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Alternativas jurídicas para o uso sustentável das unidades de conservação no bioma florestal com araucária

Alternativas jurídicas para o uso sustentável das unidades de conservação no bioma florestal com araucária

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1 INTRODUÇÃO

            As unidades de conservação constituem-se em arma eficaz na luta para a conservação do meio ambiente, permitindo preservar e manter grandes áreas florestais e, talvez o mais importante, formar um elo entre os principais remanescentes.

            A Resolução n0. 011/87 do CONAMA define as unidades de conservação como áreas naturais protegidas e sítios ecológicos com características naturais relevantes, de domínio público ou privado, legalmente instituídos pelo Poder Público para proteger a natureza, com objetivos e limites definidos e com regimes específicos de manejo e administração, ao qual se aplicam garantias adequadas de proteção.

            No ano de 1996 o Brasil possuía mais de 30 milhões de hectares do território protegidos por este instituto, e já vive o paradoxo envolvendo a harmonização entre o crescimento da população e a conseqüente pressão sobre as áreas protegidas (PÁDUA, 1997).

            O assunto mereceu especial atenção do legislador constitucional que, no art. 225, § 1º, inc. III, da Constituição Federal Brasileira de 1988, dita que sejam definidas, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos. Regulamentando o dispositivo, foi editada a Lei n0. 9.985/2000, criando o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC).

            Antes do diploma legal supracitado entrar em vigor, o Brasil possuía um arcabouço de leis tratando desordenadamente do tema, das quais destacam-se: a Lei 4.771/1965, que previa a criação de Parques Nacionais, Estaduais e Municipais, Reservas Biológicas e Florestas Nacionais, Estaduais e Municipais; a Lei nº 5.197/1967 de Proteção à Fauna, prevendo a criação de Reservas Biológicas Nacionais, Estaduais e Municipais; a Lei nº 6.513/1977, que previa a criação de Áreas Especiais e de Locais de Interesse Turístico; a Lei nº 6.938/1981, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, prevendo a criação de espaços territoriais especialmente protegidos pelo Poder Público, Federal, Estadual e Municipal, tais como Áreas de Proteção Ambiental, de Relevante Interesse Ecológico e reservas Extrativistas; bem como a transformação de determinadas áreas em Reservas ou Estações Ecológicas.

            O Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC) divide as unidades de conservação em dois grupos: o primeiro é o das Unidades de Proteção Integral e o segundo, das Unidades de Uso Sustentável. Hoje o Brasil possui cerca de 1,8% do território protegido em unidades de conservação de proteção integral e outros 2% (16,2 milhões de hectares) em unidades de conservação de uso sustentável (PÁDUA, 1997).

            Em âmbito nacional, o sistema de unidades de conservação é gerido em três instâncias: Órgão Consultivo (CONAMA), Órgão Central (Ministério do Meio Ambiente) e Órgãos Executores (IBAMA em conjunto com Órgãos Estaduais e Municipais). No Paraná, os órgãos que atuam na gestão das unidades de conservação são a Secretaria Estadual do Meio Ambiente (órgão central), o CONSEMA (órgão consultivo) e o Instituto Ambiental do Paraná (órgão executor).


2. UNIDADES DE PROTEÇÃO INTEGRAL

            Essa categoria engloba estações ecológicas, reservas biológicas, parques nacionais, monumentos naturais e refúgios da vida silvestre. Nesses locais, qualquer atividade a ser realizada fica condicionada à autorização prévia do órgão responsável e deverá priorizar a manutenção do equilíbrio do ecossistema, sendo que as visitas públicas ficam restritas àquelas com objetivos educacionais e científicos.

            As áreas particulares incluídas em seus limites, com exceção dos monumentos naturais e refúgios da vida silvestre, que podem ser constituídos também em áreas particulares, serão desapropriadas, de acordo com o que dispõe a lei. São ferramentas compatíveis com o objetivo da conservação do bioma com Araucária, porém um enfoque eminentemente preservacionista, não permitindo o uso sustentável e necessitando da tutela e financiamento quase exclusivos do Poder Público.

            As Estações Ecológicas compreendem áreas com ecossistema representativo, de posse e domínio públicos, que têm como objetivo a preservação da natureza e a realização de pesquisas científicas.

            As Reservas Biológicas são florestas e demais formas de vegetação que têm como objetivo a preservação integral da fauna e flora, existentes em seus limites, sem interferência humana direta ou modificações ambientais, excetuando-se as medidas de recuperação de seus ecossistemas alterados e as ações de manejo necessárias para recuperar e preservar o equilíbrio natural, a diversidade biológica e os processos ecológicos naturais.

            Os Parques Florestais por sua vez constituem-se de áreas extensas e delimitadas que têm como finalidade à preservação de ecossistemas naturais de grande relevância ecológica e beleza cênica, possibilitando a realização de pesquisas científicas e o desenvolvimento de atividades de educação e interpretação ambiental, de recreação em contato com a natureza e de turismo ecológico.

            Enquadram-se nesta classificação os Parques Nacionais, os Parques Estaduais e os Parques Municipais, distinguindo-se pela esfera de criação. Têm uso e visitação sujeitos às normas estabelecidas no Plano de manejo da unidade, ou às normas estabelecidas pelo órgão responsável. O Parque do Pinho, no Estado do Paraná, pode representar um espaço propício para a manutenção de matrizes genéticas e união de fragmentos regionais.

            As áreas que têm como objetivo proteger ambientes naturais onde sejam asseguradas condições para a existência ou reprodução de espécies ou comunidades da flora local e da fauna residente ou migratória, são denominadas Refúgios da Vida Silvestre. Assim como os monumentos naturais, podem ser constituídos por áreas particulares nas mesmas condições do exposto no item anterior.

            2.1 UNIDADES DE USO SUSTENTÁVEL

            Essa categoria aproxima-se sobremaneira da concepção pura de unidade de conservação, pois objetiva compatibilizar a conservação da natureza com o uso sustentável dos recursos naturais.

            Estão incluídas nessa categoria as áreas de proteção ambiental, áreas de relevante interesse ecológico, florestas nacionais, reservas extrativistas, reservas de fauna, reservas de desenvolvimento sustentável, e reservas particulares do patrimônio natural, espaços onde, em tese, seria tolerado o uso racional dos recursos naturais existentes. Podem ser constituídas por terras públicas ou privadas, ficando condicionado o seu uso às normas estabelecidas pelo gestor público em unidades de domínio público e pelas condições estabelecidas pelo proprietário em unidades particulares.

            José Afonso da SILVA (1996) considera que esses são espaços de manejo sustentável, ou seja, aqueles que são submetidos a uma proteção parcial dos atributos naturais, admitida a exploração de partes dos recursos disponíveis em regime de manejo sustentado, sujeito às limitações legais. Porção representativa destas unidades de conservação abrigam em seu interior ou nas zonas de amortecimento populações, comunidades, que, por vezes, dependem dos recursos naturais para sua sobrevivência.

            Sobre o assunto LEME MACHADO (1999) pondera que, "o fato de um bem ambiental interessar a população local e ao mesmo tempo a toda humanidade não deve conduzir a uma política de menosprezo ou marginalização do interesse local". Não se pode ignorar a significância do tema, tanto pela amplitude do território quanto pela existência de grupos que estão intrinsecamente envolvidos com estes espaços, em diversos casos dependendo destes para sua sobrevivência, a exemplo das populações tradicionais e dos indígenas.

            Ademais, advoga-se neste trabalho a tese de que esta categoria, ainda pouco utilizada no Brasil, pode ser uma alternativa para a regulação dos estoques de madeira no Estado. No entanto, tudo indica que uma solução definitiva dependerá também do reconhecimento, em termos econômicos, do valor dos benefícios, ou externalidades ambientais, oriundos dos ecossistemas naturais, tais como: a fixação do carbono, a conservação da biodiversidade, a provisão de água límpida, o lazer, entre tantos outros.

            No caso específico deste estudo, o Governo do Estado pode, por meio de suas Florestas Estaduais e, com a autorização da União, também nas Florestas Nacionais, promover a pesquisa do manejo florestal sustentado da Araucária, bem como promover o comércio da madeira de forma alternativa e sustentável, tendo o enfoque maior na preservação do bioma, aliado a um projeto social amplo com a população diretamente afetada.

