcelas não consignadas no recibo de quitação e, conseqüentemente, seus reflexos em outras parcelas, ainda que essas constem desse recibo...", valendo lembrar que tal enunciado substituiu o de nº. 41/TST, do teor seguinte: "A quitação nas hipóteses dos parágrafos 1º e 2º, do artigo 477, da CLT, concerne exclusivamente aos valores discriminados no documento respectivo."

            O Egrégio Tribunal Superior do Trabalho, ao fixar a responsabilidade em primeiro plano do empregador pelo pagamento de tais diferenças de correção monetária sobre a multa fundiária, não lhe coarctou, todavia, a possibilidade de pleitear de quem de direito, em ação regressiva, o valor desembolsado, verbis:

            "...Ressalte-se que o fato de a diferença advir da aplicação dos expurgos inflacionários, reconhecidos pelo STF como direitos adquiridos dos trabalhadores, não afasta a responsabilidade do empregador, uma vez que a reparação pecuniária caberá àquele que tinha a obrigação de satisfazer a multa fundiária à época da dispensa sem justa causa. Todavia, eventual direito de reembolso do empregador quanto às diferenças dos 40% sobre o FGTS em decorrência dos expurgos inflacionários demanda ação de regresso pela via ordinária" (gn)

            Dessa forma, acaso entenda o empregador de buscar a responsabilização subsidiária de outrem, poderá intentar ação específica, de regresso, em face de quem entenda esteja a tanto obrigado.

            Ainda neste tópico é necessário aduzir, para a hipótese em que o empregado tenha ingressado com Reclamação Trabalhista nos dois anos seguintes ao rompimento do contrato de trabalho e tenha logrado obter a condenação do empregador ao pagamento de seus direitos, se nessa Reclamação não estiver claramente abordada, como um dos fundamentos da "causa de pedir", o pleito de recomposição dos expurgos inflacionários tratados neste artigo, e ainda que tenha transitado em julgado a sentença ou o acórdão proferidos nessa Reclamação, estará ainda assim franqueado ao empregado que tenha alcançado sucesso na demanda proposta em face do órgão gestor do F.G.T.S., pleitear do empregador, até o período máximo de dois anos contados do trânsito em julgado desta decisão, a aludida restauração dos valores da multa de 40% do saldo da conta vinculada.

            É que a nova decisão, proferida pela Justiça Federal Comum, conferiu ao empregado uma nova situação jurídica, cujos efeitos, pelo só fato de terem surgido em momento posterior ao rompimento do pacto laboral, logicamente não poderiam ser alcançados pelo eventual provimento jurisdicional entregue (pela Justiça do Trabalho) quando da Reclamação ajuizada pelo empregado logo após a extinção do contrato de trabalho, onde não se tenha abordado especificamente o direito à recomposição da multa fundiária.

            Ademais, para que se configure a repetição de ações torna-se necessária a plena identidade entre os três elementos específicos, quais sejam, as mesmas partes, a mesma causa de pedir e o mesmo pedido (art. 301, par. 2º, C.P.C.), modo que ocorrendo diversidade num deles que seja não haverá repetição de demanda e, portanto, cuidar-se-á de nova ação.

            Com isso, não é de se permitir ao empregador defender-se com a coisa julgada, vez que tal circunstância jamais chegou a ocorrer, exatamente pela superveniência de situação jurídica nova e que obviamente não poderia ter sido deduzida antes do julgamento da Reclamação de que se falou acima, pois que o novel direito surgiu com o julgamento prolatado em outra esfera do Poder Judiciário.


À guisa de conclusão

            Encerra-se o presente artigo com a assertiva de que a orientação jurisprudencial colacionada neste escrito guarda estrita fidelidade com a melhor exegese do texto legal, garantidor dos direitos do empregado cujo vínculo empregatício tenha sido rompido por iniciativa do empregador, remanescendo em desfavor deste último a obrigação (e, portanto, sua legitimidade passiva ad causam para a Reclamação Trabalhista) pela exata recomposição do valor da multa fundiária.

            Ademais, a contagem do prazo prescricional a partir da data do trânsito em julgado da sentença proferida pela Justiça Federal Comum mostra-se a mais adequada sob o ponto de vista estritamente jurídico, dado que o reconhecimento do direito à correção monetária se operou em momento posterior ao do pagamento das verbas rescisórias, sendo portanto impossível que o empregado pleiteasse direito cujo implemento estava a depender do advento de pronunciamento jurisdicional específico, a ser proferido por outro Órgão do Poder Judiciário.

            A responsabilidade pelo acessório, vale dizer, a correção monetária, decorre da responsabilidade pelo principal (a multa fundiária de 40% do saldo atualizado da conta vinculada ao F.G.T.S.), ambas a cargo do empregador por força dos parágrafos 1º e 3º, da Lei Federal nº. 8.036, de 11.05.1990, ainda que o empregado tenha conferido ampla quitação às verbas que lhe foram entregues quando da rescisão do contrato de trabalho, ou as tenha recebido por força de sentença judicial proferida em Reclamação Trabalhista onde não se decidiu sobre a correção monetária suprimida pelos expurgos inflacionários.



Informações sobre o texto

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

TRINDADE, Nivaldo Silva. FGTS: expurgos inflacionários. Correção monetária. Diferenças sobre a multa de 40%. Competência da Justiça do Trabalho. Responsabilidade do empregador pelo pagamento. Prazo prescricional. Julgados do Egrégio Tribunal Superior do Trabalho. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 9, n. 237, 1 mar. 2004. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/4888. Acesso em: 24 abr. 2024.