            2.1.1 Áreas de Proteção Ambiental - APA

            As APAS têm assumido uma importância cada vez maior no Estado do Paraná. São em geral grandes espaços, com um certo grau de ocupação humana, dotada de atributos abióticos, bióticos, estéticos ou culturais especialmente importantes para a qualidade de vida e o bem-estar das populações humanas, que têm a finalidade de proteger a diversidade biológica, disciplinar o processo de ocupação e assegurar a sustentabilidade do uso dos recursos naturais.

            O SNUC prevê que as Áreas de Proteção Ambiental deverão dispor de um Conselho presidido pelo órgão responsável por sua administração e constituído por representantes dos órgãos públicos, de organizações da sociedade civil e da população residente. Não permite a preservação integral da Floresta Ombrófila Mista, mas favorece a preservação de pequenos maciços dentro do Bioma.

            2.1.2 Áreas de Relevante Interesse Ecológico

            São áreas, em geral, de pequena extensão, com pouca ou nenhuma ocupação humana, com características naturais extraordinárias ou que abrigam exemplares raros da biota regional, que têm como objetivo manter os ecossistemas naturais de importância regional ou local e regular o uso admissível dessas áreas, de modo a compatibilizá-lo com os objetivos de conservação da natureza.

            2.1.3 Florestas Nacionais, Estaduais e Municipais

            São áreas com uma cobertura florestal de espécies predominantemente nativas e têm como objetivo básico o uso múltiplo sustentável dos recursos florestais e a pesquisa científica, com ênfase em métodos para exploração sustentável de florestas nativas.

            De acordo com a Lei, a Floresta Nacional é de posse e domínio públicos, sendo que as áreas particulares incluídas em seus limites devem ser desapropriadas de acordo com o que dispõe a Lei. No Paraná a Floresta Nacional de Irati é um dos bons exemplos de conservação ambiental sustentável de Florestas de Araucária.

            Nessa categoria podem se destacar as Florestas Estaduais, caracterizadas por abrigar populações tradicionais e pela permissão de uso, dentro dos limites da lei, dos recursos naturais disponíveis. O objetivo dessas áreas é o de promover o manejo dos recursos naturais, com ênfase na produção de madeira e outros produtos não madeireiros, como o pinhão, o nó de pinho e a erva-mate, no caso da FOM, aliado à preservação da natureza, assegurando as condições para a reprodução de técnicas produtivas ambientalmente sustentáveis.

            A visitação pública está condicionada ao Plano de Manejo e as pesquisas são permitidas mediante autorização prévia. O uso deve ser regulamentado em contratos e a exploração de dos componentes dos ecossistemas naturais e a substituição da cobertura vegetal por espécies cultiváveis são condicionadas ao Plano de Manejo.

            Para que se tenha uma gestão eficiente é necessária a consolidação de definição e objetivo das Unidades de Conservação. Norteando a administração destas áreas LEME MACHADO (1999) dispõe que "as várias instâncias de interesse merecem ser identificadas, avaliadas e submetidas à um balanceamento para indicarem-se soluções que atendam, se possível, de forma concomitante aos múltiplos interesses ambientais encontrados".

            Aspecto importante é a autonomia administrativa das áreas legalmente protegidas. Ainda com as limitações tradicionais para o financiamento dessas áreas, o mero feito de lhes dar autonomia administrativa sobre recursos pode corresponder à realização ou não do proposto no plano de manejo.

            2.1.4 Reservas de Fauna

            São áreas naturais com populações animais de espécies nativas, terrestres ou aquáticas, residentes ou migratórias, adequadas para estudos técnico-científicos sobre o manejo econômico sustentável de recursos faunísticos. Nesses locais, é vedado o exercício da caça amadorística ou profissional.

            2.1.5 Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN)

            São áreas privadas, gravadas com perpetuidade, com o objetivo de conservar a diversidade biológica. O gravame de que trata a lei deve constar no termo de compromisso assinado perante o órgão ambiental, que verificará a existência de interesse público, e será averbado à margem da inscrição no Registro Público de Imóveis.

            Dentro da RPPN, é permitida a extração de recursos naturais, com exceção da madeira, e de forma que não coloque em risco as espécies ou os ecossistemas que justificaram a criação da unidade. Podem ser uma das melhores alternativas para a proteção das Florestas de Araucária nas propriedades rurais, como será demonstrado posteriormente.


3 GESTÃO DAS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO – EXPERIÊNCIA NACIONAL E INTERNACIONAL

            3.1 PLANEJAMENTO DE USO DAS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO

            A legislação florestal norte-americana é um referencial importante no que diz respeito ao planejamento das Unidades de Conservação. A Subparte A do título 36 do Código de Regulamentações Federais trata do "Planejamento e Manejo (1)das terras e recursos do Sistema Nacional de Florestas". De acordo com a seção "219.1-a", a regra jurídica tem como princípio a determinação da forma pela qual o planejamento e manejo dos recursos e das terras devem ser conduzidos no Sistema Nacional de Terras Florestais.

            Além disso, o planejamento deve guiar todas as atividades de manejo de recursos naturais e estabelecer padrões de manejo e diretrizes para o Sistema Nacional de Florestas. Esta seção reconhece ainda que as Florestas Nacionais são ecossistemas fundamentais e o seu manejo para bens e serviços requer uma consciência e consideração das inter-relações entre plantas, animais, solo, água, ar, e outros fatores ambientais envolvidos em tais ecossistemas.

            A aplicabilidade e o escopo desta norma jurídica estão estabelecidos na Seção 219.2. A regulamentação desta subparte é aplicável para o Sistema Nacional de Florestas, que inclui áreas especiais, tais como: áreas selvagens, rios cênicos e selvagens, áreas de recreação nacionais e trilhas nacionais. Sempre que as autoridades de áreas especiais necessitarem de planejamento adicional, o processo de planejamento desta subparte deve ser assunto dessas autoridades.

            Na seção 219.4 - Níveis de Planejamento- estabelece-se que o planejamento requer um fluxo contínuo de informações e direções de manejo entre os três níveis de administração florestal: nacional, regional e municipal.

            A avaliação do Plano de Uso dos Recursos Florestais (RPA) deve incluir análise dos usos presentes e futuros, demanda e oferta de recursos da floresta, pastagens naturais, e outras terras associadas considerando a oferta, a demanda e as tendências de preços associados. Ainda, deve conter um inventário dos recursos naturais presentes e recursos naturais potenciais e uma avaliação das oportunidades para melhorar a sua produção de bens e serviços tangíveis e intangíveis, juntamente com estimativas de custos de investimento e retornos financeiros diretos e indiretos para o Governo Federal.

            O RPA inclui também a descrição dos programas de pesquisa do serviço florestal, programas cooperativos, manejo do Sistema Nacional de Florestas; análises políticas e legais, e de outros fatores que possam influenciar e afetar significativamente o uso, a posse, e o manejo das florestas, pastagens naturais, e outras terras associadas.

            Importante contribuição no que tange às diretrizes para o planejamento das unidades de conservação pode ser dada pelo ato normativo norte-americano "normas de Planejamento de 2000" (Planning Rule - 2000). Tal norma é aplicável ao Sistema Nacional de Florestas e tem como princípios a manutenção ou restauração da sustentabilidade ecológica, o desenvolvimento econômico e social, a integração eficiente com a paisagem, o engajamento da população norte-americana no cuidado das terras do Sistema Nacional de Florestas, num processo contínuo em que as decisões são adaptadas para enviar novas informações e servir ao interesse público.

            O Decreto n0. 1.607/85 da Bélgica trata dos chamados parques naturais. Para a lei belga, um parque natural é um território rural de alto interesse biológico e geográfico submetido às medidas destinadas a proteger o meio, em harmonia com as aspirações da população e o desenvolvimento econômico e social do território em questão.

            Os planos de manejo dos referidos parques devem indicar os objetivos no qual concerne notadamente a conservação da natureza, a proteção do meio ambiente, o desenvolvimento do território, o desenvolvimento rural e econômico. Tal plano deve indicar também as medidas a serem tomadas para atender aos objetivos, uma descrição dos meios que serão levados a cabo para que a população se interesse pela gestão do parque, uma estimativa das despesas com pessoal, funcionamento e os investimentos necessários para gestão do parque, uma estimativa da agenda de investimentos a serem feitos, tendo-se em vista promover os objetivos do território e, eventualmente, as modificações a serem feitas devido à criação do parque.

            De acordo com a Lei n.º 19.300/1994, do Chile, a avaliação de impacto ambiental é o procedimento, a cargo da Comissão Nacional de Meio Ambiente ou da Comissão regional respectiva, que, baseado em um estudo ou declaração de Impacto Ambiental, determina se o impacto de uma atividade ou projeto se ajusta às normas vigentes.

            O artigo 106 da Constituição da Venezuela impõe ao Estado o dever de atender à defesa e conservação dos recursos naturais de seu território, estabelecendo ainda que a exploração dos mesmos estará dirigida primordialmente ao benefício coletivo dos venezuelanos. Sobre o tema dos parques nacionais, a Venezuela editou a Lei nº 20.643, de 13/11/1941. Outra lei que rege os sistema venezuelano de Parques nacional é a Lei n0. 2.022/1977

            A Lei n0. 76.629/1976 da França, Lei de Proteção Ambiental, também aborda a questão do impacto ambiental no planejamento. De acordo com o artigo 12, os trabalhos e projetos que são empreendidos por uma coletividade pública ou que necessitam de uma autorização ou uma decisão de aprovação, assim como os documentos de urbanismo devem respeitar os bens de interesse do ambiente. Segundo o mesmo artigo, o conteúdo do estudo de impacto deve compreender no mínimo uma análise do estado inicial do sítio e de seu ambiente, o estudo das modificações que o projeto causará e as medidas consideradas para suprimir, reduzir e, se possível, compensar as conseqüências danosas para o ambiente.

            A Lei n0. 4/89 da Espanha prevê entre suas categorias de espaços protegidos os Parques Naturais, que são unidades de conservação onde se harmonizará a conservação dos valores naturais com o aproveitamento ordenado dos recursos florestais (BAQUERIZO, 1990).

            3.1.1 Gestão Compartilhada das Unidades de Conservação

            Um mecanismo importante na gestão florestal é a criação de grupamentos de produtores florestais, a exemplo do previsto no Capítulo VIII da Lei n0. 248 -1 da Lei Florestal Francesa, que dispõe: "As sociedades cooperativas e suas uniões, as sociedades de interesse agrícola coletivo, as associações e agrupamentos de proprietários florestais, constituídos para melhorar a produção das florestas ou para favorecer o fluxo dos produtos e regularizar os cursos, podem ser reconhecidos pelo representante do Estado na região, após parecer do centro regional da propriedade florestal, como agrupamentos de produtores florestais,...omissis".

            O capítulo da referida lei é dedicado aos proprietários de florestas. No entanto, o mecanismo da formação de agrupamentos de produtores florestais poderia ser utilizado com sucesso em unidades de conservação de uso sustentável, uma vez que suas características recomendam a adoção de um mecanismo de gestão compartilhada.

            No México, a obrigação de cuidar dos recursos florestais e de regular o seu aproveitamento está determinada no artigo 27 da Constituição Mexicana. Os artigos 4º e 25 fazem também menção a esta matéria. O meio ambiente é disciplinado pela Lei Geral do Equilíbrio Ecológico e a Proteção ao Meio Ambiente.

            Uma alternativa desejável é a existência de um sistema de gestão participativa. A Lei nº. 15.939 do Uruguai apresenta um instrumento em seu artigo 18 que possibilita a administração e direção dos parques para o público em geral.

            A Lei Florestal da Bolívia (Lei n0. 1700/1996) prevê o regime de concessão florestal a grupamentos sociais locais. Segundo este dispositivo, os usuários tradicionais, as comunidades campesinas e os grupamentos sociais locais têm preferência na concessão de áreas com recursos tradicionais de extrativismo.

            Por razões de conveniência, o Poder Executivo poderá conceder a entidades públicas ou privadas sem fins lucrativos, a direção e administração de outros setores do Patrimônio Florestal do Estado. No caso dos parques nacionais o uso deverá ser permitido para o público em geral.

            As comunidades locais organizadas mediante qualquer uma das modalidades de pessoa jurídica previstas pela Lei nº 1551, de 20 de abril de 1997, ou outras estabelecidas na legislação nacional, terão prioridade para a outorga de concessões florestais em terras fiscais de produção florestal permanente.

            Na legislação brasileira o assunto da gestão das unidades de conservação foi tratado na Lei n0. 9.985/2000 (Sistema Nacional de Unidades de Conservação). Os artigos 23 a 36 da citada lei estabelecem normas gerais para a gestão das Unidades de Conservação.

            Uma outra alternativa a se considerar para a gestão das unidades de conservação é a criação de conselhos gestores. Nesse sentido, o Estado do Rio de Janeiro já se manifestou legislativamente sobre a criação deste instrumento para as Unidades de Conservação no Estado.

            O diploma que regulamenta tal conselho é a Lei Estadual nº. 3443/2000. Um outro aspecto importante a se considerar na gestão das unidades de conservação é o respeito às populações tradicionais que vivem nessas áreas. Neste aspecto a Lei nº. 2393/1995 dispõe sobre a permanência de populações nativas residentes em unidades de conservação do Estado do Rio de Janeiro.

            No que se refere ao trânsito de informações das, e para as, unidades de conservação a legislação norte-americana pode ser tida como referencial. Segundo ela, no caso do Sistema Nacional de Floresta do País, deve haver um fluxo das informações em três níveis administrativos: nacional, regional e, especificamente, florestal. Este princípio é importante não só para o fluxo de informações dos instrumentos da política florestas e ambiental dos estados, mas essencialmente para a criação de um sistema de gestão integrada.

            Ainda no referido ato legislativo norte-americano observa-se um referencial para a formulação de um mecanismo de avaliação dos recursos renováveis. Dentre as determinações da lei norte-americana está a avaliação da oferta e demanda dos recursos naturais renováveis assim como inventários e análises de custo de investimento. Esta determinação é de suma importância, uma vez que o uso sustentável das florestas só é possível por meio da constante avaliação dos recursos utilizados, principalmente no que diz respeito à demanda de produtos.

            3.1.2 Planos de Manejo nas Unidades de Conservação

            O Artigo 2º da Lei 9.985/2000 (SNUC) fornece a definição de Plano de Manejo como: "documento técnico mediante o qual, com fundamento nos objetivos gerais de uma unidade de conservação, se estabelece o seu zoneamento e as normas que devem presidir o uso da área e o manejo dos recursos naturais, inclusive a implantação das estruturas físicas necessárias à gestão da unidade".

            De acordo com esse diploma, todas as unidades devem possuir um Plano de Manejo. O artigo 27 fornece as diretrizes e princípios básicos para a elaboração de tais planos. O Plano de Manejo deve abranger a área da unidade de conservação, sua zona de amortecimento e os corredores ecológicos, incluindo medidas com o fim de promover sua integração à vida econômica e social das comunidades vizinhas. Na elaboração, atualização e implementação do Plano de Manejo das Florestas Nacionais, deverá ser assegurada a ampla participação da população residente.

            3.1.3 A Sustentabilidade Econômica das Unidades de Conservação

            Como instrumento da auto sustentabilidade econômica, a lei do SNUC prevê no artigo 5º. que a exploração comercial de qualquer produto elaborado a partir de recursos das unidades de conservação, inclusive os cênicos, dependerá de prévia autorização, além de sujeitar o explorador a pagamento, conforme regulamento.

            Nos empreendimentos que forem considerados, pelo EPIA/REPIA, de significativo impacto ambiental, o licenciador obrigará o empreendedor a apoiar, com 0,5 % do custo do empreendimento, no mínimo, a implantação e manutenção de unidades de conservação do Grupo de Proteção Integral, definidas pelo licenciador.

            Os artigos 47 e 48 de referida lei também possibilitam mais um instrumento para a possibilidade da auto-sustentabilidade econômica das unidades de conservação. De acordo com estes artigos, as empresas ou órgãos responsáveis pelo abastecimento de água ou energia elétrica, que façam uso dos recursos hídricos, beneficiário da proteção de uma unidade de conservação, devem contribuir para a sua implantação e manutenção.

            Um aspecto importante no desenvolvimento sustentável das unidades de conservação de uso direto é o desenvolvimento econômico das zonas de amortecimento. Nessa matéria, importante contribuição é prestada por PUTNEY (2000), segundo o qual muitos projetos internacionais que apóiam as unidades de conservação incluem atividades para fomentar o desenvolvimento sustentável das zonas de amortecimento. Estes são, em geral, projetos de desenvolvimento rural em pequena escala, utilizando-se de um enfoque participativo e adaptativo.

            Em geral, os projetos que conseguiram aumentar o apoio das comunidades locais são os que empregam táticas para o desenvolvimento da política da boa vizinhança. Neste enfoque, a administração da unidade de conservação não se faz responsável pelo desenvolvimento sustentável da zona de amortecimento, mas acompanha as comunidades em sua busca por soluções por meio de outros atores sociais como as entidades estatais de desenvolvimento rural, universidades, organizações não governamentais e igrejas.

            Pelo fato de serem localizados em uma zona de amortecimento, estes projetos devem obedecer ao requisito de que o seu impacto sobre as unidades de conservação seja pelo menos neutro. O projeto deve reduzir substancialmente os impactos negativos das comunidades sobre a unidade vizinha. O referido autor faz ainda referência a algumas conclusões de sua experiência internacional com projetos deste tipo no México, Guatemala, Costa Rica, Equador, Peru e Bolívia, dentre os quais:

            a) as instituições que administram as unidades de conservação não são estruturadas para atender adequadamente os projetos de desenvolvimento sustentável nas zonas de amortecimento;

            b) as dificuldades encontradas na implementação de projetos de desenvolvimento sustentável em zonas de amortecimento demandam tanta atenção que os mesmo programas de manejo da unidade de conservação sofre negligência.

            A Lei nº 22.723 da província de Buenos Aires, na Argentina, tem por objetivo a proteção, a conservação, o melhoramento e a restauração dos recursos naturais e do ambiente em geral. Para o desenvolvimento de atividades produtivas, o aproveitamento dos recursos naturais e para a localização dos assentamentos humanos, deve-se ter em conta os seguintes fatores: a natureza e as características de cada bioma, a vocação de cada região, em função de seus recursos, a distribuição da população e suas características geoeconômicas em geral. Ainda devem ser consideradas as alterações existentes nos biomas proveniente do efeito dos assentamentos humanos, de atividades econômicas ou de outras atividades humanas ou fenômenos naturais (BURKART et al., 1996).

            A lei supracitada prevê em seu capítulo VI a existência do Fundo de Fomento de Parques Nacionais. Segundo o artigo 25 da referida lei, tal fundo se integra da arrecadação produzida com a venda, arrendamento e concessão de imóveis, instalações e bens móveis; com o produzido dos aforos e venda de madeira fiscal e outros frutos produzidos; com os direitos de caça e pesca; com os direitos de entradas e patentes; com os direitos de edificação, construções em geral, contribuições de melhoria, assim como com as taxas que se estabeleçam como retribuição de serviços públicos.

            São agregados ao fundo também, o valor arrecado nas concessões; os preços que perceba o organismo pelos serviços prestados diretamente; as entradas provindas de multas aplicadas de acordo com esta lei; as subvenções, doações, legados, aportes e transferências de outras participações ou de pessoas físicas e jurídicas; os interesses e rendas dos bens que; as somas que são destinadas do orçamento geral da Nação e todo outro ingresso que derive da gestão e administração dos Parques Nacionais; e, finalmente, recursos não utilizados no fundo, provenientes de exercícios anteriores.

            O montante arrecadado no referido fundo deve ser aplicado para a criação de Parques Monumentos Naturais e Reservas Naturais; para a aquisição de bens necessários para o cumprimento das finalidades da lei; para a promoção de atividades que concorram para assegurar a melhor difusão e conhecimento das unidades de conservação, tais como a realização de congressos, exposições, mostras, campanhas de publicidade e outras que contribuam para a finalidade indicada; para a realização de cursos, estudos e pesquisas; os gastos com pessoal, gastos gerais e investimentos que demande o funcionamento da administração de Parques Nacionais. Pode ainda ser destinado ao cumprimento de todo outro departamento que deva realizar a administração dos parques nacionais, de acordo com as funções e atribuições que lhe sejam conferidas.

            Encontra-se na Lei nº 1.700/1996 da Bolívia importante referencial no que tange aos objetivos do desenvolvimento sustentável. No artigo 2º desta lei são citados os ditos objetivos, que são:

            a) estabelecer e fomentar as atividades florestais sustentáveis que contribuam para o desenvolvimento socioeconômico da nação;

            b) promover o desenvolvimento sustentável dos recursos florestais e garantir a conservação dos ecossistemas, da biodiversidade e do meio ambiente;

            c) proteger e recuperar as bacias hidrográficas, prevenir e deter a erosão das terras e a degradação das florestas, pradarias, solos e águas, e promover o reflorestamento;

            d) facilitar a toda a população o acesso aos recursos florestais e seus benefícios, em estrito cumprimento das prescrições de proteção e sustentabilidade; promover a pesquisa florestal, assim como a sua difusão ao serviço dos processos produtivos, de conservação e proteção dos recursos florestais;

            e) fomentar o conhecimento e promover a formação de consciência da população nacional sobre o manejo responsável das bacias e seus recursos florestais.

            A Lei n.º 13.273/48 da Argentina prevê em seu capítulo VI a existência do Fundo de Fomento Florestal. Segundo o artigo 47 da referida lei, tal fundo se integra da arrecadação produzida com a venda, arrendamento e concessão de imóveis, instalações e bens móveis; com o produto da alienação da madeira e outros frutos produzidos; com os direitos de caça e pesca; com os direitos de entradas e patentes; com os direitos de edificação, construções em geral, contribuições de melhoria, assim como com as taxas que se estabeleçam como retribuição de serviços públicos. Ainda, são incorporados ao fundo o arrecadado nas concessões; os preços públicos; as entradas provindas de multas aplicadas de acordo com a lei; as subvenções, doações, legados, aportes e transferências de outras participações de pessoas físicas e jurídicas; dotações orçamentárias e outras.

            Em algumas leis florestais da América Latina está prevista a existência do fundo florestal, a exemplo da Argentina, do Uruguai e do Chile. No Brasil tal fundo estava previsto no Decreto n0. 23.793/ 1934, o qual foi revogado pela Lei n0. 4.771 de 1965.

            O Título III do livro V da Lei Florestal Francesa institui o Fundo Florestal Nacional Francês e seus objetivos e dispõe que "em vista da reconstituição das florestas francesas, o ministro das florestas assegura, de acordo com as modalidades fixadas pelos decretos, a organização de atividades de florestamento e Reflorestamento, a avaliação e conservação dos terrenos florestados, a melhor utilização dos produtos da floresta e, em geral, tudo que tem por objetivo incrementar os recursos florestais, de facilitar a saída de produtos florestais e melhor satisfazer as necessidades das populações." (SANTOS, 1997)


4 ESTRATÉGIAS PARA O DESENVOLVIMENTO DAS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO NO PARANÁ E NO BIOMA FLORESTA OMBRÓFILA MISTA

            De acordo com dados fornecidos pelo Instituto Ambiental do Paraná (IAP), o Estado possuía em 2002, 63 unidades de conservação de domínio estadual, 9 de domínio federal, 103 de domínio municipal e 151 de domínio privado.

            Do total das unidades de conservação, 72% está incluído na categoria de unidades de conservação de proteção integral e 28% em unidades de uso sustentável.

            As unidades de conservação federais perfazem um total de 1.612.801 ha, sendo que apenas 5.286 ha (0,32%) estão na região do Bioma Florestal com Araucária. Dentre essas unidades de conservação merece destaque a Floresta Nacional de Irati, com grande potencial para exploração e pesquisa.

            As unidades de conservação estaduais, por outro lado, têm uma área total de 1.177.323 ha, distribuídos por todo o Estado. Deste total, 987.905,8 ha (82,54%) estão incluídos no Bioma de Araucária. Cerca de 129 mil ha (13,12%) pertencem à categoria das UNCs de proteção integral e 842.135 ha (86,7%) pertencem à categoria de uso sustentável, como pode ser observado no MAPA 2.

            O grande problema, porém, dessas unidades reside na dificuldade estrutural e de recursos que o Estado encontra na gestão desses espaços, a exemplo do Parque Estadual de Vila Velha, que por anos ficou praticamente entregue à própria sorte.

            Finalmente, merece destaque, no Estado do Paraná, a proliferação das RPPNs, que de acordo com dados do IAP hoje somam 151 unidades. Deste total, cerca de 65% está inserido no Bioma Florestal com Araucária, sendo que hoje as RPPNs estaduais ocupam uma área de 16.124,5 ha. Grande obstáculo surge à medida que o Poder Público não fornece as condições estruturais mínimas nem exerce sobre estes locais a vigilância efetiva para que se alcance o objetivo esperado, que é a manutenção dos remanescentes florestais em áreas particulares.

            4.1 AS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DE PROTEÇÃO INTEGRAL

            Estratégias distintas devem ser adotadas para as duas modalidades de unidades de conservação, mas com o objetivo único de manter a qualidade ambiental do Bioma Florestal com Araucária no Estado do Paraná.

            Dentro dessa perspectiva, as unidades de conservação de proteção integral assumirão importante função, consideradas, porém, todas as limitações legais inerentes à categoria, sem perder em importância para a outra categoria, mas funcionando de forma complementar e análoga.

            Num primeiro momento destaca-se a função de proteção da biodiversidade e da manutenção do ecossistema integral e incólume, que deverá abrigar essencialmente matrizes genéticas, porta-sementes, como uma forma de reverter o processo de erosão genética da Araucária e, fundamentalmente, permanecer como testemunho cultural, histórico e científico do Bioma Florestal com Araucária. Ressalta-se também a incumbência de melhoria da qualidade paisagística local.

            Ainda, dentro das limitações de uso, esses espaços devem ser destinados ao desenvolvimento de atividades de educação ambiental, turismo ecológico e científico.

            Finalmente, essas áreas deverão estar formando os elos entre as unidades de conservação, criando os desejáveis corredores ecológicos dentro do Bioma.

            4.2. AS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DE USO SUSTENTÁVEL

            De acordo com dados do Instituto Ambiental do Paraná, o Estado possui 814,6 ha ocupados por florestas estaduais, 354 ha com reservas florestais e 4.223 ha com florestas nacionais. A superfície do Estado transformada em unidades de Reservas Particulares do Patrimônio Natural é crescente (16.610,7 ha). Extensão, porém, que nem sequer se aproxima da superfície ocupada por Áreas de Proteção Ambiental, que se distribuem por mais de 840.000 ha do Bioma (TABELA 1).

            Ações meramente repressivas e estratégias coercitivas têm se mostrado insuficientes para manter os remanescentes florestais no País, que vem paulatinamente perdendo sua cobertura florestal. O grande desafio está em criar estratégias que conciliem a preservação ambiental ao desenvolvimento econômico e social. Medidas isoladas também apresentam deficiências. Alternativa viável para manter os remanescentes florestais, sem onerar sobremaneira a população residente no Bioma, está na criação de planos de desenvolvimento das unidades de conservação de uso sustentável. Para tanto, criou-se um conjunto de medidas aplicáveis às categorias de unidade de conservação existentes e a serem criadas no Bioma Florestal com Araucária no Paraná.

TABELA 1 – UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DE USO SUSTENTÁVEL LOCALIZADAS NA FLORESTA OMBROFILA MISTA

UNIDADES DE CONSERVAÇÃO

ESTADUAL

UNIDADES DE CONSERVAÇÃO FEDERAL

Floresta Estadual

Reserva Florestal

APA

Estadual

RPPN Estadual

Floresta Nacional

RPPN Federal

área ha

%

área ha

%

área ha

%

Área ha

%

área ha

%

área ha

%

814.6

0.1

354.6

0.05

841142.7

71.4

16124.5

1.36

4223.8

0.35

486.2

0.07

            Fonte – Instituto Ambiental do Paraná, 2002.

            4.3 PROPOSIÇÃO DE UM MODELO DE DESENVOLVIMENTO DAS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DE USO SUSTENTÁVEL

            Dentro de uma perspectiva de uso dos recursos sustentáveis, o que se pretende a partir deste ponto é a proposição de uma regulamentação do aproveitamento dos recursos naturais em espaços naturais protegidos. Para tanto foram selecionadas e trabalhadas duas modalidades de UNCs, já existentes, em relação a sua gestão e possibilidade de uso dos produtos da floresta, e proposta a criação de uma nova modalidade, dentro de uma concepção de desenvolvimento sustentável. Foram desenvolvidas estratégias diferenciadas, aplicáveis às diferentes situações, mas com fulcro no desenvolvimento sustentável das florestas com Araucária.

            4.3.1 Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN)

            Dentre as modalidades de UNC esta se sobressaiu no Paraná tendo vultoso incremento quantitativo, com mais de quinhentas propriedades rurais averbadas nos últimos anos. Contudo, alguns aspectos merecem ser discutidos.

            O primeiro diz respeito à carência de recursos estruturais e monetários destinados à manutenção e gestão destas áreas, eis que, por vezes, quem recebe compensação financeira em função da existência deste espaço protegido é o Poder Público, como é o caso do valor decorrente do ICMS ecológico no Paraná, restando ao particular, por sua vez, o ônus da restrição de uso da propriedade, da tutela e vigilância da floresta.

            Na resolução do problema algumas medidas podem ser tomadas. A primeira alternativa é a criação de uma linha de financiamento exclusiva para a promoção do ecoturismo em reservas particulares. Em tempo, outra alternativa, polêmica, mas viável, é o incentivo à exploração de baixo impacto de recursos não madeireiros oriundos destas propriedades, apesar da vedação legislativa, decorrente do artigo 21, §20., do SNUC, que pode e deve ser alterado.

            No caso específico do Bioma Florestal com Araucária, o foco deve estar centrado no aproveitamento de plantas medicinais e de outros subprodutos como o pinhão, o nó de pinho e a erva-mate. Objetivando o controle e a promoção destes produtos, é interessante a criação de um certificado de origem, que possa estar sob a responsabilidade do Estado ou mesmo de organizações não- governamentais, com a fiscalização do Estado.

            4.3.2 Florestas Estaduais

            O Sistema Nacional de Unidades de Conservação dispõe que as Florestas Nacional, Estadual e Municipal são áreas florestais contínuas, que devem possuir espécies predominantemente nativas. Estas áreas são, obrigatoriamente, de posse e domínio públicos, sendo que o Poder Público deverá desapropriar as áreas necessárias à sua criação. Importante destacar que esta modalidade tem como objetivo o uso múltiplo e a conservação dos recursos florestais renováveis e a pesquisa científica.

            Hoje, de acordo com dados fornecidos pelo Instituto Ambiental do Paraná (TABELA 16), o Estado possui pequena extensão do território protegido por esta ferramenta (cerca de 6.000 ha) deixando de usufruir este poderoso instituto na preservação do Bioma Florestal com Araucária. Daí emana princípio basilar, ou seja, o que se advoga nesta tese é que as florestas estaduais no Paraná podem ter valioso papel não apenas na preservação do meio ambiente, mas também na regulação dos estoques de madeira de Araucária e outras essências de valor comercial, e, por via transversa, para o desenvolvimento social e econômico regional.

            Porém, para que sejam exploradas, é necessário que as Florestas Estaduais disponham de um plano de manejo, uso e conservação, por meio do qual sejam definidos os objetivos específicos da unidade, seu zoneamento e sua utilização. O uso sustentável das Florestas Estaduais deve ter como objetivo primeiro a manutenção do equilíbrio ambiental, associado ao desenvolvimento social e econômico regional.

            Essas unidades são constituídas em propriedades do Estado e destinam-se a assegurar, mediante exploração racional, um suprimento de produtos florestais e a proteger a fauna e a flora locais, de modo a garantir a sobrevivência de suas espécies em condições naturais. Esta exploração poderá ser feita diretamente pelo Poder Público ou por meio de contratos com particulares, reservado para o Estado o domínio da terra, podendo ser outorgadas concessões, a pessoas físicas ou jurídicas, para o desenvolvimento de atividades silviculturais.

            Os contratos para a exploração das Florestas Estaduais poderão ser feitos mediante processo licitatório na modalidade de concorrência pública, ficando estabelecido que, no instrumento convocatório, deverá constar de forma clara, como um dos critérios de julgamento da proposta, a capacidade de desdobro secundário na forma de beneficiamento mínimo, dentro dos limites territoriais do município, visando ao desenvolvimento daquela população diretamente afetada pelo empreendimento.

            Os recursos financeiros provenientes das concessões serão destinados à Conta Especial Para a Gestão das Unidades de Conservação de Uso Sustentável, instituto que será tratado no decorrer deste trabalho.

            No contrato de concessão, o concessionário se obrigará a cumprir as Leis Florestais e Ambientais do Estado, bem como as disposições do Plano de Manejo da respectiva unidade. Caso o concessionário não cumpra a legislação ou viole normas específicas ou cláusulas contratuais, terá o contrato de concessão rescindido.

            O Plano de Manejo deverá sofrer revisão periódica a cada dois anos pelo órgão competente. No resguardo do interesse público, é crucial o estabelecimento pelo Estado de garantia da prestação das atividades previstas em contrato, no instrumento convocatório do processo licitatório, podendo o contratante optar por uma das seguintes modalidades de garantia:

            I - caução em dinheiro ou bens imóveis;

            II – seguro-garantia;

            III – fiança bancária.

            O Governo, através de seus órgãos especializados, fará um inventário florestal, estimando a qualidade e a quantidade de recursos disponíveis em cada unidade de conservação, sendo que a realização do inventário florestal deverá, obrigatoriamente, anteceder ao processo licitatório de concessão para exploração dos recursos florestais.

            Finalmente, dois pontos fundamentais precisam ser ressaltados. O primeiro é que em cada Unidade de Conservação a soma de todas as concessões não poderá exceder a 25% (vinte e cinco por cento) da área total da mesma. Em cada Floresta Estadual de mata natural será reservada uma ou mais áreas a serem mantidas intocáveis, as quais deverão constituir amostra expressiva dos recursos naturais do local.

            Ora, é certo que se assume um risco em relação ao remanescente, que pode ser sanado pela ação eficaz do Poder de Polícia do Estado, mas é certo também que não se pode sacrificar toda uma região, que, por vezes, está sentada sobre precioso recurso, e hoje está sendo estigmatizada por ter conservado suas florestas sob a justificativa de que a Araucária precisa ser preservada, a qualquer custo.

            4.4 PROPOSIÇÃO DE UMA NOVA CATEGORIA DE UNIDADE DE CONSERVAÇÃO RESERVAS PARTICULARES DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL (RPDS)

            4.4.1 Fundamentação Legal

            A Carta Magna do Brasil é o fundamento de qualquer produção legislativa do Brasil, determinando a competência dos Estados em matéria de meio ambiente. A Constituição assim dispõe:

            Art.23 - É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios:

            (...)

            VI - proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas;

            Art.24 - Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre:

            (...)

            VI - florestas, caça, pesca, fauna, conservação da natureza, defesa do solo e dos recursos naturais, proteção do meio ambiente e controle da poluição;

            Os princípios abrangidos pela Constituição são válidos para a totalidade do Ordenamento Jurídico, sendo imperioso citar o artigo 170 da Constituição Federal. Este dispositivo determina que a ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, respeitados certos princípios, dentre os quais guardam relação com este trabalho: a propriedade privada, a defesa do meio ambiente, a redução das desigualdades regionais e sociais e a busca do pleno emprego.

            Sublinhe-se que o legislador constitucional não deixou espaço para uma ideologia extranormativa, não cabendo ao intérprete priorizar este ou aquele princípio, mas somente ocupar-se do que já está posto, numa aplicação harmoniosa da norma, respeitados todos os princípios elencados. Desafiadora a busca de estratégias que caminhem na direção da conservação do meio ambiente como forma de aumento de postos de trabalho em atividades como o ecoturismo e a silvicultura. É certo que em hipótese alguma a defesa do meio ambiente possa implicar o aumento das desigualdades regionais e sociais, como se tem observado in loco em algumas regiões paranaenses.

            Dentre os diplomas infraconstitucionais, a Lei n0. 9.985/2000 reza que o objetivo básico das Unidades de Uso Sustentável é compatibilizar a conservação da natureza com o uso sustentável de parcela dos recursos naturais. No trato científico da norma, é prioridade identificar os princípios maiores, pois disso depende a possibilidade de compreensão ampla do sistema. Na interpretação da referida norma, é mister iniciar a investigação semântica pelo verbo compatibilizar, que na mais escorreita linguagem significa "que torna possível a coexistência", "que é conciliável". Não resta dúvida que o objetivo do legislador, ao definir esta modalidade de unidade de conservação, foi de manter no mesmo nível hierárquico a conservação da natureza e o uso sustentável de parcela dos recursos naturais, aspecto que não tem sido considerado na criação e gestão das unidades de conservação existentes.

            Dando continuidade à análise do diploma, o artigo 40. dispõe que, dentre os objetivos do SNUC estão a promoção do desenvolvimento sustentável a partir dos recursos naturais (IV) e também a valorização econômica e social da diversidade biológica (XI). Examinando a lei conclui-se que o texto está posto numa relação horizontal mantendo-se, também, um mesmo nível hierárquico entre os itens descritos no artigo. Isto quer dizer que não há prioridade para qualquer dos objetivos que devem, sempre que possível, ser privilegiados no planejamento das áreas protegidas.

            Por fim, o artigo 50. da lei, em vários de seus incisos ressalta a importância da participação popular na gestão e administração das unidades de conservação, considerando as condições e necessidades das populações locais no desenvolvimento e adaptação de métodos e técnicas de uso sustentável dos recursos naturais. Enfatiza, também, a desejável sustentabilidade econômica das unidades de conservação.

            O objetivo desta abordagem é então o de lançar luzes sobre alguns pontos que têm sido desprezados quando da criação das UNCs, eis que é notável a carência legislativa no que concerne ao uso sustentável das Unidades de Conservação.

            Partindo dessas premissas e ainda de que é desejável que cada Estado venha a criar, dentro de sua competência, e respeitado a legislação federal, modalidade de unidade de conservação que melhor se coadune com as especificidades regionais, é que foi construído este modelo de espaço protegido, com aplicação sugerida ao Bioma Florestal com Araucária.

            4.4.2 Concepção técnica e normativa das Reservas Particulares de Desenvolvimento Sustentável (RPDS)

            A Reserva Particular de Desenvolvimento Sustentável (RPDS) será uma nova categoria de unidade de conservação, constituída em áreas com cobertura florestal com espécies predominantemente nativas, dotada de atributos ecológicos importantes, que tem como objetivo básico o uso múltiplo sustentável dos recursos florestais, madeireiros e não madeireiros, o desenvolvimento socioeconômico regional e a pesquisa científica, com ênfase em métodos para exploração sustentável da floresta.

            A RPDS é de posse e domínio privados, gravada com perpetuidade, e com uso condicionado às normas estabelecidas para o manejo da unidade pelo órgão responsável por sua fiscalização.

            Nessas áreas é admitida a permanência do proprietário e de seus familiares que ali residiam quando da sua criação, respeitados os limites dispostos no plano de manejo da unidade.

            Será incentivado nessa área o uso múltiplo da floresta mediante a exploração da madeira, de produtos não madeireiros e do ecoturismo, atividades estas sujeitas às normas estabelecidas no plano de manejo.

            A exploração madeireira só será permitida em bases sustentáveis, com o uso de técnicas de baixo impacto, e acompanhada de outras atividades que deverão ser desenvolvidas no local. A exploração dependerá da aprovação do plano de manejo florestal, seguindo rígido regramento e sob constante vigilância do órgão gestor.

            Estão proibidas neste local a exploração mineral, a caça amadorística ou profissional.

            Será incentivado o desenvolvimento de projetos científicos voltados à conservação da natureza, sujeitos à aprovação do órgão ambiental responsável, sendo desejável a consulta ao conselho.

            Fica estabelecido que no mínimo 25% da área com cobertura florestal deverá ser mantida intocada na propriedade. Ainda que, parte dos recursos obtidos com a exploração dos recursos naturais deverá ser destinada à Conta Especial para a Gestão das Unidades de Conservação, o qual será tratado posteriormente neste trabalho.

            Essas áreas disporão de um Conselho Deliberativo presidido pelo órgão responsável pela sua administração e constituído por representantes dos órgãos públicos, dos proprietários das RPDS e das organizações da sociedade civil. Este conselho terá a função principal de traçar as diretrizes para o uso racional destas áreas protegidas no Estado, resguardadas as disposições legais e o direito de propriedade, garantido constitucionalmente.

            A comercialização dos produtos e subprodutos resultantes da exploração estará vinculada à certificação do produto pelo órgão competente.

            Diante do exposto, é possível apontar uma série de vantagens auferidas pelo proprietário e pela sociedade na criação e preservação dessas áreas.

            O primeiro ponto positivo ocorre com a manutenção da biodiversidade local, pela preservação de remanescente da floresta, que mesmo que tenha parte do seu todo explorada, terá uma área mínima de 25% do total integralmente preservada, como sugerido na criação do instituto. Importante destacar que estas áreas deverão ser obrigatoriamente averbadas. Esta averbação tem caráter de perpetuidade, barrando qualquer tentativa de alteração de uso do solo no momento presente ou futuro.

            Uma segunda vantagem resulta da exploração florestal que terá parte do montante destinado à Conta Especial que será reservado para a gestão e manutenção do sistema de unidades de conservação no Estado.

            O terceiro aspecto positivo dar-se-á pela melhoria da qualidade de vida da população residente no entorno, pelo aumento da oferta regional de empregos e criação de uma consciência ecológica da população, que estará aprendendo a valorizar o recurso ambiental disponível.

            O proprietário rural terá seu interesse despertado para aderir ao programa, pois o Estado deverá fomentar a venda dos produtos certificados oriundos destas áreas. Estes produtos, conseqüentemente, poderão ter um incremento no volume comercializado do produto, em razão da propaganda de um artigo produzido de forma ecologicamente correta.

            Ainda, vale salientar que prioridade deverá ser dada ao desenvolvimento de programas de formação profissional, para membros provenientes das comunidades locais, que deverão estar fazendo o beneficiamento dos produtos de madeira.

            Por fim, interessa ao produtor rural instituir esta unidade de conservação em sua propriedade, porque, apesar de ter o uso da terra limitado, usufruirá um conjunto de benefícios fiscais, exclusivos para as Reservas Particulares de Desenvolvimento Sustentável, como a isenção do Imposto Territorial Rural e a aplicação de alíquota diferenciada na aplicação do Imposto sobre Transferência de Bens Imóveis.

            4.5 Limitação à Exploração Florestal nas Unidades de Conservação de Uso Sustentável

            4.5.1 Limitação Principiológica

            Apesar da farta legislação nacional referente à proteção do meio ambiente, poucas são as normas jurídicas que contemplam o uso dos recursos florestais nas unidades de conservação. O estudo destas normas, no entanto, é válido, porque a análise da legislação nacional, estadual e municipal oferece grandiosos auxílios à real satisfação dos interesses da coletividade, objetivo maior do ordenamento jurídico.

            Observam-se, porém, limitações genéricas em relação à preservação das florestas e das unidades de conservação, estabelecidas, principalmente, pela Constituição Federal, Declaração de Estolcomo, Declaração do Rio de Janeiro (Rio 92), Lei de Crimes Ambientais, Lei do SNUC, Política Nacional do Meio Ambiente e o Código Florestal.

            Tais diplomas estabelecem princípios e delegam atribuições aos entes federativos no que concerne à proteção, preservação e restauração do ambiente, garantindo a qualidade de vida da população. Os princípios de direito ambiental vinculam a produção e a aplicação das leis em todos os seus níveis, atuam como verdadeira regra jurídica. E mais, são parâmetros utilizados na aplicação da norma ao caso concreto, formadores do regime jurídico ambiental.

            Ressalta-se, porém, a necessidade de limitações específicas ao uso econômico das unidades de conservação. A direção a ser tomada deve compatibilizar os interesses econômicos com os interesses ambientais, ou seja, o uso eco-econômico dos recursos florestais, garantindo a sustentabilidade da floresta em benefício da vida humana.

            Nesse sentido Toshio MUKAI (2002) assevera que "a Constituição Federal Brasileira, ao contemplar no mesmo plano (art. 170, IV e VI) os princípios da livre concorrência e o da defesa do meio ambiente, não admite que este último seja colocado de lado com privilégio do primeiro". O autor continua afirmando que "há que se compatibilizar, sempre e a todo custo os dois princípios. E, em caso de conflito real, há que se efetuar uma ponderação de interesses, para que não haja sacrifício total de um ou de outro. Importante assinalar a necessidade de tratamento jurídico diferenciado às diferentes modalidades de unidades de conservação tendo em vista suas finalidades, principalmente no que diz respeito à função social de cada uma delas".

            As unidades de conservação de uso direto deverão ser exploradas de forma racional respeitando os limites de sustentabilidade de cada localidade.

            Os recursos obtidos através das atividades desenvolvidas nas unidades de conservação deverão ser direcionados à preservação e recuperação dasFlorestas de Araucária e ao desenvolvimento social e econômico da região onde está inserida a floresta. As modalidades Floresta Estadual, RPPN e RPDS deverão ter usos distintos, levando em consideração as especificidades e finalidades de cada uma.

            Deverá ser criado um sistema especial de fiscalização e controle das áreas de interesse, preferencialmente utilizando os recursos obtidos com a atividade de exploração, destinados especificamente para as unidades de conservação de uso direto.

            As atividades de exploração dos recursos naturais das áreas protegidas deverão, preferencialmente, ser explorados pelas comunidades locais.

            4.5.2 Limitação à Concessão

            Passos de FREITAS (1993) entende que: "se é verdade que o ideal é que a coletividade tenha noção de seu relevante papel em tal atividade (proteger o meio ambiente), verdade é também que nem todos possuem consciência da importância da questão. Disto resulta que, na realidade, ao Poder Público é que cabe o papel principal na tutela do ambiente sadio."

            Na esfera administrativa a atuação do Estado, na garantia dos direitos coletivos, perfaz-se principalmente com a realização de procedimentos licitatórios a fim de conceder o uso de espaços florestais àquele que melhor corresponda aos anseios sociais e ecológicos. Sendo assim, a análise das Leis n0. 8.666/93 (Lei de Licitações) e n0. 8.987/95 (Lei do Regime de Concessão e Permissão) são imprescindíveis à definição de parâmetros para elaboração do procedimento licitatório e do contrato de concessão para atividades florestais. Os princípios contidos nestas normas são aplicáveis aos contratos que tem como objeto a exploração de uma unidade de conservação, mas sempre em consonância com os princípios de direito ambiental.

            A relevância ambiental e econômica da contemporaneidade em relação à atividade exploratória dos recursos florestais conduz à construção de ferramentas essenciais à proteção dos interesses coletivos ainda no procedimento licitatório. Por esta razão deve ser estabelecida a prestação de garantia acessória ao contrato de concessão para a exploração dos recursos florestais e o desdobro mínimo dos recursos florestais, como forma de agregar valor maior nas atividades mercantis ainda no Estado em que as unidades estão localizadas.

            4.5.3 Limitações Estabelecidas ao Plano de Uso dos Recursos Florestais nas Unidades de Conservação de Uso sustentável

            O Plano de Uso Florestal é um instrumento hábil a garantir a viabilidade econômica do projeto de exploração a ser realizado. Além disso, deverá garantir o mínimo impacto sobre o meio ambiente, prevendo inclusive a reserva de espécies florestais e a proteção dos abrigos dos animais locais.

            As partes do contrato vinculam-se ao plano de manejo florestal, de tal maneira que a infração as suas disposições implica infração ao próprio contrato firmado.

            É imprescindível que seja estabelecida uma fórmula indicando limites objetivos de exploração, de modo a garantir a sustentabilidade da floresta, sem comprometer a viabilidade econômica, limitando o poder discricionário dos agentes públicos.

            A exploração deverá ser progressiva em relação aos parâmetros, visando atingir um grau de uso semelhante à capacidade de regeneração anual dasFlorestas de Araucária, que de acordo com SANQUETTA et al. (2001), é de aproximadamente 40 anos. A proporção estabelecida aproxima os parâmetros exploração e capacidade de regeneração conforme a área total da unidade. O crescimento das árvores é um processo ecológico dinâmico quando, em geral, as espécies pioneiras crescem mais rapidamente que as espécies clímax, e a mistura de floras é algo que pode mascarar evidências aparentes de declínio de comunidades florestais (WHITMORE, 1990; FINEGAN 1984). Porém, a criação de unidades de grandes dimensões e de formato regular possibilita uma maior equivalência entre a exploração e a regeneração florestal.

            A proporção ideal de exploração deveria estar restrita a 2,5% da área total ao ano, o que possibilitaria a regeneração total da área em 40 (quarenta) anos, quando poderia ser novamente explorada. No entanto, a restrição supra acabaria por impossibilitar a exploração em áreas pequenas. Para viabilizar a atividade econômica foram criados valores intermediários de exploração para áreas inferiores a 100ha e para áreas entre 100ha e 500ha. A área anual passível de exploração é formada por um conjunto de cálculos mantendo a equivalência para exploração nos três grupos.

            O grupo I abrange áreas inferiores a 300ha, permitindo a exploração anual de até 10% da área total da unidade (2).

            No grupo II, contendo unidades com área superior a 300 ha e inferior a 1.000ha, tem-se a limitação correspondente à soma de 30ha, mais a soma do resultado da multiplicação de 4% e a diferença entre a área total e 300ha. A limitação assim exposta procura manter a equivalência da viabilidade econômica entre os grupos. Os 30ha base são resultantes da análise dos primeiros 100ha da área da unidade à limitação de 10% para exploração. A exploração limitada a 4% atinge o montante da área total da unidade reduzido de 300ha, estes inclusos na exploração base (30ha), evitando-se, assim, considerar duas vezes a mesma área como parâmetro para exploração.

            A representação constante no grupo III segue a mesma linha aplicada ao grupo II. A limitação dá-se pela soma de 58ha adicionado de 2,5% da diferença entre a área total e 1.000ha. Primeiro, o quantum base de 130ha é resultado da aplicação da limitação de 10% de exploração aos primeiros 300ha e da aplicação do limitador de 4% à área superior a 1.000ha e inferior a 300ha. No primeiro caso, resultando em 30ha e no segundo em 38ha, totalizando 68ha base passíveis de exploração. A limitação de 2,5% atinge a área total da unidade reduzida de 1.000ha, pois estes já foram analisados e calculados, formando a exploração base. Mais uma vez evita-se a utilização dúplice do parâmetro a fim de calcular a área passível de exploração. Isto posto, nota-se que é mantida a equivalência quanto à viabilidade econômica dos diversos grupos. E mais, demonstra-se uma tendência à correspondência entre a capacidade de regeneração da floresta e a área passível de exploração anual dada pela dimensão total da unidade.

            4.6 APLICAÇÃO DO MODELO

            Utilizando informações obtidas em bancos de dados do IAP, foi procedida uma simulação de aplicação da fórmula desenvolvida, donde foram obtidos os resultados a seguir expostos.

            TABELA 2 - SIMULAÇÃO DE USO DOS RECURSOS MADEIREIROS NAS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DE USO SUSTENTÁVEL CONFORME MODELO PROPOSTO

            Categoria

            Dimensão

            (ha)

            Área explorável

            (ha)

            %

            Floresta Nacional

            ou

            Estadual

            4000

            133.25

            3.323

 

            3200

            113

            3.531

 

            1600

            73

            4.562

 

            1030

            58.75

            5.704

             

            RPDS

            988

            57.52

            5.822

 

            879

            53.16

            6.048

 

            568

            40.72

            7.169

 

            318

            30.76

            9.661

             

            RPPN

            297

            29.7

            10

 

            245

            24.5

            10

 

            130

            13

            10

             

            A análise da tabela acima denota a adoção de princípios para a criação de novas unidades de conservação, princípios esses que se baseiam na criação de Unidades extensas e de formato regular, a fim de preservar o meio ambiente sem inviabilizar economicamente o empreendimento, compatibilizando o fator de capacidade de regeneração da floresta e a sua exploração. A proporção entre a área passível de exploração anual e a área total da unidade visa atingir o grau de capacidade de regeneração total da floresta, transformando-a em um recurso perene e importante instrumento de política sócio-econômica e ecológica (3).


5 REESTRUTURAÇÃO ADMINISTRATIVA

            5.1 CONTA ESPECIAL PARA A GESTÃO DAS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO - CEGUC

            A Conta Especial para o Desenvolvimento das Unidades de Conservação de Uso Sustentável foi criada como instrumento hábil para a autogestão das unidades de conservação. Há de se destacar a limitada capacidade do aparato estatal na fiscalização de suas extensas áreas verdes, daí a necessidade de implantação de um sistema próprio para o controle das atividades relacionadas a este objeto.

            A eficácia de um instrumento legal é indissociável da reestruturação da fiscalização e gestão das atividades realizadas na unidade de conservação tendo em vista os fins a que se destina. Entende-se por reestruturação dos mecanismos de fiscalização sua descentralização, tornando-lhes mais efetivos e concentrados. A participação da sociedade e do terceiro setor é muito relevante neste aspecto, pois irá complementar a fiscalização estatal. Observa-se, neste aspecto, a importância da educação ambiental (Lei n0. 9.795/99), destacando-se a formação de uma consciência ambiental social, preservando e, indiretamente, fiscalizando o meio ambiente.

            Não obstante a situação acima especificada, nota-se a importância da criação um sistema de gestão próprio para as unidades de conservação de uso sustentável. Um sistema de gestão evitaria o desvio de finalidade na aplicação dos recursos advindos do contrato para exploração das unidades, combatendo o uso arbitrário do Erário e restringindo moderadamente o poder discricionário do administrador público.

            A criação de uma conta, formada pelo conjunto de receitas advindas da utilização econômica das unidades, estabeleceria um sistema de autogestão das unidades, dada pela aplicação dos recursos aos fins desejados (infra-estrutura, fiscalização, desenvolvimento tecnológico, elaboração de planos de manejo, incentivos etc.), garantindo a independência e a estabilidade financeira do sistema.

            Esse instrumento terá o objetivo de fomentar atividades que visem:

            a) promover a melhoria da qualidade ambiental;

            b) intensificar e aprimorar a fiscalização;

            c) melhorar a infra-estrutura e das vias de acesso nas UNCs;

            d) estimular iniciativas que possam beneficiar a população local;

            e) promover a capacitação e educação ambiental para a comunidade do entorno das UNCs;

            Constituirão recursos da CEGUC:

            a) recursos financeiros provenientes da concessão ou direito de uso das Florestas Estaduais e das Reservas Extrativistas;

            b)recursos advindos de indenizações por descumprimento de previsões contratuais ou normas legais referentes às UNCs;

            c) recursos advindos pela aplicação de multas pela prática de atos ilícitos cometidos nas Unidades de Conservação de Uso Sustentável;

            d) rendimentos de qualquer natureza auferidos com a remuneração decorrente da aplicação de seu patrimônio;


6.CONCLUSÃO

            O Brasil adotou em sua política ambiental a criação de Unidades de Conservação como meio de efetivação da proteção e desenvolvimento florestal (Lei n0. 6.938/81). As Unidades de Conservação formam um microssistema de preservação ambiental, e a implantação de um Sistema Nacional de Unidades de Conservação (Lei n. 9.985/2000) demonstra uma real possibilidade de integração entre desenvolvimento sócio-econômico e preservação ambiental.

            Destaca-se nesse contexto que, a Política Florestal é formada por um conjunto sistematizado e ordenado de atos, limitados por princípios gerais ambientais, objetivando um fim comum. Logo, a unidade de conservação como instrumento depende da realização dos instrumentos outros na esfera fática. E mais, embora os incentivos fiscais não possam ser conferidos senão por lei específica, não se descarta sua utilização como meio hábil à realização material da política florestal.

            A legislação federal estabelece medidas jurídicas relevantes à proteção dos interesses difusos e coletivos, os quais BOBBIO (1987) denomina de direitos de terceira geração, mas tais medidas são pouco eficazes no campo prático. Logo, a principal deficiência na efetivação da política florestal é a execução da previsão legal, a otimização da fiscalização e vigilância das atividades práticas. Observa-se que esta deficiência legislativa não é própria do Estado nacional, dos estados e municípios brasileiros, mas atinge os países do MERCOSUL.

            No entanto, a criação de uma norma executiva da política florestal que se refira às Unidades de Conservação deverá ser realizada pelos Estados, em virtude da especificidade dos biomas no território brasileiro, fator esse que dificultaria a criação de uma norma nacional. A exploração modular tendo por parâmetro a capacidade de regeneração da floresta aparenta ser a mais efetiva forma de controle legal da degradação ambiental. A progressividade da área passível de exploração criaria uma equivalência entre unidades de dimensões variadas, garantindo a viabilidade econômica em todas as categorias.

            Isto posto, deduz-se que, visando otimizar a política florestal, os Estados precisam normatizar a utilização econômica das Unidades de Conservação de Uso Sustentável. Essa norma deverá garantir a sustentabilidade de uma floresta de acordo com a sua capacidade de regeneração da mesma, imprescindível para tanto estudos técnico-científicos, continuados, do bioma.


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Notas

            01.As unidades de conservação constituem-se em arma eficaz na 01. Tradução livre do autor

            02

GRUPO I

Áreas < 300 ha

10% da área total

GRUPO II

Äreas > 300 e < 1000ha

30 ha* + 4%. (área total – 300 ha)

GRUPO III

Áreas >1000 ha

58 ha + 2,5%. (área total – 1.000ha)

-30 ha corresponde a máxima exploração do GRUPO I

- 130 ha corresponde a exploração máxima do GRUPO I +GRUPO II

           03. As unidades de conservação constituem-se em arma eficaz na 03 Destaca-se a importância da criação de unidades de conservação com dimensões consideráveis, para possibilitar a completa regeneração da floresta após o ciclo de estabelecido em estudos. A criação de unidades de maiores dimensões protege o interesse coletivo e o meio ambiente, além de restringir o poder discricionário dos agentes políticos.


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PIRES, Paulo de Tarso de Lara. Alternativas jurídicas para o uso sustentável das unidades de conservação no bioma florestal com araucária. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 9, n. 264, 28 mar. 2004. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/5012. Acesso em: 1 maio 2024.